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Crimes omissivos impróprios e a responsabilidade penal do garante na violência sexual contra pessoa vulnerável

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Academic year: 2021

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GRANDE DO SUL

CATIUSA RAMONE KUHN

CRIMES OMISSIVOS IMPRÓPRIOS E A RESPONSABILIDADE PENAL DO GARANTE NA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA PESSOA VULNERÁVEL

Ijuí (RS) 2018

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CATIUSA RAMONE KUHN

CRIMES OMISSIVOS IMPRÓPRIOS E A RESPONSABILIDADE PENAL DO GARANTE NA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA PESSOA VULNERÁVEL

Monografia de Conclusão do Curso de Graduação em Direito, objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão Curso - TCC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: MSc. Ester Eliana Heuser

Ijuí (RS) 2018

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Dedico esse trabalho à minha família, por todo apoio, carinho e incentivo de sempre!

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AGRADECIMENTOS

Inicio agradecendo à minha família, em geral, pelo apoio, incentivo e carinho de sempre.

Agradeço aos meus pais, que desde meus primeiros passos me mostraram com muito amor e dedicação o caminho correto e os princípios a seguir, me ensinando e mostrando que a honestidade e o caráter são os bens mais valiosos que um ser humano pode ter. Obrigada por tudo que fizeram por mim. Ao meu amado irmão Cauê, que apesar de estar apenas começando a sua caminhada, tenho certeza de que será um grande homem.

Ao meu namorado, por todo apoio, incentivo e paciência, principalmente nos momentos de angústia e cansaço, sempre me dando ânimo e não me deixando desistir dos meus sonhos. Também aos meus sogros, pelo incentivo e carinho durante todo este caminhar.

Aos meus amigos, por entenderem os momentos de ausência e, mesmo assim, continuarem estando sempre presentes.

À minha orientadora, Prof.ª Ester Eliana Hauser, a quem admiro muito e que é uma referência para mim, não só na área Penal, mas para todo o Curso de Direito. Foi um privilégio ser sua aluna. Agradeço por todos os ensinamentos, e, principalmente, por me fez amar ainda mais o DIREITO. Obrigada pela paciência, incentivo, auxílio e pela dedicação durante a realização deste trabalho de conclusão de curso.

Agradeço, igualmente, a todos os demais professores da Universidade Regional do Noroeste do Estado – UNIJUÍ, por todo aprendizado dividido durante as aulas, que me fizeram crescer muito no decorrer destes 5 anos, tanto intelectualmente quanto como pessoa.

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Aos meus colegas, pelo apoio e ombro amigo, tanto nos bons, quanto nos maus momentos, afinal, “quem caminha sozinho pode até chegar mais rápido, mas aquele que vai acompanhado, com certeza vai mais longe.” Clarice Lispector.

E, finalmente, a DEUS, por ter me iluminado e ter me tornado privilegiada em poder cursar um curso tão lindo como o Direito é.

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“Justiça é consciência, não uma consciência pessoal mas a consciência de toda a humanidade. Aqueles que reconhecem claramente a voz de suas próprias consciências normalmente reconhecem também a voz da justiça.” Alexander Solzhenitsyn.

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O presente trabalho de conclusão de curso busca verificar o modo como ocorrem os crimes omissivos impróprios, bem como avaliar como se produz a responsabilização penal da pessoa que possui o dever de cuidado, proteção ou vigilância, ou seja, o garantidor, frente à sua omissão nos crimes de violência sexual perpetrados contra pessoa vulnerável. Analisa o conceito analítico de delito e a conduta penalmente relevante, descrevendo o crime como fato típico, antijurídico e culpável. Distingue brevemente ação e omissão. Diferencia a conduta comissiva, omissiva própria e omissiva imprópria (comissiva por omissão). Averigua a imputação do resultado e o nexo de causalidade nos crimes omissivos impróprios. Identifica o papel do garantidor, bem como o dolo e culpa nos crimes comissivos por omissão. Busca compreender a coautoria, a participação e a responsabilidade penal do garantidor ante à prática de um crime omissivo impróprio. Analisa a proteção à dignidade sexual da pessoa vulnerável no Código Penal Brasileiro, demonstrando o conceito de dignidade sexual. Desenvolve o conceito de vulnerabilidade, identificando o fenômeno da violência sexual no Brasil e a tutela penal da dignidade sexual. Averigua o reconhecimento da participação por omissão na jurisprudência brasileira, enfatizando a conveniência da responsabilização do garantidor nos crimes contra a dignidade sexual de pessoa vulnerável. E, por fim, finaliza concluindo que o Estado deve garantir a proteção ao Direito Fundamental de preservação à Dignidade Sexual de crianças e adolescentes vítimas de crimes de cunho sexual, perpetrados no âmbito familiar, ante à omissão de seu protetor, visando coibir a ocorrência de tais delitos, além de efetuar a responsabilização penal, de maneira severa, do garantidor omitente.

Palavras-Chave: Crimes omissivos impróprios. Violência sexual. Vulnerabilidade. Garante. Responsabilidade Penal.

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The present work of conclusion of course seeks to verify the way in which improper omissive crimes occur, as well as to evaluate how the criminal responsibility of the person who has the duty of care, protection or vigilance, that is to say, the guarantor, takes place against its omission crimes of sexual violence perpetrated against a vulnerable person. It analyzes the analytical concept of crime and the relevant criminal conduct, describing crime as a typical, unlawful and culpable crime. Briefly distinguish between action and omission. It differs from commissive conduct, omissive proper and improper omissive (commissive by omission). Find out the imputation of the result and the causal link in improper omissive crimes. It identifies the role of the guarantor as well as the fraud and guilt in committing crimes by omission. It seeks to understand the co-authoring, participation and criminal responsibility of the guarantor before the practice of an improper omissive crime. It analyzes the protection of the sexual dignity of the vulnerable person in the Brazilian Penal Code, demonstrating the concept of sexual dignity. It develops the concept of vulnerability, identifying the phenomenon of sexual violence in Brazil and the criminal protection of sexual dignity. Find out the recognition of participation by omission in Brazilian jurisprudence, emphasizing the convenience of guarantor accountability in crimes against the sexual dignity of a vulnerable person. Finally, it concludes by concluding that the State must guarantee the protection of the Fundamental Right of Preservation of the Sexual Dignity of children and adolescents who are victims of crimes of a sexual nature, perpetrated in the family, before the omission of their protector, in order to prevent the occurrence of such criminal offenses, in addition to making criminal responsibility, in a severe manner, of the omitting guarantor.

Keywords: Inaccurate omissive crimes. Sexual violence. Vulnerability. Ensures. Criminal Responsibility.

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INTRODUÇÃO...9

1 CRIMES OMISSIVOS IMPRÓPRIOS E RESPONSABILIDADE PENAL...11

1.1 O conceito analítico de delito e a conduta penalmente relevante: crime como fato típico, antijurídico e culpável...12

1.2 A conduta penalmente relevante e a distinção entre ação e omissão...19

1.2.1 A conduta comissiva...25

1.2.2 A conduta omissiva própria e omissiva imprópria: distinções...25

1.3 A imputação do resultado e o nexo de causalidade nos crimes omissivos impróprios...30

1.4 O papel do garantidor, dolo e culpa nos crimes omissivos impróprios...35

1.5 Coautoria, participação e a responsabilidade penal do garantidor...40

2 OS CRIMES SEXUAIS CONTRA PESSOA VULNERÁVEL E A RESPONSABILIZAÇÃO DO GARANTE POR CONDUTA OMISSIVA IMPRÓPRIA...43

2.1 A proteção à dignidade sexual da pessoa vulnerável no Código Penal Brasileiro...43

2.1.1 O conceito de dignidade sexual...51

2.1.2 O conceito de vulnerabilidade...52

2.1.3 Os crimes em espécie...55

2.2 O fenômeno da violência sexual no Brasil e a tutela penal da dignidade sexual: a violência silenciosa...61

2.3 O reconhecimento da participação por omissão na jurisprudência brasileira...66

2.4 A conveniência da responsabilização do garantidor nos crimes contra a dignidade sexual de pessoa vulnerável...69

CONCLUSÃO...76

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso aborda o modo como ocorre a responsabilização penal dos garantes, possuidores do dever legal de cuidado, proteção ou vigilância, frente à sua omissão nos crimes sexuais perpetrados contra sujeitos vulneráveis, quais sejam no presente estudo, crianças e adolescentes.

Tal estudo se faz necessário ante à grande frequência com que ocorrem crimes contra a dignidade sexual de pessoas vulneráveis, problema este que vem sendo enfrentado desde os tempos primórdios e, ainda hoje, em que pese a evolução em que se encontra a sociedade, os índices apontam que a frequência com que ocorrem é muito elevada. Crimes estes que causam muita repulsa, tanto pelo fato de serem cometidos contra crianças e adolescentes, quanto pelo fato de tal violência ocorrer, na grande maioria dos casos, dentro de suas próprias casas, perpetuando-se sob os olhos de quem possui o dever legal de garantir sua proteção e segurança.

No intuído de realizar o presente estudo, buscar-se-á analisar o referencial teórico basilar para a concretização da presente monografia, realizando-se leitura e fichamento de tal material, juntamente com a coleta de dados estatísticos, legislativos, e fontes bibliográficas, tanto físicas, quanto eletrônicas, com o fulcro de realizar uma reflexão crítica sobre o assunto supracitado.

Primeiramente, no decorrer do primeiro capítulo elaborado, realizou-se uma breve abordagem sobre o conceito analítico de delito, analisando a conduta penalmente relevante, bem como distinguindo ação e omissão. Verificou-se ainda, o modo como ocorre a responsabilização penal do garantidor omisso, identificando como se dá a imputação do

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resultado e o nexo de causalidade nos crimes omissivos impróprios, enfatizando a incidência do dolo ou da culpa, além da possibilidade de coautoria e participação.

Já no segundo capítulo, buscou-se identificar a proteção pelo Estado à dignidade do sujeito tido como vulnerável, aprofundando-se na questão da dignidade sexual do indivíduo, analisando os crimes em espécie no Código Penal Brasileiro a fim de verificar como ocorre a responsabilização penal do garante omisso frente à legislação brasileira.

Por fim, averiguou-se como se dá o fenômeno da violência sexual no Brasil e como ocorre a tutela penal da dignidade sexual dos sujeitos tidos como vulneráveis, verificando o reconhecimento da participação por omissão na jurisprudência brasileira, bem como a conveniência da responsabilização do garantidor nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes.

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1 CRIMES OMISSIVOS IMPRÓPRIOS E RESPONSABILIDADE PENAL

A violência sexual praticada contra pessoas vulneráveis - crianças e adolescentes - é

um problema que vem sendo enfrentado desde os tempos primórdios e, ainda hoje, em que pese a evolução em que se encontra a sociedade, seus índices são bastante significativos, sendo que, na maioria dos casos, tais situações se dão no ambiente familiar e envolvem pessoas próximas, perpetuando-se em razão da omissão ou negligência de quem tem a obrigação de proteção, cuidado e vigilância (garantidores).

Verifica-se, desta forma, a necessidade de se impor uma medida penal diferenciada a quem, em que pese possuir o dever de prestar auxílio, cuidado e proteção, estando na posição de garantidor, se omite, vindo a colaborar com o resultado do delito sofrido pelo sujeito que, por sua condição de desenvolvimento físico, mental e psicológico, encontra-se em uma situação de vulnerabilidade, necessitando de uma maior proteção pelo Estado em relação às demais pessoas da sociedade.

Consoante ao disposto, à luz do artigo 229 da Carta Constitucional Brasileira (1988), constata-se que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores [...]”, ou seja, possuem o dever legal de garantir a proteção de seus filhos. Por conseguinte, aliado ao disposto no artigo 131, parágrafo 2º, alínea “a”, do Código Penal de 1940, aduz-se que quem tem o dever legal de proteção responde penalmente pelo crime como se o praticado tivesse.

Tratam-se dos crimes omissivos impróprios, ou como também chamados, comissivos por omissão, que são aqueles que ocorrem, principalmente, em situações de violência sexual praticada contra pessoa vulnerável, sob os olhos de quem possui o dever legal de garantia, devendo este arcar com as consequências penais não apenas frente a tal omissão, mas sim de forma relevante, a fim de ser responsabilizado na seara criminal como se autor fosse de tal

delito.

1 Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa.

Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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1.1 O conceito analítico de delito e a conduta penalmente relevante: crime como fato típico, antijurídico e culpável.

A partir do Princípio da Legalidade, garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso XXXIX, da Magna Carta (BRASIL, 1988) e protegida como cláusula pétrea, observa-se que “não há crime observa-sem lei anterior que o defina, nem pena observa-sem prévia cominação legal2.”

Assim, verifica-se a necessária cominação em lei para que se possa imputar a alguém eventual delito.

Ademais, já no artigo primeiro do Código Penal (BRASIL, 1940) vigente, identifica-se a presença de tal princípio, referindo que “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”, sendo que, segundo ele, conforme aduz Paulo Queiróz (2015, p. 76), “só por lei, em sentido estrito, emanada do Poder Legislativo, o Estado poderá legislar sobre matéria penal, definindo as infrações penais e cominando as respectivas sanções.”

Desta feita, conforme o disposto no artigo 1º da Lei de Introdução do Código Penal (BRASIL, 1941), “considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa [...]”

Outrossim, seguindo a esteira de Guilherme de Souza Nucci (2014b, p. 137), o crime é um ente político, pois a criminalização do comportamento que se quer punir, depende da escolha do legislador ordinário:

[...] O conceito de crime é artificial, ou seja, independe de fatores naturais, constatados por um juízo de percepção sensorial, uma vez que se torna impossível classificar uma conduta, ontologicamente, como criminosa. Em verdade, é a sociedade a criadora inaugural do crime, qualificativo que reserva às condutas ilícitas mais gravosas e merecedoras de maior rigor punitivo. Após, cabe ao legislador transformar esse intento em figura típica, criando a lei que permitirá a aplicação do anseio social aos casos concretos.

Cumpre ressaltar que, conforme entendimento de Nelson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso (1978), antes de tudo, vem o crime a ser um fato, o qual não pode ser compreendido apenas sob a expressão da vontade mediante ação ou omissão, mas também sob o seu

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resultado, ou seja, os seus consequentes efeitos, eventual lesão ou situação de perigo à que se submete determinado interesse jurídico penalmente tutelado.

Nesta senda, no que se refere ao conceito doutrinário de delito, a definição de infração penal pode ser desdobrada em vários aspectos. O primeiro, trata-se do aspecto formal, em que “a infração penal é somente o que a lei disser que é, já que não há crime nem pena sem lei que o defina.” (QUEIRÓZ, 2015, p. 181).

Da mesma forma, segundo entendimento de Nucci (2014b, p. 138), o conceito formal de crime “é a concepção do direito acerca do delito, constituindo a conduta proibida por lei, sob ameaça de aplicação de pena, numa visão legislativa do fenômeno.”

Verifica-se assim, que o aspecto formal do conceito de delito é compreendido como a tradução do que refere o Princípio da Legalidade, sendo o crime toda ação ou omissão proibida por lei, sob a ameaça de imputação de pena (BITENCOURT, 2012).

Portanto, “o conceito formal corresponde a definição nominal, ou seja, relação de um termo a aquilo que o designa.” (ELEUTÉRIO, 2001, p. 185).

Outro aspecto a ser observado é o conceito material do delito, sendo que, a partir deste, temos por crime a

[...] conduta individual e socialmente danosa ou gravemente lesiva de bem jurídico, visto que, por implicar as maiores violências (em tese) sobre a liberdade do cidadão, segue-se que só faz sentido definir como delito condutas que não possam ser

objeto (exclusivamente) de outras formas menos lesivas de prevenção e controle social [...] (QUEIRÓZ, 2015, pp. 181-182, grifo nosso).

Destarte, segundo o entendimento de Guilherme de Souza Nucci (2014b, p. 137), o conceito material de delito “é a concepção da sociedade sobre o que pode e deve ser proibido, mediante a aplicação de sanção penal. É, pois, a conduta que ofende um bem juridicamente tutelado, merecedora de pena.”

Na mesma senda, refere Cezar Roberto Bitencourt (2012) que, segundo o aspecto material, delito é toda ação ou omissão que vem a contrariar os valores e interesses mais relevantes no âmbito de uma sociedade, necessitando sua expressa proibição com a consequente ameaça de pena em caso de descumprimento.

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Assim sendo, é de se perceber que “o conceito material corresponde a definição real, que procura estabelecer o conteúdo do fato punível.” (ELEUTÉRIO, 2001, p. 185).

Vale ressaltar que, no entendimento de Paulo Queiróz (2015, p. 182), há ainda a existência dos conceitos de crime formal-material e definitorial, definindo o primeiro, pelo fato de ter por insuficiente os critérios formal e material quando vistos de forma isolada, referindo ser o crime uma infração potencialmente lesiva ao ordenamento jurídico-penal.

Já o conceito definitorial, que advém da Teoria do Etiquetamento3, consiste na ideia de que:

O delito, que não tem consistência material, é o resultado, não tanto da lei, mas dos processos de reação social, que constroem a conduta desviada, de modo que a conduta não é desviada em si mesma, e sim em razão de um controle social de reação e seleção. O crime é, portanto, uma construção social arbitrária resultante dos processos de criminalização primária (a lei etc.) e secundária, a cargo do sistema de justiça criminal (Polícia etc.). (QUEIRÓZ, 2015, p. 182).

Finalmente, passa-se à análise do conceito analítico de delito, tido como um desdobramento do conceito formal, conforme acima averiguado (QUEIRÓZ, 2015, p. 183), sendo, desta forma, compreendido majoritariamente, em que pese as divergências encontradas na doutrina brasileira, como fato típico, antijurídico e culpável.

Também chamado como conceito dogmático ou jurídico de crime, conforme Eleutério (2001, p. 186, grifo nosso),

Sua origem remonta ao ano de 1906, oriunda da doutrina alemã de Beling, através de sua obra “Die Lehre vom Verbrechen” (“A Teoria do Crime”), que culminou em 1930 com sua segunda obra “Die Lehre vom Tatbestand” (“A Teoria do Tipo”). O crime, portanto, passou a ser definido como toda a ação ou omissão, típica,

antijurídica e culpável.

Assim, passa-se ao desdobramento de tais elementos.

3 Também conhecida como Labeling Approach Theory, “é uma teoria criminológica marcada pela ideia de que

as noções de crime e criminoso são construídas socialmente a partir da definição legal e das ações de instâncias oficiais de controle social a respeito do comportamento de determinados indivíduos.” (ORTEGA, 2016).

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No que se refere à tipicidade de um delito, partindo do pressuposto do Princípio da Legalidade no Direito Penal, consoante ao disposto por Paulo Queiróz (2015, p. 184), uma conduta vem a ser típica “sempre que se ajuste à descrição prevista numa norma penal incriminadora (v.g., matar, roubar) [...] Declarar, pois, típica uma ação, é declará-la jurídico-penalmente relevante [...]”

Nesse sentido, à luz do entendimento de Fernando Eleutério (2001, p. 187), verifica-se que “a conduta praticada deve se ajustar a descrição do crime criado pelo legislador e previsto em lei, pois pode a conduta não ser crime, e, não sendo crime, denomina-se: conduta atípica (não punida, tendo em vista que não existe um dispositivo penal que a incrimine).”

Não obstante o acima disposto, necessário ressaltar que a tipicidade exige plena adequação da conduta aos elementos objetivos (descritivos), normativos e subjetivos (dolo) do tipo. Nesta senda, verifica-se a existência de “[...] uma operação intelectual de conexão entre a infinita variedade de fatos possíveis da vida real e o modelo típico descrito na lei.” (BITENCOURT, 2012, p. 337).

Nesse sentido, “[...] é indispensável para a existência da tipicidade que não só o fato, objetivamente considerado, mas também sua antijuridicidade e os elementos subjetivos se subsumam a ele” (MIRABETE; FABBRINI, 2012, p. 98).

Desta forma, para que seja uma conduta tida como típica, necessário se faz analisar se determinada conduta se adapta aos requisitos determinados em lei, passando-se a um juízo de tipicidade (BITENCOURT, 2012). Assim, conclui-se que para que um fato seja tido como típico, primeiramente é necessário analisar se presentes estão os elementos objetivos, normativos e subjetivos.

No que se refere aos elementos objetivos, ou como também chamados, descritivos, verifica-se que “podem ser facilmente compreendidos somente com a percepção dos sentidos. Referem-se a objetos, seres, animais, coisas ou atos perceptíveis pelos sentidos. Os elementos objetivos não oferecem, de regra, nenhuma dificuldade [...]” (BITENCOURT, 2012, p. 342).

Quanto aos elementos normativos, são aqueles que necessitam de uma atividade valorativa para sua compreensão, ou seja, é necessário fazer um juízo de valor, tendo em vista

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que são circunstâncias que não se limitam a descrever o natural (BITENCOURT, 2012). “São exemplos característicos de elementos normativos expressões tais como ‘indevidamente’ [...]; ‘sem justa causa’ [...]; ‘sem permissão legal’ [...]” (BITENCOURT, 2012, p. 342).

Já os elementos subjetivos do tipo, segundo Bitencourt (2012, p. 342, grifo do autor):

[...] Permitem compreender a ação ou omissão típica não só como um processo causal cego, mas como um processo causal dirigido pela vontade humana para o alcance de um fim. De tal forma que, no momento de realizar o juízo de subsunção de uma conduta a um concreto tipo penal, é necessário também analisar o conteúdo dessa vontade, isto é, sua relevância típica.

Isto posto, a partir dos elementos subjetivos do tipo, para que se configure a tipicidade do delito, verifica-se a necessidade de o agente visar atingir determinada finalidade, ou seja, apresentam uma vontade de agir, isto é, o ânimo com que o agente atua. Da mesma forma, constitui elemento subjetivo o estado de consciência do agente ao cometer o delito (MIRABETE; FABBRINI, 2012).

Assim, necessário se faz tecer alguns comentários acerca do dolo, ou seja, a vontade de agir do agente ante ao cometimento de um delito.

Segundo Queiróz (2015, p. 242, grifo nosso), “há o dolo, sempre que o agente realiza os elementos do tipo com consciência e vontade; ou ainda: atua com dolo o agente que dirige sua ação, quer direta, quer indiretamente, no sentido da realização do tipo, consciente e

voluntariamente.”

Desta forma, para a caracterização do dolo, precisam estar presentes seus elementos, quais sejam o cognitivo ou intelectual, a partir do qual é necessária, no momento da prática de determinada ação, a consciência, previsão ou representação do ato, bem como a vontade de agir, abrangendo a conduta do agente (comissiva ou omissiva), o resultado e o nexo causal (BITENCOURT, 2012).

Nesse sentido, segundo Queiróz (2015, p. 242, grifo nosso) “a consciência necessária à configuração do dolo é o conhecimento da lesividade ou potencialidade lesiva de uma

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se faltar um desses elementos, o caso será (em princípio) de simples culpa.” (QUEIRÓZ, 2015, p. 243).

Cumpre ressaltar que, nos crimes omissivos, assunto a ser abordado no presente trabalho de conclusão de curso, a omissão será dolosa quando o agente, podendo atuar concretamente, se omite de forma consciente e voluntária, a ação que está a seu alcance e lhe é exigida, permitindo com que o fato típico ocorra, seja de forma consumada ou tentada, bem como a omissão será culposa, quando decorrer de negligência, imprudência ou imperícia (QUEIRÓZ, 2015).

Faz-se necessário destacar ainda, que o dolo pode ocorrer de forma direta ou eventual. Temos por dolo direto, ou como também chamado, dolo imediato, segundo Bitencourt (2012, p. 352, grifo do autor), quando:

O agente quer o resultado representado como fim de sua ação. A vontade do agente é dirigida à realização do fato típico. O objeto do dolo direto é o fim proposto, os

meios escolhidos e os efeitos colaterais representados como necessários à

realização do fim pretendido. Assim, o dolo direto compõe-se de três aspectos, quais sejam, representação, querer e anuir, nos seguintes termos: 1) a representação do resultado, dos meios necessários e das consequências secundárias; 2) o querer a ação, o resultado, bem como os meios escolhidos para a sua consecução; 3) o anuir na realização das consequências previstas como certas, necessárias ou possíveis, decorrentes do uso dos meios escolhidos para atingir o fim proposto ou da forma de utilização desses meios.

O dolo eventual, por sua vez, é quando o agente não tem a intenção de produzir determinado resultado, porém assume o risco. “Haverá dolo eventual quando o agente não quiser diretamente a realização do tipo, mas aceitá-la como possível ou até provável,

assumindo o risco da produção dor resultado (art. 18, in fine, do CP).” (BITENCOURT,

2012, p. 354, grifo do autor).

Desta forma, verifica-se que, segundo Bitencourt (2012), a consciência e a vontade, como elementos constitutivos, devem estar presentes para a caracterização do dolo eventual, sendo que o mero conhecimento da probabilidade do resultado é insuficiente para tal.

Sendo assim, temos como típica toda a conduta humana, seja ela comissiva ou omissiva, que corresponda ao descrito no modelo legal, logo, tipicidade significa a

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coincidência entre algum comportamento humano e determinada norma penal incriminadora (QUEIRÓZ, 2015, p. 184).

Quanto à antijuridicidade, também denominada como ilicitude, verificamos que a conduta, além de estar tipificada na Lei Penal (BRASIL, 1940), conforme supra analisado, faz-se por necessário analisar se esta contraria o ordenamento jurídico penal como um todo sendo, de fato, tida como ilícita.

Tecendo comentários acerca da matéria, afirma Paulo Queiróz (2015, p. 185, grifo do autor) que:

Diz-se assim ilícita (ou antijurídica) a ação sempre que for praticada contrariamente ao direito, isto é, sem o amparo de uma causa de exclusão da ilicitude, como a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal ou o exercício regular de direito (CP, art. 23). Assim, não há crime de homicídio, mas

homicídio simplesmente, quando, por exemplo, o agente mata outrem em legítima

defesa. Significa dizer que, embora típica a ação, visto coincidir com a descrição do art. 121 do Código Penal, ela não é considerada ilícita, uma vez que está autorizada pelo direito, de sorte que quem mata em legítima defesa atua legitimamente; age, pois, nos limites da legalidade.

Nessa senda, assevera Eleutério (2001, p. 188), que a ação tipificada em norma penal incriminadora será antijurídica sempre que não estiver expressamente respaldada em Lei como sendo lícita. Logo, podemos encontrar o conceito de ilicitude de um fato típico por exclusão, sendo que, deste modo, quando determinado fato não for declarado lícito por eventual causa de exclusão de ilicitude, será antijurídico.

Por sua vez, no que se refere à culpabilidade, salienta Nucci (2014b, p. 236, grifo nosso), que “trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o agente ser imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como

ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo [...]”

Cumpre ressaltar que, em nosso País, em lugar de se analisar, caso a caso, a maturidade do agente que cometeu determinado delito para o fim de analisar eventual culpabilidade, optou-se pelo critério objetivo cronológico, qual seja, ter mais de 18 anos de

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idade (NUCCI, 2014b, p. 242), conforme disposto do artigo 274 do Código Penal (BRASIL, 1940).

Não obstante, o critério cronológico não é o único a ser observado. Há também a verificação da capacidade mental do agente que cometeu o delito. Nesse passo, conforme entendimento de Guilherme de Souza Nucci (2014b, p. 242, grifo nosso), para fins de análise quanto à inimputabilidade, hão de ser analisados os seguintes aspectos:

a) biológico: leva-se em conta exclusivamente a saúde mental do agente, isto é, se o

agente é, ou não, doente mental ou possui, ou não, um desenvolvimento mental incompleto ou retardado. A adoção restrita desse critério faz com que o juiz fique absolutamente dependente do laudo pericial; b) psicológico: leva-se em consideração unicamente a capacidade que o agente possui para apreciar o caráter ilícito do fato ou de comportar-se de acordo com esse entendimento. Acolhido esse critério de maneira exclusiva, torna-se o juiz a figura de destaque nesse contexto, podendo apreciar a imputabilidade penal com imenso arbítrio; c) biopsicológico: levam-se em conta os dois critérios anteriores unidos, ou seja, verifica-se se o agente é mentalmente são e se possui capacidade de entender a ilicitude do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. É o princípio adotado pelo Código Penal, como se pode vislumbrar no art. 265 [...].

Assim sendo, “a culpabilidade constitui, portanto, as condições subjetivas que devem concorrer para que seu autor seja merecedor da pena, pois, do contrário isto é, se inculpável, não sofrerá pena alguma, devendo ser absolvido.” (QUEIRÓZ, 2015, p. 186).

Ora, face as considerações aduzidas, bem como o desdobramento do conceito analítico do delito, constata-se que o crime é um fato típico, com fundamento do Princípio da Legalidade, antijurídico, pois contrário ao disposto no ordenamento legal, e culpável, ante às questões relativas à imputabilidade, consciência da ilicitude e possibilidade e exigibilidade de agir de outra forma.

1.2 A conduta penalmente relevante e a distinção entre ação e omissão.

Segundo Ribeiro (2012) a necessidade de uma conduta, ação ou omissão, para a constituição do delito é uma conquista importantíssima para o direito penal liberal, com fulcro na proteção dos bens jurídicos vitais para o homem e para a sociedade em geral, tendo em

4 Art. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas

estabelecidas na legislação especial.

5 Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou

retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (BRASIL, 1940).

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vista que, em tempos remotos, o direito penal prescindiu o conceito de conduta para aplicar a pena, vindo a serem punidos, deste modo, coisas, animais e até mesmo pensamentos.

Com efeito, segundo Brandão (2000), a ação e a omissão são as modalidades da conduta humana, sendo que, por muitas vezes, toma-se o termo ação como sinônimo da conduta. Isso se dá pelo fato de o termo ação envolver a comissão, que se identifica com a ação positiva, e a omissão, que se identifica com a negativa.

Consoante ao disposto verifica-se que:

A conduta humana é a pedra angular da teoria do delito. É com base nela que se formulam todos os juízos que compõem o conceito de crime: tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade. A tipicidade é a adequação da conduta com a norma; a antijuridicidade é o juízo de reprovação da conduta e a culpabilidade é o juízo de reprovação sobre o autor da conduta. (BRANDÃO, 2000, p. 1).

Todavia, verifica-se que o Código Penal (BRASIL, 1940) vigente não conceitua ação ou omissão, ficando a critério da doutrina atribuir-lhes eventual definição sendo que, conforme entendimento de Bitencourt (2012), seria humanamente impossível elaborar um conceito genérico para ambos.

Nesse sentido, oportuna é a transcrição de Cezar Roberto Bitencourt (2012, p. 278, grifo do autor) que refere que “os conceitos de ação e de omissão devem ser valorativamente

neutros, no sentido de não prejulgarem aqueles elementos (tipicidade, antijuridicidade e

culpabilidade).”

Por conseguinte, à luz do saber de Bitencourt (2012, p. 278, grifo do autor):

O resultado não pertence à ação, mas ao tipo, naqueles crimes que o exigem (crimes materiais). Ação e omissão, em sentido estrito, constituem as duas formas básicas do fato punível, cada uma com sua estrutura específica, distinta: a primeira viola uma proibição (crime comissivo), a segunda descumpre uma ordem (crime omissivo).

Deste modo, no tocante à conduta, segundo Guilherme de Souza Nucci (2014b, p. 161), no prisma jurídico, esta possui diferentes teorias da ação, sendo que, dentre os doutrinadores estudados, verificou-se como principais as teorias: causal – naturalista, causal – neokantiana, finalista e social, as quais serão suscintamente analisadas.

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A primeira remete-se ao conceito causal ou naturalista da ação, definida a partir do entendimento de Liszt, Beling e Radbruch que, segundo entendimento de Bierrenbach (2014, p. 51), “caracterizava-se por distinguir, nitidamente, o processo causal externo (ação, resultado e relação de causalidade entre ambos) – a parte objetiva do fato – e o conteúdo da vontade, a parte subjetiva).”

Deste modo, “a ação originaria de um processo causal sempre que um movimento corporal voluntário pudesse ser atribuído à vontade humana, qualquer que fosse seu conteúdo.” (BIERRENBACH, 2014, p. 51).

Nesse viés, temos que “conduta é a ação ou omissão voluntária e consciente que determina movimentos corpóreos.” (NUCCI, 2014b, p. 161), não se analisando, desta forma, o resultado e eventual culpabilidade do agente (dolo ou culpa), fato este que a difere da teoria finalista da ação, que será discorrida a seguir.

Nesse sentido, à luz do entendimento de Cláudio Brandão (2000, p. 2, grifo nosso):

O nome dessa teoria (causalista) deriva do nome causalidade. A lei da causalidade, que rege as ciências da natureza, baseia-se numa relação de causa e efeito, que não é compreendida, mas simplesmente explicada pelo homem. Um exemplo da causalidade é a fervura da água: a cem graus centígrados, nas condições naturais de temperatura e pressão, dar-se-á a fervura da água; pode-se dizer que a fervura da água foi efeito da situação de ela estar a cem graus centígrados. Nesse mesmo raciocínio, transmudando-o para a ação, pode-se dizer que a modificação do

mundo exterior é efeito da volição do sujeito.

Assim, verifica-se que, a partir desta teoria, a ação é o movimento corpóreo voluntário que causa modificação no mundo exterior, limitando-se, desta forma, a função da ação à atribuição de uma modificação no mundo exterior (BRANDÃO, 2000).

Não obstante, tecendo comentários acerca da teoria causal da ação, Bitencourt (2012, p. 280) refere que em que pese tal teoria teve boa acolhida em alguns países, não obteve sucesso na dogmática Alemã, tendo em vista sua inaplicabilidade nos crimes omissivos pelo fato de faltar-lhe relação de causalidade entre a não realização de um movimento corporal e o resultado, não cumprindo, desta forma, a função de elemento básico da teoria do delito.

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A segunda, conforme entendimento de Sheila Bierrenbach (2014, p. 53) refere-se à teoria causal neokantiana ou neoclássica da ação, criada por Mezger, a partir de influências da filosofia neokantiana, a qual se manteve até a década de 1930 do século XX, a qual deixou de lado o método científico naturalista de observar e descrever advindo do positivismo, passando a adotar a metodologia própria das ciências de espírito, que se caracterizava pelo compreender e valorar os fatos.

Por seu turno, a partir de tal teoria, “já não se buscava tanto uma causalidade física, mecanicista, entre a conduta e o resultado, mas uma valoração de evento, enquanto produto do comportamento humano voluntário.” (BIERENBACH, 2014, p. 53).

Já a partir da teoria finalista da ação, advinda do pensamento de Welzel, temos que a conduta é tida como uma ação ou omissão, voluntária e consciente, implicando em um comando de movimentação ou inércia do corpo humano, objetivando algum resultado como finalidade (NUCCI, 2014b).

Nesse viés, afirma Bitencourt (2012, p. 281, grifo nosso) que:

Ação é o comportamento humano voluntário conscientemente dirigido a um fim. A ação compõe-se de um comportamento exterior, de conteúdo psicológico, que é a

vontade dirigida a um fim, da representação ou antecipação mental do resultado

pretendido, da escolha dos meios e a consideração dos efeitos concomitantes ou necessários e o movimento corporal dirigido ao fim proposto.

Nesta senda, temos que a ação humana se trata de um acontecer final e, não apenas causal, sendo que a finalidade da ação se baseia na capacidade do indivíduo prever, dentro de seus limites, as consequências possíveis a resultarem de sua conduta.

Assim, segundo o entendimento de Clara Vasconselos Ribeiro (2012, p. 5) “a espinha dorsal da ação é a vontade, consciente do fim, reitora do acontecer causal; sem ela, a ação seria rebaixada a um acontecimento causal cego.”

Nesse sentido, consoante ao disposto, aduz Welzel (apud BRANDÃO, 2000, p. 3) que “a ação humana [...] pode ser inferida do fato de poder o homem, por força de seu saber causal, prever dentro de certos limites as consequências possíveis de sua conduta. Assim, pode orientar seus distintos atos à consecução do fim desejado.”

(24)

Logo, no que se refere à diferença entre a teoria causal da ação e a teoria finalista da ação, verifica-se que, segundo Brandão (2000, p. 4):

Quando se diz que a ação humana tem em sua estrutura a vontade dirigida a um fim, diz-se na verdade que o dolo reside na ação. Essa é a fundamental diferença entre a teoria causalista, e a teoria finalista: na teoria causalista, não se analisa o conteúdo da vontade que está presente na ação, portanto não se reconhece que o dolo está na 0ação; para essa teoria, o dolo deve ser estudado na culpabilidade; já no finalismo, reconhece-se que a vontade dirigida a um fim dirige a causalidade, logo o conteúdo da vontade, isto é, o dolo, é integrante da ação.

Observa-se ainda na doutrina, à luz do entendimento de Nucci (2014b, p. 162), a presença da teoria social da ação, a partir da qual a conduta vem a ser o comportamento voluntário e consciente que se demonstre socialmente relevante, tendo por finalidade servir de ponte entre as teorias causal e final da ação, posto que vislumbra ser mais importante para a consideração da conduta como penalmente relevante o seu significado social.

Nesse sentido, conforme entendimento de Bitencourt (2012, p. 284), a teoria social da ação “surgiu como uma via intermediária, por considerar que a direção da ação não se esgota na causalidade e na determinação individual, devendo ser questionada a direção da ação de forma objetivamente genérica.”

Ademais, segundo Jescheck (apud BRANDÃO, p. 5) “a ideia central da teoria social da ação é buscar a síntese da relação entre o comportamento humano e o mundo circundante, sendo ação todo comportamento socialmente relevante.”

Não obstante, fazendo um comentário crítico à tal teoria, aduz Cláudio Brandão (2000, p. 6) que:

A teoria social, por sua vez, procura um conceito valorativo de ação, valorando sua relevância social. Ora, foi dito que o conceito de ação serve como elo de ligação entre os elementos do crime, possibilitando sua sistematização. Por isso o conceito de ação deve ser valorativamente neutro, pois os juízos de valor serão feitos por meio da tipicidade e da antijuridicidade. Se nós utilizamos um conceito que não seja valorativamente neutro, poderemos até mesmo pré-julgar a tipicidade e a antijuridicidade, o que não corresponde às exigências de um direito penal liberal. Por isso, a teoria social também não é hábil para revelar a substância da ação humana.

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Ressalvadas tais teorias, verifica-se que, atualmente, conforme entendimento majoritário na doutrina, a que melhor se enquadra em nosso sistema penal brasileiro é a teoria finalista da ação.

Assim, retomando seu conceito, afirma Bitencourt (2012, p. 281, apud WELSEN) que “a finalidade, ou o caráter final da ação, baseia-se em que o homem, graças a seu saber causal, pode prever, dentro de certos limites as consequências possíveis de sua conduta”.

Destarte, segundo o entendimento do autor Damásio E. de Jesus (2011, p. 267) “conduta é a ação ou omissão humana consciente e dirigida a determinada finalidade.”

Nesse sentido, importante se faz destacar algumas características da conduta para fins de relevância penal:

a) A conduta se refere ao comportamento do homem, não dos animais irracionais. O ato do homem, por sua vez, só constitui conduta como expressão individual de sua personalidade. [...] Sujeito ativo do delito nas infrações penais comuns só pode ser uma pessoa física. A pessoa jurídica não é capaz de delinquir no tocante a crimes comuns, como o furto, o homicídio etc. De ver que a Lei n. 9.605, de 12-2-1998, em seus arts. 3.º e 21 a 24, admite a responsabilidade penal da pessoa jurídica em relação a delitos ambientais; b) Cogitationis poenam nemo patitur. Só as condutas

corporais externas constituem ações. O Direito Penal não se ocupa da atividade

puramente psíquica; c) A conduta humana só tem importância para o Direito Penal quando voluntária; d) O comportamento consiste num movimento ou abstenção

de movimento corporal. (JESUS, 2011, p. 268, grifo nosso).

Outrossim, quanto aos elementos da conduta, verifica-se que estes estão constituídos por atos de vontade dirigidos a um fim, bem como a clara manifestação dessa vontade, que abrange o aspecto psíquico, ou seja, o campo intelectual derivado do comando cerebral e o aspecto mecânico, movimento ou abstenção de movimento (MIRABETE; FABBRINI, 2012, p. 88).

Desta forma, “não constituem conduta os atos em que não intervém a vontade. Exemplos de ausência de conduta: coação física irresistível, [...] e movimento de abstenção de movimento em casos de sonho, sonambulismo, hipnose, embriaguez [...]” (MIRABETE; FABBRINI, 2012, p. 89).

Nesse viés, temos por conduta penalmente relevante a ação ou omissão, que será a seguir analisada detalhadamente.

(26)

1.2.1 A conduta comissiva

À luz do entendimento de Paulo Queiróz (2015, p. 209), “comissivos são os crimes (é a regra) cujos tipos descrevem um comportamento positivo, razão pela qual o crime consiste em fazer o que a lei proíbe (matar, furtar, etc.).”

Nesta senda, aduz-se que os “crimes comissivos são os que exigem, segundo o tipo penal objetivo, em princípio, uma atividade positiva do agente, um fazer.” (MIRABETE; FABBRINI, 2012, p.115).

Desse modo, verifica-se que os crimes comissivos são os crimes de ação, ou seja, de comportamento positivo, ao passo que consistem na realização de uma ação positiva, com o escopo de obter algum resultado tipicamente ilícito, sendo que, a maioria dos crimes previstos na lei penal brasileira (1940) e na legislação extravagante, é constituída pelos delitos de ação, ou seja, os crimes comissivos (BITENCOURT, 2012, p. 272).

Consoante ao disposto, “a maioria dos núcleos dos tipos se consubstancia em modos positivos de agir, como matar, apropriar-se, destruir, danificar etc. Quando o crime é cometido por essa forma positiva de agir [...] foi praticado mediante comissão.” (JESUS, 2011, p. 278).

1.2.2 A conduta omissiva própria e omissiva imprópria: distinções

De outra banda, enquanto os crimes comissivos são os praticados mediante uma ação, os omissivos são desenvolvidos mediante inação, sendo que nos primeiros o sujeito faz alguma coisa e, nos segundos, deixa de fazê-la, tendo por critério divisor o comportamento do sujeito (JESUS, 2011, p. 232).

Ademais, no direito penal brasileiro, verifica-se a existência de normas proibitivas e de normas imperativas, ou, como também chamadas, mandamentais, sendo que, a infração das normas imperativas se trata da essência do crime omissivo, consistindo, portanto, em não fazer a ação ordenada (BITENCOURT, 2012).

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Igualmente, refere Bitencourt (2012, p. 300, grifo nosso) que “o crime omissivo consiste sempre na omissão de uma determinada ação que o sujeito tinha obrigação de

realizar e que podia fazê-lo.”

Dessa forma, temos que a omissão não significa apenas não fazer nada, e sim, não fazer algo determinado na legislação, tendo em vista que todos os crimes omissivos têm em comum a omissão do dever jurídico, vindo a constituir infrações de normas preceptivas (QUEIRÓZ, 2015, p. 226).

Assim, à luz do entendimento de Queiróz (2015, p. 226), “o legislador pune a abstenção do comportamento do agente, que deixa de praticar uma ação que lhe é determinada por lei.” Nesse passo, vale ressaltar que os crimes omissivos estão presentes no sistema penal brasileiro em duas formas, sendo como crimes omissivos próprios e crimes omissivos impróprios.

No que se refere aos crimes omissivos próprios ou, como também chamados, de pura omissão, conforme entendimento de Damásio de Jesus (2011, p. 233), se concretizam com a

simples abstenção da realização de um ato, independentemente de um resultado posterior, ou seja, o resultado é imputado ao agente pela simples omissão da norma penal.

Nesse sentido, os crimes omissivos próprios:

São os que objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o

que a lei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica e não sendo necessário qualquer resultado naturalístico. Para a existência do crime,

basta que o autor se omita quando deve agir. Cometem crimes omissivos puros os que não prestam assistência a pessoa ferida (omissão de socorro, art. 1356), o médico

que não comunica a ocorrência de moléstia cuja notificação é compulsória (art. 2697), o funcionário que deixa de responsabilizar seu subordinado que cometeu

6 Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou

extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

7 Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória:

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infração no exercício do cargo (condescendência criminosa, art. 3208) ou abandona

cargo público (art. 3239), etc. (MIRABETE; FABBRINI, 2012, p. 115, grifo nosso).

Deste modo, constata-se que tais crimes consistem numa desobediência à uma norma imperativa que determina a prática de uma conduta, sendo que esta não é realizada, havendo, desta forma, um dever de agir imposto por lei, quando é possível seu cumprimento sem risco pessoal (BITENCOURT, 2012).

Por conseguinte, “são delitos omissivos próprios aqueles cuja conduta envolve um não fazer típico, que pode – ou não – dar causa a um resultado naturalístico.” (NUCCI, 2014b, p. 177).

Igualmente, conforme entendimento de João Bernardino Gonzaga (1962, p. 250 apud NUCCI, 2014b, p. 177), “o sujeito se abstém de praticar um movimento tendente a obter determinado efeito útil ou deixa de impedir a atuação de forças modificadoras da realidade, possibilitando o surgimento do mal.”

Portando, salienta Bitencourt (2012, p. 301) que, nos crimes omissivos puros/próprios:

Basta a abstenção, é suficiente a desobediência ao dever de agir para que o delito se consuma. O resultado que eventualmente surgir dessa omissão será irrelevante para a consumação do crime, podendo representar somente o seu exaurimento, pois responderá pelo resultado quem lhe deu causa, que, na hipótese, não foi o omitente; pode, em alguns casos, quando houver previsão legal, configurar uma majorante ou uma qualificadora [...]

Não obstante, em que pese (via de regra) serem crimes de mera conduta, dispensando, desta forma, eventual investigação acerca da causalidade, verifica-se que, em relação à aplicação de eventual majorante, é indispensável também a análise do nexo causal entre a conduta omissiva e o resultado determinante da majoração da pena (BITENCOURT, 2012).

8 Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no

exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

9 Art. 323 - Abandonar cargo público, fora dos casos permitidos em lei:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. § 1º - Se do fato resulta prejuízo público:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 2º - Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira: Pena - detenção, de um a três anos, e multa.

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Assim, salienta Bitencourt (2012, p. 301, grifo nosso) o dever de indagar a seguinte questão para fins de incidência da referida majorante: “a ação omitida teria evitado o

resultado?” Resultado este que, embora não tinha a obrigação de impedir, decorreu em

virtude de eventual omissão, ou seja, a obrigação do agente era de agir, e não de evitar tal resultado, mas, nesse caso, atribui-se, por previsão legal, uma majorante pelo desvalor do resultado (BITENCOURT, 2012).

Por sua vez, nos crimes omissivos impróprios, ou, como também chamados, comissivos por omissão, objetivo principal do presente estudo, a lei vem a equiparar a omissão à ação, de modo que, caso o agente não faça o disposto em lei, responderá pelo fato não apenas em razão da sua omissão em si, mas como se o fizesse ativamente (comissivamente), dolosa ou culposamente (QUEIRÓZ, 2015), lhe sendo imputado o

resultado.

Destarte, no entendimento de Queiróz (2015, p. 209), a omissão imprópria “equivale jurídico-penalmente à ação, desde que o agente/garante não aja de modo a evitar um resultado concretamente evitável.”

Nestes crimes, à luz do entendimento de Bitencourt (2012, p. 302, grifo nosso), “o

agente não tem simplesmente a obrigação de agir, mas a obrigação de agir para evitar um resultado, isto é, dever agir com a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento.”

Assim, segundo Jesus (2011, p. 279, grifo nosso):

São delitos em que a punibilidade advém da circunstância de o sujeito, que a isto

se encontrava obrigado, não ter evitado a produção do resultado, embora pudesse

fazê-lo. Ele se omite, ocorrendo o resultado. Isso não quer dizer que ele produz o resultado, uma vez que da omissão, fisicamente, nada surge. Ocorre que a lei considera que o não fazer tem o mesmo valor do fazer. Assim, pode-se praticar um homicídio por meio de um comportamento positivo (desferir facadas, p. ex.) ou negativo (deixar a vítima morrer de inanição).

Desta feita, verifica-se que, para a imputação de crime omissivo impróprio faz-se necessário que o agente tenha o dever jurídico de impedir o resultado, seja por meio de mandamento legal específico; quando o sujeito, de outra maneira, tornou-se garantidor da não

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ocorrência de eventual resultado; ou ainda, quando um ato precedente determina essa condição (JESUS, 2011, p. 280).

Nesse viés, dispõe o art. 13, §2º do Código Penal (BRASIL, 1940):

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Assim, verifica-se a necessidade de o agente possuir o papel de garante ou garantidor, que, segundo Sheila Bierrenbach (2014, p. 80) são “aqueles que, por sua especial posição, podem ser sujeitos ativos especiais dos crimes omissivos impróprios.”

Constata-se assim que a imputação de um crime omissivo impróprio cabe somente a quem possui este dever especial de garantia, que, “diante de uma situação de perigo que paire sobre o bem jurídico de seu garantido, deixe de agir para conjurá-lo.” (BIEERENBACH, 2014, p. 81).

Logo, “a omissão que não é típica, vale dizer, quando o não fazer deixa de constar expressamente num tipo penal, somente se torna relevante para o direito penal caso o agente tenha o dever de agir. Do contrário, não se lhe pode exigir qualquer conduta.” (NUCCI, 2014b, p. 178).

Desta feita, à luz do entendimento de Queiróz (2015, pp. 226-227, grifo do autor):

Enquanto nos crimes omissivos próprios supõem a violação de um dever de agir, simplesmente, nos comissivos por omissão, o agente tem, além desse dever legal de agir, um dever legal de evitar o resultado, motivo pelo qual o omitente responde como se o tivesse produzido, em razão de o legislador considerar, nos omissivos impróprios, mais grave a inação, dado o tipo especial de relação que se estabelece entre o agente e o bem jurídico tutelado.

Nesse passo, nos crimes comissivos por omissão, o legislador equipara a omissão à ação, vindo o agente omisso a responder como se praticado tivesse o delito caso não aja, podendo fazê-lo, como por exemplo os policiais, bombeiros, salva-vidas que, poderão

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responder por homicídio, embora não tendo matado, quando deixarem de agir a fim de evitar eventual morte, podendo fazê-lo (QUEIRÓZ, 2015).

1.3 A imputação do resultado e o nexo de causalidade nos crimes omissivos impróprios

Primeiramente, faz-se importante ressaltar, no que tange à culpabilidade do agente, as teorias da causalidade existentes no direito penal brasileiro.

A primeira, adotada pelo código penal vigente, é a Teoria da Equivalência das Condições, ou, como também chamada, conditio sine qua non, sendo que para o desdobramento desta teoria, imprescindível ressaltar o artigo 13, caput, do Código Penal (1940), que dispõe que “o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.”

Nesta senda, verifica-se que, na primeira parte do referido artigo está inserido o nexo causal nos crimes materiais, ou seja, nos crimes de resultado. Já a segunda parte disciplina o uso da teoria da equivalência das condições, posto que abrange tanto os crimes de ação, comissivos, como também os de omissão, omissivos (BITENCOURT, 2012).

Posto isto, constata-se que a partir da referida teoria, conforme entendimento de Paulo Queiróz (2015, p. 220, grifo do autor):

A questão de quando uma conduta pode ser considerada como causa de um evento há de ser resolvida por meio de uma fórmula heurística de conteúdo hipotético: a fórmula da conditio sina qua non, é dizer, para saber se determinada condição

pode ser considerada causa do resultado, dever-se-á utilizar o chamado método (ou procedimento) hipotético de eliminação, segundo o qual, quando eliminada

mentalmente a causa, eliminar-se o efeito, haverá o nexo causal; caso contrário, isto é, se, cessada a causa, não cessar o efeito, a relação causal não estará configurada [...].

Por conseguinte, não havendo a relação de causalidade, ou seja, o nexo causal, não poderá ser imputado ao agente determinado resultado, “porque tal conduta não constituirá condição sem a qual o resultado não teria ocorrido (conditio sine qua non).” (QUEIRÓZ, 2015, p. 221).

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Neste mesmo sentido, conforme Bitencourt (2012, p. 310, grifo do autor):

Para que se possa verificar se determinado antecedente é causa do resultado, deve-se fazer o chamado juízo hipotético de eliminação, que consiste no seguinte: imagina-se que o comportamento em pauta não ocorreu, e procura-imagina-se verificar imagina-se o resultado teria surgido mesmo assim, ou se, ao contrário, o resultado desapareceria em consequência da inexistência do comportamento suprido. Se se concluir que o resultado teria ocorrido mesmo com a supressão da conduta, então não há nenhuma relação de causa e efeito entre um e outra, porque mesmo suprindo esta o resultado existiria. Ao contrário, se, eliminada mentalmente a conduta, verificar-se que o resultado não se teria produzido, evidentemente essa conduta é condição indispensável para a ocorrência do resultado e, sendo assim, é sua causa.

No que se refere aos crimes omissivos impróprios, a causalidade está inserta diretamente no artigo 13 do Código Penal (BRASIL, 1940), visto que este adota o ponto de vista lógico, a fim de imputar como causa também as condições negativas, posto que, eventual omissão de quem deveria impedir determinado resultado vem a se tornar condição deste (BIERRENBACH, 2014).

Igualmente, salienta Bierrenbach (2014, p. 93), que “a estrutura lógica da causalidade é a mesma, na ação e na omissão. Na busca do nexo causal na omissão, pode-se utilizar a mesma fórmula prática de que se lança mão na conduta ativa, apenas invertendo-a.”

Desta forma, verifica-se que nos delitos praticados em razão da omissão deve-se averiguar se, caso acrescentada a ação esperada por quem tenha o dever de agir, ou seja, a ação do garante, o resultado teria a probabilidade de desaparecer, sendo que, em caso positivo, o garante omisso deverá responder objetivamente pelo resultado (BIERRENBACH, 2014).

A segunda teoria existente se trata da Teoria da Causalidade Adequada, que, segundo Bitencourt (2012, p. 317, grifo do autor):

Parte do pressuposto de que a causa adequada para a produção de um resultado típico (aspecto objetivo) não é somente a causa identificada a partir da teoria da equivalência das condições, mas sim, aquela que era previsível ex ante, de acordo com os conhecimentos experimentais existentes e as circunstâncias do caso concreto, conhecidas ou cognoscíveis pelo sujeito cuja conduta se valora (aspecto subjetivo).

Já a partir da Teoria da Causa Juridicamente Relevante, terceira teoria, averígua-se a relevância jurídica da conduta que veio a ser considerada como causa de um resultado a partir

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da teoria da equivalência das condições, devendo ser abordada pela interpretação do tipo penal referente (BITENCOURT, 2012).

Há ainda a existência da teoria da imputação objetiva, que, segundo Guilherme de Souza Nucci (2014b, p. 167) “tem por finalidade imputar ao agente a prática de um resultado delituoso apenas quando o seu comportamento tiver criado, realmente, um risco não tolerado, nem permitido, ao bem jurídico.”

Não obstante as teorias suscintamente apresentadas, atualmente o art. 13 do Código Penal de 1940 adota claramente a teoria da equivalência dos antecedentes causais para fins de atribuição do resultado, não distinguindo, desta forma, ação e omissão, “causa e condição (que enseja o funcionamento da causa), causa e ocasião (que provoca, acidentalmente a produção do efeito) e causa e concausa (que coopera com a conduta do sujeito) [...]” (BIERRENBACH, 2014, p. 93).

Conforme entendimento de Bitencourt (2012, p. 303, grifo do autor), são três os pressupostos fundamentais dos crimes omissivos impróprios para a imputação do resultado, sendo o primeiro o poder de agir, que, segundo o autor:

É um pressuposto básico de todo comportamento humano. Também na omissão, evidentemente, é necessário que o sujeito tenha a possibilidade física de agir, para que se possa afirmar que não agiu voluntariamente. É insuficiente, pois, o dever

de agir. É necessário que além do dever, haja também a possibilidade física de agir,

ainda que com risco pessoal. Essa possibilidade física de agir falta, por exemplo, na hipótese de coação física irresistível, não se podendo falar em omissão penalmente

relevante, porque o emitente não tinha a possibilidade física de agir. Aliás, a rigor,

nem poderia ser chamado de omitente, porque lhe faltou a própria vontade, e sem vontade não há ação, ativa ou passiva.

Nesta senda, no que se refere à possibilidade de agir, refere Queiróz (2015, p. 228) que “é a capacidade de o agente atuar no caso concreto e evitar que o resultado lhe é imputado. Precisamente por isso, não cabe, por exemplo, imputar a omissão a alguém que, por não saber nadar, se recusa a prestar socorro a um banhista que se afoga.”

O segundo pressuposto trazido pelo autor se trata da evitabilidade do resultado, a partir do qual, observa-se que:

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Ainda que o omitente tivesse a possibilidade de agir, fazendo-se um juízo hipotético

de eliminação – seria um juízo hipotético de acréscimo –, imaginando-se que a

conduta devida foi realizada, precisamos verificar se o resultado teria ocorrido ou não. Ora, se a realização da conduta devida impede o resultado, considera-se a sua omissão causa desse resultado [...] (BITENCOURT, 2012, p. 304, grifo do autor).

Assim, necessário se faz estar presente o nexo de causalidade entre o fato e a omissão, tendo em vista que, em ausente esse nexo, ou seja, essa relação de não impedimento, não é imputado ao omisso o resultado, posto que, se a realização da conduta esperada pelo agente não possibilitaria o impedimento de eventual resultado, pode-se inferir que este, em razão da sua omissão, causou tal resultado, ficando, desta forma desautorizado eventual atribuição do resultado ao omitente (BITENCOURT, 2012).

Deste modo, verifica-se que não é suficiente a possibilidade de agir para evitar o resultado, é necessário também que a ação omitida e exigida por lei seja efetivamente capaz de evitar de fato o resultado, visto que, demonstrando-se a inutilidade da ação, não caberá a imputação do resultado, pois inexiste, neste caso, o nexo de causalidade entre a omissão do agente e o resultado obtido (QUEIRÓZ, 2015).

O terceiro pressuposto para a configuração do crime omissivo impróprio, à luz de Bitencourt (2014, p. 304, grifo do autor), é o dever de impedir o resultado, visto que:

Se o agente podia agir e se o resultado desapareceria com a conduta omitida, ainda assim não se pode imputar o resultado ao sujeito que se absteve. É necessária uma

terceira condição, ou seja, é preciso que o sujeito tivesse o dever de evitar o resultado, isto é, o especial dever de impedi-lo ou, em outros termos, que ele fosse o

garantidor da sua não ocorrência.

Neste passo, refere Paulo Queiróz (2015, p. 228, grifo nosso), que:

Como se trata de um tipo penal em branco, que remete (parcialmente) a sua complementação a um dever extrapenal de proteção, cuidado, etc., os pressupostos e limites de incidência da omissão imprópria serão dados, em última análise, pela norma a que o tipo remete, expressa ou tacitamente. Assim, por exemplo, o dever de proteção, cuidado e vigilância dos pais [objeto do presente estudo] limitar-se-á aos filhos menores ou incapazes que se acharem sob sua guarda e enquanto essa situação persiste (CC, arts. 1.630 e seguintes). O mesmo ocorrerá quanto aos demais garantidores previstos em lei.

Por conseguinte, verifica-se que nos crimes omissivos impróprios há a necessidade de uma ação por aqueles que, por sua especial condição, possuem o dever legal de proteção,

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cuidado e vigilância, assim, verificamos a existência de um “dever legal de agir, um dever

legal de evitar o resultado [...]” (QUEIRÓZ, 2015, p. 226, grifo nosso).

Dessa forma, caso quem possua tal posição de garante, em havendo determinada situação em que exija deste uma ação de modo a, ao menos, tentar evitar determinado delito e consequentemente seus resultados, e este, por sua vez, venha a se omitir, não responderá como nos crimes omissivos próprios, apenas em razão de sua omissão, e sim, de modo relevante, vindo a responder como se praticado tivesse o referido delito.

Isso ocorre pelo fato de “o legislador considerar, nos crimes omissivos impróprios, mais grave a inação, dado o tipo especial de relação que se estabelece entre o agente e o bem jurídico tutelado.” (QUEIRÓZ, 2015, p. 227).

Assim, verificamos a essencial necessidade de agir que recai sob aqueles que detêm este dever de cuidado, proteção e vigilância – ou seja, os garantes – perante seus garantidos, visto que, em caso de omissão por parte daqueles, responderão como se efetivos autores fossem de determinado ato ilícito que porventura vier a ocorrer diante de sua omissão.

Nesse sentido, oportuna é a transcrição de Bitencourt (2012, p. 305, grifo do autor), onde, a respeito do garante e sua omissão relevante, aduz que “se o sujeito, em virtude de sua abstenção, descumprindo o dever de agir, não obstruir o processo causal que se desenrola diante dele, digamos assim, é considerado pelo Direito Penal, como se o tivesse causado.”

Desta forma, cumpre ressaltar a relevância causal nos crimes omissivos impróprios, posto que, em tais crimes, o garante não tem simplesmente o dever legal de agir, e sim, o dever de agir a fim de evitar um resultado, ou seja, agir com o objetivo de evitar que determinado delito se concretize, não havendo, desta forma, um crime de cunho material, e sim, de resultado, exigindo-se, assim, a presença do nexo causal existente entre a omissão do agente e o resultado ocorrido (BITENCOURT, 2012).

Diante disso, à luz do entendimento de Nucci (2014b, p. 177):

São crimes omissivos impróprios os que envolvem um não fazer, que implica na falta do dever legal de agir, contribuindo, pois, para causar o resultado. Não têm tipos específicos, gerando uma tipicidade por extensão. Para que alguém responda

Referências

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