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2.4. Espaço, tempo e história Kariri-Xokó e Xukuru-Kariri

2.4.2. Os Xukuru-Kariri

O Município de Palmeira dos Índios está localizado na região Centro-Norte do Estado de Alagoas, limitando-se ao Norte, com o Estado de Pernambuco e com o município alagoano de Quebrangulo, ao Sul com Igaci e Belém, a Leste com Paulo Jacinto, Mar Vermelho e Tanque D‟Arca e a Oeste com Estrela de Alagoas. A área municipal na configuração atual ocupa 460,61 km2 correspondendo a 1.66% do território alagoano, inserida na Mesorregião do Agreste e na microrregião denominada de Palmeira dos Índios210.

O Serrote do Vento, a Serra do Goiti, a Serra da Boa Vista, a Serra do Capela, a Serra Canadá, a Serra Macacos são os relevos do Município de Palmeira dos Índios211, espaço que historicamente foi ocupado pelos indígenas Xukuru-Kariri. O relevo pode ser descrito como movimentado e com dissecados vales estreitos e profundos. Com uma variedade na fertilidade dos solos, embora possa considerar de média para alta. Aproximadamente 40% da unidade geoambiental faz parte da Depressão Sertaneja, paisagem típica do Semiárido nordestino, caracterizada por uma superfície de pediplanação. Predominando o tipo de relevo suave-ondulado, cortada por vales, com vertentes dissecadas. Esses relevos isolados testemunham os ciclos intensos de erosão que atingiram grande parte do chamado Sertão nordestino. A área do Município é recortada por rios perenes, porém de pequena vazão e o potencial de água subterrânea é baixo212. O Coruripe, com nascente na Serra da Mandioca e Traipú são rios do

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OLIVEIRA, C. E. Op. Cit. 1938.

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MASCARENHAS, João de Castro; BELTRÃO, Breno Augusto; SOUZA JR. Luiz Carlos de. (Orgs.). CPRM/Serviço Geológico do Brasil. Projeto cadastro de fontes de abastecimento por água subterrânea. Diagnóstico do Município de Palmeira dos Índios, Estado de Alagoas. Recife: CPRM/PRODEEM, 2005, p. 8.

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BARROS, Ivan. Palmeira dos Índios: terra e gente. Maceió, Academia Maceioense de Letras, 1969, p. 39.

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Município e Cafurnas e Chucurús formam os açudes213. As florestas subcaducifólicas e caducifólicas formam a vegetação, típicas do Agreste214.

A descrição do espaço onde habitava o povo Xukuru-Kariri foi justificada pelas atividades de agricultura naquela época e até a atualidade, com certa abundância, pois abastecia parte do mercado interno do Município e outros vizinhos com frutas, legumes e verduras. Isso, em razão do clima, solos férteis e água suficiente para tais atividades, embora as melhores terras estivessem ocupadas por fazendeiros que historicamente fazem parte da oligarquia local.

A população do Município de Palmeira dos Índios, na década de 1960, era de 15.642 habitantes na cidade, de um total 47.621215. A população indígena informada pelo SPI era de 272 indígenas aldeados216. É importante destacar que grande parte da população indígena na época vivia “desaldeada”, significando que os dados apresentados poderiam ser bastantes inferiores em relação à totalidade da população indígena no Município.

O povoamento do Município de Palmeira dos Índios teve uma relação direta com os povos indígenas habitantes na região. Com a presença religiosa em 1770217do Frei Domingos de São José, que chegou para missão catequética, foi iniciada a construção da primeira igreja tendo como padroeira a Virgem Mãe de Deus. Em 1773 o Frei recebeu uma doação, de D. Maria Pereira Gonçalves, meia légua de terras, possibilitando a substituição da Igreja que foi anteriormente construída. Em 1798, foi criada a Freguesia de Palmeira dos Índios e, em 1835, foi elevada à categoria de vila, desvinculando-se de Anadia. Em 1846, voltou à condição de Distrito, em consequência das disputas políticas entre famílias locais. Sete anos depois retornou à categoria de vila, sendo elevada à cidade, em agosto de 1889218.

A alfabetização para os indígenas foi marcada pela ausência de escolas até o final do século XIX, assim como para toda população da vila e posteriormente Município de Palmeira dos Índios. Poucos indígenas sabiam ler e escrever, mesmo com

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BARROS, I. Op. Cit. 1969, p. 39.

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Idem.

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dem.

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Museu do Índio. Rio de Janeiro. Dados demográficos. 1962. Mf. 167. Fotog. 726.

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Essa perspectiva não invalida a história da presença indígena anterior ao período colonial. Os indígenas na configuração contemporânea a atuação do SPI de 1952 a 1967.

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Para maior detalhamento sobre o povoamento do Município de Palmeira dos Índios ver: Antunes (1984); Barros (1969); Duarte (1974); Torres (1974); Martins (1994); Lopes (2013). IBGE. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/Alagoas/palmeiradosindios.pdf.> Acesso em: 09 de set. 2014.

a presença dos religiosos Franciscanos, ao que parece, apenas alguns nativos no aldeamento eram alfabetizados. A maioria aprendia os ensinamentos religiosos comportamentais para lidar com os símbolos e práticas cristãs necessárias ao ofício da labuta diária, segundo a visão da Igreja Romana e de acordo com o projeto colonial.

Existem estabelecidas escolas de instrucção primaria, uma na povoação de Jacuipe, outra na villa d'Atalaia, na Palmeira dos Indios e finalmente na povoação do Collegio ou Porto-Real; mas que não são privativas para os indios e muito pouco é o proveito que lhes resulta. Estão presentemente providas de professores apenas as de Atalaia e Palmeira e sem provimento as de Jacuipe e Collegio. Havia sido creada uma de igual ensino no Urucú; nunca foi provida, e finalmente se acha suprimida por lei provincial do anno passado. As cadeiras acima são fundadas nos centros das villas e povoações, e por tanto afastadas do foco de população das respectivas aldeias.219

O conhecimento letrado, na perspectiva luso-brasileira, hierarquizava. Não seria diferente para os indígenas, aqueles que acessavam os conhecimentos por meio da escrita, estavam num grau superior aos demais. Status que produzia efeitos por incentivar distanciamentos entre os indígenas e qualquer outro trabalhador analfabeto no Município. Os títulos da Educação formal produziam hierarquia que se traduziam em poder. Portanto, na corrida para manter os territórios indígenas, a alfabetização aparecia como instrumento essencial, pois os indígenas com acesso à escola, mesmo os que passaram a viver na Vila/Cidade contribuíram para o fortalecimento político com os acirramentos entre fazendeiros ou posseiros nos anos de atuação do SPI.

A alfabetização para os indígenas constituiu-se num instrumento político, na medida em que poderia ascender socialmente, mas significava também reunir poder para os confrontos em defesa da terra. Todavia, é preciso avaliar que ocorreram perdas para os indígenas ao serem alfabetizados foram incalculáveis, pois a perspectiva era abandonar as línguas nativas, incluindo os rituais religiosos.

Supõe-se que as primeiras formas de alfabetização com os indígenas em Palmeira dos Índios, tenha ocorrido com coordenação do Franciscano Frei Domingos de São José, por volta de 1770 a1783. E certamente, havia a presença indígena por ser um aldeamento. Ao que parece não se tratava de escolas com estruturas organizadas, como as surgidas em 1838 e funcionou no ano seguinte, destinada aos estudantes do sexo masculino, administrada pelo professor Félix Francisco Pinto, onde possivelmente existiam indígenas estudando. Porém, não foi possível acessar dados consistentes que evidenciassem tal situação, pois os nativos fora dos aldeamentos não eram identificados

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naquele momento. Nos argumentos de Souza220, com a ausência do Estado, os vigários da Freguesia desempenharam o papel de professores da cultura letrada, tendo primazia às crianças de famílias mais abastadas, pois as menos favorecidas estavam em sua maioria no campo, quando não realizando atividades servis na cidade, para as quais as letras eram dispensáveis. Essa perspectiva possibilitou supor que essa situação era a mesma para os indígenas, e ainda, pensar que a massa urbana e rural era composta em grande medida por indígenas.

Até o ano de 1930, Palmeira dos Índios contava com oito professores/as no ensino público atuando em escolas isoladas e nos grupos escolares para atender a uma população estimada em 47.120 habitantes, 10 escolas e 339 estudantes matriculados221. Os dados consultados não possibilitaram saber quantos desse total de estudantes eram indígenas, porém certamente havia um número bastante reduzido. Existiam três escolas particulares mistas atendendo a 41 mulheres e 59 homens matriculados somando um total de 100 estudantes222.

A estratégia dos Xukuru-Kariri foi conviver com os religiosos e com a sociedade palmeirense, às vezes negando, às vezes assumindo uma identidade indígena ou como trabalhadores para fazendeiros nas terras do aldeamento devolutas ao Estado, mas também como pequenos proprietários, em lotes de terras que alguns conseguiram comprar. As implicações para os indígenas com a implantação da Vila de Palmeira elevada à categoria de Município foram na produção de uma massa analfabeta sem acesso à grande parte dos bens, principalmente os que se concentravam na cidade. Portanto, essa perspectiva educativa, evolucionista e hierarquizante produziu distanciamento entre aqueles que tinham acesso à escola e aos que permaneceram, até meados do século XX, analfabetos.

2.5. O processo de instalação dos Postos Indígenas do SPI em Porto Real do