• Nenhum resultado encontrado

Mana vol.8 número1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Mana vol.8 número1"

Copied!
28
0
0

Texto

(1)

CALDEIRA, Teresa P. do Rio. 2000. Ci-dade de M uros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34/ Edusp. 399 pp.

Andréa M oraes Alves Dou tora n d a , PPG AS-M N -UFRJ , Escola d e Se rviço Socia l/ UFRJ

O te m a d a crim in a lid a d e e se u s e fe itos ve m d e sp e rta n d o o in te re sse d e p e s-q u isa d ore s b ra sile iros d e sd e o in ício d os a n os 80. N e ssa m e sm a é p oca , p a ssa a se r re g istra d o, a tra vé s d e in stru m e n tos d e m e d içã o e sta tística , u m a u -m e n to ve rtig in oso d os cri-m e s viole n tos n a s g ra n d e s cid a d e s d o p a ís. En q u a n to vá rios tra b a lh os se con ce n tra ra m e m e xp lica r o p orq u ê d e sse cre scim e n to d a violê n cia u rb a n a , Te re sa C a ld e ira e s-colh e u u m ca m in h o ou sa d o: e stu d a r a re la çã o e n tre crim in a lid a d e , d e m ocra -cia e e sp a ço u rb a n o. De sse d e sa fio n a s-ce u o livro Cid ad e d e M u ros: Crim e , S e g re g ação e Cid ad an ia e m S ão Pau lo. Ba se a d a e m d e p oim e n tos d e m ora -d ore s -d e b a irros -d ife re n te s -d a ci-d a -d e d e Sã o Pa u lo, colh id os e n tre 1989 e 1991, Te re sa C a ld e ira a n a lisa se u s d is-cu rsos e m re la çã o à crim in a lid a d e , à s in stitu içõe s d e m ocrá tica s e a os d ire itos civis. A te se ce n tra l d a a u tora é a d e q u e se con fig u ra n a socie d a d e b ra sile i-ra a q u ilo q u e e la e J a m e s H olston , e m a rtig o d e 1998 (“ De m ocra cy, La w, a n d Viole n ce : Disju n ction s of Bra zilia n C

iti-RESEN HAS

ze n sh ip ” ), q u a lifica m d e “ d e m ocra cia d isju n tiva ” . Este con ce ito, e m b ora n ã o se ja e xa u stiva m e n te tra b a lh a d o n o li-vro, é a m ola m e stra d a a rg u m e n ta çã o d a a u tora . C a ld e ira a va lia q u e u m a d a s m a iore s con tra d içõe s d o Bra sil con te m p orâ n e o re sid e n o fa to d e q u e a e xp a n -sã o d a cid a d a n ia p olítica , a tra vé s d o p roce sso d e tra n siçã o d e m ocrá tica , se d e se n volve u p ari p assu com a d e sle g i-tim a çã o d a cid a d a n ia civil e a e m e r-g ê n cia d e u m a n oçã o d e e sp a ço p ú b lico fra g m e n ta d o e se g re g a d o, d a í o ca rá te r d isju n tivo d e sse p roce sso d e d e m ocra tiza çã o. O s d e p oim e n tos d os e n tre vista d os sob re a crim in a lid a d e u rb a n a , a in stitu içã o p olicia l, os d ire itos h u -m a n os e a s p rá tica s d e p riva tiza çã o d o e sp a ço com o ob je tivo d e m a n u te n çã o d a se g u ra n ça e a fa sta m e n to d a a m e a ça à m e sm a re ve la m e re p rod u ze m e ssa d isju n çã o.

(2)

re sp on sá ve is p e lo a u m e n to d a crim in a lid a d e n o se u b a irro, é u m b om e xe m -p lo d e ssa d in â m ica d e cria çã o d e d is-ta n cia m e n tos. O p rin cíp io cla ssifica tó-rio é ca p a z d e tra n sform a r a ca te g oria q u e e sta ria m a is p róxim a d o n a rra d or – p e la con d içã o d e m ig ra n te –, m a s q u e é d ife re n te – d e ou tra cla sse socia l –, e m u m ou tro d ista n te e con d e n a d o. Ain d a m a is in te re ssa n te n o tra b a lh o, é q u e e ssa cria çã o d e fron te ira s n ã o se li-m ita a u li-m u n ive rso socia l, C a ld e ira m ostra com o o m e sm o m e ca n ism o a tu a e n tre m ora d ore s d a p e rife ria e d e b a ir-ros d e e lite d a cid a d e d e Sã o Pa u lo.

N a s p a rte s II e III d o livro, a a u tora a b ord a d ois a sp e ctos ilu stra tivos d a “ d e m ocra cia d isju n tiva ” : a in stitu içã o p olicia l e os “ e n cla ve s fortifica d os” . O s e n cla ve s “ sã o p rop rie d a d e p riva d a p a -ra u so cole tivo e e n fa tiza m o va lor d o q u e é p riva d o e re strito a o m e sm o te m -p o q u e d e sva loriza m o q u e é -p ú b lico e a b e rto n a cid a d e . Sã o fisica m e n te d e -m a rca d os e isola d os p or -m u ros, g ra d e s, e sp a ços va zios e d e ta lh e s a rq u ite tôn i-cos. Sã o volta d os p a ra o in te rior e n ã o e m d ire çã o à ru a , cu ja vid a p ú b lica re -je ita m e xp licita m e n te . Sã o con trola d os p or g u a rd a s a rm a d os e siste m a s d e se g u ra n ça , q u e im p õe m re g ra s d e in clu -sã o e e xclu -sã o.” (:258) A p olícia e os e n cla ve s se rã o tom a d os, a ssim com o os d iscu rsos sob re a crim in a lid a d e u rb a -n a , com o form a s d e e xp re ssã o d a lóg i-ca d e e xclu sã o e se g re g a çã o e xiste n te n a socie d a d e b ra sile ira con te m p orâ -n e a , form a s q u e co-n vive m com ca ra c-te rística s d e m ocrá tica s d e ssa m e sm a socie d a d e , p or isso sã o e xe m p los d o ca -rá te r d isju n tivo d e n ossa d e m ocra cia . Aq u i se a p re se n ta m os m a iore s p rob le -m a s n o a rg u -m e n to d a a u tora .

N o in ício d a p a rte II, e la critica u m a visã o d icotôm ica d a re a lid a d e socia l, a rg u m e n ta n d o q u e os lim ite s e n tre p ú -b lico/ p riva d o, le g a l/ ile g a l n ã o sã o rig

(3)

d os d ire itos civis e d e su a s in stitu içõe s; d o ou tro, a lóg ica d a violê n cia e d a se -g re -g a çã o. Esta ú ltim a e sta ria se m p re a m e a ça n d o o su ce sso d a p rim e ira , torn a torn d ose u m e torn tra ve p a ra o p le torn o d e -se n volvim e n to d a d e m ocra cia n o p a ís. Volta m os a o p a ra d ig m a d a “ m od e rn i-d a i-d e in com p le ta ” .

Um olh a r m a is a p rofu n d a d o sob re a s p rá tica s p olicia is e sob re a vid a coti-d ia n a n os “ e n cla ve s fortifica coti-d os” e vi-d e n cia m a is n u a n ça s e con tra vi-d içõe s vi-d o q u e p od e ría m os e sp e ra r à p rim e ira vis-ta . N e m se m p re a se g re g a çã o e a vio-lê n cia sã o a s m a rca s d e sse s e sp a ços. Da m e sm a form a , n e m se m p re o Esta -d o -d e -d ire ito e os e sp a ços p ú b licos, co-m o a s p ra ça s e ru a s, sã o vistos coco-m o a re n a s d a d ive rsid a d e . As situ a çõe s e con te xtos on d e e ssa s fron te ira s se m e s-cla m sã o e sse n cia is p a ra com p re e n d e r-m os a s in te rp re ta çõe s q u e os in d iví-d u os fa ze m iví-d e su a p róp ria socie iví-d a iví-d e . Ap e sa r d e e sta r con scie n te d isso, a a u -tora p ou co e xp lora e sse ra ciocín io e m se u tra b a lh o.

N a p a rte fin a l d o livro, e scrita m a is re ce n te m e n te , e la volta a in sistir n a s d u a s lóg ica s op osta s: “ N o con te xto d a tra n siçã o p a ra a d e m ocra cia , o m e d o d o crim e e os d e se jos d e vin g a n ça p riva d a e viole n ta vie ra m sim b oliza r a re sistê n cia à e xp a n sã o d a d e m ocra cia p a -ra n ova s d im e n sõe s d a cu ltu -ra b -ra sile i-ra , d a s re la çõe s socia is e d a vid a coti-d ia n a .” (:375) C om o b a se coti-d e ssa re sis-tê n cia , C a ld e ira a p on ta a con ce p çã o d e corp o q u e se ria p a rtilh a d a , se g u n d o e la , p e la socie d a d e b ra sile ira .

Re fe rin d o-se à p rá tica d a tortu ra com o a to tid o com o le g ítim o, à violê n -cia d om é stica , à p rá tica in d iscrim in a d a d a ce sa ria n a e a té a o ca rn a va l, Te re sa C a ld e ira a firm a q u e a socie d a d e b ra si-le ira con stru iu u m a re la çã o “ in circu n s-crita e m a n ip u lá ve l” com o corp o. Essa re la çã o fle xíve l a ca b a p or n ã o p e rm itir

o e sta b e le cim e n to d e re g ra s m a is cla -ra s d e re sp e ito in d ivid u a l, o q u e te ria sid o o ca so, p or e xe m p lo, d a Eu rop a O cid e n ta l e d os Esta d os Un id os, p a íse s d e tra d içã o lib e ra l. O q u e m e p a re ce e q u ivoca d o n e ssa a rg u m e n ta çã o é o u so d e u m a im a g e m civiliza d ora e d e -m ocrá tica d a tra d içã o lib e ra l e -m op osi-çã o a u m a im a g e m d e fra g ilid a d e d os d ire itos in d ivid u a is. Se rá q u e n ã o se e sta ria , n a ve rd a d e , re p rod u zin d o e ste -re ótip os sob -re a m b os os m od e los? E, a lé m d isso, con stru in d o u m a visã o d e socie d a d e b ra sile ira b a se a d a n a n e g a -çã o d a “ socie d a d e lib e ra l e d e m ocrá ti-ca e u rop é ia e n orte -a m e riti-ca n a ” ?

A a u tora n ã o cla ssifica o Bra sil e ou tra s socie d a d e s d e p a ssa d o colon ia l com o socie d a d e s n ã o m od e rn a s. Afi-n a l, e la s d e se Afi-n volve ra m iAfi-n stitu içõe s d e m ocrá tica s b a se a d a s n o d ire ito p olítico e socia l. N o e n ta n to, C a ld e ira e n -te n d e q u e a q u i se con stitu iu u m a “ m od e rn iod a od e p e cu lia r” , cu ja m a rca od istin -tiva e stá n a fra g ilid a d e d os d ire itos ci-vis. O d e sa fio, se g u n d o a a u tora , se ria e q u ilib ra r os a sp e ctos p ositivos d a fle -xib ilid a d e d os corp os, com o a se n su a li-d a li-d e – m a is u m e ste re ótip o –, com u m a circu n scriçã o d os m e sm os q u e e vita sse os a b u sos con tra os d ire itos in d ivi-d u a is, p rin cip a lm e n te e m u m con te xto on d e a d e sig u a ld a d e socia l os torn a m a is fre q ü e n te s con tra os d om in a d os (p ob re s, m u lh e re s, cria n ça s). Ta is a b u sos, p oré m , n ã o se ria m m e n os fre q ü e n -te s e m p a íse s d e tra d içã o lib e ra l – b a s-ta le m b ra rm os, p or e xe m p lo, d os ca sos re corre n te s d e a b u so se xu a l con tra cria n çcria s e m p cria íse s e u rop e u s e n os Estcria -d os Un i-d os. Lá , ta m b é m , a circu n scriçã o d os corp os ta lve z n ã o se ja a ssim tã o d e fin id a com o fa z p a re ce r a a n á lise d e C a ld e ira .

(4)

d e m ocra cia sã o a s p e ça s d e sse jog o. A te n ta tiva d e C a ld e ira é u m p rim e iro p a sso q u e n os d e ixa p ista s p a ra a va n -ça r. Um a in ve stig a çã o sob re a s p rá tica s d e se g re g a çã o e d e h om og e n e iza çã o d a vid a cotid ia n a ta lve z n os m ostre u m a flu id e z d e sig n ifica d os m u ito m a ior d o q u e a q u e la a p re se n ta d a p e los d iscu r-sos d os su je itos. Alé m d isso, p od e n os g u ia r p a ra e n con tra rm os ou tra s p e ça s q u e p od e m e sta r fa lta n d o n e sse jog o.

FRANCHETTO, Bruna e HECKENBER-GER, M ichael (orgs.). 2001. Os Povos do Alt o Xingu: Hist ória e Cult ura. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. 496 pp.

Julio Cezar M elatti

Profe ssor, Un ive rsid a d e d e Bra sília

O volu m e te m p or te m a os a ltoxin g u a -n os p rop ria m e -n te d itos, h oje re d u zid os a trê s p ovos fa la n te s d e lín g u a s a ru a k (Wa u rá , M e h in a k o e Ya w a la p iti), q u a tro d e lín g u a s k a rib (Ku ik u ro, Ka la p a -lo, M a tip u / N a h u k w á e Ba k a iri), d ois d e lín g u a s tu p i (Ka m a yu rá e Aw e ti) e u m d e lín g u a isola d a (Tru m a i), q u e p a u ta m su a vid a sob re u m fu n d o cu ltu ra l com u com , com a s se com a n tê com é tn ica e p olitica -m e n te d istin tos, a in d a q u e vá rios d e le s re con h e ça m e m se u se io a e xistê n cia d e d e sce n d e n te s d e p ovos d e sa p a re ci-d os. À e xce çã o ci-d os Ba k a iri, q u e h oje vive m n a s ca b e ce ira s d e trib u tá rios d os rios Te le s Pire s e Arin os, tod os e stã o n a m e ta d e m e rid ion a l d o Pa rq u e In d íg e n a d o Xin g u .

O s d e ze sse is a u tore s d os te xtos n e -le re u n id os sã o h e te rog ê n e os e m su a form a çã o. H á e tn ólog os (Rob e rt C a r-n e iro, G e rtru d e Dole , Elle r-n Ba sso, Th o-m a s G re g or, Eo-m ilie n n e Ire la n d , Ra fa e l Ba stos, Ed ir Pin a d e Ba rros, Aristóte le s Ba rce los N e to, M a rce la C oe lh o d e Sou za ), lin g ü ista s (Au rore M on od Be cq u e

-lin , Bru n a Fra n ch e tto, Ra q u e l G u ira d e llo), a n trop ólog os b iológ icos (Rob e r-to Ve n tu ra Sa n r-tos, C a rlos C oim b ra J r.), u m a rq u e ólog o (M ich a e l H e ck e n b e r-g e r) e u m a r-g e ór-g ra fa (M a ria Lú cia Pire s M e n e ze s), d e sd e ve te ra n os d a d é ca d a d e 50 a té jove n s re cé m -ch e g a d os a os te m a s xin g u a n os.

O p rop ósito g e ra l d o volu m e é o d e rom p e r com a im a g e m d e u m Alto Xin -g u d e p a ssa d o tota lm e n te d e scon h e ci-d o a n te s ci-d a p rim e ira e xp e ci-d içã o ci-d e Ka rl von d e n Ste in e n e m 1884 e , a p ós a m e s-m a , socia ls-m e n te e stá tico e cu ltu ra l-m e n te h ol-m og ê n e o.

(5)

cio-n a is com se u s a ssa ltos a rm a d os e a d i-fu sã o d e m olé stia s con ta g iosa s. O s Tu p i e fin a lm e n te os Tru m a i in g re ssa ra m n a á re a . C h e g a e n tã o Ste in e n , q u e os e n -con tra org a n iza d os n u m p a d rã o q u e a in d a é o d e h oje : u m con ju n to d e p o-vos p olítica e ritu a lm e n te a rticu la d os e n volvid os p or ou tros q u e con sid e ra m b ra vios. O u tros p e sq u isa d ore s os visi-ta m . A in te rfe rê n cia , m a is d o q u e a a ssistê n cia , g ove rn a m e n ta l a tu a à d istâ n cia , d e u m p osto a o su l, p a ra on d e a ca -b a m p or se tra n sfe rir tod os os Ba k a iri. A com u n ica çã o a é re a se e sta b e le ce e m m e a d os d o sé cu lo XX, q u a n d o ta m b é m a p op u la çã o xin g u a n a ch e g a a se u m í-n im o. Um a a ssistê í-n cia m a is e ficie í-n te a con d u z à re cu p e ra çã o. O q u e fa scin a n a a rq u e olog ia xin g u a n a é a p ossib ili-d a ili-d e ili-d e re la cion a r os ve stíg ios p ré -h is-tóricos a os p ovos q u e a tu a lm e n te a li vve m e , m a is a in d a , p e rm itir a o p e sq u i-sa d or con ve ri-sa r com os n a tivos sob re o q u e e n con tra .

É o q u e a con te ce ta m b é m com o te xto d e Bru n a Fra n ch e tto. Alé m d a a -va lia çã o d o e sta d o a tu a l d o con h e ci-m e n to lin g ü ístico d a re g iã o, d e u ci-m a d e scriçã o m a is d e m ora d a d a s ca ra cte rística s d a s lín g u a s k a rib , d a q u a lifica -çã o d o m u ltilin g ü ism o xin g u a n o, e la a in d a p od e n os p a ssa r a s op in iõe s d e a lg u n s fa la n te s sob re a s p e cu lia rid a d e s d o ve rn á cu lo e com o o con tra sta m com os d ia le tos ou lín g u a s a fin s.

As con trib u içõe s a o volu m e fora m d istrib u íd a s e m d u a s p a rte s: “ Visõe s Re g ion a is” e “ Visõe s Loca is” . In sp ira -d a ta lve z n a a lte rn â n cia e n tre e stu -d os com p a ra tivos e m on og rá ficos q u e m a r-cou o d e se n volvim e n to d a e tn og ra fia d o Alto Xin g u , e ssa d istin çã o é m u ito d ifícil d e se m a n te r, com o sin tom a tica m e n te o a te sta o a rtig o d e Th om a s G re -g or, in clu íd o n a s “ Visõe s Re -g ion a is” . Em b ora foca liza d o a p a rtir d e u m só p o-vo, os M e h in a k o, e n tre os q u a is p e sq u

isou , o p a p e l d a s m u lh e re s n os ca sa m e n -tos in te ré tn icos, com o p e n h ore s d a p a z e p re g a d ora s d a b oa von ta d e , foi e é im p orta n te n a form a çã o, e xp a n sã o e m a -n u te -n çã o d e tod o o siste m a xi-n g u a -n o.

G e rtru d e Dole , q u e e n tre ou tros tra b a lh os e n sa iou a té u m a p e sq u isa a r-q u e ológ ica p ion e ira ju n to a os Ku ik u ro n a d é ca d a d e 50, com p a re ce a o volu m e com u m a rtig o n o q u a l, p a ra con -tra b a la n ça r a ê n fa se d a d a d e sd e Ste i-n e i-n à g ra i-n d e se m e lh a i-n ça e i-n tre a s cu ltu ra s xin g u a n a s, a p on ta su a s d ife re n ça s e m d istin tos d om ín ios. J á Aristóte -le s Ba rce los N e to, foca liza n d o a s a rte s visu a is, m ostra com o se u s m otivos se tra n sform a m e tra n sita m p or e sse s d o-m ín ios – o o-m ítico, o ritu a l, o xa o-m â n ico, o cotid ia n o d a vid a a ld e ã – e a in d a p e -la re d e in tra xin g u a n a e p e lo m u n d o d os b ra n cos.

Tolh id os p e la fa lta d e d a d os re ce n -te s sob re ín d ice s ig u a lm e n -te d isp on íve is p a ra a m a ior p a rte d os p ovos xin g u a n os e á re a s vizin h a s, Rob e rto Ve n tu ra Sa n tos e C a rlos C oim b ra J r. se le -cion a m se te m e d id a s a n trop om é trica s tom a d a s p or a n tig os p e sq u isa d ore s, tod a s e la s, com e xce çã o tod a e sta tu ra , re -fe re n te s à ca b e ça , e con clu e m q u e os xin g u a n os sã o m orfolog ica m e n te m a is a fin s e n tre si d o q u e com ou tros g ru p os in d íg e n a s d o Bra sil C e n tra l, o q u e d e corre ria d e u m in te n so flu xo g ê n ico e n -tre su a s com u n id a d e s.

(6)

con tra stá -lo com o d e Ed ir Pin a d e Ba r-ros, q u e m ostra com o os a tu a is Ba k a iri a va lia m a s con se q ü ê n cia s d a e xp e d içã o d e Ste in e n : con corre u p a ra su a d e p op u la çã o e m virtu d e d o con tá g io, p a -ra a a lte -ra çã o d e su a s re la çõe s com os d e m a is xin g u a n os, p a ra o a b a n d on o d os form a d ore s d o Xin g u e su a tra n s-form a çã o e m tra b a lh a d ore s d e u m p osto d o SPI q u e n ã o se d e stin a va a a p oiá -los, m a s sim à a tra çã o e a ssistê n cia d os p ovos q u e lá fica ra m .

Alé m d o a rtig o d e Ed ir Pin a d e Ba r-ros, h á ou tros se is n a p a rte “ Visõe s Lo-ca is” . Por força m e sm o d a a rticu la çã o e n tre os g ru p os xin g u a n os, n e n h u m d os a rtig os se a té m e xclu siva m e n te a u m a p e rsp e ctiva loca l. O q u e m a is d isso se a p roxim a é ta lve z o d o p e sq u isa -d or ve te ra n o Rob e rt C a rn e iro, q u e a p re se n ta u m m ito d os Ku ik u ro re fe re n te à orig e m d o la g o Ta h u n u n u , ju n to a o q u a l vive ra m n o p a ssa d o. Este la -g o, n a m a r-g e m d ire ita d o C u lu e n e (ou d o Xin g u , q u e n os m a p a s d o IBG E com e ça com a is a o su l, n a foz d o Se te d e Se -te m b ro), é rod e a d o p or ve stíg ios a r-q u e ológ icos d e a ld e ia s con stitu in te s d o q u e H e ck e n b e rg e r ch a m a d e C om p le -xo O rie n ta l, re la cion a d o a os Ka rib .

Em ilie n n e Ire la n d d iscu te com o os Wa u rá cla ssifica m os p ovos d a re g iã o, e m xin g u a n os, b ra vios e b ra n cos, con form e su a a d e sã o a os p a d rõe s q u e d e -ve m orie n ta r a con d u ta q u e tê m com o a m a is d e se já ve l p a ra os se re s h u m a n os. Re con h e ce m , e n tre ta n to, os e xe m -p los e s-p orá d icos d e com -p orta m e n to solid á rio d os b ra vios e se n te m -se in co-m od a d os coco-m a le co-m b ra n ça d e ca sos e m q u e te ria m in corrid o e m a çõe s e m d e sa cord o com se u s id e a is.

O s a rtig os d e Elle n Ba sso, Ra fa e l Ba stos e M a rce la C oe lh o d e Sou za , q u e foca liza m , re sp e ctiva m e n te , os Ka la p a lo, os Ka m a yu rá e os Aw e ti, le -va m e m con ta a m e sm a cla ssifica çã o

d e p ovos, p oré m sã o m a is in cisivos e m a ce n tu a r a a rticu la çã o e n tre e le s, n ã o com o u m e sta d o, m a s com o u m p roce s-so q u e ve m se d e se n volve n d o a o lon g o d os ú ltim os sé cu los: g ru p os q u e se a g re g a m e m n ova s u n id a d e s, se m q u e d e le s se p e rca a m e m ória ; a d e re m a os p a d rõe s xin g u a n os, se m q u e e ste s se sob re p on h a m in te ira m e n te a e le m e n -tos cu ltu ra is a n te riore s; con tin u a m a d ifu n d ir e n tre si n ova s con trib u içõe s cu ltu ra is, com o o rito d o J a w a ri, in tro-d u zitro-d o p e los Tru m a i, os ú ltim os a se in se rire m n o con ju n to xin g u a n o.

Fin a lm e n te o te xto re fe re n te a os Tru m a i, d e Au rore M on od -Be cq u e lin e Ra q u e l G u ira rd e llo, te m m a is o ca rá te r d e in ve n tá rio d e e le m e n tos q u e ve -n h a m a se rvir p a ra a e la b ora çã o d e u m tra b a lh o com a m e sm a orie n ta çã o d os d e m a is cola b ora d ore s.

Se n ã o tra ta d e q u e stõe s in te ira -m e n te n ova s, u -m a ve z q u e b oa p a rte d e se u s a u tore s já e xp lorou os te m a s n e le e xp ostos e m tra b a lh os d e m a ior fôle g o, o volu m e te m o m é rito d e re u -n ir e ssa s co-n trib u içõe s p a ra u m a h istó-ria d o Alto Xin g u , torn a n d o m a is e vi-d e n te a con ve rg ê n cia vi-d os re su lta vi-d os d e su a s p e sq u isa s.

(7)

-d a to-d a a p a rte q u e fica a o n orte -d a a l-d e ia a lto-xin g u a n a m a is se te n trion a l, d os Tru m a i, se ria p ossíve l d u p lica r-lh e a e sca la . O s lim ite s d a s p rop rie d a d e s ru ra is, q u e n ã o tê m in te re sse p a ra os a rtig os q u e in te g ra m o volu m e , d e ve ria m se r ria p ria g ria d os, ria ssim com o o e m ria rria -n h a d o d a s p e q u e -n a s corre -n te s d ’á g u a . Por ou tro la d o, d e ve ria m se r a u m e n ta -d os, torn a n -d o-os le g íve is, os n om e s -d e p ovos e rios p rin cip a is (m e d id a e sta ta m b é m re com e n d á ve l p a ra ou tros m a -p a s d o volu m e ). E n a s m a rg e n s d e ve r-se -ia in d ica r os g ra u s d os m e rid ia n os e p a ra le los.

Por fim , a in d a q u e n ã o se ja e sse o se u p rop ósito, e sse volu m e p a re ce p re n u n cia r a re tom a d a d o e stu d o com p a -ra tivo d os Aru a k (m a is d e oite n ta a n os d e p ois d o tra b a lh o p ion e iro d e M a x Sch m id t), fu n d a d ore s q u e sã o d o n ód u -lo e m torn o d o q u a l se form ou o p a d rã o a lto-xin g u a n o. Ta l com o a con te ce u , n a se g u n d a m e ta d e d o sé cu lo XX, com os J ê , d e p ois os Ka rib , e m se g u id a os Tu p i e a té os Pa n o, os Aru a k te ria m a g ora a su a ve z.

HARRIS, M ark. 2000. Life on the Ama-zon. The Ant hropology of a Brazilian Peasant Village. Oxf ord: Oxf ord Uni-versit y Press/ The Brit ish Academy. 236 pp.

M arco Antonio Gonçalves Profe ssor, PPG SA-IFC S-UFRJ

O livro d e M a rk H a rris é , e m tod os os se n tid os, u m a e tn og ra fia n ã o con ve n ci-on a l: in ova e m su a a b ord a g e m crítica d a “ con stru çã o d a Am a zôn ia ” com o ob je to d e e stu d o; q u e stion a o u so d a ca te g oria “ id e n tid a d e ” , p rop on d o u m a n ova p e rce p çã o p a ra e ste con ce ito n a a n trop olog ia ; p rod u z u m a e scrita con

s-cie n te d os p rob le m a s e p iste m ológ icos im p lica d os n o fa ze r e tn og rá fico.

A p e sq u isa q u e d e u orig e m a o livro foi re a liza d a com o p ré -re q u isito p a ra a te se d e d ou tora d o d o a u tor, d e fe n d id a n a Lon d on Sch ool of Econ om ics, a q u a l, re e scrita a p a rtir d a ob te n çã o d e u m a b olsa d e p ósd ou tora d o ju n to à Aca d e m ia Britâ n ica , g a n h ou n e ssa p u b lica -çã o n ova form a e m a ior d e n sid a d e .

O e stu d o b a se ia -se e m u m tra b a lh o d e ca m p o re a liza d o e m Pa rú , vila rib e i-rin h a n o m u n icíp io d e Ó b id os (Esta d o d o Pa rá ), e n tre ju lh o d e 1992 e ja n e iro d e 1994. “ N ã o é o te m p o q u e m u d a m a s a s p e ssoa s” – a fra se d e u m a in form a n te , q u e se rve d e e p íg ra fe , e xp re ssa sin -te tica m e n -te o p rob le m a ce n tra l q u e H a rris se p rop õe a re solve r: a s re la çõe s e n tre id e n tid a d e , te m p ora lid a d e e m u -d a n ça cu ltu ra l.

Ao e xp or a s re p re se n ta çõe s corre n -te s n a li-te ra tu ra sob re a re g iã o a m a zô-n ica , o a u tor forzô-n e ce u m p a zô-n o d e fu zô-n d o p a ra p e n sa r su a com p le xid a d e . Am a zôn ia é u m e m a ra n h a d o d e d ive rsid a -d e s: a m e rín -d ios vá rios, ca m p e sin a tos d ife re n cia d os, se rin g u e iros, m a d e ire i-ros, g ra n d e s cid a d e s com e lite s e cla sse m é d ia . As id e n tid a d e s d e “ a m a zôn co” , “ in d íg e n a ” ou “ cid a d ã o b ra sile i-ro” p od e m ocorre r sim u lta n e a m e n te e , n e sse se n tid o, o p rob le m a é sa b e r si-tu a r ou loca liza r e ssa s id e n tid a d e s n o p a n ora m a d a s m u d a n ça s h istórica s q u e a fe ta m a p rá tica d a vid a d iá ria n a Am a -zôn ia , p rod u zin d o, con se q ü e n te m e n te , m a is id e n tid a d e s, u m a ve z q u e e sta s sã o con stru íd a s n e ssa p rá tica . Em ta l ce n á rio, p orta n to, n ã o h á id e n tid a d e d e fin id a , n ã o h á ce n tro: o q u e e xiste sã o m e d ia çõe s e tra n sform a çõe s. O rio A-m a zon a s é a A-m e ton íA-m ia d o “ se r a A-m a zô-n ico” , a q u ilo q u e , a o m e sm o te m p o, cria vín cu los e isola m e n tos.

(8)

so-b re id e n tid a d e e m u d a n ça . O e sforço d o a u tor é o d e con trib u ir p a ra p e n sa r os m od os m ú ltip los e coe xiste n te s d e cria -çã o e d e fin i-çã o d a id e n tid a d e . N e ssa n ova a ce p çã o, id e n tid a d e é d a d a ou e x-p re ssa n o q u e a s x-p e ssoa s fa ze m e e m com o fa ze m a s coisa s, e n ã o p re e sta b e -le cid a n a form a d e u m co-le tivo é tn ico ou d e cla sse . Esta p rop osiçã o m e p a re -ce fu n d a m e n ta l. N e sse livro, o a u tor p e rse g u e u m ou tro tip o d e id e n tid a d e q u e a q u e la q u e d ivid e a h u m a n id a d e e m cu ltu ra s e com u n id a d e s, b u sca n d o a p re e n d e r o “ ou tro la d o d a id e n tid a d e [...] o re la cion a l, o vivid o, o con h e ci-m e n to in corp ora d o d e p rá tica s e h a b ili-d a ili-d e s e a q u ilo q u e é irre p re se n tá ve l n o d iscu rso ve rb a l.” (:7) N e ssa a b ord a -g e m , a id e n tid a d e se con strói a p a rtir d e h istória s “ in te rsu b je tiva s e con e ctiva s” . Vislu m b ra se a ssim u m a a lte rn a -tiva p a ra a con ce itu a çã o d a id e n tid a d e e n q u a n to p rod u to d ia lé tico d a e xp e riê n cia h istórica d e p e ssoa s p ra tica -m e n te e n g a ja d a s e -m u -m -m u n d o vivi-d o. O va lor vivi-d a e xp e riê n cia p a ra e ssa con ce itu a çã o se fa z se n tir n a p rop osiçã o d o a u tor d e u m a on tolog ia d a id e n -tid a d e p or d e fin içã o a n tiin te le ctu a lista , a n cora d a n a vid a n o m u n d o, e m lu g a r d e con stitu íd a com o h a b ilid a d e p a ra tra n sce n d e r e sse m u n d o m e d ia n te a cria çã o d e a b stra çõe s d a ord e m d a cu l-tu ra e d a p olítica .

O livro e stá org a n iza d o e m q u in ze ca p ítu los q u e p rocu ra m , a p a rtir d e u m a b e m con stru íd a e tn og ra fia , visita r a s q u e stõe s loca is a m a zôn ica s e os p ro-b le m a s te óricos p rop ostos p e la a n tro-p olog ia . A n a rra tiva é b e m -su ce d id a a o e sta b e le ce r u m a vin cu la çã o e n tre o lo-ca l e o g lob a l, fa ze n d o m e d ia çõe s e n tre p la n os p róxim os e d ista n te s, e n tre o m u n d o a m a zôn ico e a te oria a n trop oló-g ica . O s ca p ítu los sã o d ivid id os e m d ois tip os d e n a rra tiva com p le m e n ta re s. O s ca p ítu los e tn og rá ficos m a is con ve n

cion a is – “ As M a ré s d a H istória cion a Am a -zôn ia ” , “ C on tin u id a d e e Re cu rsos” , “ N ós Som os Tod os Fa m ília Aq u i” , “ Ritm os” , “ Tra b a lh o coRitm o Vid a ” e “ Fron -te ira s” – con tra sta m com a q u e le s e m q u e o a u tor n a rra e m p rim e ira p e ssoa su a e xp e riê n cia e o se n tid o te órico q u e q u e r im p rim ir a e ste con ce ito. Sã o se te re la tos m a is su b je tivos q u e com p le m e n ta m e , à s ve ze s, e stru tu ra m os ou -tros: “ O C u rso d o Rio” , “ C a b oclo” , “ Pe s-ca n d o com J osé M a ria ” , “ En tre Dois Ir-m ã os” , “ O u tra M a n e ira d e C on ta r” (u Ir-m e n sa io fotog rá fico), “ Posse ssã o” , “ Fe ch a n d o o C írcu lo” . Essa d u p la e stru tu -ra d iscu rsiva , q u e p od e ria p a re ce r e x-ce ssiva e re d u n d a n te , se p rova u m a m a n e ira b e m d osa d a d e a p roxim a r o le itor à e xp re ssã o com p le ta d o m u n d o e m q u e vive u o a u tor, a o m e sm o te m p o e m q u e d á m a ior d e n sid a d e à s q u e s-tõe s p rop ria m e n te e tn og rá fica s.

(9)

s-troe m se u a ce sso a os re cu rsos d e q u e n e ce ssita m . O p a re n te sco p a re ce u m fa tor fu n d a m e n ta l n a con tin u id a d e d e ssa s p op u la çõe s, e o a u tor re ve la a s e stra té g ia s d e ca sa m e n to e su a s re la çõe s com o a ce sso a os re cu rsos. Se -g u in d o o e xe m p lo m a u ssia n o d e a b od a g e m od a sa zon a liod a od e e sq u im ó, H a r-ris e xp lora o m od o com o os rib e irin h os con stroe m su a socia b ilid a d e , e com o e xp e rie n cia m a s d ife re n te s e sta çõe s. An a lisa , ta m b é m , o con ce ito d e tra b a lh o e xp re sso p e los in form a n te s n o d e se m p e n h o d e su a s d ife re n te s a tivid a -d e s. Pe rce b e q u e o “ tra b a lh o” n ã o é con stru íd o e m a n ta g on ism o a o vive r m a s, p e lo con trá rio, “ tra b a lh o” e stá lig a d o d ire ta m e n te à a lig ê n cia e a o “ fa -ze r” n o m u n d o. A p a rtir d e sta p e rsp e c-tiva d a e xp e riê n cia , d o e sta r n o m u n d o, p rop õe u m a ou tra visã o d o ca m p e sin a -to a m a zôn ico. Em ve z d e cla ssificá -lo com o “ m a rg in a l” a o siste m a a b ra n g e n -te d a s troca s, p e rce b e -o e n q u a n to for-m a n d o cofor-m u n id a d e s q u e con stroe for-m e sp a ços d e lib e rd a d e e n ã o a p e n a s d e su b ju g a çã o a o siste m a d om in a n te . Se m -p re -p re ocu -p a d o com o -p a rticu la r e e vita n d o a ssu m ir u m a p e rsp e ctiva g e n e -ra liza n te , a n a r-ra tiva “ En tre Dois Ir-m ã os” re ve la a riq u e za d a s h istória s d e vid a p a ra a con stru çã o d e e xp lica çõe s sociológ ica s: d ois irm ã os, d ois d e stin os, d u a s form a s d ife re n te s d e ob te r a ce sso a re cu rsos. O b se rva -se a p re ocu p a çã o d o a u tor e m n ã o h ip osta sia r a cu ltu ra , a h istória e o a m b ie n te com o p rod u tore s d e “ tip os socia is” e p rocu ra r com p re e n d e r p roce ssos com p le xos d e d ife re n cia çã o q u e se p a ssa m e m u m m e sm o a m -b ie n te d a d o.

A con trib u içã o d e cisiva d e se u tra -b a lh o re sid e ta m -b é m n o e m p re e n d i-m e n to d e u i-m a re a n á lise d a ca te g oria Cab oclo. Procu ra n d o n ã o re ificá la a in -d a m a is, p re fe re u sa r os te rm os “ rib e iri-n h o” ou “ ca m p oiri-n ê s” . O u so d o te rm o

“ ca m p on ê s” re coloca a q u e stã o a m a zôn ica n o ca m p o d a tra d içã o d e e stu -d os -d e ca m p e sin a to, tã o ca ra à a n tro-p olog ia . A n a rra tiva “ C a b oclo” con te s-ta a n a tu re za d a ca te g oria socia l, d e fi-n ifi-n d o e ste te rm o e m fu fi-n çã o d a q u e le s q u e o u sa m , isto é , com o u m te rm o for-ja d o p e los e stra n g e iros a o m u n d o ru ra l a m a zôn ico. De sse m od o, con se g u e d i-n a m iza r a d iscu ssã o d e u m a ca te g oria p e trifica d a com o a d e ca b oclo, d a n d olh e n ovos con torn os e m a ior re n d im e n -to e a lca n ce te óricos.

(10)

m od e lo. É o ca so d e Pá lsson , q u e d e fin e o m é tod o a n trop ológ ico com o “ d iscu rso vivo” , ca ra cte rístico d e u m “ d iá log o d e -m ocrá tico” e -m q u e a n trop ólog o e n a ti-vo (ou m e lh or, o p e sq u isa d or d e ca m p o e se u a n fitriã o) n ã o e stã o su b m e tid os à cu ltu ra , à h istória e à s p olítica s e con ôm ica s, p e rsistin d o u ôm e sp a ço p a ra a in -ve n çã o e a a m iza d e q u e e sca p a m à s d e te rm in a çõe s g e ra is d a situ a çã o d e p e sq u isa . M oore , com su a p rop osiçã o d e “ a n a tom ia vivid a ” , ta m b é m in sp ira o a u tor n o se n tid o d e re ve la r a n a tu re -za in corp ora d a d a id e n tid a d e , d e cor-re n te d o fa to d e q u e a s e xp e riê n cia s su rg e m d e in te ra çõe s socia is con cre ta -m e n te situ a d a s n o te -m p o e n o e sp a ço. Este p on to p a re ce se r ce n tra l p a ra a su p e ra çã o d e u m a com p re e n sã o d a e xp e -riê n cia e id e n tid a d e com o fixa s e in d ivid u a liza d a s. O q u e o a u tor q u e r ju sta -m e n te e xp lora r e ch a -m a r a a te n çã o é p a ra a ca p a cid a d e d a s p e ssoa s d e se a d a p ta re m com su ce sso à s m u d a n ça s d a s circu n stâ n cia s h istórica s. As p e s-soa s p od e m con tin u a r e xistin d o p orq u e re in ve n ta m a si p róp ria s e re orie n ta m se u s ob je tivos p a ra o p re se n te . De sse m od o, o a rg u m e n to ce n tra l é o d e q u e a s ca ra cte rística s d a m u d a n ça , d a a u -to-im a g e m , d a re cu p e ra b ilid a d e e d a s op ortu n id a d e s n ã o sã o sim p le s té cn ica s d e sob re vivê n cia , m a s e le m e n tos con s-titu tivos d a s id e n tid a d e s socia is.

KUSCHNIR, Karina. 2000. Eleições e Re-presentação no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Relume-Dumará/ NuAP-M N-UFRJ. 95 pp.

Fernando Alberto Balbi Dou tora n d o, PPG AS-M N -UFRJ

Dou tora e m An trop olog ia Socia l p e lo PPG ASM N UFRJ , Ka rin a Ku sch n ir re

-e scr-e v-e p a ra -e ss-e livro a lg u n s a rtig os b a se a d os e m su a d isse rta çã o d e m e stra -d o, a p re se n ta -d a n a m e sm a in stitu içã o.

O te xto se in se re n o ca m p o d a “ a n -trop olog ia d a p olítica ” , e p rocu ra a n a li-sa r a s p rá tica s p olítica s e m fu n çã o d a s con ce p çõe s e d os p on tos d e vista d os p róp rios a tore s. A a u tora ce n tra su a a -te n çã o n os ve re a d ore s d o Rio d e J a n e i-ro e b u sca d a r con ta d a s re g ra s e d os va lore s q u e d ã o se n tid o à su a e xp e ri-ê n cia p olítica a p a rtir d a ob se rva çã o d a s in te ra çõe s q u e m a n tê m com se u s e le itore s, p a re s, fu n cion á rios d o Pod e r Exe cu tivo m u n icip a l e jorn a lista s.

(11)

O s q u a tro p rim e iros ca p ítu los d o li-vro e xp lora m e ssa s ob se rva çõe s p a ra e xa m in a r a s d ife re n te s fa ce ta s d a a tu a -çã o d os ve re a d ore s. N o ca p ítu lo 1, Ku s-ch n ir m ostra q u e e xiste u m a m a rca d a corre la çã o e n tre o tip o d e ca m p a n h a e -le itora l d e se n volvid o p e los ca n d id a tos a ve re a d ore s e a d istrib u içã o d e se u s votos. O s d ive rsos tip os d e d iscu rso d e ca m p a n h a e xp re ssa m e stra té g ia s d is-tin ta s volta d a s a p rop or a d e te rm in a d os e le itora d os ce rta s cla sse s d e vín cu los. Isso im p lica u m e sforço d os ca n d id a tos p a ra con stru ir se u p e rte n cim e n to a u m g ru p o d e re fe rê n cia d e se u s e le itore s a tra vé s d a p rop osiçã o d e u m tip o e sp e -cífico d e in te rcâ m b io voto/ m a n d a to. N e sse se n tid o, a a u tora d istin g u e e n tre u m a e stra té g ia “ com u n itá ria / a ssiste n -cia lista ” e ou tra “ id e ológ ica / p olítica ” . O ca p ítu lo 1 cu lm in a com a ob se rva çã o d e q u e o in te rcâ m b io voto/ m a n d a to n ã o é se n ã o “ u m m om e n to d e n tro d e u m a ca d e ia d e re la çõe s q u e se p roce ssa m e m torn o d a a tivid a d e p olítica , q u e n ã o e stá re strita a o p e ríod o e strita m e n te e le itora l” (:32).

O ca p ítu lo 2 e la b ora e sse p on to, con ce n tra n d o-se n a cotid ia n id a d e d o m a n d a to le g isla tivo. Se u m a ior m é rito é m ostra r a com p le xid a d e d a p e rsp e ctiva d os ve re a d ore s q u a n to a o se u p a p e l com o m e d ia d ore s. Assim , os ve re a -d ore s “ a ssiste n cia lista s” e os “ d e ológ i-cos” se d ife re n cia m n a m e d id a e m q u e os p rim e iros se d e d ica m fu n d a m e n ta l-m e n te a cria r e re p rod u zir re la çõe s p e s-soa is com os e le itore s, p rop orcion a n d olh e s b e n s e se rviços, e n q u a n to os se -g u n d os te n d e m a tra b a lh a r e m n om e d e ca u sa s re p re se n ta tiva s d e g ru p os org a n iza d os, ocu p a n d o-se d e fa cilita r su a p a rticip a çã o n o “ p roce sso p olítico” m a is d o q u e lh e s ofe re ce r re cu rsos m a -te ria is. Tod a via , p osto q u e a m b os os ti-p os se e n con tra m im e rsos e m a lg u m a form a d e in te rcâ m b io voto/ m a n d a to

q u e su p õe d ívid a s p a ra com se u s e le i-tore s, “ a ve re a n ça te m se m p re u m a v e rte n te d e assistê n cia à p op u la çã o” (:45). M e sm o a ssim , os ve re a d ore s – se -ja m “ id e ológ icos” ou “ a ssiste n cia lis-ta s” – lis-ta m b é m a g e m com o “ m e d ia d o-re s cu ltu ra is” , p on to q u e é d e se n volvi-d o n o ú ltim o ca p ítu lo.

O ca p ítu lo 3 a n a lisa a com p le xa d i-n â m ica d a s re la çõe s q u e os ve re a d ore s m a n tê m e n tre si. Ele s re con h e ce m su a in te rd e p e n d ê n cia com o u m fa to fu n d a -m e n ta l, con scie n te s d e q u e “ n u -m ce rto n ív e l d e atu ação, o voto d a d o (a fa vor d e u m p roje to ou p rop osiçã o) d e ve sig n ifica r voto re trib u íd o” (:52). Isso se re -fle te n o va lor q u e con ce d e m a o fa to d e te re m u m “ b om trâ n sito” e à ca p a cid a -d e -d e fa ze re m a cor-d os. C on tu -d o, o “ b om trâ n sito” se vê a fe ta d o p e la n e -ce ssid a d e d e tom a re m p osiçã o e m fa -ce d o jog o p olítico. C om e fe ito, é im p ossí-ve l p a ra u m ossí-ve re a d or se r n e u tro, p osto q u e “ o ê xito d e se u m a n d a to d e p e n d e d a solid ifica çã o d e a lia n ça s – ta re fa q u e só p od e se r con se g u id a a tra vé s d a tro-ca d e votos” (:58), e o voto só se rve co-m o in stru co-m e n to d e in te rcâ co-m b io d e sd e q u e o ve re a d or fa ça p a rte d e a lg u m d os g ru p os q u e op e ra m n a C â m a ra . Essa te n sã o e n tre a n e ce ssid a d e d e m a n te r u m “ b om trâ n sito” e o im p e ra tivo d e e s-ta b e le ce r a lia n ça s d u rá ve is – q u e d á con ta e m ce rta m e d id a d a in sta b ilid a -d e -d os b locos -d e “ situ a çã o” e “ op osi-çã o” – con stitu i u m “ con flito e n tre d ois tip os d e com p orta m e n to va loriza d os e p re scritos p e lo g ru p o” (:58) q u e os ve -re a d o-re s -re solve m d e m a n e ira q u a se te a tra l n o p le n á rio, ju stifica n d o a m b os e m te rm os d a d e fe sa d os in te re sse s d e se u s e le itore s.

(12)

so-m e n te o Exe cu tivo p od e p rop orcion a r-lh e s. Ku sch n ir a ssin a la q u e e xiste u m a a ssim e tria e n tre Exe cu tivo e Le g isla tivo q u e “ n ã o e stá in scrita n a s a trib u içõe s d os d ois Pod e re s e sim n o p roce sso d e troca s p rom ovid o n o e xe rcício d os m a n -d a tos -d e se u s ocu p a n te s” (:68). Essa a ssim e tria h a b ilita os ve re a d ore s e n q u a n -to m e d ia d ore s m a s im p lica u m a g ra n d e in sta b ilid a d e e con flitos p e rm a n e n te s, se n d o re sse n tid a p e los le g isla d ore s. Por ou tro la d o, a m íd ia g e ra lm e n te ofe re ce u m a im a g e m n e g a tiva d o Le g isla tivo, d e sp re stig ia n d oo d ia n te d a op in iã o p ú -b lica . O s ve re a d ore s re a g e m a e ssa s si-tu a çõe s e m p re e n d e n d o cole tiva m e n te u m a “ d e fe sa in stitu cion a l” d a C â m a ra , com o in tu ito d e re força r se u p re stíg io visa n d o in cre m e n ta r se u p ote n cia l d e troca ta n to com o Exe cu tivo com o com a p op u la çã o. Um a sp e cto e sse n cia l d e s-se m ovim e n to é a te n ta tiva d e “ e le va r o statu s p olítico d o p a rla m e n to ca rioca n a e stru tu ra d e d istrib u içã o d e p od e r e p re stíg io n a cion a l” (:78), re ivin d ica n d o a h e ra n ça cu ltu ra l e h istórica d a cid a -d e , su a “ ca p ita li-d a -d e ” .

Escrito e m cola b ora çã o com G ilb e r-to Ve lh o, o ca p ítu lo 5 d ista n cia -se d o r-tom e tn og rá fico d o re sta n te d o livro p a ra si-tu a r a fig u ra d os ve re a d ore s n o m a rco m a is a m p lo d o p rob le m a d a “ m u ltip li-cid a d e e d e scon tin u id a d e e n tre d om í-n ios e p rovíí-n cia s d e sig í-n ifica d o” (:83) q u e ca ra cte riza a s socie d a d e s com p le -xa s. N e sta s, a d q u ire u m a im p ortâ n cia ca p ita l o “ p ote n cia l d e m e ta m orfose ” d os in d ivíd u os, su a ca p a cid a d e p a ra a lte ra r su a s a tivid a d e s e su a p róp ria a -p re se n ta çã o d o se lf d e m od o a tra n sita r p or e ssa s p rovín cia s d e sig n ifica d o. Es-se tip o d e tra je tória p ossib ilita a a lg u n s in d ivíd u os a tu a r com o m e d ia d ore s e n -tre ca te g oria s socia is, d om ín ios e n íve is d e cu ltu ra . Ta l se ria o ca so d os ve re a d o-re s e , d e m od o m a is g e ra l, d os p olíticos, q u e n ã o a p e n a s in te rp re ta m e tra d u

-ze m a s lóg ica s d os d ive rsos u n ive rsos socia is com a s q u a is e n tra m e m con ta to com o re a liza m u m tra b a lh o d e b ricola -g e m , cria n d o n ova s re a lid a d e s a p a rtir d e se u trâ n sito p or a q u e le s u n ive rsos d ísp a re s. O p olítico se ria , e m ú ltim a in s-tâ n cia , u m “ e sp e cia lista e m m u d a n ça d e p a p é is” cu ja id e n tid a d e ilu stra ria “ a s ca ra cte rística s m a is g e ra is d e u m a socie d a d e com p le xa , h e te rog ê n e a , m u l-tifa ce ta d a , e m p e rm a n e n te p roce sso d e con stru çã o” (:89).

N os ú ltim os trin ta a n os, a a n trop o-log ia socia l e / ou cu ltu ra l te n d e u m a ci-ça m e n te a u m h e rm é tico a cú m u lo d e con ce itos ca d a ve z m a is ob scu ros e d e u tilid a d e cre sce n te m e n te d u vid osa . Es-sa fe b ril cria tivid a d e te órica p a re ce te r-se tra n sform a d o e m u m fim e m si m e s-m o, q u içá cos-m o p rod u to d a s cre sce n te s p re ssõe s e m fa vor d a d ife re n cia çã o sim b ólica re q u e rid a p e la con corrê n cia in -tra -a ca d ê m ica . Esq u e ce u -se , d e ssa for-m a , q u e os con ce itos ca re ce for-m d e u for-m va lor in trín se co e q u e o a p orte d e u m a a n á lise q u a lq u e r à in te lig ib ilid a d e d os fe n ôm e n os socia is n ã o d e p e n d e ta n to d e q u a is sã o os con ce itos u sa d os q u a n to d e com o se os u sa . O tra b a lh o d e Ka -rin a Ku sch n ir te m o im e n so m é rito d e n ã o se te r e n tre g u e a e ssa la m e n tá ve l te n d ê n cia con te m p orâ n e a . Pe lo con trá -rio, com u m a a rq u ite tu ra te órica d e in sp ira çã o tra d icion a l e q u a n tita tiva m e n -te lim ita d a con se g u e d a r u m a con tri-b u içã o va liosa à a n á lise d e u m a in sti-tu içã o com p le xa e d e u m a p osiçã o p olí-tica p ou co com p re e n d id a .

(13)

n ã o te m n a d a a ve r com a s con ve n çõe s re a lista s d a e tn og ra fia clá ssica – é u m a virtu d e p ou co fre q ü e n ta d a q u e e n ri-q u e ce o tra b a lh o d e Ku sch n ir. Se ca b e la m e n ta r a lg o a re sp e ito d e se u livro é d e e la n ã o te r a p rove ita d o a oca siã o d e re e scre ve r a rtig os p a ra a cre sce n ta r m a te ria l e tn og rá fico, d e ixa n d o a ssim a lg u n s p on tos p ou co cla ros on d e , tod a -via , p a re ce e vid e n te q u e a s d ú vid a s d o le itor se d e ve m n ã o à q u a lid a d e d a a n á lise m a s à p a rcim ôn ia d o te xto. Tra ta -se , a d e m a is, d e u m b om e xe rcício e tn o-g rá fico – a o q u e e ssa re se n h a n ã o fa z ju stiça – e d e u m livro p a rticu la rm e n te re com e n d á ve l p a ra le itore s in te re ssa -d os n a a n á lise -d a s in stitu içõe s le g isla ti-va s e d os fe n ôm e n os corre n te m e n te tra ta d os sob os rótu los d e “ a ssiste n cia -lism o” , “ clie n te -lism o” e “ corru p çã o” .

LEAL, João. 2000. Et nograf ias Port u-guesas (1870-1970). Cultura Popular e Ident idade Nacional.Lisboa: Publica-ções Dom Quixote. 274 pp.

Lorenzo M acagno Pe sq u isa d or, C EBRAP

Etn og rafias Portu g u e sas p rocu ra m os-tra r q u e a a n trop olog ia p ortu g u e sa se ca ra cte rizou , e n tre 1870 e 1970, p or u m d iscu rso com p rom e tid o com a e la b ora -çã o d e u m m od e lo e tn og e n e a lóg ico d a id e n tid a d e n a cion a l e , p orta n to, com a con stru çã o d e u m a com u n id a d e d e d e s-ce n d ê n cia com q u a lid a d e s e sp e cífica s. A p a rtir d e sta p re m issa , J oã o Le a l te n -ta d a r con -ta d e u m a sé rie d e con trib u i-çõe s q u e fize ra m d a cu ltu ra p op u la r d e m a triz ru ra l u m te m a ce n tra l d a e tn o-g ra fia e d a a n trop oloo-g ia e m se u p a ís. Ta l ce n tra lid a d e te ria a lim e n ta d o u m con ju n to d e re fle xõe s e m torn o d a id e n -tid a d e n a cion a l. O títu lo d a p rim e ira

p a rte é , n e sse se n tid o, b a sta n te e xp líci-to: “ À p rocu ra d o p ovo p ortu g u ê s” .

Pa ra a te n u a r os e fe itos p rovoca d os p e lo te rm o an trop olog ia p ortu g u e sa (u sa d o n o sin g u la r com o su b sta n tivo e a d je tivo, re sp e ctiva m e n te ), a a b ord a -g e m é se n síve l a u m e n foq u e d iscip lin a r a m p lo. Isto sig lin ifica q u e ta is re fle -xõe s sob re a n a cion a lid a d e p ortu g u e sa n ã o te ria m corre sp on d id o som e n te à a n trop olog ia , m a s sob re tu d o a ou tros d iscu rsos q u e J oã o Le a l p re fe re d e n o-m in a r e tn og rafias e sp on tân e as.

(14)

con ce p çã o h istoricista d a cu ltu ra p op u la r. Por isso, o ca m p on ê s é visto, sob re -tu d o n a con ce p çã o d e Roch a Pe ixoto, com o u m a e sp é cie d e p rim itiv o m od e r-n o. J á r-n o te rce iro p e ríod o, q u e va i d e 1910 a 1920, a cu ltu ra p a ssa a se r vista com o sin ôn im o d e a rte p op u la r, com -p re e n d e n d o u m con ju n to d e ob je tos (a ola ria , o tra je tra d icion a l, a ca sa ) q u e d e ve m , a n te s d e tu d o, se r vistos e a p re -cia d os. A e tn og ra fia tra n sform a -se , li-te ra lm e n li-te , e m “ e tn og ra fia a rtística ” , e xp re ssã o q u e , se g u n d o J oã o Le a l, e ra com u m n os te xtos d a é p oca . Aq u e la p rim e ira p re ocu p a çã o com o te xtu a l ce d e lu g a r a u m a con ce p çã o e m in e n te -m e n te visu a l d a cu ltu ra p op u la r. O q u a rto p e ríod o se d e se n volve d a d é ca -d a -d e 30 a té os a n os 70, coin ci-d in -d o com o Esta d o N ovo e m Portu g a l, e se ca ra cte riza p or u m a d ive rsid a d e m a ior d e a tore s, q u e o a u tor d istrib u i e m trê s g ru p os: u m g ru p o con stitu íd o p e los e t-n óg ra fos m a is lig a d os a o Esta d o N ovo, cu ja p olítica te ria re se rva d o u m lu g a r e xtre m a m e n te im p orta n te a o folclore ; ou tro g ru p o vin cu la d o a J org e Dia s, q u e se ria se m d ú vid a a fig u ra ce n tra l d a a n trop olog ia p ortu g u e sa n e sse s a n os; e u m te rce iro com p osto p or u m con ju n to d e in te le ctu a is vin cu la d os d e form a m e n os siste m á tica à e tn og ra fia e à a n trop olog ia . C om form a çõe s m u ito va ria d a s (a rtista s, a rq u ite tos, m ú sicos) e com p osicion a m e n tos p olíticos re la ti-va m e n te d ive rsifica d os, e ste ú ltim o g ru p o p rocu rou , se g u n d o J oã o Le a l, con stru ir u m con tra d iscu rso e m fa ce d o d iscu rso e tn og rá fico d o Esta d o N ovo.

O ca p ítu lo 2 e xp lora os a rg u m e n tos q u e con ce d e ra m a os lu sita n os u m lu -g a r p rivile -g ia d o n a lista e tn o-g e n e a ló-g ica d a n a çã o p ortu ló-g u e sa . Um d os p rota g on isrota s e m le va r a d ia n te a s te se s lu -sita n ista s foi o a rq u e ólog o J oa q u im Sa r-m e n to q u e , e n tre 1876 e 1879, p roce d e u a u m a a u tê n tica e xu m a çã o d os lu sita

-n os com o a -n te p a ssa d os é t-n icos d e Por-tu g a l. N o e n ta n to, com o te m p o, o e x-clu sivism o d a s te se s lu sita n ista s foi p e rd e n rd o força , sob re tu rd o p or m e io rd o tra -b a lh o d e J org e Dia s, q u e va loriza ca d a ve z m a is u m p lu ra lism o e tn og e n e a lóg ico icom o m od e lo e xp lica tivo d a sin g u -la rid a d e p ortu g u e sa . Isto d e ixa , se m d ú vid a , u m a p orta a b e rta p a ra su a p os-te rior a d e sã o a o lu so-trop ica lism o.

O ca p ítu lo 3, e n ce rra n d o a p rim e ira p a rte d o livro, a n a lisa a lg u n s e n sa ios q u e se e m p e n h a ra m n a b u sca d e u m a su p osta p sicolog ia é tn ica p a ra o im a g i-n á rio i-n a cioi-n a l p ortu g u ê s. N e ssa s d iscu s-sõe s a p a re ce o te m a q u a se on ip re se n te d a d e ca d ê n cia n a cion a l. Assim , Ad olfo C oe lh o (1847-1919), p re ocu p a d o com os fa tore s d e d e g e n e re scê n cia d o p ovo p ortu g u ê s, su ste n ta va q u e ta l d e ca d ê n -cia e ra u m a e sp é cie d e d oe n ça é tn ica d e Portu g a l. Esta visã o se rá re tom a d a p or Roch a Pe ixoto, sob re tu d o e m se u e n sa io p ion e iro O Cru e l e Triste Fad o (1897), cu ja ca ra cte riza çã o n e g a tiva d a a lm a n a cion a l ch e g a a o p on to e xtre m o. Um d os te m a s e stru tu ra n te s d o ca -rá te r n a cion a l p ortu g u ê s te ria sid o in a u g u ra d o, com ê xito, p or Te ixe ira d e Pa scoa e s. Tra ta se d o q u e J oã o Le a l d e fin e com o a in v e n ção d a sau d ad e . Se n -d o p oe ta , e scritor e e n sa ísta , o sa u -d o-sism o, con ce b id o d e ssa ve z com o u m m ovim e n to lite rá rio e sp e cífico, e n con -tra rá e co e m a lg u m a s d e riva çõe s d a e t-n og ra fia p ortu g u e sa , p or m e io d e u m con ju n to d e e stu d os sob re a lite ra tu ra p op u la r e n tre 1910 e 1920. Essa s a n á li-se s sã o o p re lú d io p a ra q u e , n a d é ca d a d e 50 (q u a n d o os e stu d os sob re o ca rá -te r n a cion a l já e sta va m n a a g e n d a d e tra b a lh o d a a n trop olog ia n orte -a m e rca n a ), J org e Dia s re a lize su a con trib u i-çã o m a is siste m á tica e in flu e n te sob re o a ssu n to.

(15)

cu ltu ra is e m torn o d a a rq u ite tu ra p op u -la r” . É ce n tra d o n o p rota g on ism o d e Ra u l Lin o com o im p u lsion a d or d o M ov im e n to d a Casa Portu g u e sa e , p orta n to, com o form u la d or d e u m tip o p ortu -g u ê s d e h a b ita çã o p op u la r q u e te ria con trib u íd o p a ra o p roce sso d e re fu n -d a çã o -d a n a cion a li-d a -d e . Esse m ovi-m e n to se e n volve u e ovi-m u ovi-m a re cicla g e ovi-m e ru d ita e e ste tiza n te d e a lg u n s com p o-n e o-n te s d a cu ltu ra p op u la r ru ra l.

O ca p ítu lo 5 d e scre ve com o, n os a n os 30, o M ov im e n to d a Casa Portu -g u e sa foi con te sta d o e q u e stion a d o p or u m g ru p o d e “ e tn óg ra fos e sp on tâ n e os” : tra ta va -se d os e n g e n h e iros d o In stitu to Su p e rior d e Ag ron om ia q u e , n a q u e la é p oca , re a liza ra m u m a m p lo In q u é rito à H ab itação Ru ral, cu ja m e tod olog ia ce n tra l con sistia e m e sta d a s p e riód ica s n o ca m p o: “ O b se rva d a p e los e n g e n h e i-ros a g rôn om os, a ca sa p op u la r d e ixa d e se r a n a lisa d a a tra vé s d e q u a lid a d e s co-m o a b e le za , a h a rco-m on ia d a coco-m p osi-çã o, o vice jo d a cor, p a ra p a ssa r a se r vista a p a rtir d e ca te g oria s com o a m i-sé ria , a su jid a d e , a fa lta d e con d içõe s h ig iê n ica s, o ch e iro n a u se a b u n d o, e tc.” (:163). Por con ta d e ssa s d iscu ssõe s, o a rg u m e n to d e J oã o Le a l e voca p rob le m á tica s m a is a m p la s, cu ja s coord e n a -d a s oscila m e n tre -d ois e xtre m os: -d e u m la d o, a s te n ta çõe s cu ltu ra lista s (a m p a ra d a s, m u ita s ve ze s, e m u m a fa scin a çã o e ste tiza n te ); d e ou tro, os a p e los in -te rve n cion ista s sob a b oa con sciê n cia d e u m a e sp é cie d e re form ism o socia l. Em ú ltim a in stâ n cia , p od e m se r lid os a q u i, q u a se n a s e n tre lin h a s, os d e sa fios se m p re re corre n te s e m torn o d o p a r cu ltu ra / d e se n volvim e n to.

N o ca p ítu lo 6, J oã o Le a l d e té m -se e m ou tro g ru p o d e “ e tn óg ra fos e sp on tâ n e os” . Tra ta se , d e sta ve z, d e u m g ru p o d e a rq u ite tos q u e d e p ois d e re a liza re m su ce ssiva s via g e n s p e lo in te rior ru -ra l re d ig iu o In q u é rito à A rq u ite tu -ra

Pop u lar e m Portu g al. O In q u é rito b u s-ca ir u m p ou co a lé m d a s crítis-ca s re for-m ista s d os e n g e n h e iros a g rôn ofor-m os. Bu sca -se a g ora fa ze r u m a le itu ra d a a r-q u ite tu ra p op u la r sob o p rism a d o m o-d e rn ism o, ca o-d a ve z m a is o-d ivu lg a o-d o n a Eu rop a d os a n os 50. Esse g ru p o d e a r-q u ite tos e vid e n cia , a lé m d isso, u m a cre sce n te se n sib ilid a d e e tn og rá fica p a -ra re con h e ce r a m u ltip licid a d e d a s e x-p re ssõe s d a a rq u ite tu ra a o lon g o d e to-d o o p a ís. Em su a q u a lito-d a to-d e to-d e críticos d o m od e lo u n itá rio d a “ ca sa p ortu g u e sa ” , o a u tor coloca os a rq u ite tos d o In -q u é rito n a m e sm a sin ton ia d a s con tri-b u içõe s e tn og rá fica s d e Ve ig a d e O li-ve ira , a n a lisa d a s n o ca p ítu lo 7.

O livro te rm in a com u m in stig a n te e n sa io, in sp ira d o e m J a m e s Fe rn a n d e z, sob re a s n a rra tiva s d a id e n tid a d e p ro-vin cia l (q u e com p õe a te rce ira e ú ltim a p a rte d o livro: “ N a çã o e re g iã o: ré p li-ca s, a p rop ria çõe s, re sistê n cia s” ). J oã o Le a l tom a o ca so d os Açore s, cu ja sin -g u la rid a d e (a trib u íve l, e n tre ou tra s coi-sa s, a se u ca rá te r in su la r) op e ra e m tor-n o d o se g u itor-n te d ile m a : sã o os Açore s u m a e sp é cie d e Portu g a l d ife re n te ou , p e lo con trá rio, con stitu e m u m Portu g a l e m e sca la re d u zid a e , p orta n to, u m m o-d e lo io-d e n titá rio a se r se g u io-d o p a ra a “ g ra n d e p á tria ” p ortu g u e sa ?

(16)

a n trop olog ia p ortu g u e sa p od e ria se r d e p ositá ria ta m b é m d e u m a in fin id a d e d e “ e tn óg ra fos e sp on tâ n e os” , d isse m i-n a d os p or tod o o u ltra m a r p ortu g u ê s. Este u ltra m a r cob ria u m e sp a ço tra n s-con tin e n ta l q u e , n o im a g in á rio n a cio-n a lista d o Esta d o N ovo (e cio-n a s p róp ria s le is), foi re p re se n ta d o com o u m a sim p le s e xte n sã o te rritoria l (e m u ita s ve -ze s cu ltu ra l) d e Portu g a l. Sob ta l d e sce n tra m e n to, se ria p ossíve l ta m b é m re -d ire cion a r a p róp ria -d iscu ssã o e m torn o d a id e n tid a d e n a cion a l, a q u a l m u ita s ve ze s se n u triu d e ssa a la rd e a d a voca -çã o u ltra m a rin a . O p róp rio J org e Dia s, q u e com e çou fa ze n d o tra b a lh o d e ca m -p o n o n orte d e Portu g a l e a ca b ou n o n orte d e M oça m b iq u e , viu se ob rig a -d o, e m virtu -d e -d e se u itin e rá rio e tn o-g rá fico, a re fle tir e m u m tom lu sotrop i-ca lista sob re os su p ostos b e n e fícios d e u m a id e n tid a d e p ortu g u e sa d e ste rrito-ria liza d a e p lu ra l.

N o m a is, o tra b a lh o d e J oã o Le a l con stitu i, se m d ú vid a , u m e sforço a n a -lítico q u e n os a d ve rte a tod o m om e n to sob re o ca rá te r p a rcia l e in stá ve l d os e m p re e n d im e n tos id e n titá rios. C om e -fe ito, a tra vé s d os p orta -voze s d o “ p o-vo” e d a “ cu ltu ra p op u la r” , é p ossíve l vislu m b ra r q u e a id e n tid a d e n a cion a l é p rod u to d e u m ca m p o d e d isp u ta s se m -p re e m m ovim e n to.

LOM NITZ, Claudio (org.). 2000. Vicios Públicos, Virt udes Privadas: La Cor-rupción en M éxico. M éxico: CIESAS/ M iguel Angel Porrua. 294 pp.

M arcos Otavio Bezerra

Profe ssor, De p a rta m e n to d e Sociolog ia d a UFF Ao a ssu m ir a p re sid ê n cia d o M é xico, Vice n te Fox e sta b e le ce u com o u m a d a s p rin cip a is p riorid a d e s d e su a a d m in

tra çã o o com b a te à corru p çã o. Su a d is-p osiçã o is-p a ra e n fre n ta r a q u e stã o e a n e ce ssid a d e , a o m e sm o te m p o, d e ofe -re ce r u m a -re sp osta à s e xp e cta tiva s d a p op u la çã o q u a n to à s fre q ü e n te s d e -n ú -n cia s d e irre g u la rid a d e s -n a a d m i-n istra çã o p ú b lica con d u zira m o p re sid e n -te a a n u n cia r n o p rim e iro d ia d e se u g ove rn o a im p le m e n ta çã o d e u m p rog ra -m a a n ticorru p çã o. Estu d os in te rn a cion a is p re ocu p a d os e m q u a cion tifica r o va lor d os re cu rsos p ú b licos d e svia d os p a -ra a corru p çã o n o M é xico e stim a m q u e e ste corre sp on d a a a p roxim a d a m e n te 15% d o tota l d os im p ostos (fe d e ra is, e s-ta d u a is e m u n icip a is) re colh id os a n u a l-m e n te . Tra ta -se d e a lg o a cil-m a d e US$ 30 b ilh õe s q u e d e ixa m d e re torn a r p a ra a p op u la çã o sob a form a d e in ve sti-m e n tos e p rog ra sti-m a s p ú b licos. O livro org a n iza d o p or C la u d io Lom n itz, d o C e n tro d e Estu d os La tin o-Am e rica n os d a Un ive rsid a d e d e C h ica g o, con stitu i, p or u m la d o, u m a im p orta n te con trib u i-çã o p a ra o e n te n d im e n to d a s ra zõe s p e la s q u a is o com b a te à corru p çã o é a p re se n ta d o com o u m a d a s p rin cip a is p olítica s p ú b lica s n o M é xico e , p or ou -tro, ofe re ce u m con ju n to d e e stu d os ú te is p a ra in te g ra r u m a a n á lise com p a -ra tiva d o fe n ôm e n o.

(17)

“ C orru p çã o e Form a çã o d e C la sse s So-cia is n o Sé cu lo XX” e “ C orru p çã o, Ri-tu a l Político e Sa cra liza çã o d o Esta d o” . A ca d a u m a d a s p a rte s corre sp on d e re s-p e ctiva m e n te u m a q u e stã o a q u e os tra b a lh os p rop õe m ofe re ce r u m a con -trib u içã o m a is d ire ta : a tra n sform a çã o h istórica d os d iscu rsos d a corru p çã o e su a vin cu la çã o com m u d a n ça s p olíti-ca s, e con ôm iolíti-ca s e cu ltu ra is; o lu g a r d a corru p çã o a d m in istra tiva e p olítica n o p roce sso d e form a çã o d a s cla sse s socia is; a a ssosocia çã o e n tre corru p çã o e re -p re se n ta çã o -p olítica . Pe n sa d o a -p a rtir d e su a va ria çã o d e se n tid o e d ive rsid a -d e -d e form a s -d e m a n ife sta çã o, o fe n ô-m e n o d a corru p çã o é toô-m a d o, o q u e ô-m e p a re ce u m a p e rsp e ctiva fru tífe ra , com o u m p on to d e vista p a rticu la r p a ra a con stru çã o d e re fle xõe s sob re a s socie -d a -d e s n a cion a is e , e sp e cia lm e n te , n ã o ob sta n te a ca te g oria corru p çã o lh e a n te ce d e r, os p rin cíp ios d e a çã o e a s re la çõe s e sta b e le cid a s e m torn o d os Esta -d os n a cion a is.

Um d os m a iore s ob stá cu los p a ra a e la b ora çã o d e a n á lise s con siste n te s so-b re a s con d u ta s con ce so-b id a s com o cor-ru p ta s sã o a s d ificu ld a d e s e n con tra d a s p e los p e sq u isa d ore s p a ra re u n ir m a te -ria l e m p írico sob re a q u e stã o. C om o se sa b e , a s p rá tica s corru p ta s e corru p to-ra s d istin g u e m -se , p a rticu la rm e n te , p or su a in visib ilid a d e socia l, a té o m om e n to e m q u e a p a re ce m sob a form a d e d e -n ú -n cia s p ú b lica s. Essa d ificu ld a d e é con torn a d a p e los a u tore s a tra vé s d a u tiliza çã o d e m a te ria is d ive rsos e d a m ob iliza çã o d e e stra té g ia s d e a n á lise cria tiva s sob re o fe n ôm e n o. Assim , a corru p çã o é con stru íd a com o ob je to a p a rtir, p or e xe m p lo, d e p roce ssos in q u i-sitoria is e ju ríd icos d o p e ríod o colon ia l, d e ca rta s d e re lig iosos e fu n cion á rios d a a d m in istra çã o colon ia l, d e d e n ú n -cia s d e im p re n sa , d e ob se rva çã o d ire ta , e n tre vista s, e stu d os d e ca so, d o e xa m e

d e tra je tória s p olítica s e e m p re sa ria is e ritu a is p olíticos.

O e xa m e d e sse m a te ria l é e fe tu a d o d e m od o q u e a q u ilo q u e se te m p or cor-ru p çã o e m ca d a m om e n to e situ a çã o é in scrito n o u n ive rso d e re p re se n ta çõe s e p rá tica s socia is rotin e ira s. Essa p re o-cu p a çã o p a u ta a m a ioria d os a rtig os, e a a p re e n sã o d o fe n ôm e n o d a corru p çã o a p a rtir d e ssa p e rsp e ctiva con stitu i o p on to forte d a cole tâ n e a . Assim , p od e -m os a co-m p a n h a r n os a rtig os co-m o a corru p çã o se con e cta com d ife re n te s d im e n sõe s e a tivid a d e s d a socie d a d e m e xica n a . Pa ra n ã o ir a lé m d e a lg u n s e xe m p los p od e -se re m e te r a o m od o co-m o e la se a ssocia à co-m ora l re lig iosa , à s a çõe s ju ríd ica s, a o cre scim e n to e e x-p a n sã o d e a tivid a d e s fin a n ce ira s (com o b a n cos) e e m p re sa ria is, a o siste m a e a çõe s p olíticos e à s a tivid a d e s lú d ica s (com o a s fe sta s loca is). Em tod os e sse s ca sos, a corru p çã o n ã o é d e scrita com o a lg o q u e e stá à m a rg e m d a s a tivid a d e s ou in stitu içõe s; a o con trá rio, o q u e é re s-sa lta d o é o m od o com o e sta s e a s p rá tica s corru p ta s se fom e n ta m m u tu a m e n -te . A im a g e m q u e su rg e d a s d e scriçõe s é a d a e xistê n cia d e u m con ju n to d e re -d e s p e ssoa is (con stitu í-d a s p or re la çõe s fu n d a d a s e m m ú ltip los in te re sse s) q u e vin cu la m órg ã os e p rog ra m a s p ú b licos a d ife re n te s se tore s e g ru p os socia is. A e ste s ú ltim os, e ssa s lig a çõe s p rop orcio-n a m , e orcio-n tre ou tros a sp e ctos, a orcio-n ã o a p li-ca çã o ou a p lili-ca çã o e m con d içõe s fa vo-rá ve is d os re g u la m e n tos e sta ta is e a u tiliza çã o e a p rop ria çã o p riva d a d e re -cu rsos p ú b licos (sim b ólicos e m a te ria is). Assim , o q u e se d e sig n a com o corru p çã o su rg e cla ra m e n te com o u m a re la -çã o socia l cu ja in te rp re ta -çã o se a sse n ta e m e le m e n tos h istóricos e cu ltu ra is.

(18)

(“ C on trol d e la Ig le sia y Tra n sg re sion e s Ecle siá stica s d u ra n te e l Pe riod o C olo-n ia l” ) coolo-n trib u i p a ra a d iscu ssã o sob re a d im e n sã o h istórica d a n oçã o d e cor-ru p çã o a o e stu d a r p roce ssos d e tra n s-g re ssõe s d e ca rá te r civil e re lis-g ioso co-m e tid a s p or co-m in istros e a u xilia re s d a Ig re ja n os sé cu los XVII e XVIII. L. Arn old (“ Socie d a d C orp ora tiva , C orru p -ción C orp ora tiva : La Re siste n cia a la Su b ord in a ción y a l Ab u so d e Pod e r” ) e xa m in a a u tiliza çã o d o “ re cu rso d e fu e rza ” , u m d isp ositivo ju ríd ico, com o m e io d e p rote çã o a a b u sos d e p od e r n o p e ríod o colon ia l. E. Se m o (“ De la C olon ia a la Iolon d e p e olon d e olon cia : La Líolon e a Im a -g in a ria e n tre lo Pú b lico y lo Priva d o” ) d iscu te com o a cob ra n ça e com e rcia li-za çã o d e u m im p osto p ú b lico (“ d ie z-m o” ) p or p a rte d o Esta d o, Ig re ja e olg a rq u ia s loca is a b re m ú ltip la s p ossib i-lid a d e s d e fra u d e e corru p çã o. F. Ka tz (“ La C orru p ción y la Re volu ción M e xica n a ” ), a p a rtir d o e stu d o d a s vá ria s fa -se s d a Re volu çã o M e xica n a , e xa m in a a q u e stã o d a p e rce p çã o d a corru p çã o e su g e re q u e o g ra u e m q u e os líd e re s cu m p ria m su a s p rom e ssa s e o se u e n ri-q u e cim e n to p e ssoa l e ra m e le m e n tos im p orta n te s n o ju lg a m e n to d e su a s con -d u ta s fe ito p e los re volu cion á rios e a so-cie d a d e . G . d e la Pe ñ a (“ C orru p ción e In form a lid a d ” ) e xa m in a , n o con te xto u rb a n o con te m p orâ n e o d e G u a d a la ja -ra , a s a çõe s d e q u a tro tip os d e a tore s e con ôm icos e m situ a çõe s d e in form a li-d a li-d e e su a s con e xõe s com a g e n te s g o-ve rn a m e n ta is e p olíticos q u e , e m troca d o a frou xa m e n to n a a p lica çã o d a s n orm a s oficia is, lh e s a sse g u ra orm g a n h os p e -cu n iá rios. D. N u g e n t (“ La C orru p ción a Ba jo N ive l: La s Za n ja s y la Su ce sión d e u m Pu e sto Político” ) a n a lisa a a sce n sã o e q u e d a d e u m p olítico m u n icip a l p re so à s e n g re n a g e n s d o p a rtid o g ove rn a n te e visto p e la p op u la çã o com o e n volvid o e m irre g u la rid a d e s n a e la b ora çã o d e

(19)

xis-tê n cia d e g ra n d e s te m a s ou e sp e ra n ça s p a ra os p olíticos, isto é , p a ra d a r u m n ovo se n tid o m ora l à p olítica .

Se a a n á lise d a corru p çã o a p a rtir d e su a in scriçã o n a s re p re se n ta çõe s e p rá tica s cotid ia n a s d a s e n tid a d e s e in stitu içõe s p ú b lica s e p riva d a s é re sp on -sá ve l p e la s con trib u içõe s m a is sig n ifi-ca tiva s d os te xtos, e ssa m a ior a te n çã o con fe rid a a os fe n ôm e n os a os q u a is a corru p çã o e stá re la cion a d a a ca b a , p or su a ve z, se n d o ta m b é m re sp on sá ve l p e los lim ite s d e a lg u n s a rtig os. O q u e m e p a re ce ocorre r é u m a e sp é cie d e d e se q u ilíb rio d a a n á lise e m fa vor d os fe n ôm e n os tid os com o n e ce ssá rios a o e n te n d im e n to d a corru p çã o – com o a u tiliza çã o d o “ re cu rso d e fu e rza ” , o e xa -m e d a Re volu çã o M e xica n a ou a con s-tru çã o d e e sp a ços p ú b licos e ritu a is –, fa ze n d o com q u e e sta ú ltim a se ja in clu íd a n a d iscu ssã o d e form a se cu n d á -ria . Se n te -se fa lta n e sse s ca sos d e u m a a rticu la çã o m a is siste m á tica e n tre os a sp e ctos e xa m in a d os a o lon g o d os te x-tos e o fe n ôm e n o d a corru p çã o.

N o M é xico, com o n o Bra sil, à ce n -tra lid a d e d o fe n ôm e n o d a corru p çã o n a socie d a d e e n os d iscu rsos p ú b licos n ã o corre sp on d e u m in te re sse d os cie n tis-ta s socia is p e lo te m a . As ra zõe s q u e fu n d a m e ssa e sp é cie d e silê n cio – q u e com e ça a se r rom p id o e m fu n çã o so-b re tu d o d e p re ocu p a çõe s e q u e stõe s con d icion a d a s p e los in te re sse s d e a g ê n -cia s e e n tid a d e s in te rn a cion a is (O N U, Ba n co M u n d ia l e G -7) – a in d a e stã o p or se r e xp lica d a s e n ã o se re su m e m , ce rta m e n te , a o p rob le m a d e a ce sso a o m a -te ria l e m p írico. N e sse con -te xto, os a rti-g os re u n id os n o livro con siste m e m u m a lou vá ve l con trib u içã o p a ra a in tro-d u çã o tro-d e u m p on to tro-d e vista m a is tro-d is-ta n cia d o e a n a lítico e m u m u n ive rso d e d e b a te s e m q u e p re d om in a m os d iscu r-sos jorn a lísticos e a s tom a d a s d e p osi-çõe s p olítica s.

M ARGARIDO, Alf redo. 2000. A Luso-f onia e os LusóLuso-f onos: Novos M it os Port ugueses.Lisboa: Edições Univer-sitárias Lusófonas. 89 pp.

Igor José de Renó M achado Dou tora n d o, Un ica m p

O livro A Lu sofon ia e os Lu sófon os é u m lib e lo con tra u m a form a h e g e m ôn ica d o p e n sa m e n to socia l p ortu g u ê s, re -p re se n ta d a -p or in te le ctu a is, colu n ista s d e im p orta n te s jorn a is e in te le ctu a is or-g â n icos d o p a rtid o d o or-g ove rn o (o PS) e d o le q u e p olítico q u e se e ste n d e a té a e xtre m a d ire ita . Sob u m a iron ia re fin a -d a e u m a cru e za á ci-d a , M a rg a ri-d o p õe à m ostra a s e n tra n h a s n a d a g loriosa s d e ssa form a d e p e n sa m e n to q u e d om i-n a a C om u i-n id a d e d os Povos d e Líi-n g u a Portu g u e sa (C PLP) e a d ip lom a cia p or-tu g u e sa e q u e , e m b ora ig n ora d a n o Bra sil (com o, a d e m a is, o p róp rio Portu -g a l), é in sid iosa e e fe tiva n a re la çã o d e Portu g a l com os p a íse s a frica n os q u e se livra ra m d o ju g o p ortu g u ê s a p ós sa n -g re n ta s -g u e rra s colon ia is. É in sid iosa ta m b é m n a org a n iza çã o in te rn a d a im i-g ra çã o p a ra Portu i-g a l q u e , d e a cord o com a s re g ra s d a Un iã o Eu rop é ia , fe -ch a a s p orta s a os im ig ra n te s d a s e x-co-lôn ia s. N e sse se n tid o, a lu sofon ia a fe ta d ire ta m e n te a vid a d os ce rca d e 50 m il b ra sile iros im ig ra n te s e m Portu g a l, se con ta rm os a p e n a s os n ú m e ros oficia is.

Referências

Documentos relacionados

Não se trata nem de imitação (se fosse o caso, o uso maciço de tabaco pelos Ikpeng bem como o uso difundido de drogas psicotrópicas entre outros povos amazô- nicos inibiriam, mais

Munich: Piper

No caso dos descendentes da nobreza, a mobilização não é explicitada, e as tentativas de realizá-la só se fazem em caráter privado; a ANF, que obteve o reconhecimento oficial de

Princeton: Princeton University

Abre-se aqui o estudo das modalidades das transações como fenômeno ao mesmo tempo cultural, social e econômico: a questão desemboca em uma etnografia das práticas comerciais,

Against Race — Imagining Political Culture beyond the Color Line.. Cambridge: Harvard University

A comparação com o Brasil, nesse caso, impõe-se pela dife- rença: afora um interesse acadêmico passageiro no “freudo-marxismo” contemporâneo ao fenômeno homólogo na

Este texto foi apresentado no simpósio “Anthropology in Print, the Transformation of Scholarly Publications” realizado na 100 a Reunião da American Anthropological Asso-