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A realidade social: educação e trabalho na sociedade capitalista

No documento Sua Formação (páginas 31-35)

O sistema capitalista se desenvolveu no decorrer da história, de modo que segundo Nunes Brasil (2005) insurgiu de realidades sociais concretas, sem ser pensada ou manipulada por um grupo como um projeto conspiratório para dominação e subserviência. Nesse sentido, no percurso histórico do capitalismo, os elementos da realidade lógico-histórica, produzem e são produzidas no decorrer da existência do capitalismo, podendo ser consideradas estratégias para a manutenção de seu modo de produção.

O capitalismo possui uma processualidade histórica que impõe e mantém uma realidade compatível com sua lógica, referendada por um processo de socialização humana da qual a base é construída pelo trabalho alienado. Este, relacionando, sistemicamente, com a educação, forja uma concepção de mundo também conveniente ao capitalismo e o resultado só poderia ser a ocultação das contradições

inerentes aos embates travados na relação trabalho e capital. Em seu desenvolvimento, o capitalismo constitui e é constituído de elementos prescritivos dirigidos à ação humana, regulando-a e, nesse sentido, criando um caminho pedagógico (NUNES BRASIL, 2005, p. 9).

Segundo Manacorda (2000, p.3), a educação proporciona o desenvolvimento do homem em sua totalidade, que acontece em diversos espaços não limitados à escola ou à família, mas em todos os espaços da sociedade numa relação de constante busca, por onde perpassa a historicidade, a transitoriedade de toda formação existente. A educação é prática social constituinte e constituída no plano das relações definida nos diferentes espaços da sociedade, que trabalha na constituição do indivíduo, às necessidades sociais, ela é instrumento essencial do processo de socialização e de formação humana (FRIGOTTO, 1995).

Diante disso, a função da educação é a hominização, no sentido de que o homem se constrói, se desenvolve e é formado nas relações sociais que estabelece com o grupo ao qual pertence, pois ele é produto do desenvolvimento histórico; visto que o homem é um ser além do que a natureza o confere, é um produto histórico, membro de uma determinada sociedade, um ser pensante, consciente, livre e universal.

A ordem capitalista vigente regula uma ação pedagógica que condiciona sujeitos, cuja educação tende a repetir um padrão de classificação hierárquica social, escolarmente sancionado e reproduzido nas formas de uma cumplicidade irrefletida, em que se perpetuam modelos estabelecidos. A relação sistema de ensino e sistema produtivo permite que as estruturas autoritárias do segundo transbordem e se tornem padrão repetido pelo primeiro, e, de forma circular, constitui-se em movimento ininterrupto de educação e dominação; daí as relações entre a lógica capitalista conformando processos educativos institucionalizados ou não e a ideologia sub- reptícia que transfere responsabilidades sociais coletivas para a esfera individual, justificando a irracionalidade societal como advinda de incompetências pessoais (NUNES BRASIL, 2005, p. 12).

A educação tem tempo e especificidades que se contrapõem à lógica e ao tempo do mundo do trabalho. Mascarenhas (2005) defende que deve-se respeitar a exigência de um tempo maior na educação, maiores investimentos e seu retorno a longo prazo, contestando a reivindicação do mercado de trabalho que trabalha com o imediatismo, redução de custos, aligeiramento e retorno rápido. Nesse sentido, esta relação não deve acontecer subordinando a educação ao setor mercadológico, visto que o espaço educacional não tem condições de acompanhar o mundo do trabalho, a lógica mercadológica capitalista, suas exigências e características que perseguem o lucro. Não há estabilidade no mercado do trabalho, ele é volátil, imerso a constantes mudanças, pois segue as orientações do capital que visa atividades lucrativas não se sujeitando a diretrizes e planos determinados.

As instituições educativas devem trabalhar em prol de uma formação de qualidade, fornecendo aos seus educandos subsídios para que se desenvolvam como seres pensantes, críticos, autônomos. Assim, os profissionais nelas formados, serão intelectuais capazes de considerarem e conduzirem seus alunos como cidadãos ao entendimento e desenvolvimento de pensamentos e ações que os libertem das amarras produzidas pelas demandas do capital.

Nesse sentido, de acordo com Mascarenhas (2005), para que a educação atenda esses processos de desenvolvimento integral do ser humano, deve-se considerar a concepção de trabalho marxiana, portanto, pelas diferenciações entre emprego e trabalho. O emprego refere- se à ocupação, ao cargo que um indivíduo ocupa. Já o trabalho não é somente a produção de um dado material, assim, esta relação não deve servir como adestramento de corpo e mente visando à produtividade. Trabalho é o devir humano, é elemento chave, essencial da sociabilidade14 humana, para tanto, não há como separar trabalho e educação, pois o homem se torna sociável pela educação, e o trabalho é a base desta sociabilidade.

As determinações do sistema do capital delongam e dificultam a proposta da educação de superar o processo de alienação no qual os trabalhadores são inseridos, para então proporcionar a emancipação da humanidade, pois como aponta Mészáros (2008) “o impacto da incorrigível lógica do capital sobre a educação tem sido grande ao longo do desenvolvimento do sistema” (p. 35), o que dificulta extrair a obscuridade imposta, o capital é irreformável, sua natureza sistêmica, total e reguladora não abre espaços para correções ou mudanças fora de seus objetivos, o que impede o processo de reconstrução. No entanto, o autor acredita que é pela educação que se tem possibilidades de superar os obstáculos impostos.

No sistema do capital, não se espera do trabalhador a sua criação, reflexão sobre sua ação, objetivação de seu desenvolvimento intelectual e de suas potencialidades, mas sim, a alienação desde o processo de fragmentação do trabalho e constituição do trabalhador parcial, espera-se apenas o necessário para determinada função, parte de um todo, não o todo. A mecanização não propicia tempo e nem possibilita a intervenção de seu executor, dispensa-se investimentos intelectual e criativo, acentuando a separação entre pensamento e ação, trabalho intelectual e manual, próprio da sociedade capitalista.

Neste processo de valorização da mão de obra, na qual pensar não faz parte, o homem parece ter se tornado superado, substituível e, sendo assim, não há a necessidade de

14 Sociabilidade é entendida aqui como a capacidade natural do ser humano viver em sociedade.

formação, de qualificação, visto que o trabalhador não é figura central, mas sim as máquinas, os interesses de quem os comanda e logo o seu produto. Nunes Brasil (2005), esclarece que no decorrer do desenvolvimento histórico do capitalismo, este possui ação humana regulativa e formativa por meio de mediação educativa que incute no trabalhador estratégias para à expansão e acumulação do capital, sendo incentivado conhecimentos e habilidades específicos para que se produza continuamente visando a apropriação do produto e da natureza pelo capital subordinando o trabalho ao capital, que incentivam a:

[...] divisão, a segmentação e introjeta padrões expressivos de relações sociais divididas e divisoras, cujo conteúdo baseia-se em hierarquias e valores subjacentes às relações sociais formuladas entre os indivíduos, os grupos e na interrelação entre as instituições sociais (NUNES BRASIL, 2005, p. 12-13).

Nesse contexto, o capitalismo se utiliza de pressupostos para dominar, conformar e manipular os indivíduos a fim de dividi-los e enfraquecê-los enquanto classe. A divisão de classes torna o homem unilateral, incompleto, alienado e, no entanto, o impossibilita de perceber sua situação e de agir para transformá-la. A realidade social da formação de professores está impregnada de ideais neoliberais que permeiam a preparação para a docência e dificulta ações para uma formação integral, iludindo a sociedade, instituições de ensino e aos próprios professores distorcendo seu papel e utilizando essa “mão de obra educacional”

para a reprodução e manutenção dos interesses do capital. Sendo assim, se faz necessário mudanças na relação de trabalho para transformar a realidade social na qual estamos inseridos, de modo a permitir a formação integral do ser humano, a omnilateralidade marxiana, que integre o saber e o fazer.

A formação omnilateral deve iniciar-se na infância, proporcionando a emancipação ao tornar livre a propriedade e os sentidos humanos tanto objetiva quanto subjetivamente, ou seja, “o desenvolvimento de suas condições físicas, psicológicas, afetivas, lúdicas, estéticas”

(LIMA, L. 2010). No momento, estamos frente a uma nova mudança de exploração da classe trabalhadora, novas exigências estão sendo postas pelo capitalismo à educação.

[...] O que sociólogos e economistas estão sinalizando em seus estudos nos diz que as mudanças na organização do trabalho e a introdução de novas tecnologias estão começando a exigir um novo estilo de trabalhador. Este novo trabalhador necessita, agora, de habilidades gerais de comunicação, abstração e integração, as quais não podem ser geradas rapidamente no próprio local de trabalho. São habilidades próprias de serem aprendidas na escola, durante a instrução regular. Esta é a raiz do recente interesse das classes dominantes pela qualidade da escola, em especial da escola básica (FREITAS, L. 2011, p. 97-98).

Diante disso, percebe-se que investidores veem a escola como lócus para a formação da mão de obra, diminuindo o tempo e os custos das empresas em qualificação da sua mão de

obra, ocultando seu real interesse pela qualidade da escola. Hermida (2012) afirma que inseridos neste contexto capitalista, a educação escolar é utilizada para a formação de contingentes de indivíduos, no momento do desenvolvimento das competências que lhe insere nos processos produtivos exigidos pelo trabalho, sendo assim, a educação desempenha um duplo papel no processo de produção e de ganhos econômicos. De um lado ela incrementa a capacidade produtiva dos futuros trabalhadores e de outro ajuda a diluir e a despolitizar as relações de classe, contribuindo para a perpetuação das condições políticas, sociais e econômicas pelas quais uma parte do produto gerado é expropriada. E é nesse contexto que defendemos a importância de uma perspectiva de formação unitária para professores.

A formação de professores embasada na perspectiva de formação de todas as potencialidades do ser, possibilita que o futuro professor perceba que o seu trabalho, “o trabalho docente contém a contradição, a oposição entre o saber do dominante e o saber do dominado[...]” (SILVA, K. 2011, p. 19), e que por seu trabalho há condições necessárias de desenvolvimento de cidadãos politizados, críticos e emancipados.

No documento Sua Formação (páginas 31-35)