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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO Ozana Baptista Gusmão

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Ozana Baptista Gusmão

A repercussão geral das questões constitucionais, no recurso

extraordinário e a ampliação do acesso à Justiça.

MESTRADO EM DIREITO

São Paulo

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

A repercussão geral das questões constitucionais, no recurso

extraordinário e a ampliação do acesso à Justiça.

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito (Direito Processual Civil) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Nelson Nery Júnior.

São Paulo

(3)

BANCA

_________________________

_________________________

(4)

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por me oferecer a chance de viver a experiência de poder estudar nesta instituição.

Agradeço ao meu Orientador, Professor Doutor Nelson Nery Júnior e aos professores com os quais tive o prazer e a oportunidade de conviver durante o mestrado, especialmente ao Professor Doutor Sérgio Seiji Shimura, Professor Doutor Anselmo Prieto Alvarez, Professora Doutora Teresa Arruda Alvim Wambier, ao Professor Doutor Gilson Delgado Miranda, e à Professora Doutora Maria Celeste Cordeiro Leite Santos, além dos servidores e colegas.

Ao meu amigo e sócio Murillo Espinola de Oliveira Lima, primeiramente por sua amizade e carinho, e também pelo apoio incondicional em todos os momentos. Aos meus pais, irmãos, sobrinhos e amigos.

Aos colegas e funcionários do meu escritório.

Não posso deixar de agradecer também, ao Doutor Georges Abboud e às queridas Márcia Santos e Eliete Hugueney de Figueiredo.

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GUSMÃO, Ozana Baptista. A repercussão geral das questões constitucionais, no recurso extraordinário e a ampliação do acesso à Justiça. São Paulo. 2009. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009.

RESUMO

O presente estudo tem por objetivo analisar os impactos que a introdução do instituto da repercussão geral no recurso extraordinário trará ao sistema jurídico brasileiro, especialmente sobre a crise que assola o Supremo Tribunal Federal, bem como analisar a pertinência ou não da adoção do filtro para o fim que se propõe. Justifica-se o estudo pela profunda alteração que a adoção do instituto trará sobre todo o sistema, provocando inclusive mudança de paradigma do recurso extraordinário. Para melhor compreensão dessas alterações, primeiramente examinar-se-á os aspectos históricos, situando a criação do recurso extraordinário e o Supremo Tribunal Federal, no sistema jurídico brasileiro. Serão também analisados institutos similares, adotados em outros países, bem como os meandros da versão brasileira do filtro recursal. Colocar-se-á a questão cultural dos operadores e jurisdicionados frente às situações jurídicas na cena brasileira. Por fim, cotejar-se-á a criação e legitimidade do instituto frente à garantia constitucional da duração razoável do processo e o acesso à Justiça.

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GUSMÃO, Ozana Baptista. The overall impact of constitutional issues in the appeal and the extraordinary expansion of access to justice. São Paulo. 2009. Monograph (Masters of Law) - Pontifical Catholic University of São Paulo, São Paulo, 2009.

ABSTRACT

The following study aims to analyse the impacts that the introduction of the subject of general repercussion on the extraordinary appeal will bring to the Brazilian juridical system, specially over the crisis that is inflicted on the Supreme Federal Court. It looks as well to analyse the pertinence or not of adopting a filter to the ends it is purposed to. The study is justified by the profound alterations that the subject adoption will bring to all the system, even causing a paradigm shift on the extraordinary appeal. For a better understanding of those alterations, it will first examine the hystorical aspects, placing the creation of the extraordinary appeal and the Supreme Federal Court on the Brazilian juridical system. Similar subjects, adopted in other countries, will also be analyzed, as well as the courses of the Brazilian appeal filter version. It will raise the cultural question, of operators and those under jurisdiction, facing the juridical situations, on the Brazilian scenario. At last, it will collate the subject creation and legitimity to the constitutional guarantee of process reasonable length and access to Justice.

(7)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...09

1.1 Definição do problema ...10

1.2 Justificativa ...16

1.3 Objetivos ...17

1.3.1 Objetivo principal ...17

1.3.2 Objetivos específicos...17

1.4 Revisão de literatura ...17

1.5 Procedimento metodológico...24

1.6 Esboço dos capítulos ...24

INTRODUÇÃO...26

1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA RECURSAL NOS TRIBUNAIS SUPERIORES...29

1.1 O papel institucional do STF ...35

1.2. O devido processo legal e o acesso à Justiça...42

1.2.1 Duplo grau de jurisdição...44

1.2.2 Amicus curiae...52

1.2.3 A repercussão geral e os direitos fundamentais...58

1.3.As tentativas de contenção de admissibilidade de recursos extraordinários...68

2. O RECURSO EXTRAORDINÁRIO ...71

2.1 Requisitos de admissibilidade ...77

2.1.1 Pressupostos extrínsecos...77

2.1.2 Pressupostos intrínsecos...78

2.1.3 Requisitos prévios ...79

2.1.4 Requisitos específicos...81

2.1.5 Requisito especial ...82

2.2 Requisitos da petição recursal ...82

2.3 Procedimento ...83

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3. A REPERCUSSÃO GERAL COMO FILTRO LEGÍTIMO A PERMITIR O

FUNCIONAMENTO DO STF...85

3.1 Natureza jurídica da repercussão geral...88

3.2 Conceito de repercussão geral...89

3.3 Repercussão Geral e a relevância econômica, social, política e jurídica...90

3.3.1 Relevância econômica...90

3.3.2 Relevância social...90

3.3.3 Relevância política ...90

3.3.4 Relevância jurídica ...91

3.4 Do quórum para o reconhecimento da repercussão geral ...91

3.5 Da rejeição da repercussão geral...91

3.6 Irrecorribilidade da decisão que não reconhece a repercussão geral ...91

3.7 Caráter da decisão...92

4. O DIREITO ESTRANGEIRO...95

4.1 O sistema norte-americano ...95

4.1.1 Aspectos institucionais ...101

4.2 Outros sistemas ...103

4.2.1 O sistema alemão ...103

4.2.2 O sistema argentino ...104

4.2.3 O sistema japonês ...105

5. A NECESSIDADE DE DESCONSTRUÇÃO DA CULTURA RECORRENTE DO JURISDICIONADO BRASILEIRO...107

5.1 O direito à razoável duração do processo e o acesso à justiça...111

CONCLUSÃO...121

(9)

LISTA DE ABREVIATURAS

AI – agravo de instrumento Art. - artigo

CF – Constituição Federal CPC – Código de Processo Civil EC – Emenda constitucional EDcl – Embargos de Declaração

PEC – projeto de emenda constitucional RE – Recurso extraordinário

REsp – Recurso especial

(10)

1. INTRODUÇÃO

Ao serem iniciados os estudos do mestrado em Processo Civil, direito das relações sociais, já havia sido publicada a Emenda Constitucional nº 45/2004. Porém, só no decorrer do curso, com a promulgação da lei regulamentadora (Lei nº 11.418/2006) é que começaram, de forma mais intensa, as discussões a respeito das profundas mudanças que tal emenda trouxe ao sistema jurídico brasileiro, muitas das quais, a princípio, não despertaram maiores expectativas, por se mostrarem, ao primeiro olhar, meras alterações formais, sem muitos reflexos no mundo prático.

Com o decorrer do tempo, e após as primeiras obras doutrinárias publicadas sobre o tema, uma das inovações produzidas pela Emenda Constitucional nº 45/2004 passou a despertar especial interesse, de estudo, como a introdução do novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, prevista no art. 1º, da referida emenda, que altera o art. 102, §3º, da Constituição Federal.

O processo de amadurecimento e de interesse por tal questão se deu durante o cumprimento do crédito ministrado pelo professor Nelson Nery Júnior, em que foi oportunizado o aprofundamento dos estudos sobre o processo civil na Constituição Federal, pois apesar do tempo decorrido desde a graduação e da prática jurídica desenvolvida desde então, nunca tal tema pareceu tão atraente. Por tudo isso, o interesse em conhecer melhor os reflexos da referida emenda constitucional sobre o recurso extraordinário, e deste sobre o sistema judiciário, ficou mais aguçado.

O desenvolvimento do presente trabalho se dá, principalmente, através de compilação da doutrina, ou seja, mediante a exposição do pensamento de autores renomados, organizando suas opiniões de forma lógica, quando apresentam posições antagônicas e harmonizando os pontos de vista comuns.

(11)

1.1 Definição do problema

O Supremo Tribunal Federal vive grave crise, face o emperramento causado pelo excesso de processos que sobem àquele tribunal para apreciação. Tal situação parece ter nascido com o próprio tribunal, e neste momento, assim como já foi em outras ocasiões, é objeto de tentativa de superação, por meio da criação de mecanismo de contenção de recursos extraordinários, já que, a despeito de possuir diversas outras competências, é esse recurso juntamente com o respectivo agravo de instrumento, que em maior volume chega à Corte Suprema, causando seu estrangulamento.

Conforme se verifica na tabela abaixo, extraída do sítio oficial do Supremo Tribunal Federal, o número de recursos extraordinários e agravos de instrumento, distribuídos naquela Corte, de 1990 a 2009, representa mais de 90% dos casos, o que não deixa dúvida de que esse é o recurso mais frequente na Corte Suprema.

Tabela 1

Percentagem de Recurso Extraordinária (RE) e Agravos de Instrumento (AI) em relação aos processos distribuídos – 1999 a 20091

Ano

Total Processos

Distribuídos DistribuídosAI

% AI / Relação Processos

Distribuídos DistribuídosRE

% RE / Relação Processos

Distribuídos RE + AISOMA

% AI + RE / Relação Processos Distribuídos

1990 16.226 2.465 15,2 10.780 66,4 13.245 81,6

1991 17.567 5.380 30,6 10.518 59,9 15.898 90,5

1992 26.325 7.838 29,8 16.874 64,1 24.712 93,9

1993 23.525 9.345 39,7 12.281 52,2 21.626 91,9

1994 25.868 8.699 33,6 14.984 57,9 23.683 91,6

1995 25.385 11.803 46,5 11.195 44,1 22.998 90,6

1996 23.883 12.303 51,5 9.265 38,8 21.568 90,3

1997 34.289 16.863 49,2 14.841 43,3 31.704 92,5

1998 50.273 26.168 52,1 20.595 41 46.763 93

1999 54.437 29.677 54,5 22.280 40,9 51.957 95,4

2000 90.839 59.236 65,2 29.196 32,1 88.432 97,4

Ano

Total Processos

Distribuídos DistribuídosAI

% AI / Relação Processos

RE Distribuídos

% RE / Relação Processos

SOMA RE + AI

% AI + RE / Relação Processos

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Distribuídos Distribuídos Distribuídos

2001 89.574 52.465 58,6 34.728 38,8 87.193 97,3

2002 87.313 50.218 57,5 34.719 39,8 84.937 97,3

2003 109.965 62.519 56,9 44.478 40,4 106.997 97,3

2004 69.171 38.938 56,3 26.540 38,4 65.478 94,7

2005 79.577 44.691 56,2 29.483 37 74.174 93,2

2006 116.216 56.141 48,3 54.575 47 110.716 95,3

2007 112.938 56.909 50,4 49.708 44 106.617 94,4

2008 66.873 37.783 56,5 21.531 32,2 59.314 88,7

2009 10.538 5.984 56,8 2.312 21,9 8.296 78,7

Fonte: Brasil, (2009).

Constitucionalistas de escol como Luiz Roberto Barroso (BARROSO, 2006), Inocêncio Coelho (MENDES;COELHO;BRANCO, 2008, p.16), além de juristas como Eduardo de Avelar Lamy (LAMY, 2005, p.172), bem como a cientista política Maria Tereza Sadek, observaram esse fenômeno, ratificado neste trabalho com as observações do dia-a-dia, que a Constituição Federal normatizou direitos que deveriam ser objeto de legislação ordinária, e isso, faz toda a diferença. Seja porque as discussões, ao invés de serem politizadas são judicializadas, seja porque o descumprimento de leis federais é discutido em última instância, perante o Superior Tribunal de Justiça (que a despeito de também estar abarrotado de processos e emperrado, dispõe de mecanismos capazes de resolver essa situação, sem alterar de forma radical o sistema judiciário) enquanto que ofensa às normas constitucionais [ é apreciada pelo Supremo Tribunal Federal.

A constitucionalização deu ensejo a uma atuação ampla por parte do Judiciário e particularmente de sua corte suprema, o STF. Não é acidental que o Supremo seja levado a se pronunciar sobre tantos assuntos e menos ainda que eles digam respeito a tão ampla gama de temas. A Constituição de 1988 consagrou extenso rol de direitos, conferiu condições que garantem status de poder ao Judiciário, ampliou o número de legitimados com acesso direto ao Supremo. Ademais, a expressiva judicialização de questões políticas, econômicas e sociais implicou a composição dos tribunais como arena de disputas políticas e instância decisória final (SADEK, 2008).

(13)

Nosso Judiciário foi construído na Constituição de 1988 como Poder de Estado. Esse Judiciário tem duas faces. Uma é de prestação de serviços, que é fazer aquilo que compete à Justiça fazer: garantir direitos, resolver conflitos, arbitrar divergências. A outra é a face política. Essa face política é típica de todo o arranjo institucional presidencialista. No caso brasileiro, isso se acentua porque temos uma Constituição muito detalhista e com uma gama de direitos enorme, direitos individuais e supra-individuais. E quanto maior for a Constituição, mais detalhista, mais específica, maior é a margem de atuação do Poder Judiciário. Além disso, nós temos duas competições grandes: uma é entre as instituições e outra é dentro de cada uma das instituições. Conflitos entre o Executivo e o Legislativo, quem é que arbitra? O Judiciário. Então, a pauta do Judiciário é enorme e todos os itens têm repercussão pública muito grande. Como você tem muitas mudanças, o Judiciário é chamado a arbitrar o tempo inteiro. A toda e qualquer exigência de reforma constitucional, o Judiciário entra.

A Emenda 45, que trouxe a reforma do Judiciário em 2004, acentuou ainda mais o protagonismo público do Supremo Tribunal Federal. Com a Repercussão Geral, o Supremo vai ser dono da agenda. Essa era uma coisa que sempre chamava a atenção quando o Judiciário brasileiro era comparado com o americano. O Judiciário norte-americano é muito mais dono da agenda do que o nosso. O nosso era obrigado a tratar de tudo o que chegasse lá. Agora, nosso Supremo assume o papel de Corte Constitucional (SADEK, 2009).

A Constituição Federal brasileira é, segundo a classificação do critério de extensão, analítica ou prolixa, ou seja, é daquelas constituições que “se desdobram numa infinidade de normas no afã de constitucionalizar todo o conjunto da vida social.” (MIRKINE-GUETZÉVITCH, 1951, p. 17, apud MENDES;COELHO;BRANCO, 2008, p.16).

A locução constitucionalização do Direito é de uso relativamente

recente na terminologia jurídica e, além disso, comporta múltiplos sentidos. Por ela se poderia pretender caracterizar, por exemplo, qualquer ordenamento jurídico no qual vigorasse uma Constituição dotada de supremacia. Como este é um traço comum de grande número de sistemas jurídicos contemporâneos, faltaria especificidade à expressão. Não é, portanto, nesse sentido que está aqui empregada. Poderia ela servir para identificar, ademais, o fato de a Constituição formal incorporar em seu texto inúmeros temas afetos aos ramos infraconstitucionais do Direito. Trata-se de fenômeno iniciado, de certa forma, com a Constituição portuguesa de 1976, continuado pela Constituição espanhola de 1978 e levado ao extremo pela Constituição brasileira de 1988. Embora esta seja uma situação dotada de características próprias, não é dela, tampouco, que se estará cuidando.

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conteúdo material e axiológico se irradia, com força normativa, por todo o sistema jurídico (BARROSO, 2006).

Além de conter o mérito de traduzir os anseios democráticos e de contribuir de forma singular para a consolidação da estabilidade política do país, compreende também uma gama de normas que tratam de interesses legítimos de trabalhadores, classes econômicas, categorias funcionais, reserva de mercado, privilégios corporativos. Enfim, envolve direitos que poderiam muito bem ser disciplinados pela legislação ordinária, poupando assim a interpretação constitucionalizada de todos esses direitos.

Os reflexos desse fenômeno podem ser percebidos não só no condicionamento da validade e sentido de todas as normas do direito infraconstitucional, como também repercutem na atuação dos três poderes (exemplos: limita a discricionariedade do legislativo na elaboração de leis no âmbito do Poder Legislativo; limita a discricionariedade e impõe deveres de atuação no ambito de Poder Executivo; e condiciona todas as normas do sistema para o Poder Judiciário; estabelece limitações ao uso da propriedade privada, subordinando-a a valores constitucionais e ao respeito a direitos fundamentais, no âmbito das relações entre particulares).

Não se pode ignorar que essa característica contribui de forma decisiva para a crise em que se encontra mergulhado o Supremo Tribunal Federal, dado o excesso de recursos gerados para aquela Corte.

Óbvio que o constituinte originário tinha todos os motivos para acautelar-se, pois à época da elaboração da Carta Magna as circunstâncias políticas eram outras. O país vinha de um período de flagrantes desrespeitos aos direitos e garantias dos cidadãos, à liberdade de comunicação, reunião e pensamento que ficaram subordinados ao conceito de segurança nacional, levando boa parte da sociedade à profunda alienação política, e para assegurar que aquela situação não se repetisse, preferiu constitucionalizar direitos que poderiam ser objeto de leis ordinárias.

(15)

violados especialmente pelo Poder Público. Diversos são os fatores que contribuem para essa situação, entre eles, a incapacidade política dos governantes, deficiências estruturais dos Poderes da República, falta de planejamento eficaz, entre outros. , mantendo-se apenas como direitos formais, o que acaba por fomentar a busca judicializada da concretização das garantias de sua efetivação. E sendo tais direitos assegurados constitucionalmente e não por leis ordinárias, além de ganhar foros de interpretação judicial, deslocando o cenário da discussão para os tribunais, ao invés das casas do Congresso Nacional, as matérias discutidas em processos judiciais que reclamam esses direitos encontram como último abrigo o Supremo Tribunal Federal.

A conjugação desses fatores promove a ascensão institucional do Poder Judiciário, atribuindo-lhe um papel político inédito no cenário nacional, dividindo espaço com o Legislativo e o Executivo, provocando mudança de comportamento da sociedade para com as instituições judiciais, impondo reformas estruturais e suscitando questões complexas acerca da extensão de seus poderes.

Se apenas os direitos e valores fundamentais tivessem sido constitucionalizados, os demais direitos seriam objeto de leis ordinárias, o que além de dar maior mobilidade às normas, permitindo adequação à realidade de cada momento, com maior facilidade, já que o quorum para a aprovação de lei é muito menor do que para alteração do texto constitucional, também logicamente levaria a sociedade a uma maior participação política, cobrando resultados de seus parlamentares, e permitiria que eventual judicialização fosse decidida pelos tribunais, podendo chegar no máximo ao Superior Tribunal de Justiça.

Ao comentar os motivos e estudos que levaram a criação do Superior Tribunal de Justiça pela Constituição de 1988, o hoje ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Mário da Silva Velloso evidencia que já na década de 1960 havia a preocupação em fazer do Supremo Tribunal Federal uma Corte Constitucional nos moldes da Corte Suprema dos Estados Unidos.

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relevante tarefa que é própria de uma corte constitucional. Também esse dado influiu para que fosse adotada pela mesa-redonda da FGV em 1965, a decisão no sentido da criação de um tribunal que pudesse aliviar o STF da sobrecarga de serviço (VELLOSO, 1989a, p. 17).

Verifica-se pelo texto acima transcrito que, embora há mais de 40 anos houvesse a preocupação de retirar do Supremo Tribunal Federal a incumbência de analisar matéria infraconstitucional, a questão de fundo era a mesma que hoje tenta-se contornar com a criação do instituto da repercussão geral, qual tenta-seja, permitir que o Supremo Tribunal Federal adquira condições de funcionalidade e reserve suas energias para decidir questões de relevância para toda a sociedade, matéria constitucional, adequando a Constituição formal à Constituição real, interpretando o texto e ajustando-o à realidade, promovendo maior igualdade social.

Até agora as tentativas resultaram frustradas, já que não conseguiram resolver o problema do excesso de recursos que acolhem à Corte, mantendo seus ministros assoberbados de trabalho, muitas vezes repetitivo, e o pior, sem conseguir cumprir a missão constitucional de emitir decisões paradigmáticas, já que, de certa forma, as decisões da Corte máxima da Justiça brasileira foram vulgarizadas, por “obrigar” os senhores ministros a decidir questões sem a menor relevância política, econômica, social ou jurídica, durante tanto tempo e em volume tão grande, que por mais que fossem produzidas por juízes dotados de notável saber jurídico, não poderiam alcançar um grau de reflexão compatível com a relevância que as decisões da Suprema Corte devem conter, seja porque destituídas de relevância político, econômica, social ou jurídica, ou ainda por se avolumarem a cada dia processos numa progressão quase que impossível de ser vencida, pressionando a Corte por decisões mecânicas e no “atacado”. Mas ainda assim, lutando para conseguir preencher os espaços deixados pela política, atendendo os pleitos da sociedade sempre que instada a atuar nesse campo. Porém, devido à descomunal carga de trabalho, nem sempre essas demandas são atendidas no ritmo desejado, o que por outro lado, desconforta o jurisdicionado, causando prejuízos de toda ordem aos indivíduos e à nação, gerando inclusive insegurança jurídica.

(17)

equipado humana e materialmente, capaz de responder às demandas em tempo e modo adequados, e à nação como organismo que se vê pressionado pela comunidade internacional e por investidores estrangeiros, por não garantir a necessária segurança jurídica aos grandes investidores e aos cidadãos brasileiros, levando a um certo descrédito da sociedade brasileira e da comunidade internacional para com o Judiciário.

Diante desse quadro, pergunta-se: Com a exigência do requisito de repercussão geral, será possível ao Supremo Tribunal Federal adquirir a liberdade necessária para apreciar apenas os recursos extraordinários contendo questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, sem ferir princípios e garantias constitucionais, preservando direitos fundamentais e garantindo amplo acesso à Justiça?

1.2 Justificativa

O grande impacto gerado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, com a inclusão do § 3º ao artigo 102 da Constituição Federal, e respectiva regulamentação dos artigos 543-A e 543-B do Código de Processo Civil, pela Lei nº 11.418/2006, e do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal pela Emenda Regimental nº 21/2007, trouxe para o universo dos operadores do direito diversas discussões em torno da inovação criada para a admissibilidade do recurso extraordinário.

Sendo o recurso extraordinário uma instituição tradicional em nosso sistema, as preocupações mostram-se ainda mais acentuadas, já que, com as alterações constitucional, legislativa e regimental, o que se espera é uma mudança efetiva de paradigmas, passando o Supremo Tribunal Federal a decidir em sede de recurso extraordinário, apenas questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, relegando ao segundo grau de jurisdição o dever de fazer Justiça no particular.

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1.3.1 Objetivo Principal

O objetivo principal é mostrar que a repercussão geral amplia o acesso à Justiça ao abreviar o tempo da entrega da prestação jurisdicional, e aprofundar os debates em torno de questões relevantes para toda a sociedade, pela via do recurso extraordinário.

1.3.2 Os objetivos específicos desta pesquisa envolvem a análise das seguintes questões:

9 Se o duplo grau de jurisdição ficou mitigado com a exigência do novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário?

9 Se a repercussão geral é um filtro legítimo a permitir o acesso ao Supremo Tribunal Federal, via recurso extraordinário?

9 Se a repercussão geral impede ou amplia o acesso à Justiça? De que forma se dá esse fenômeno?

1.4 Revisão de literatura

(19)

apenas uma ínfima parte das ações que tramitam pelos tribunais verdadeiramente contêm tais requisitos, e por consequência proporciona maior acesso à Justiça.

O alargamento do acesso à Justiça ou a uma ordem jurídica justa, é evidenciado por Kazuo Watanabe(1988, p. 128), ao afirmar que; “[...]a problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa.” Segundo o autor, isso ocorrerá não só através do aprofundamento das reflexões sobre as questões selecionadas, mas também, na efetivação dos direitos constitucionais até então relegados a meros formalismos, tais como o direito a entrega da prestação jurisdicional de forma mais célere, com a significativa redução de tempo, por não mais submeter o vencido a espera do julgamento de recursos extraordinários e demais recursos dele derivados, destituídos de matéria a ensejar seu conhecimento, que muitas vezes provocavam a manifestação da Corte sobre matérias que veiculavam interesses afetos apenas às partes processuais e sem ofensa ao texto constitucional, ou que veiculavam matéria já decidida centenas ou até milhares de vezes, e ainda da participação ampliada por mecanismos como a intervenção do amicus curiae.

A discussão em torno da necessidade de contenção da crise que assola o Supremo Tribunal Federal, ou a crise do recurso extraordinário (MOREIRA ALVES, 1989), aliada à necessidade de viabilizar-se a entrega da prestação jurisdicional com maior celeridade, em homenagem ao princípio da dignidade da pessoa humana e o alargamento do acesso à Justiça, tem se intensificado nos últimos anos, levando juristas e políticos à incansável tarefa de encontrar soluções que possibilitem tais anseios.

O primeiro questionamento que se pretende responder é relativo ao duplo grau de jurisdição. Para tanto, busca-se na melhor doutrina o apoio necessário para demonstrar que o novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário não vulnera o princípio do duplo grau, até porque, este, embora previsto constitucionalmente, não tem garantia de direito absoluto.

(20)

Segundo a Constituição Federal vigente, há previsão para o princípio do duplo grau, quando se estabelece que os tribunais do país terão competência para julgar causas originariamente e em grau de recurso. Na CF 102 II, dizendo que o STF conhecerá, em grau de recurso ordinário, outras determinadas e, também, pelo n. III do mesmo dispositivo constitucional, tomará conhecimento, mediante recurso extraordinário, das hipóteses que enumera, evidentemente criou o duplo grau de jurisdição.

Ocorre que a Constituição Federal limita o âmbito de abrangência desse princípio, como por exemplo ao enumerar casos em que cabe o recurso ordinário ou extraordinário, ao dizer que as decisões do Tribunal Superior Eleitoral são irrecorríveis, salvo quando contrariem a CF (CF 121 §3º), entre outras hipóteses.

Isto nos faz concluir que, muito embora o princípio do duplo grau de jurisdição esteja previsto na CF, não tem incidência ilimitada, como ocorria no sistema da Constituição Imperial. De todo modo está garantido pela lei maior. Quer dizer, a lei ordinária não poderá suprimir, pura e simplesmente, os recursos previstos na Constituição Federal (NERY JÚNIOR, 2004a, p. 41).

E em outra obra, o mesmo autor conclui de forma brilhante o seu discurso, ao demonstrar vício na Lei n. 8.038/90:

Hoje não há nenhuma previsão constitucional ensejadora de limitação ou vedação ao cabimento quer do recurso especial, quer do extraordinário, de sorte que o legislador infraconstitucional não tem autorização para restringir o acesso ao STF e STJ, impondo barreiras ao cabimento dos recursos extraordinário e especial.

Somente por emenda constitucional é que se poderiam estabelecer restrições ao cabimento dos recursos extraordinário e especial, a exemplo do que ocorria no sistema constitucional revogado com o expediente da argüição de relevância da questão federal (NERY JÚNIOR, 2004b, p. 213).

Orestes Nestor de Souza Laspro (1999, p. 202) fundamenta a inexistência de garantia constitucional ao segundo grau de jurisdição, ao afirmar que: O recurso extraordinário é sempre cabível contra decisões de única ou última instância, se houver ofensa à Constituição, declarar a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, julgar válida lei ou ato de governo, contestado em face da Constituição.

(21)

E, após citar Castro Nunes, o autor conclui:

Nesse sentido, o ensinamento preciso de Castro Nunes, ainda antes da Constituição em vigor: ’A necessidade de uma instância de superposição com autoridade constitucional para cassar os julgados tresmalhados da observância da lei e imprimir à jurisprudência uma direção uniforme não é peculiar aos regimes federativos, embora tenha nestes maior alcance e significação, porque da partilha de poderes entre União e os Estados resulta um problema que nos Estados unitários não existe, o da legislação e judiciário separados, levando à possibilidade de colisões que, sem aquele controle supremo, ficariam sem remédio, reduzidas à letra morta a Constituição e as leis federais e comprometida a segurança dos direitos, a paz social e a existência mesma da União (NUNES, 1946

apud LASPRO, 1999, p. 202).

E complementa que; Esse recurso não é adequado à discussão da matéria de fato e das questões de direito infraconstitucional, restringindo-se às de direito constitucional, razão pela qual também não pode ser considerado como uma garantia do duplo grau de jurisdição (LASPRO, 1999, p. 202).

Outra questão que se pretende responder diz respeito à ampliação do acesso à Justiça, em face da exigência de demonstração da existência de repercussão geral.

Analisando o novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, que pretende conter o número de recursos extraordinários que acendem ao Supremo Tribunal Federal, até o advento da EC nº 45/2004, Eduardo Cambi, acentua:

A mera previsão formal do recurso extraordinário e a submissão do recorrente a um longo tempo para o seu julgamento é uma forma de negar o acesso à justiça, contribuindo para o descrédito do Poder Judiciário, além de violar, o agora explícito direito fundamental, a celeridade da prestação jurisdicional. O Estado, ao prolongar eternamente as angústias e os sofrimentos do cidadão, viola conteúdos substancias da democracia que são a cidadania e a dignidade da pessoa humana, devendo ser responsabilizado pelos danos morais provocados (CAMBI, 2005, p. 158)..

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direito fundamental, à medida que submete a parte vencedora a uma demora abusiva, para a entrega da prestação jurisdicional, conforme o exposto a seguir:

O processo civil não é mera retórica ou preocupação acadêmica, mas sim técnica e instrumento indispensável à concretização do direito substancial ofendido ou ameaçado.

O direito ao processo, portanto, com o tônus da efetividade, pertence ao conjunto desses direitos, ditos fundamentais, que estão ligados ao conceito de dignidade humana, princípio sobre o qual está assentada a estrutura do Estado brasileiro (art. 1.º, III, da CF). Trata-se, por assim dizer, de direito fundamental instrumental, pois, o reconhecimento de rico elenco de direitos fundamentais (individuais e coletivos) no plano constitucional, sem a simultânea previsão de instrumentos processuais aptos a proporcionar sua eficaz e efetiva realização, resultaria no próprio esvaziamento da idéia de direitos fundamentais.

No caso brasileiro, é imperioso destacar o constante (ao menos nos últimos anos) esforço do legislador, voltado a inserir no sistema processual civil, mecanismos voltados ao alcance da efetividade do processo, assim como a aperfeiçoar outros, preexistentes.

Portanto, sob essa ótica que se adentra no tema ‘recursos’ e em seguida nos seus ‘efeitos’.

[...]

A existência de recursos se deve a várias razões. O inconformismo é uma reação natural do ser humano. Instintivamente, diante de uma negativa de ver atendido um interesse, o homem busca uma outra alternativa ou opinião. É uma tendência do homem não se sujeitar a um único julgamento.

Além disso, um segundo julgamento, principalmente se for feito por um número maior de pessoas e mais experientes, em tese, encerra um pronunciamento mais apurado.

Ainda, só o fato de o juiz saber que a sua decisão pode ser reexaminada e modificada já leva a um maior cuidado na sua elaboração.

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O nosso sistema adotou uma posição intermediária. Cabe recurso, porém há limites e requisitos para o seu uso (SHIMURA, 2005, p. 105).

No mesmo sentido, expõe Hoffman (2007):

[...] o acesso demasiadamente aberto às Cortes Superiores acarreta o acúmulo absurdo de processos a serem julgados, inviabilizando uma prestação jurisdicional adequada e condizente com a importância desses Tribunais, uma vez que compele o advogado a desenvolver uma mentalidade de sempre recorrer, por temer não realizar o trabalho mais adequado e completo ao seu cliente, razão pela qual o estabelecimento de critérios mínimos ou situações mais precisas seriam de bom alvitre, a fim de impedir a transformação dessas Cortes naquilo que não são nem devem ser: terceira instância. Seja como for, é inegável que algo seja feito, pois já se passou do ponto máximo de saturação de casos levados às Cortes Constitucionais, fazendo com que aqueles que realmente demandam um posicionamento fiquem anos à espera de um resultado (HOFFMAN, 2007, p. 327).

Nesse aspecto, é necessário esclarecer que a contenção de recursos destituídos de repercussão geral não mitiga nenhuma forma de direito já conquistada. Antes pelo contrário, amplia o acesso à Justiça, e, assim, efetiva direito fundamental garantido constitucionalmente a todos os cidadãos, pois permite que recursos extraordinários destituídos de efetiva ofensa ao texto constitucional e que causam o emperramento da Corte venham onerar todos os indivíduos, especialmente aos recorrentes que aviam recursos que preenchem os requisitos constitucionais, mas que têm que aguardar mais tempo do que o necessário numa situação de normalidade para terem suas pretensões apreciadas, não significando amplo acesso à Justiça. Além disso, tal prática desprestigia a decisão de primeiro grau, e não traduz a suposta nobreza que se quer emprestar à decisão chancelada pela Suprema Corte, quando esse ato significa redecidir sobre questões já resolvidas do ponto de vista jurídico.

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pequenas causas, custas judiciais etc), tocam em ponto da maior relevância para este estudo, no que tange ao transplante de soluções encontradas para os mesmos problemas em outros países, sem a adequada alocação de tais soluções ao sistema que está recebendo a técnica desenvolvida, como se verifica com o próprio recurso extraordinário recebido do direito norte americano, sem observância das peculiaridades de nosso sistema federativo :

Um aspecto igualmente óbvio – bem conhecido dos estudiosos de Direito Comparado – é o de que as reformas não podem (e não devem) ser transplantadas simploriamente de seus sistemas jurídicos e políticos. Mesmo que transplantadas ‘com sucesso’, uma instituição pode, de fato, operar de forma inteiramente diversa num ambiente diverso (392). Nossa tarefa deve consistir, com o auxílio de pesquisa empírica e interdisciplinar, não apenas em diagnosticar a necessidade de reformas, mas também cuidadosamente monitorar sua implementação (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 162).

Pretende-se demonstrar que a absorção do instituto, o bom funcionamento do Supremo Tribunal Federal e a ampliação do acesso à Justiça, a partir da introdução do novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, dependerá não só do comportamento do jurisdicionado,especialmente de seu maior cliente que é o Estado (União), mas de todos os operadores do direito e principalmente da própria Corte Suprema, no uso do poder de apreciar ou não determinados temas, sob o pálio do interesse geral.

Se adequadamente utilizado, o mecanismo da repercussão geral, ao lado de outro tão importante quanto ele, como é o caso da súmula vinculante, também introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, crê-se, conseguirá contribuir de maneira significativa para o alcance desse desiderato.

A este trabalho ainda serão acrescentadas menções de obras, artigos, estudos, entrevistas, jurisprudências e revistas especializadas sobre o tema.

1.5 Procedimentos metodológicos

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pesquisa bibliográfica, buscando auxílio na doutrina alusiva especificamente ao novel instituto, e em institutos semelhantes ou afins.

Os recursos tecnológicos proporcionados pela Internet também serão de grande valia, especialmente no acompanhamento das decisões exaradas pelo Supremo Tribunal Federal, bem como das informações estatísticas daquele tribunal.

Será utilizada ainda a jurisprudência para situar o posicionamento da Corte Suprema na análise dos casos levados ao seu conhecimento, por meio de recursos extraordinários supostamente condutores de repercussão geral.

Não serão necessárias pesquisas de campo, visto que os dados estatísticos podem ser obtidos diretamente no sítio oficial do Supremo Tribunal Federal, ou em obras de reconhecido valor e conteúdo jurídico, a serem citadas na bibliografia consultada.

1.6 Esboço dos capítulos

Para melhor entendimento deste trabalho, os capítulos serão organizados de forma a demonstrar que o instituto da repercussão geral é instrumento de aceleração da entrega da prestação jurisdicional e ampliação do acesso à Justiça.

No capítulo 1 será apresentada uma breve digressão sobre o sistema recursal brasileiro dos tribunais superiores, o papel institucional do Supremo Tribunal Federal, além do princípio do devido processo legal e do acesso à Justiça frente ao princípio do duplo grau de jurisdição, dos direitos fundamentais e da admissão do amicus curiae na análise da existência ou não de repercussão geral. Serão analisadas ainda as tentativas de contenção de admissibilidade de recursos extraordinários ao longo da história do STF e do recurso extraordinário.

(26)

No capítulo 3 será verificado, um pouco mais detidamente, o instituto da repercussão geral, em seus aspectos mais relevantes .

No capítulo 4 será feito um breve apanhado do direito estrangeiro, com destaque para o sistema norte americano, uma vez que é este o paradigma do recurso extraordinário. Também focalizará o novo filtro de admissibilidade do recurso extraordinário, com breve análise sobre os aspectos institucionais do requisito naquele país, além de brevíssima análise de outros sistemas estrangeiros, que à semelhança do sistema norte americano, também adotam filtros de acesso às respectivas cortes supremas.

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INTRODUÇÃO

O mundo experimenta grandes transformações nas relações sociais, econômicas, políticas, jurídicas e nos valores morais neste momento, que clamam e justificam necessárias mudanças na ordem jurídica interna de cada país, a fim de que os respectivos sistemas jurídicos respondam à altura da necessidade de seus cidadãos e de todos quantos estejam sob sua égide, sobre as demandas a que cada indivíduo está sujeito.

(28)

O foco principal deste trabalho é tratar da repercussão geral sob o enfoque do acesso à Justiça. Para isso, buscou-se situar no quadro jurídico institucional do Supremo Tribunal Federal o papel do recurso extraordinário. Além disso, teceu-se análise sobre a incidência do instituto nos direitos e garantias fundamentais de acesso à Justiça. Procurou-se ainda, apesar da brevidade da análise, demonstrar que o instituto foi inspirado em experiências vitoriosas em outros países e buscou-se analisar sua compatibilidade com o sistema jurídico brasileiro.

Não se tem a pretensão de esgotar o assunto, o qual é extenso, complexo e apaixonante. Porém, busca-se mirar o foco da pesquisa sobre os aspectos considerados relevantes para elucidar a questão da aplicação do instituto da repercussão geral e o objetivo de ampliação do acesso à Justiça, com a aceleração da entrega da prestação jurisdicional, sem aviltar direitos e garantias inscritos na Constituição Federal.

Assim, na primeira parte do trabalho dedica-se algumas considerações sobre o sistema recursal brasileiro, analisando o papel institucional do STF, o princípio do devido processo legal e as tentativas de contenção da admissibilidade do recurso extraordinário.

De igual modo, a segunda parte é voltada para o recurso extraordinário e seus requisitos de admissibilidade e procedimento.

Na terceira parte procura-se estudar um pouco do instituto da repercussão geral e sua forma de operação. Na quarta parte faz-se breve incursão pelo direito estrangeiro e na quinta e última parte, tece-se uma crítica à situação do Supremo Tribunal Federal, tendo por base as premissas fixadas no decorrer do trabalho.

O instituto ainda não foi totalmente absorvido pelo jurisdicionado, por isso ainda não pode ser avaliado com o distanciamento que só o tempo permite, sendo assim, optou-se por não apresentar uma parte inicial dedicada à evolução histórica.

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(30)

1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA RECURSAL NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

O sistema judiciário brasileiro contempla quatro instâncias decisórias, duas de caráter ordinário (primeiro e segundo graus de jurisdição) e duas de caráter extraordinário (uniformização da interpretação das leis e da Constituição, garantia de respeito à Constituição e do direito federal em todo o território nacional) (MARTINS, 2009).

A Constituição Federal instituiu os órgãos judiciais (art. 92) e atribuiu competência material e hierárquica: ao Supremo Tribunal Federal (art. 102), ao Superior Tribunal de Justiça (art. 105), aos Tribunais Regionais Federais (art. 108), à Justiça Federal (art. 109), indicou a matéria que a lei deve atribuir às Justiças especializadas - Tribunal Superior do Trabalho (art.114), Tribunais Regionais do Trabalho (artigos 113), Tribunal Superior Eleitoral, Tribunais Regionais Eleitorais e Juízos Eleitorais (art. 121), Superior Tribunal Militar e Auditorias Militares, e ainda traçou normas gerais sobre a competência dos Tribunais de Justiça e juízos estaduais (art. 125 e parágrafos).

A competência constitucional dos tribunais classifica-se em originária, recursal ordinária e recursal extraordinária.

Em 1890, pouco antes do advento da 1ª Constituição do Brasil, definitiva (1891), o Governo Provisório baixou o Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, criando o Supremo Tribunal Federal, nascendo assim, a mais alta Corte de Justiça do país, cujo escopo maior era a análise de decisões de última instância dos tribunais estaduais por intermédio de recurso. Recurso este, inspirado na Judiciary Act (americano) de 1789.

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(erros de direito) da decisão recorrida, a fim de que a Suprema Corte Federal cassasse ou reformasse o julgado. Este foi o paradigma do recurso extraordinário, em seus primórdios (MACIEL, 2006, p. 8).

Antecederam historicamente o Supremo Tribunal Federal, o Supremo Tribunal de Justiça, criado em 1891 e a Casa de Suplicação, criada com a vinda de D. João VI de Portugal, em 1808 (VELLOSO, 2003, p. 22).

O Brasil apresenta inúmeras singularidades. Dentre elas, a de ser um país que se tornou judiciariamente independente antes da sua independência política. Quatorze anos se passaram entre um e outro fato histórico. Tudo porque, em 10 de maio de 1808, por alvará expedido pelo Príncipe Regente, D. João, foi a Relação da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro elevada à Casa de Suplicação do Brasil, vale dizer, a última instância judiciária, onde terminariam os feitos, sem mais atuação da Casa de Suplicação de Lisboa (VIANNA, 1923, p. 342 apud GRACIE, 2007).

O Supremo Tribunal Federal foi instituído pelo decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890. As demais cortes superiores derivaram de um processo que ao longo do tempo foi se aperfeiçoando, sendo que todos os demais foram criados pelas Constituições Federais.

A Constituição Federal de 1934 criou o Tribunal Superior Eleitoral, a de 1946, o Tribunal Superior do Trabalho, e a de 1988, o Superior Tribunal de Justiça, transferindo parte da competência recursal do Supremo Tribunal Federal para essas Cortes, de modo a diminuir a carga de trabalho da Corte Suprema.

Além da sua competência originária e recursal, que é ampla (art. 102, I “a” à “r” e II, “a” e “b”, CF), o Supremo Tribunal Federal tem por missão precípua julgar o recurso extraordinário, a fim de manifestar-se sobre a interpretação do texto constitucional, extirpando eventual ofensa, tal como previsto nas sucessivas constituições.

(32)

para destrancar a subida dos recursos extraordinários não admitidos no segundo grau, cerca de 90% de dos recursos tramitados pelo Supremo. Num universo que frequentemente ultrapassa a cifra dos cem mil processos, conforme se verifica na tabela abaixo, significa que cada ministro recebe certa de nove mil processos para serem julgados por ano. O dado revela uma quantidade absolutamente desproporcional à capacidade de julgamento aos mais comezinhos critérios de qualidade que se pode esperar de tão elevado número e do caráter extraordinário para o qual foi criado.

A tabela abaixo, extraída do sítio do STF, demonstra os números dos últimos oito anos, e reflete a situação de exaustão e de vulgarização do recurso extraordinário, que de extraordinário só tem o nome, face à (in)capacidade de apenas onze ministros julgarem tamanho número de processos, e a voracidade com que se litiga perante a mais alta Corte de Justiça do país, como se todas as decisões que levaram à interposição desses recursos tivessem de fato o condão de ofender o texto constitucional.

Movimentaçã

o STF 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Proc. Protocolados 105.30 7 110.77 1 160.45

3 87.186 83.667 95.212

127.53 5 119.32 4 100.78 1 Proc.

Distribuídos 90.839 89.574 87.313

109.96

5 69.171 79.577

116.21 6

112.93

8 66.873 Julgamentos 86.138 109.69

2 83.097 107.86 7 101.69 0 103.70 0 110.28 4 159.52 2 130.74 7 Acórdãos

publicados 10.770 11.407 11.685 10.840 10.674 14.173 11.421 22.257 19.377

Para solucionar a situação acima descrita, o Congresso Nacional aprovou, em 2004, a Emenda Constitucional nº 45, conhecida popularmente como a Reforma do Judiciário, criando, entre outros mecanismos, o instituto da repercussão geral da questão constitucional. Desta forma permitiu-se a apreciação pelo Supremo Tribunal Federal somente dos recursos extraordinários revestidos de relevantes questões econômicas, sociais, políticas ou jurídicas, a juízo dos seus ministros.

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do recurso), além de ser vedado o reexame de matéria fático-probatória, bem como haver necessidade de demonstração do requisito do prequestionamento (= manifestação explícita da Corte inferior sobre a matéria que se pretende ver reexaminada); e o preenchimento de pressupostos especiais de admissibilidade (ofensa direta à Constituição ou à Lei Federal, ou divergência jurisprudencial), sendo portanto de fundamentação semelhante.

Pode-se dizer que, atualmente, com a avalanche de processos que chegam ao Superior Tribunal de Justiça e Tribunal Superior do Trabalho, e até a regulamentação do instituto da repercussão geral, também chegavam ao Supremo Tribunal Federal, devido à facilidade que tinham as partes de recorrer e pela necessidade subjetiva de um pronunciamento “obrigatório” sobre todas as decisões inferiores, o extraordinário se transformou em ordinário: vulgarizou-se a via de acesso às Cortes superiores, de forma que a exceção passou a ser regra.

O que se pretende é evitar que o Supremo Tribunal Federal tenha de ocupar-se de questões de interesse visto como restrito à esfera jurídica das partes do processo, em ordem a poder reservar sua atenção e seu tempo para matérias de mais vasta dimensão, para grandes problemas cuja solução deva influir com maior intensidade na vida econômica, social, política do país (MOREIRA, 2005, p. 240).

A criação desse instituto buscou frear a ânsia recorrente do jurisdicionado, ampliando o acesso à Justiça, sem deixar de garantir o direito à ampla defesa, tão caro ao Estado Democrático de Direito. Os números alcançados até então eram absolutamente desproporcionais à capacidade de vazão da Corte Suprema, consequentemente contaminando a qualidade dos julgamentos à medida que as discussões travadas em cada processo não conseguiam aprofundar o debate sobre questões relevantes para todos os jurisdicionados, comprometendo até certo ponto a segurança jurídica, bem maior a toda a sociedade, além de darem a equivocada impressão de que todas as decisões que geravam esses recursos extraordinários realmente vulneravam o texto constitucional. Os números falam por si, ao se observar apenas a título de exemplo os dados a seguir. Em 20071, o STF julgou 159.522 (BRASIL, STF, 2009) processos, o STJ 330.257 (BRASIL, STJ, 2009)

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e o TST 153.592 (BRASIL, TST, 2009). Apesar de absurdos, tais números não refletem eficiência ou presteza da Corte Suprema, pois o saldo de processos de um ano para o outro, somados aos novos que se acumulam a cada mês, é maior ainda do que os já julgados. E a forma de julgamento, em verdadeira linha de produção (ainda que formalmente os processos tenham obedecido a todos os trâmites processuais e legais), não encontra ecos nos princípios norteadores do acesso à ordem jurídica justa e no Estado Democrático de Direito. Além disso, sabe-se que é humanamente impossível, que onze ministros do Supremo Tribunal Federal julguem esse número monumental de processos, dedicando-lhes todo o saber jurídico e notoriedade de que são dotados (MARTINS, 2009).

Por outro lado, sabe-se também que grande parte desse volume não diz respeito à ofensa à Constituição Federal, nem causa qualquer prejuízo ao Estado Democrático de Direito, tratando-se no mais das vezes de recursos que dizem respeito a meros interesses das partes, sem qualquer ofensa ao texto constitucional já plenamente pacificado com a decisão colegiada do tribunal estadual ou regional, mas que teimosamente insistem em ter uma decisão do Supremo Tribunal Federal, muito mais por capricho ou desejo protelatório, do que por efetiva inconstitucionalidade da decisão, tanto que mais de 50% (cinquenta por cento) desses recursos dizem respeito a agravos de instrumento para subida do recurso extraordinário, o que dá a medida de que, na primeira fase do exame de admissibilidade dos recursos extraordinários (feita no tribunal local) a alegada inconstitucionalidade é descartada nessa proporção, e apenas uma pequena parcela desse percentual é reformada para reconhecer a efetiva ofensa ao texto constitucional.

O quadro abaixo, extraído do sítio do STF, reflete essa realidade.

Ano

Total Processos

Distribuídos DistribuídosAI

% AI / Relação Processos

Distribuídos DistribuídosRE

% RE / Relação Processos

Distribuídos RE + AISOMA

% AI + RE / Relação Processos Distribuídos

1990 16.226 2.465 15,2 10.780 66,4 13.245 81,6

1991 17.567 5.380 30,6 10.518 59,9 15.898 90,5

1992 26.325 7.838 29,8 16.874 64,1 24.712 93,9

1993 23.525 9.345 39,7 12.281 52,2 21.626 91,9

1994 25.868 8.699 33,6 14.984 57,9 23.683 91,6

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1996 23.883 12.303 51,5 9.265 38,8 21.568 90,3

1997 34.289 16.863 49,2 14.841 43,3 31.704 92,5

1998 50.273 26.168 52,1 20.595 41 46.763 93

1999 54.437 29.677 54,5 22.280 40,9 51.957 95,4

2000 90.839 59.236 65,2 29.196 32,1 88.432 97,4

2001 89.574 52.465 58,6 34.728 38,8 87.193 97,3

2002 87.313 50.218 57,5 34.719 39,8 84.937 97,3

Ano

Total Processos

Distribuídos DistribuídosAI

% AI / Relação Processos

Distribuídos DistribuídosRE

% RE / Relação Processos

Distribuídos RE + AISOMA

% AI + RE / Relação Processos Distribuídos

2003 109.965 62.519 56,9 44.478 40,4 106.997 97,3

2004 69.171 38.938 56,3 26.540 38,4 65.478 94,7

2005 79.577 44.691 56,2 29.483 37 74.174 93,2

2006 116.216 56.141 48,3 54.575 47 110.716 95,3

2007 112.938 56.909 50,4 49.708 44 106.617 94,4

2008 66.873 37.783 56,5 21.531 32,2 59.314 88,7

2009 10.538 5.984 56,8 2.312 21,9 8.296 78,7

Percentagem de Recurso Extraordinária (RE) e Agravos de Instrumento (AI) em relação aos processos distribuídos – 1999 a 2009

Fonte: (BRASIL, Portal de Informações Gerenciais do STF, 2009).

Assim, para a plena saúde do sistema jurídico, especialmente quanto ao aspecto da segurança jurídica, apenas as exceções, ou seja, aqueles recursos que tratam de matéria efetivamente constitucional ou de Lei Federal deveriam ser objeto dos recursos dirigidos aos tribunais superiores, já que compete aos tribunais estaduais e regionais e às Turmas Recursais dos Juizados Especiais a revisão colegiada da decisão do magistrado de 1º grau. Como ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, cujo modelo constitucional foi adotado desde a primeira Carta republicana brasileira de 1891.

(36)

Visando a reordenação dessa situação verdadeiramente caótica, o legislador federal criou a Emenda Constitucional nº 45/2004, promovendo alterações fundamentais para o funcionamento do Judiciário, e, sobretudo, para a celeridade processual.

O instituto sofreu acirradas críticas, especialmente por parte dos advogados.

Roberto Busato, presidente da Sessão Federal da Ordem dos Advogados do Brasil quando da aprovação do projeto de lei que regulamentou o instituto, afirmou em entrevista ao Jornal Folha de São Paulo (2006) que a repercussão geral era antidemocrática e contrariava o princípio constitucional de livre acesso do povo à Justiça. Além disso, sua adoção significaria o retorno, de forma dissimulada, do instituto da arguição de relevância, que na prática geraria a inexistência de atuação do Supremo Tribunal Federal. Parte da doutrina, conforme se apresenta mais a frente, também repudia a adoção do instituto.

Tais críticas só devem ser amenizadas com a mudança de mentalidade dos operadores do direito, do jurisdicionado e com a mudança de postura do próprio STF, pois a repercussão geral, sem dúvida, tem um aspecto positivo muito relevante, que é alargar o acesso à Justiça. É o que se pretende demonstrar neste trabalho.

Para que tal desiderato seja alcançado, deixando de ser mera conquista formal, como tantos outros direitos e garantias que se encontram consagrados no texto constitucional, é preciso que haja um esforço conjunto de operadores e jurisdicionados. Por parte da Corte é necessário coragem política de aplicar o instrumento com rigor e é necessário que haja consciência jurídica quanto aos demais operadores para que as melhorias se consolidem e o sistema possa funcionar com maior harmonia e efetividade na entrega da prestação jurisdicional.

1.1 O papel institucional do STF

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A doutrina da tripartição dos poderes concebeu os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário independentes e harmônicos entre si, reservando ao Poder Judiciário a tarefa de solucionar os conflitos levados à sua apreciação.

A Constituição de 1988 atribuiu ao Poder Judiciário legitimidade para controlar o arbítrio dos demais poderes. Nesse sentido, cabe aos juízes: o poder e o dever de anular atos administrativos ilegais; invalidar atos praticados com abuso de poder; declarar a inconstitucionalidade de leis e atos normativos.

Nessa perspectiva, o Supremo Tribunal Federal assume o papel de guarda da Constituição (art. 102). “O constituinte de 1988 pretendeu conferir ao Supremo Tribunal Federal, atribuição de Corte Constitucional do Brasil, atribuindo-lhe a competência precípua de guarda da Constituição” (ROCHA, 1997, p.186-187).

De acordo com a atual Constituição, o STF possui três planos de competência: originário, recursal ordinário e recursal extraordinário. Todos disciplinados no art. 102:

1) Competências originárias: disciplinadas no art. 102, I, alíneas ‘a’ à ‘r’, sendo a mais importante a inscrita na alínea ‘a’: cabe ao STF processar e julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.

Sobre o tema, assevera o ministro Gilmar Ferreira Mendes, in litteris:

Assim, se se cogitava, no período anterior a 1988, de um modelo misto de controle de constitucionalidade, é certo que o forte acento residia, ainda, no amplo e dominante sistema difuso de controle. O controle direto continuava a ser algo acidental e episódico dentro do sistema difuso.

(38)

2) A competência recursal ordinária: conforme dispõe o art. 102, II, alínea ‘a’ refere-se àqueles casos em que o STF julga em recurso ordinário: o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção, decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, quando denegatória a decisão. Cabe, ainda, recurso ordinário ao STF de decisões que tenham por objeto crimes políticos (art. 102, II, b). A matéria, em princípio, nada tem de constitucional. O recurso da decisão, proferida pela Justiça Federal de primeiro grau, sobe imediatamente ao STF.

3) Competência recursal extraordinária: O recurso extraordinário, por meio do qual o Supremo Tribunal exerce o controle difuso de constitucionalidade. Segundo o art. 102, III, compete ao STF julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: contrariar dispositivo da Constituição; declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição; julgar válida lei local contestada em face da lei federal.

Assim, percebe-se que o STF é órgão de cúpula do Poder Judiciário, desempenhando o papel institucional de Corte Constitucional, mas não em sentido estrito, prevendo o art. 102 da Constituição Federal diversas atribuições que lhe retiram a exclusividade em apreciar o confronto das interpretações dos diversos tribunais ao texto constitucional. A Emenda Constitucional nº 45/2004, poderia ter avançado no sentido de retirar da sua competência as atribuições que não tivesssem o objetivo precípuo de manter a incolumidade da ordem constitucional, mas não o fez.

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A função jurisdicional do STF decorre do Poder Constituinte (originário), e este tem natureza política, configurando-se, portanto, ilimitado e desvinculado de qualquer princípio jurídico-positivo, que entendeu originariamente que deveria ter no Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição e também atribuiu-lhe as demais funções. A Emenda Constitucional nº 45/2004 manteve as mesmas funções para a Corte máxima da Justiça brasileira.

Eventual transformação do STF em tribunal exclusivamente constitucional exigiria radical mudança das suas atribuições e transferência de competência das tarefas de índole não exclusivamente controladora da constitucionalidade, o que excluiria o controle difuso de constitucionalidade, ou pelo menos alteraria seu perfil, algo que parece não se cogitar neste momento. Visto que apesar de ter sido proposta (em substitutivo) pelo Deputado Aluízio Nunes Ferreira, relator da PEC 96/92, que deu origem à EC nº 45/2004, não avançou, de forma que o STF permanece como tribunal de cúpula do Poder Judiciário, mas não como tribunal exclusivamente constitucional (SÁ, 2006, p.98).

A Emenda Constitucional nº 45/2004, ainda que não tenha dado essa nova dimensão ao Supremo Tribunal, alterou profundamente o sistema jurisdicional, com a adoção da repercussão geral para admissão do recurso extraordinário, redefinindo-lhe o papel institucional como instância recursal.

O Supremo Tribunal Federal ainda não é uma Corte Constitucional pura, apesar de apreciar, mediante recurso extraordinário, questões relacionadas à Constituição, pois a sua competência originária e para julgar recursos ordinários ainda é muito extensa, como se observa dos incisos I e II do mesmo dispositivo (CORTÊS, 2006, p. 240).

O Supremo Tribunal Federal, conforme já discorrido no tópico que tratou do recurso extraordinário, desde sua criação desempenha papel de guardião da inteireza da Constituição Federal, mas também possui amplo espectro de atuação com competência originária e para apreciar ações ordinárias, portanto, não é Corte constitucional pura.

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possuem os requisitos mínimos para passar pelo crivo do conhecimento, tendo em vista o manifesto objetivo protelatório. Obviamente que se está aqui a tratar do estoque de processos existente até a entrada em vigor do dispositivo previsto no §3º do art. 102 da Constituição Federal. Visto que, após a entrada em vigor da norma devidamente disciplinada pela Lei nº 11.418/2006 e RISTF, o número de recursos extraordinários caiu de maneira significativa3, o que já demonstra que o mecanismo adotado permitirá ao Supremo Tribunal desenvolver o papel de Corte Constitucional, nos moldes adotados pelo sistema jurídico brasileiro.

Bem destaca o professor Nelson Nery Júnior:

No atual sistema constitucional brasileiro, temos realmente uma Corte Constitucional federal, consubstanciada no STF, conclusão que se extrai da competência que o legislador constituinte conferiu àquela corte de justiça. Verificamos, entretanto, que o perfil constitucional de nosso Tribunal Federal Constitucional não se nos afigura o melhor, porquanto não nos parece que um órgão do Poder Judiciário possa apreciar, em último e definitivo grau, as questões constitucionais que lhe são submetidas de forma abstrata (v.g. controle de constitucionalidade por meio de ADIn e de ADPF), cujos membros são nomeados pelo Presidente da República sem critério de proporcionalidade ou representatividade dos demais poderes (NERY JÚNIOR, 2004 b, p. 29-30).

E complementa:

Com efeito, em países que possuem tribunais constitucionais, como por exemplo, a Alemanha, esse tribunal é o órgão constitucional de todos os Poderes, situando-se no organograma do Estado ao lado do Executivo, Legislativo e Judiciário, não sendo, portanto, órgão do Poder Judiciário e nem se situando acima dos Poderes Executivo e Legislativo. É formado por pessoa indicadas pelos Três Poderes, com mandato certo e transitório, vedada a contínua ou posterior recondução. O tribunal constitucional é, pois, suprapartidário (NERY JÚNIOR, 2004b, p. 30).

Como forma de tentar conter o número descomunal de recursos extraordinários, diversas medidas foram adotadas ao longo dos anos, tanto pela

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Corte quanto pelo legislador e pelo constituinte. Essas medidas serão analisadas no item que trata dos filtros de contenção de recursos extraordinários.

Atualmente encontra-se em vigor a Emenda Constitucional nº 45/2004, editada pelo Congresso Nacional, que criou a súmula vinculante e a repercussão geral no recurso extraordinário, meios que se espera, sejam capazes de conter a subida de recursos que não tratem de matéria exclusivamente constitucional, à Corte Suprema. Tais mecanismos foram introduzidos no sistema jurídico de forma legítima, e visam promover o resgate da função institucional do Supremo Tribunal Federal.

A exemplo do que ocorre nos Estados Unidos e também em outros países que adotam o sistema de filtros para a apreciação de recursos pelas respectivas Cortes supremas (Argentina, Japão, Alemanha), o Supremo Tribunal Federal, após a Emenda Constitucional nº 45/2004 e sua regulamentação pela Lei nº 11.418 de 19 de dezembro de 2006, passou a cumprir verdadeiramente o papel de Corte excepcional, cabendo-lhe controlar, na via principal e direta a constitucionalidade ou inconstitucionalidade das leis (Ação Direta de Inconstitucionalidade e Constitucionalidade) ou na via incidental por meio do recurso extraordinário, a adequada aplicação das normas constitucionais.

Com a adoção desse mecanismo, no que tange ao recurso extraordinário, a Corte Suprema deverá observar a presença não só dos requisitos de admissibilidade, até então existentes (cabimento, legitimação, interesse em recorrer, tempestividade, preparo, regularidade formal e inexistência de fato impeditivo ou extintivo de direito de recorrer e dos requisitos excepcionais exigidos nessa via extraordinária), mas também em sede de preliminar, a existência de questões relevantes (aspecto objetivo), do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que extrapolem os interesses subjetivos da causa (aspecto subjetivo violado), ou seja, deverá ficar caracterizada a presença de repercussão geral antes de julgar seu mérito, através do juízo de admissibilidade do recurso, constatando ou não a presença de pressupostos preliminares necessários a conferir regularidade ao mesmo.

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Tribunal Federal, de forma definitiva. Sendo que, com relação à repercussão geral, é atribuição exclusiva do STF examinar sua existência ou não.

Busca-se com isto, que o Supremo Tribunal Federal atue somente nos casos em que o zelo à Constituição Federal reclame sua manifestação, ou seja, naqueles casos em que as disposições da Constituição não são vulneradas, não há porque invocar-se a manifestação da Suprema Corte, bastando para a correta entrega da prestação jurisdicional, que os litigantes tenham seu conflito resolvido por uma Corte de Justiça, ou mesmo por um órgão de primeiro grau, já que conforme será visto, o duplo grau de jurisdição, no ordenamento jurídico brasileiro não é obrigatório.

Tal constatação pode ser deduzida da maneira mais óbvia, tão meticuloso que foi o constituinte em colocar no texto constitucional tantos direitos e garantias de forma explícita. Caso quisesse que o duplo grau de jurisdição fosse obrigatório, teria feito constar da Carta Política, de maneira clara e objetiva, esse direito ou garantia. Além disso, diversas disposições do Código de Processo Civil preveem atos irrecorríveis, e nem por isto tiveram suas constitucionalidades questionadas (Art. 482, §3°, no Art. 519, parágrafo único, no Art. 543, §§ 2° e 3° do CPC).

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imprescindível para realização dos fins que justificam sua existência (preservação da Constituição Federal), reservando seu tempo e energia para a apreciação de outros recursos ou medidas que realmente necessitem ser apreciados e confrontados com o texto constitucional, por veicularem matéria com relevância social, política, econômica ou jurídica, ou transcendência, assegurando ao jurisdicionado o direito fundamental à razoável duração do processo, sem a interposição de recursos protelatórios.

1.2. O devido processo legal e o acesso à Justiça

Conforme se vem sustentando ao longo deste estudo, o instituto da repercussão geral amplia o acesso à Justiça, a medida que permite maior reflexão dos senhores ministros do Supremo Tribunal Federal sobre as matérias discutidas. Também se entende que as garantias de acesso à Justiça não só foram preservadas, como foram efetivamente ampliadas, seja em face da possibilidade de aprofundamento dos debates, já que a Corte Suprema poderá selecionar os recursos que irá julgar, descartando aqueles que não veiculam repercussão geral, e portanto destituídos de requisitos justificadores de sua apreciação pelo tribunal máximo, seja pela manutenção do duplo grau de jurisdição e respeito aos direitos fundamentais, ou ainda pela permissão da participação do amicus curiae na aferição da repercussão geral, o que por si só democratiza as decisões do tribunal de cúpula.

Neste intróito, tratar-se-á do devido processo legal, apenas para alcançar o princípio que mais de perto interessa a esta pesquisa, neste momento, que é o duplo grau de jurisdição. Em seguida, tratar-se-á da participação do amicus curiae e, finalmente, far-se-á breve análise do instituto da repercussão geral e seus reflexos frente aos direitos fundamentais, assim consagrados no ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, não se aterá a discorrer sobre todos os princípios derivados do devido processo legal, por não ser este o foco de discussão.

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posteriormente incorporado à Constituição Federal americana, adquirindo inclusive conteúdo material (NERY JÚNIOR, 2004b, p.61).

O sistema recursal brasileiro adota o princípio estabelecido pelo sistema norte-americano do due process of law (= devido processo legal), sobre o qual se alicerçam os principais institutos do direito processual, entre os quais se destacam o princípio da lealdade processual, que em uma de suas vertentes desemboca no acesso à Justiça, ou deveria desembocar no “acesso à ordem jurídica justa” (WATANABE, 1988, p.128). Esta se concretiza quando ao cidadão de fato é admitido participar em juízo, com todas as garantias constitucionais, e a receber a prestação jurisdicional efetiva e de acordo com os valores da sociedade em que está inserido.

Atualmente tal princípio se desdobra nas garantias e direitos individuais explicitados no Art. 5º da Constituição Federal.

Este também é o entendimento de Arturo Hoyos, para quem a cláusula do devido processo legal compreende além da oportunidade de as partes serem ouvidas por um tribunal competente e pré-determinado por lei, independente e imparcial, de produzir provas lícitas, dentre outras garantias universalmente tidas como garantidoras do devido processo legal, que o processo se desenvolva sem dilações indevidas, literis:

De esta forma, nosotros entendemos que la garantía constitucional del debido proceso es una institución instrumental en virtud de la cual debe asegurarse a las partes en todo proceso - legalmente establecido y que se desarrolle sin dilaciones injustificadas -oportunidad razonable de ser oídas por un tribunal competente, predeterminado por la ley, independiente e imparcial, de pronunciarse respecto de las pretensiones y manifestaciones de la parte contraria, de aportar pruebas lícitas relacionadas com el objeto del proceso y de contradecir las aportadas por la contraparte, de hacer uso de los medios de impugnación consagrados por la ley contra resoluciones judiciales motivadas y conformes a derecho, de tal manera que las personas puedan defender efectivamente sus derechos.

Referências

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