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A Vida na Escola: Actividades Desenvolvidas

5.2.2. Visita Guiada à Escola do CMRA

O Centro de Medicina e de Reabilitação de Alcoitão (CMRA), no período em que se realizou o estudo, possuía um Serviço de Reabilitação Pediátrica onde se encontrava uma equipa multidisciplinar composta por médicos, terapeutas, enfermeiros, psicólogos, técnicos de serviço social, educadores de infância e professores dos 1º, 2º, 3º ciclos de escolaridade e do secundário. Salvo a professora responsável pelo projecto TeleAula: Relação e Aprendizagem (P4) que exercia as suas funções na sala Multimédia (sala polivalente com equipamento escolar próprio) e a docente do 1º ciclo, todos os anos colocada na Escola de origem (nº 2 de Alcoitão), todos os outros professores eram requisitados a pedido do CMRA, sempre que um aluno ali internado deles precisasse.

Os professores que ali davam apoio educativo pertenciam a uma EB 2,3 e a uma Escola Secundária da região e leccionavam, no ano lectivo em que decorreu o estudo, as disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Inglês e Ciências da Natureza, entre outras, de acordo com o perfil do currículo à medida dos alunos internados durante os períodos lectivos em que se realizava o respectivo tratamento. Estas aulas decorriam na Sala Multimédia. O CMRA tinha estabelecido um acordo com a DRELVT que atestava que os alunos com período de internamento superior a um mês deveriam ter aulas e/ou apoio lectivo efectuado pelos professores daquelas escolas e que poderiam mesmo ser ali matriculados, se o prazo fosse mais dilatado.

Na Sala Multimédia decorriam as sessões de comunicação do projecto TeleAula, as sessões de leitura de contos e de música da Fundação do Gil e outras actividades de carácter lúdico e didáctico. Esta sala dispunha de um armário biblioteca e encontrava-se equipada com um computador, fornecido pelo

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CANTIC/CRTIC, ligado à Internet e com recursos tecnológicos (periféricos e

software adequados às características funcionais e às vertentes metodológicas do

projecto TeleAula, como era o caso do programa de videoconferência ElsaVision32 com rede dedicada e câmara acoplada). A sala dispunha de mais dois computadores a funcionar com ligação à Internet, duas impressoras e dois

scanners, também fornecidos pelo CANTIC/CRTIC. Durante quase todo o período

em que decorreu a investigação apenas esteve funcional a ligação à Internet de um dos computadores e com o sistema operativo Windows 98, o que limitava a instalação de novos programas e funcionalidades e era manifestamente insuficiente para o número de alunos que frequentava esta sala-escola.

Os alunos internados no CMRA possuíam diferentes patologias e incapacidades como Trissomia 21, diversos tipos de paralisia, malformações e traumatismos, que obrigavam à total imobilização na cama em alguns casos e, em quase todos, à deslocação em cadeira de rodas, ou outras ajudas técnicas, frequentando assim as actividades escolares. Alguns desses jovens, com idade superior aos dezoito anos, frequentavam o Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF)33.

Muitos dos alunos nunca tinham tido a hipótese de se deslocar a um estabelecimento de ensino regular, devido a vários factores como a falta de acessibilidades, o reduzido campo de manobra das ajudas técnicas e a falta de condições familiares ou de saúde. Por isso, tinham frequentado sempre a Escola em meio hospitalar. Com todos os constrangimentos que essa situação acarretava, alguns jovens apresentavam reflexos comportamentais próprios que pouco se coadunavam com uma situação de sala de aula regular. A manipulação das tecnologias por esses alunos acarretava também algumas dificuldades de ordem física e ergonómica, pois apesar das adaptações de hardware e de interfaces como

32 Relembrando as interfaces de TeleAula, como anteriormente se referiu o Kit ElsaVision, à semelhança do

PictureTel, é constituído por drivers de vídeo, câmara de vídeo, microfone e colunas). Destina-se à comunicação através de videoconferência, estabelecimento de comunicações telefónicas, à partilha de ficheiros ou aplicações e ao apoio do trabalho colaborativo.

33 De acordo com a explicação veiculada pelo governo “o PIEF é o Programa Integrado de Educação e

Formação, medida de excepção que se apresenta como remediação quando tudo o mais falhou e à qual os jovens e suas famílias efectivamente aderem (depois de terem rejeitado outras existentes quer no sistema educativo quer na formação profissional ou de terem sido rejeitados...)” acedido em Janeiro de 2008 de http://www.peti.gov.pt/peeti_menu.asp?menuID=7.

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ratos de bola, estes acabavam por não ser utilizados, porque os alunos pretendiam com as suas limitações aprender a manipular o rato e o teclado padronizados.

Neste sentido, na sala multimédia, foi aberto um espaço de discussão sobre afectos, inclusão, igualdade de oportunidades, afastamento da família durante a estadia no hospital e um potencial ingresso na vida activa, no qual se procurava estimular o gosto e a vontade de estudar novas matérias e a criar novos interesses.

O uso das TIC, com maior destaque para a Internet e para a videoconferência que se utilizava na TeleAula, era muito estimulante para estes alunos e, na maioria das vezes, a única hipótese de lidarem com o mundo exterior, de procurarem memórias ou informação, de se relacionarem com pessoas da mesma idade, com as mesmas aspirações e sonhos - uma hipótese de, através da Escola, se sentirem iguais a todos os outros. Quando a rede se encontrava desligada devido a qualquer falha técnica, para além das aulas que contavam com a presença dos respectivos professores das disciplinas do currículo personalizado, eram realizadas outras actividades como pesquisa de assuntos em livros (da biblioteca da sala Multimédia), elaboração de trabalhos escritos, actividades manuais e procedimentos científicos experimentais (como por exemplo a simulação de um vulcão, a acção do fermento e da flor do iogurte).

Esta sala multimédia além de escola, era utilizada também como despensa de dádivas para o Centro e como sala de ocupação de tempos livres, o que condicionava bastante o regular funcionamento das aulas ou teleaulas, pois tanto auxiliares de educação como educadoras, assim como outros profissionais de saúde entravam e saiam a todo o tempo, não deixando os alunos concentrarem-se nas actividades e tarefas curriculares.

Digno de referência, também, era o isolamento profissional com o qual a docente desta escola se confrontava. Comparando com as observações realizadas nas outras escolas de hospital participantes do estudo (e afastando as devidas particularidades deste local) não era evidente a cultura colaborativa entre educadoras, auxiliares de educação, pessoal médico e de enfermagem, fisioterapeutas e psicólogos. Este facto condicionava o regular funcionamento da escola, pois assim que a professora se ausentava não era dada continuidade às

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actividades lectivas e os alunos ficavam sem qualquer encaminhamento pedagógico, não fazendo os trabalhos de casa, nem se preparando para testes. Esta situação de certo modo foi resolvida com a realização de reuniões de planificação efectuadas no início de cada período e tendo em conta o perfil dos alunos internados.

Numa primeira fase, o processo de ensino-aprendizagem decorria através da realização de actividades específicas, planificadas, para os devidos efeitos, pela professora responsável pela sala multimédia. A operacionalização destas actividades era participada por educadoras e auxiliares de educação que se encontravam presentes na sala. As actividades eram concebidas segundo os princípios da pedagogia activa, centrada no aluno. Procurava-se que os alunos se envolvessem em tarefas comuns, nas quais pudessem discutir e partilhar as suas ideias, criatividade e imaginação, tendo em conta a sua premente necessidade de socialização fora do hospital.

Numa segunda fase a aplicação de conhecimentos e a reflexão aconteciam por intermédio da colaboração com outros, sendo socialmente partilhadas através dos comentários publicados no jornal de parede (presente fisicamente à entrada do piso do serviço de Pediatria) e nas participações virtuais comentadas no blogue criado pela professora (www.amaltatemoutroblog.blogspot.com) ou mediante as TeleAulas com as escolas parceiras, que aproximavam mais do ambiente escolar os alunos em situação de internamento. As TeleAulas eram sempre desenvolvidas e conduzidas em parceria, envolvendo a escola do CMRA, a escola do Hospital Garcia d‟Orta e a EB2.3 parceira (em ocasiões especiais a escola do primeiro ciclo do Agrupamento de Escolas também participava), que alternavam a comunicação consoante o dia da semana. As actividades concretas decorriam com base na discussão de temas explorados anteriormente na plataforma de e-learning TeleAula ou no blogue atrás referido.

Desde o primeiro dia em que fui à escola como investigadora que se estabeleceu entre mim e aprofessora responsável (P4) uma verdadeira parceria, que acabou por se operacionalizar num par pedagógico em que para além de veicularmos conceitos e desenvolvermos as tarefas propostas, davamos apoio à

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utilização dos dispositivos tecnológicos e do software de e-learning quer aos professores da escola EB2,3 de origem quer à professora da escola de hospital parceira (HGO). Esta colaboração permanece anos após a realização da investigação.

Para além de garantir o desenvolvimento das actividades lectivas aquela colaboração evitou, em certa medida, o isolamento da docente, visto o protocolo existente com as escolas parceiras e de origem que previa a presença no hospital de professores das disciplinas que os alunos internados estavam a estudar, apenas se ter concretizado esporadicamente. Este isolamento era em certa medida reforçado pela ausência de uma parceria efectiva entre as instituições circundantes e o próprio CMRA que assegurou uma aproximação mais frutuosa no sentido de uma verdadeira inclusão.

A tabela 5.7. representa uma síntese da caracterização desta escola.

Tabela 5.7.

Caracterização da Escola do CMRA

Alunos

 internados no Serviço de Reabilitação Pediátrica do CMRA, para reabilitação física e cognitiva

 em tratamento de deficiências congénitas e deficiências adquiridas  das escolas de origem e um aluno da escola parceira HGO Idades e níveis de

escolaridade

 dos 7 aos 20 anos

 frequência do 1.º ao 12.º ano de escolaridade, Cursos de Educação e Formação (CEF) e Ensino Especial com currículos personalizados e Percursos Educativos Individuais

Origem  Portugal (continente), Madeira, Açores, PALOP e outros países

Tecnologias

 2 computadores insuficientes, desactualizados e com avarias sucessivas  1 computador desktop com o sistema operativo Windows 98 e software

de videoconferência ElsaVision/ligação RDIS e mais 2 PCs com o Windows XP. Ligação ADSL com falhas. 2 impressoras e 2 scanners, 1 câmara digital e 1 microfone

Constrangimentos visíveis na sala de aula

 diversidade de interesses ao nível sociocultural  grande isolamento social

 vivência de perdas: da saúde física, da auto-estima e da identidade  falta de concentração e dificuldade de aprofundamento dos temas  dificuldade de acompanhamento do aluno pelas escolas de origem

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