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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. Raquel Coelho Dal Rio Silveira

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Raquel Coelho Dal Rio Silveira

O Direito Eleitoral no Brasil: análise crítica e alternativas para seu aprimoramento

Mestrado em Direito

São Paulo 2018

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Raquel Coelho Dal Rio Silveira

O Direito Eleitoral no Brasil: análise crítica e alternativas para seu aprimoramento

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito Constitucional, sob a orientação do Prof. Dr. André Ramos Tavares.

São Paulo 2018

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Sistema para Geração Automática de Ficha Catalográfica para Teses e Dissertações com dados fornecidos pelo autor

S587d

Silveira, Raquel Coelho Dal Rio

O direito eleitoral no Brasil: análise crítica e alternativas para seu aprimoramento / Raquel Coelho Dal Rio Silveira. -- São Paulo: [s.n.], 2018.

148p ; 30 cm.

Orientador: André Ramos Tavares.

Dissertação (Mestrado em Direito) -- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito, 2018.

1. Direito eleitoral. 2. Financiamento de campanha eleitoral. 3. Justiça Eleitoral. 4. Política. I. Tavares, André Ramos. II. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito. III. Título

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Banca Examinadora

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_______________________________________________

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À minha família de origem, meus pais Pedro (in memoriam) e Maria Luiza, e minha irmã, Ana Cristina, a quem tudo devo.

À família que constituí, ao lado de Fernando e nossos filhos, Laura e Tiago, com todo amor, pelo apoio e paciência incondicionais.

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AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, Prof. Dr. André Ramos Tavares, pelos ensinamentos transmitidos e por me proporcionar oportunidades que contribuíram para minha formação, aprendizado e realização desta dissertação.

Ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que, através do Programa de Estímulo e Aperfeiçoamento de Magistrados, autorizou-me a cursar o Mestrado em Direito na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

À Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), pelo convênio realizado com a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, permitindo aos juízes federais o aprimoramento de sua formação.

À bibliotecária e exímia servidora da Justiça Federal em Campinas, Elaine de Aquino Cardoso Silva, pelo auxílio imprescindível na localização de inúmeras obras consultadas para elaboração deste trabalho e na revisão relativa às normas da ABNT.

Aos colegas e servidores da 1a Vara Gabinete do Juizado Especial Federal de Campinas, pelo apoio e compreensão durante minhas ausências para cursar as disciplinas do Mestrado.

Aos meus amigos Luiz Augusto Castro, Márcio Bellocchi, Roberta Tarpinian, Ronaldo Francisco e Viviane Formigosa, por tornarem minhas manhãs de aula mais divertidas, pela amizade surgida nos corredores da PUC, pelo apoio e incentivo.

À Didi Arruda Alvim, pelas preciosas dicas e, literalmente, pela acolhida em São Paulo.

À minha mãe, Profa. Maria Luiza, pela revisão do texto, e por ser a minha grande referência e meu porto seguro, sempre ao meu lado, ajudando-me em absolutamente tudo.

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"Saber não basta, devemos aplicar. Desejar não basta, devemos fazer". Johann Wolfgang von Goethe

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SUMÁRIO

RESUMO ABSTRACT

1- INTRODUÇÃO ... 10

2- DIREITO, POLÍTICA, DEMOCRACIA E ÉTICA ... 13

2.1 Direito ... 13

2.2 Política ... 20

2.3 Democracia ... 23

2.4 Ética ... 28

2.5 Relação entre Direito, Política, Democracia e Ética ... 33

3- O DIREITO ELEITORAL E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS ... 40

4- FINANCIAMENTO DE CAMPANHA ELEITORAL ... 48

4.1 Modelos de financiamento ... 48

4.2 Financiamento de campanha eleitoral no Brasil ... 51

4.2.1 A crise de governança e governabilidade no Brasil e sua relação com o financiamento de campanha eleitoral ... 59

4.3 Financiamento de campanha eleitoral em outros países democráticos ... 64

4.3.1 Europa ... 65

4.3.2 América do Norte ... 67

4.3.3 América Latina...69

4.3.4 Oriente Médio... 70

5- PARTIDOS POLÍTICOS ... 71

5.1 Origem do Poder Judiciário brasileiro ... 71

5.2 Conceito de partido político ... 74

5.3 Os partidos políticos no Brasil atual (século XXI) ... 76

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6- A JUSTIÇA ELEITORAL: SUA NATUREZA E COMPETÊNCIA PARA SEU

EXERCÍCIO ... 87

6.1 Poder Judiciário brasileiro: um breve panorama histórico ... 87

6.2 A Justiça Federal ... 89

6.3 A Justiça Eleitoral ... 91

6.4 Competência para exercício das funções eleitorais ... 95

7- PROPOSTAS PARA APRIMORAMENTO DO DIREITO ELEITORAL ... 100

7.1 Democracia intrapartidária ... 103

7.2 Financiamento público ... 106

7.3 Redução da fragmentação partidária ... 114

7.4 Reestruturação da justiça eleitoral ... 118

8- CONCLUSÃO ... 123

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 127

ANEXOS ... 140

Anexo 1 - Constituição Política do Império do Brasil, de 1824 (excerto) ... 140

Anexo 2 - Lei de 15 de outubro de 1827 ... 141

Anexo 3 - Lei de 29 de novembro de 1832 (excerto) ... 144

Anexo 4 - Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 1934 (excerto) ... 148

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RESUMO

O presente trabalho parte dos conceitos de Direito, Política, Democracia e Ética e da relação existente entre eles. Faz-se uma análise crítica de alguns dos institutos do Direito Eleitoral, objetivando demonstrar como o modelo de financiamento de campanha eleitoral no Brasil interfere na governabilidade e governança do país, gerando corrupção, crise de representatividade e, em última análise, comprometendo a implementação de políticas públicas e o ideal democrático. Outrossim, apesar da previsão constitucional do pluripartidarismo político, comprova-se que a existência de um número excessivo de partidos e a ausência de democracia intrapartidária, tal como se verificam hoje, têm-se mostrado nocivas. A Justiça Eleitoral, por seu turno, da forma como está estruturada, também merece críticas. Em razão de sua natureza federal, deve ter sua competência exercida por juízes federais. Por fim, são feitas algumas sugestões, visando ao aprimoramento do Direito Eleitoral no Brasil.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Eleitoral. Política. Financiamento de campanha eleitoral. Governabilidade. Justiça Eleitoral.

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ABSTRACT

The present paper begins with the concept of law, politics, democracy and ethics and the relation between them. It does a critical analysis of some institutes of the Electoral Law, aiming to demonstrate how the model of financing of electoral campaign in Brazil interferes in the governability and governance of the country, generating corruption, crisis of representativeness and, ultimately, compromising the implementation of public policies and the democratic ideal. Also, in spite of the constitutional prediction of political parties pluralism, proves that the existence of excessive number of parties and the lack of intra-party democracy, as it happens today, has been harmful. The Electoral Court, for its part, in the way it is structured, also deserves criticism. Considering the Court’s federal nature, its jurisdiction must be exercised by federal judges. Finally, some suggestions are made, to improve the Electoral Law in Brazil.

KEY WORDS: Electoral Law. Politics. Financing of electoral campaign. Governability. Electoral Court.

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1. INTRODUÇÃO

Direitos fundamentais são pressupostos do Estado constitucional democrático e, sendo o Brasil um Estado Democrático de Direito, não há falar-se em Democracia onde não houver limites aos poderes dos governantes e onde não se garantam ou respeitem os direitos fundamentais.

Na Constituição Federal de 1988, encontram-se inseridos entre os direitos fundamentais os direitos políticos, que englobam o Direito Eleitoral.

A imprensa brasileira tem noticiado, diariamente, fatos a respeito do maior escândalo de corrupção da história do país.

Segundo a organização não governamental Transparência Internacional1, o país caiu em dezessete posições e ocupa a 96ª posição no ranking mundial da corrupção, sendo essa a pior colocação do país desde que esta lista foi criada, em 1995.

O alto custo de campanha, a personalização dos votos, a migração de legendas, a fragmentação partidária, a falta de democracia intrapartidária, coligações injustificadas, o enfraquecimento dos partidos políticos, a crise de governança e governabilidade, a situação de vulnerabilidade, inclusive, institucional, entre os três poderes, são apenas alguns aspectos da crise que se enfrenta atualmente no Brasil, exigindo-se do Estado uma postura eficiente, que permita superá-la.

Em razão dessa crise, que vem de longa data, anseia-se por uma reforma política, a qual implica mudanças no Direito Eleitoral, sendo este o foco do presente trabalho. Ciente de que se trata de um assunto demasiadamente vasto, o tema abordado nesta dissertação restringe-se à análise do modelo atual de financiamento de campanha eleitoral, da forma como estão estruturados os partidos políticos e da Justiça Eleitoral, evidenciando a necessidade de reformulação dos mesmos.

O objetivo geral deste trabalho é refletir sobre o Direito Eleitoral no Brasil. Para tanto, os objetivos específicos são demonstrar que há distorções no modelo de financiamento de campanha eleitoral, no papel desempenhado pelos partidos políticos e na forma como está estruturada a Justiça Eleitoral e apresentar propostas para o seu aprimoramento.

1 < https://www.transparency.org/news/feature/corruption_perceptions_index_2017>. Acesso em: 30 maio 2018.

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O financiamento de campanha eleitoral, tal como tem sido feito atualmente no Brasil, muitas vezes de forma irregular, interfere no jogo político pós-campanha e na capacidade gerencial do Estado, comprometendo a governabilidade e a governança, na medida em que muitos governantes, quando eleitos, já assumem os respectivos cargos “endividados” com seus financiadores, vale dizer, comprometidos em retribuir-lhes aquilo que receberam durante a campanha eleitoral, ensejando contratações irregulares ou qualquer outro tipo de favorecimento. Em outras palavras, converteu-se em fonte de corrupção.

As eleições não são financiadas da forma como deveriam, de modo que o resultado das urnas não reflete um jogo legítimo entre candidatos disputando o pleito em situação de igualdade. O debate político, nos moldes atuais, não é capaz de definir um interesse legítimo a orientar o governo na implementação de políticas públicas, havendo um completo divórcio entre o Estado e a sociedade, o que gera uma verdadeira crise de legitimidade.

Assiste-se, hoje, no país, a uma completa distorção no tocante ao papel que os partidos políticos devem desempenhar. A Constituição Federal de 1988 optou pela democracia através deles, entretanto não é o que se verifica no seu âmbito interno. Além disso, o pluripartidarismo, também consagrado na Constituição, é salutar e é o sistema mais consentâneo com o regime democrático, porém constata-se no país uma excessiva fragmentação partidária, que enfraquece e compromete a atuação dos partidos políticos, na medida em que pequenos partidos, sem qualquer representatividade, acabam fazendo de sua legenda um grande “comércio”, além de gerar um desperdício de verba pública, por receberem recursos do fundo partidário.

Nesse contexto, não se pode perder de vista o papel fundamental da Justiça Eleitoral, criada na Revolução de 1930 e com o objetivo de moralizar as eleições e evitar as práticas antidemocráticas existentes até então.

À Justiça Eleitoral cabe zelar pelas eleições, pelo respeito à vontade popular e, em última análise, tornar efetiva a democracia.

Assiste-se a uma verdadeira judicialização da política, fazendo com que o Judiciário funcione como uma segunda e inadequada instância do jogo político, vendo-se obrigado a adotar uma postura mais ativista, seja por uma ineficiência ou crise de representatividade do Legislativo, seja por uma incapacidade da sociedade de se organizar espontaneamente. Como consequência, exsurge a importância da atuação da Justiça Eleitoral, que acaba sendo mais demandada.

No tocante a quem compete seu exercício, sendo a Justiça Eleitoral federal, em primeira instância, deveriam os juízes federais exercer tal competência. Já em segunda

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instância, a Constituição Federal preserva o princípio da composição plural dos órgãos judiciais, sendo salutar a intenção do constituinte de ser heterogênea a composição dos tribunais pátrios, razão pela qual a Justiça Eleitoral, para que cumpra seu mister, também merece passar por reformas, permitindo-se, em respeito à Constituição Federal, uma maior participação da Justiça Federal na composição dos Tribunais Regionais Eleitorais.

Quanto à metodologia, será utilizado o método dedutivo. Partir-se-á de um levantamento bibliográfico a respeito do tema para, em seguida, apresentar-se um panorama geral do Direito Eleitoral no Brasil, fazendo-se uma análise crítica de alguns de seus objetos de estudo e identificando seus problemas, que comprometem a democracia, para deduzir-se a necessidade de reformas. Já, no final, serão propostas alternativas, sugestões de mudança, visando ao aprimoramento do Direito Eleitoral. Essas questões evidenciam a relevância do tema e a necessidade de um estudo mais aprofundado.

Após a presente introdução, no segundo capítulo, buscar-se-á demonstrar como Direito, Política, Democracia e Ética estão relacionados, de modo que não é possível pensar em aprimoramento do Direito Eleitoral sem que se pense conjuntamente nesses quatro institutos. No terceiro capítulo, partir-se-á da conceituação de direitos fundamentais, demonstrando estar o Direito Eleitoral inserido no âmbito dos direitos políticos, que são direitos daquela categoria.

Nos capítulos seguintes, será feita uma análise mais detalhada de três dos objetos de estudo do Direito Eleitoral: o financiamento de campanha eleitoral, os partidos políticos e a própria Justiça Eleitoral.

No capítulo sete, serão propostas algumas alternativas de mudança, para, então, finalmente, apresentarem-se as conclusões desta dissertação.

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2. DIREITO, POLÍTICA, DEMOCRACIA E ÉTICA

Antes de entrarmos no tema propriamente dito da presente dissertação, faz-se mister trazer a lume os conceitos de Direito, Política, Democracia e Ética, e demonstrar como tais institutos estão interligados, não se podendo pensar em Direito dissociado de Política, por exemplo, como já se sustentou outrora.

De se ressaltar que, na França2, até que a ciência política se tornasse disciplina autônoma, era quase toda contida no Direito.

Apesar de parecerem demasiadamente abstratos, a compreensão desses conceitos é fundamental para o desenvolvimento do presente trabalho.

Com efeito, o Estado não pode ser visto apenas do ponto de vista normativo, tampouco apenas do ponto de vista político, sociológico. Há que se buscar um equilíbrio, uma complementariedade entre Direito, Política, Democracia e Ética.

Assim, para uma análise do processo eleitoral brasileiro, bem como para que se façam algumas proposições ao final do trabalho, serão abordados, nos próximos tópicos, os institutos do Direito, da Política, da Democracia e da Ética.

2.1 Direito

“O direito é um dos fenômenos mais notáveis da vida humana. Compreendê-lo é compreender uma parte de nós mesmos” (FERRAZ JÚNIOR, 1991, p. 25).

Etimologicamente, é palavra proveniente do latim directus e significa aquilo que é reto, que segue em linha reta, que segue regras ou ordens preestabelecidas.

Como disse Santo Agostinho (1964), todo mundo sabe o que é o tempo, mas defini-lo não é tarefa fácil. O mesmo ocorre com o Direito. Muito embora todos possam ter uma ideia do que seja, defini-lo é missão árdua.

Muitos são os méritos de Hart (1968), e aqui cabe destacar o de compreender e explicar o Direito enquanto sistema normativo que se caracteriza pela relação mantida com a linguagem, coação, poder e moral. Afirma que, em nenhuma outra ciência ou disciplina, verifica-se o que acontece com o Direito quando se tenta defini-lo, já que inúmeros são os

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A primeira cátedra de Direito Constitucional foi na França, no século XIX. Até então, o Direito Constitucional era chamado de Direitos Políticos.

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conceitos e as respostas à pergunta “o que é Direito?” e, para defini-lo, é necessário traçar seus limites ou diferenciá-lo de outras coisas.

O Direito está inserido na vida social, política e econômica e, em geral, é modelado para levar a um permanente consenso. Ele estabelece os limites do possível, condicionando o que pode ser e excluindo o que não pode ser. É fundamental na formação da cultura de um povo, sendo importante ferramenta para reduzir a complexidade da vida em sociedade, evitando-se o caos. É um importante instrumento para regular o sistema social (PUGLIESI, 2009).

Mesmo que se considere o Direito uma ficção, é incontroverso que se transforma em realidade jurídica, tornando-se efetivo, uma vez presentes determinados elementos, dentre os quais o Estado, através do exercício de sua soberania e de sua atividade política.

Direito, como sinônimo de ordenamento, corresponde ao conjunto de normas de conduta e organização, que regulamenta a vida em sociedade, permitindo a convivência e a sobrevivência de um grupo social. Nesse aspecto, o que diferencia o Direito da moral, costumes, religião entre outros, é o fato de ser coativo, tornando-se, como afirmam Bobbio et al. (1992, p. 349), “o principal instrumento através do qual as forças políticas, que têm nas mãos o poder dominante em uma determinada sociedade, exercem o próprio domínio”.

O Direito representa um modelo de ordem, e a ordem que o homem persegue é a que simboliza a Justiça.

A teoria do ordenamento jurídico, baseada na unidade, coerência e compleitude3 (Bobbio, 2006), surgiu entre o fim do século XVIII e XIX, em razão da exigência de dar unidade a um conjunto de normas jurídicas fragmentárias, que constituíam um risco permanente de incerteza. Referida teoria encontrou a sua expressão no pensamento de Kelsen, para quem o ordenamento jurídico é o Direito enquanto organização da força.

Kelsen (1991), jurista positivista e autor da Teoria Pura do Direito, inaugurou um novo paradigma de reflexão do Direito. Referido autor, influenciado por Kant e pelo positivismo4 científico do século XIX, procurou delinear a ciência do Direito desprovida de

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No tocante à coerência e compleitude, tais caracteres estão estreitamente ligados entre si. São fundamentais para que não haja normas demais (exuberância), nem de menos (deficiência), o que representaria, no caso de excesso, contradição entre normas e, no caso de falta, lacuna.

4

O termo positivo significa o real, em contraposição ao quimérico; o útil, em oposição ao ocioso; a certeza em oposição à indecisão; o preciso em oposição ao vago. Traduz a proposta de organização moral e intelectual da sociedade.

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qualquer influência externa, purificada de toda ideologia política e de todos os elementos de ciência natural.

Kant, um dos principais filósofos da era moderna e para quem a ciência é toda série de conhecimentos sistematizados ou coordenados mediante princípios, apoiado na teoria da natureza de Newton, modificou a forma de pensar da burguesia. Referido filósofo tentou estabelecer a fronteira do conhecimento possível, isto é, como é possível e até onde é possível conhecer e o que é possível conhecer. Supõe a existência de modos de percepção e, a partir daí, retira a informação do todo. Buscou reivindicar uma universalização incondicionada de regras moralmente relevantes e fundamentar a ação humana na razão. Denominou esse imperativo moral de “imperativo categórico”, fundado no princípio da autonomia. Sua formulação mais conhecida é a de que se deve agir de tal forma que a máxima que inspira a sua conduta possa se transformar em uma lei universal.

Kelsen (1991), baseado em Kant, vê a norma como o sentido de um ato, ligada ao ser e ao dever-ser. Ato aqui compreendido como sendo algo realizado no espaço e no tempo, sensorialmente perceptível ou uma manifestação externa de conduta humana, com significado do ponto de vista do Direito.

Ser (Sein) e dever-ser (Sollen) são as categorias usadas por Kelsen para distinguir o Direito da realidade. Ser é a condição do dever-ser. Trouxe o conceito de norma fundamental (Grundnorm), hierarquicamente superior a todas as outras normas, na qual se funda todo o ordenamento jurídico e da qual derivam todas as outras normas.

A questão da norma fundamental está na base do ordenamento. Consoante os ensinamentos de Bobbio (2006, p. 201), a norma fundamental não é posta, “mas sim suposta pelo jurista para poder compreender o ordenamento: trata-se de uma hipótese ou de um postulado ou de um pressuposto do qual se parte no estudo do Direito” (grifos do autor).

Kelsen parte da supremacia da norma em relação ao Poder, ao contrário de Karl Schmitt, representante do denominado decisionismo político e para quem a política está acima de qualquer outro elemento caracterizador do Estado, devendo o Direito a ela se submeter.

Na visão do referido jurista, o que confere validade a uma norma é outra norma, entendendo-se por validade a pertinência de uma norma a um sistema de normas inter-relacionadas e em conformidade com a norma fundamental. Nessa visão, a teoria do referido jurista tem por objetivo ser uma teoria de validade do Direito.

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Para Kelsen, o Estado não é nada fora do ordenamento jurídico. Desde o momento em que o Estado é a organização da força monopolizada e esta organização se exprime através de um ordenamento coativo [...] Direito e Estado são unum et idem e aquilo a que se chama habitualmente poder político não é mais do que poder que torna real um ordenamento normativo e faz deste ordenamento um ordenamento efetivo e não imaginário.

Toda ciência tem seus limites metodológicos, e o limite da ciência do Direito é dado pela norma fundamental. Direito para Kelsen restringe-se ao Direito positivo e não se confunde com Justiça, que estaria ligada ao estudo da Ética. Kelsen, portanto, vê o Direito enquanto norma, sem qualquer interferência da política, da sociologia ou de qualquer outro fator externo.

Partindo de tal premissa, o Estado, na visão de Kelsen, pertencendo ao mundo do dever-ser, explica-se pela unidade das normas de direito de determinado sistema, do qual ele é apenas nome ou sinônimo, de modo que quem compreender o Direito como norma compreenderá o Estado.

Afirma Bonavides (2014, p. 44) que a doutrina de Kelsen tem sua originalidade em banir do Estado todas as implicações de ordem moral, ética, histórica, sociológica, criando o Estado como puro conceito, agigantando-lhe o aspecto formal, de cunho exclusivamente jurídico, escurecendo a realidade estatal com seus elementos constitutivos, materiais, o que leva à hipertrofia do elemento formal – “o poder, posto que dissimulado este na santidade inviolável de normas concebidas como direito puro”.

Ainda consoante Bonavides (2014), essa teoria, que situa Direito e Estado em relação de identidade, fazendo de todo Estado um Estado de Direito, se aceita, apagaria na consciência do jurista o sentido dos valores e, na sentença do magistrado, os escrúpulos normais de equidade. Também favoreceria o despotismo das ditaduras totalitárias, por emprestar base jurídica a todos os atos do poder, até mesmo os mais inconcebíveis contra a vida e a moral dos povos. O autor cita como exemplo a experiência da Alemanha nazista, que mostrou até onde podem chegar as consequências de um positivismo normativista, à maneira kelseniana.

Não se pode tratar do conceito de Direito sem mencionar a teoria tridimensional do Direito, defendida por Reale (1994), segundo o qual a Ciência do Direito, sobretudo a partir da Segunda Guerra Mundial, vem se caracterizando por uma crescente luta contra o formalismo, rechaçando-se soluções puramente abstratas, sendo essa tendência expressão da cultura contemporânea. Daí falar-se no Direito como experiência, como concreção jurídica,

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expressões estas que correspondem à aspiração no sentido de harmonizar a lógica das regras jurídicas com as exigências reais da vida social. O tridimensionalismo jurídico, sustenta referido jurista, tem o mérito de evitar que a Ciência do Direito seja reduzida a uma vaga Axiologia Jurídica.

Ao contrário de Kelsen, para quem o Direito é norma jurídica e nada mais do que norma, Reale (1994, p. 119) defende que norma é a indicação de um caminho, o qual, para ser percorrido, deve partir de determinado ponto (o fato) e ser guiado por certa direção (valor). O Direito é, sob essa ótica, uma integração normativa de fatos segundo valores. Sustenta o jurista, ainda, que os três elementos – fato, valor e norma – não se correlacionam apenas, mas se dialetizam: “há uma dinamicidade integrante e convergente entre esses três fatores, de tal maneira que temos três ordens de dialética conforme o seu sentido dominante no processo”.

Até mesmo Hans Kelsen, com o seu propósito de preservar a Ciência do Direito das indébitas intromissões de sociólogos, psicólogos, biólogos, economistas etc., abriu caminho para uma nova compreensão integral do direito, não só por ser o seu normativismo bem distinto do ‘legalismo’ da Escola da Exegese, mas também em virtude de haver uma tridimensionalidade implícita na colocação da Teoria Pura do Direito (REALE, 1994, p. 20).

O Direito, na visão do autor, portanto, é uma realidade tridimensional; é sempre fato, valor e norma para quem quer que o estude, havendo apenas variação no ângulo ou prisma de pesquisa.

Para o eminente jurista, o Direito não é um fato que plana na abstração, solto no espaço e no tempo. Ele está imerso na vida humana - que é um complexo de sentimentos e estimativas -, sendo uma dimensão dela, acontecendo em seu seio e estando no processo existencial do indivíduo e da coletividade.

A necessária complementariedade das pesquisas do filósofo, sociólogo e do jurista revela-se quando se estuda o problema da validade do direito, cujo discurso é tecido com três fios: “em termos de vigência ou de obrigatoriedade formal dos preceitos jurídicos; de eficácia ou da efetiva correspondência social ao seu conteúdo; e de fundamento, ou dos valores capazes de legitimá-los numa sociedade de homens livres” (REALE, 1994, p. 15, grifos do autor).

Para Reale (1994, p. 124), “o mundo jurídico é formado de contínuas ‘intenções de valor’ que incidem sobre uma ‘base de fato’, refragendo-se em várias proposições ou direções

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normativas, uma das quais se converte em norma jurídica em virtude da interferência do Poder” (grifos do autor).

Por seu turno, Bobbio (2006), ao definir o positivismo jurídico, aduz que não existe outro Direito, senão o positivo, vale dizer, senão o Direito posto pelo poder soberano do Estado, mediante normas gerais e abstratas. Prossegue o jurista afirmando que o impulso para a legislação nasce da dupla exigência de pôr ordem no caos do direito primitivo e de fornecer ao Estado um instrumento eficaz para intervenção na vida social, para concluir que o juspositivismo pode ser considerado sob três aspectos: como um certo modo de abordar o estudo do Direito, como uma certa teoria do Direito e como uma certa ideologia do Direito.

A ligação entre método e teoria, na visão do referido jurista, é puramente histórica. De se ressaltar que a adoção de um método pode levar a resultados teóricos distintos. Do mesmo modo, a assunção do método e da teoria juspositivista não implica a assunção da ideologia do positivismo ético. Essa afirmação não é reversível, vale dizer, a ideologia juspositivista pressupõe a teoria juspositivista, e esta última pressupõe o método juspositivista.

O método positivista é simplesmente método científico5 e, portanto, afirma Bobbio (2006) ser necessário adotá-lo, se se quer fazer ciência jurídica ou teoria do Direito. Se não for adotado, não se fará ciência, mas filosofia ou ideologia do Direito.

Na visão de Ferraz Júnior, T. S. (1991), é a decidibilidade dos conflitos o problema central da ciência do Direito, enquanto ciência prática, que é dogmática, por não negar certos dogmas (premissas), mas também zetética, na medida em que o Direito não trabalha apenas com certezas, e, sim, com as incertezas dos conflitos da sociedade. A dogmática pressupõe a zetética. Afirma o jurista:

O direito, assim, de um lado, nos protege do poder arbitrário, exercido à margem de toda regulamentação, nos salva da maioria caótica e do tirano ditatorial, dá a todos oportunidades iguais e, ao mesmo tempo, ampara os desfavorecidos. Por outro lado, é também um instrumento manipulável que

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A ciência, palavra derivada do latim scientia, tem por significado o conhecimento ou saber. Inicia-se com observações neutras dos mais variados fenômenos, extraindo-se delas as leis científicas (proposições gerais) através do processo de indução.

Segundo Comte - pai da corrente filosófica denominada positivismo científico, do século XIX - ciência é a forma de conhecimento que se caracteriza pela certeza sensível de uma observação sistemática e pela certeza metódica que garante o acesso adequado aos fenômenos observados, relacionando-os a princípios que permitem combinar as observações isoladas e investigando-os, buscando suas relações constantes de concomitância e sucessão, isto é, suas leis. A ciência, para Comte, é capaz de prever e controlar os fenômenos para a construção da sociedade positiva.

Já a teoria tem por objetivo descrever a realidade, e sua avaliação consiste em verificar se há correspondência entre o que foi nela descrito e a realidade.

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frustra as aspirações dos menos privilegiados e permite o uso de técnicas de controle e dominação que, pela sua complexidade, é acessível apenas a uns poucos especialistas (FERRAZ JÚNIOR, T. S., 1991, p. 33).

É uma ciência prática, na medida em que o problema central do Direito contemporâneo é decidir conflitos. E essa ciência prática é a dogmática, porque baseada no princípio da aceitação sem discussão de pontos de partida (os dogmas).

Se, por um lado, a dogmática do Direito depende de não se negarem os pontos de partida, por outro, não se pode desconsiderar as incertezas dos conflitos da vida social.

Ainda de acordo com Ferraz Júnior, T. S. (1991), para lidar com essas incertezas, é preciso identificar o que seja Direito; entendê-lo e, só então, decidir. Para tanto, é necessário recorrer à teoria da linguagem: regras sintáticas (combinação das normas entre si), semânticas (conotação e denotação das normas em relação ao objeto) e pragmáticas (análise das normas em relação à sua função).

Para Grau (2014), o Direito significa um sistema de princípios (normas) coercitivamente impostos a um determinado grupo social, por qualquer organização social, dotada de poder para tanto.

Nas palavras de Ferraz Júnior, T. S. (1991), o Direito é um “jogo sem fim”, que além de não ter fim, também não tem começo. Já se nasce dentro do Direito, cabendo a cada um, portanto, apenas avaliar se o jogo está sendo corretamente jogado.

Na percepção de Canotilho (2003), os atos normativos não possuem todos a mesma hierarquia, isto é, encontram-se num plano vertical que tem a Constituição ocupando a posição mais alta6, o que se justifica em virtude da pluralidade de normas e da indeclinável função ordenadora do Direito, cabendo ao intérprete a função de organizá-lo. Sua atividade é, portanto, dar operacionalidade prática à concepção de Constituição, considerando-a como um sistema normativo aberto a princípios e regras.

Para Härbele (1997), diante do papel fundamental da Constituição para a sociedade e para o Estado, aquela deve ser interpretada de forma adequada à sociedade pluralista (sociedade aberta), e todo aquele que vive a Constituição é seu legítimo intérprete. Essa proposta de Häberle representa uma democratização da hermenêutica constitucional. Em outras palavras, a noção de sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, representando todos aqueles que são atingidos pela hermenêutica constitucional, chama-os, em nome da

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O autor afirma, entretanto, que este modelo piramidal não tem hoje virtualidades suficientes para captar o relevo jurídico do direito internacional e comunitário. Aponta a existência de problemas relacionados à unidade do sistema jurídico e à articulação de várias fontes de direito, já que hoje não apenas a Constituição representa o vértice de um sistema, mas também normas internacionais e comunitárias.

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democracia pluralista, a dividir com os juízes a tarefa de contribuir para a interpretação da norma constitucional, mesmo porque todo poder emana do povo.

Ao tratar do sentido da interpretação das normas constitucionais, sob o ponto de vista teórico-político, Canotilho (2003) afirma que a interpretação deve ter em conta a especificidade resultante do fato de a constituição ser um estatuto jurídico do político. A influência dos valores políticos na tarefa da interpretação legitima o recurso aos princípios políticos constitucionalmente estruturantes, mas não pode servir para alicerçar propostas interpretativas que radiquem em qualquer sistema de supra-infra ordenação de princípios nem em qualquer ideia de antinomia.

Para referido autor, o princípio da unidade da constituição é uma exigência da coerência narrativa do sistema jurídico que obriga o intérprete a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar, de modo a sempre considerá-las não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios, exprimindo uma concepção correta do direito e da justiça.

De todos os conceitos acima expostos, extrai-se que o Direito, enquanto ordenamento, de caráter coativo, desempenha fundamental papel como instrumento de pacificação, que promove o consenso, a harmonia na vida em sociedade. Esse é o conceito que norteará o desenvolvimento do presente trabalho.

2.2 Política

Com relação à Política, considere-se, inicialmente, sua etimologia. A palavra deriva do adjetivo originado de polis (politikós), que significa tudo o que se refere à cidade. A obra

Politica, de Aristóteles, deve ser considerada o primeiro tratado sobre a natureza, as funções,

as divisões do Estado, e sobre as várias formas de governo (BOBBIO, 2000).

O termo política, ao longo do tempo, foi perdendo seu significado original, sendo habitualmente utilizado para indicar toda e qualquer atividade que tenha como referência o Estado (a polis), o qual atua ora como sujeito ora como objeto.

Ciência política, sob o prisma filosófico, “em sentido lato, tem por objeto o estudo dos acontecimentos, das instituições e das ideias políticas, tanto em sentido teórico (doutrina) quanto em sentido prático (arte), referido ao passado, ao presente e às possibilidades futuras” (BONAVIDES, 2014, p. 40).

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Política pode ser conceituada como a arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados. Em outras palavras, é a arte ou prática de administrar questões públicas. É fazer as escolhas dos projetos que serão transformados em realidade, visando ao bem comum, à satisfação do interesse público, de uma forma legal e legítima. Seu conceito está intimamente relacionado com a noção de poder, mais especificamente, poder de um homem sobre outro homem. Também guarda pertinência com a conflituosidade humana.

Bobbio (2000) menciona a existência de três formas clássicas de poder: paterno, despótico e político, sendo este diferenciado dos demais em razão das características de exclusividade, universalidade e inclusividade. É exclusivo na medida em que os detentores do poder não permitem, no seu âmbito de domínio, grupos armados independentes; é universal em razão da capacidade dos detentores do poder político de tomar decisões legítimas e efetivas; por fim, é inclusivo pela possibilidade de intervir imperativamente na esfera de cada um, através do Direito.

Para Silva, J. A. (2006), o poder é fenômeno sócio-cultural. É fato da vida social. O poder político, que é o poder do Estado, como grupo social máximo e total, é superior a todos os demais poderes sociais, o que caracteriza a soberania estatal. É o poder político, portanto, uno, indivisível e indelegável.

No que toca aos fins da política, Bobbio (2000, p. 167) assinala que, se o poder político é o poder supremo em um determinado grupo social, em razão do monopólio da força, os fins que vierem a ser perseguidos por obra dos políticos são aqueles considerados de acordo com as circunstâncias preeminentes para um dado grupo social, desse modo, conclui o autor que “os fins da política são tantos quantas forem as metas a que um grupo organizado se propõe, segundo os tempos e as circunstâncias”, conclui o autor.

Concorda-se com o autor no tocante ao entendimento de que o homem político deve agir com paixão, no sentido de dedicação apaixonada àquilo que se propõe fazer; deve agir com senso de responsabilidade, assumindo-a inteiramente ou utilizando-a como guia determinante da própria ação; deve agir com capacidade de previsão, olhando o futuro com sabedoria e prudência, vale dizer, levando em conta a realidade que opera sobre todos, evitando o distanciamento (pecado mortal de qualquer homem político) e a ação movida por vaidade pessoal.

A questão do que pode ser considerado um bom governo e distingui-lo do mau governo é algo que atormenta o pensamento político. Para Bobbio (2000), o bom governo é aquele no qual o governante exerce o poder em conformidade com as leis preestabelecidas e

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se vale do próprio poder para perseguir o bem comum, representando o constitucionalismo o desfecho natural da ideia do bom governo fundado na supremacia da lei.

Hoje, não se fala mais em bom governo ou mau governo, mas sim em governabilidade e ingovernabilidade, em razão do número de demandas das sociedades ser muito superior à capacidade de qualquer sistema político de atendê-las. Esse aspecto será retomado mais adiante nesta dissertação.

Partindo-se da premissa de que toda ação traz em si um prejuízo, a elaboração das normas por quem detém o poder para tanto e a condução da política são formas de agir, devendo, portanto, serem pautadas com o objetivo de serem o mais bem sucedidas possível, vale dizer, com vistas a obterem o melhor resultado possível e, ao mesmo tempo, o menor prejuízo. Em outras palavras, a obterem o mínimo do máximo, de acordo com o teorema minimax7.

A Teoria dos Jogos, do matemático John Nash, é uma teoria de modelização de conflitos e foi desenvolvida com a finalidade de analisar situações competitivas que envolvem interesses conflitantes, nas quais a ação de uma pessoa influencia, mas não determina o resultado do jogo8. É uma teoria matemática para lidar com conflitos humanos e tem por objetivo lidar com o mínimo do máximo de prejuízo ou o máximo do mínimo de prejuízo.

Os agentes públicos, portanto, devem agir de modo dedicado, responsável e prudente, de acordo com as regras do jogo e com seu conhecimento das circunstâncias, para a satisfação do bem comum. Devem agir para obterem certos resultados ao menor custo no sistema, com a informação de que dispõem. Cientes de que serão cobrados pelos bons resultados obtidos, não podem, porém, agir simplesmente pensando na satisfação pessoal (distanciando-se da sociedade) e tampouco movidos pela vaidade, seguindo a máxima maquiavélica de que os fins justificam os meios.

Quando lhe falta uma causa assim concreta, o político corre o risco de continuamente confundir a prestigiosa aparência do poder com o poder real, e quando lhe falta o senso de responsabilidade, arrisca-se a gozar do poder simplesmente por amor à potência, sem lhe dar um objetivo por conteúdo (BOBBIO, 2000, p. 204).

7 É o estudo de estratégias que visa a maximizar os ganhos e a minimizar as perdas. Representa o conjunto de estratégias ótimas para todos os jogadores em jogo. O critério minimax oferece diretrizes para medir a utilidade de uma decisão, oferecendo um caminho para o mínimo do máximo.

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2.3 Democracia

Denomina-se forma de governo a maneira como o poder é instituído na sociedade e a relação entre o povo e seus governantes, diferindo do que se denomina sistema de governo, o qual diz respeito ao modo como se relacionam os poderes. As formas de governo mais comuns são a monarquia e a república e, em linhas gerais, conforme Aristóteles, tomando por base o número de governantes, podem ser classificadas em realeza (um só governante); aristocracia (um grupo de governantes) e democracia (governo exercido por uma multidão)9.

Aristóteles (2008) foi o primeiro a usar o conceito de democracia. Obviamente, o que ele descreveu como democracia, em Atenas, é uma noção completamente diferente da noção dos dias atuais. Consoante as lições de Franco (1974), em Atenas, além dos membros da Assembleia do Povo, órgão da democracia direta do qual participavam todos os politicamente capazes, o conselho dos Quinhentos e dos Archontes, que atuavam como assembleia representativa e poder executivo, respectivamente, eram escolhidos por sorteio, o que, segundo Platão, era a maneira mais sábia, pois contava com a revelação divina e não com a falibilidade das escolhas humanas.

Democracia é uma noção que adquire, com o tempo, na história, diferentes formas, diferentes instrumentos, diferentes estratégias. É, portanto, dinâmica e está em constante transformação.

Consoante Bobbio et al. (1992), na teoria contemporânea da democracia, confluem três grandes tradições do pensamento político: a teoria clássica (aristotélica), pela qual a democracia (governo do povo, de todos os cidadãos) distingue-se da monarquia e da aristocracia; a teoria medieval, de origem romana, calcada na soberania popular; e a teoria moderna, conhecida como teoria de Maquiavel, segundo a qual as formas de governo são basicamente monarquia e república, sendo a democracia uma forma de república. E concluem referidos autores que os questionamentos ligados à democracia, às suas características, sua importância ou desimportância são tão antigos quanto a reflexão sobre as coisas da política, tendo sido objetos de estudo, de reformulações em todas as épocas.

Um conceito mínimo de Democracia, compreendida como contraproposta a todas as formas de governo autocrático, segundo os ensinamentos de Bobbio (2015), está caracterizado por um conjunto de regras primárias ou fundamentais que estabelecem quem está autorizado a

9 De se ressaltar que essas três formas podem sofrer degeneração quando o governante deixa de atender aos interesses comuns, em prol de interesses particulares, vale dizer, a realeza pode se degenerar em tirania; a aristocracia em oligarquia; e a democracia em demagogia.

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tomar decisões coletivas e através de quais procedimentos. Deve ser atribuído a um número elevado de cidadãos o direito de participar direta ou indiretamente da tomada de decisões coletivas; deve haver regras de procedimento como a da maioria e, também, é necessário que aqueles a quem cabe decidir ou eleger os que deverão decidir tenham alternativas reais e condição de poder escolher entre uma e outra. Ou seja, quem é chamado a decidir deve ter o direito de livremente se expressar, de emitir opiniões etc.

Em poucas palavras, Bobbio (1997, p. 156) define a democracia como o “sistema de regras que permitem a instauração e o desenvolvimento de uma convivência pacífica”.

Não há democracia sem participação e, quanto maior essa participação, mais legitimidade tem o governo.

Kelsen (2000a) afirma que se temos que ser comandados, que seja por nós mesmos, devendo haver o mínimo de afastamento entre a autonomia (liberdade anárquica) e heteronomia (coerção externa), o que só é possível mediante a passagem da liberdade da anarquia à liberdade da democracia. O jurista rejeita categoricamente qualquer justificação do princípio majoritário fundada na ideia de igualdade em relação ao poder, isto é, de que a maioria de votos tem maior poder que a minoria de votos10. Defende que os valores dos quais é portadora a maioria não são menos valores do que aqueles dos quais é portadora a minoria, de modo que a ordem social deve apropriar-se dos valores expressos pela maioria, mas sem impedir nem dificultar que a minoria se torne maioria, levando os seus valores para a ordenação.

A ideia de igualdade está conjugada não com o poder, mas com a liberdade. Para Kelsen (2000a), a concordância entre vontades individuais e vontade do Estado será tanto mais fácil de obter quanto menor for o número de indivíduos com os quais seja necessário um acordo para decidir uma modificação na vontade do Estado.

A concepção de povo, que não pode ser determinado em termos sociológicos, na visão do referido jurista, está ligada à ideia de submissão das pessoas à mesma ordem jurídica estatal.

Se democracia significa o governo pelo povo, cabe definir por quais meios o povo externará sua vontade. Sob esse aspecto, a doutrina aponta vários tipos de democracia: a direta, a semidireta e a representativa. A direta, como o próprio nome diz, é aquela em que há o pronunciamento direto do povo, deliberando sobre todas as questões, o que é praticamente impossível nos dias de hoje. A semidireta, por seu turno, é caracterizada pela presença de

10 O jurista utiliza uma passagem bíblica, que narra quando os judeus escolheram Cristo para ser crucificado, ao invés de Barrabás, para ilustrar que a maioria pode cometer erro.

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institutos que permitem a participação popular sem que haja, no entanto, ampla discussão antes da deliberação, a exemplo do referendum, plebiscito, iniciativa popular11, veto popular e recall. Por fim, em razão da impossibilidade de se efetivar a democracia direta e em razão das limitações da democracia semidireta, há a democracia representativa, também denominada procedimental, institucional ou formal, pela qual o povo elege seus representantes, para que decidam em seu nome.

Em razão da insuficiência dos modelos de democracia acima mencionados, alguns teóricos defendem o que se denomina democracia deliberativa. Tavares (2010b) define-a como aquela que não se circunscreve ao momento de tomada de decisão, mas cuja ênfase recai mais sobre o modo de formação e o encaminhamento das discussões e conclusões do que sobre a decisão propriamente dita e seu conteúdo. Trata-se de uma democracia inclusiva, dialógica. Sustenta-se que a complexidade da sociedade não pode ser um obstáculo à democracia, de modo que o diálogo responsável é a melhor forma de efetivá-la. Assim, a democracia deve incorporar um momento de amplas discussões, que lhe permita promover um embate e conhecimento profundo de ideias e pontos de vista, objetivando a ampliação dos horizontes da agenda política.

Consoante Gisbert (2017), a democracia representativa possui quatro elementos básicos: proibição de mandato imperativo, decisões tomadas mediante discussão, liberdade de opinião pública e periodicidade eleitoral.

Distingue-se da democracia representativa a denominada democracia substantiva, que se confunde com a ideia de justiça social e se propõe concretizar seus enunciados. Chama-se substantiva porque se refere a certos conteúdos inspirados em ideais característicos da tradição do pensamento democrático, com relevo para o igualitarismo, nas precisas lições de Bobbio et al. (1992).

Dalla-Rosa (2007) afirma que a democracia substantiva é a democracia de conteúdo, vinculada aos direitos fundamentais e centrada na realização do indivíduo em todas as suas potências. Trata-se de uma democracia de limite, de controle, de uso, e de ação do poder político ou, em outras palavras, diz respeito à influência do cidadão na formulação e implementação das políticas públicas, na definição das prioridades.

Dito ainda de outra forma, a democracia formal, procedimental - que se preocupa com os meios e os procedimentos utilizados no processo democrático, enfatizando-se os aspectos procedimentais - pode ser definida como o governo do povo. Por outro lado, para a

11 A lei complementar 135/2010, conhecida como a Lei da Ficha Limpa, que acrescentou hipóteses de inelegibilidades, é fruto de projeto decorrente de iniciativa popular.

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democracia substancial, considerada o governo para o povo, não bastam os mecanismos eleitorais para que a democracia seja mantida, pois aspectos econômicos-sociais influenciam no resultado das eleições, de modo que devem ser considerados ao se definirem as democracias. Desigualdades sociais refletem em desigualdades políticas.

Conforme Tavares (2010a), há uma polissemia inata à assimilação da democracia, ao que podem ser adicionados inúmeros paradoxos, tais como a incapacidade técnica de o povo se autogovernar e a possibilidade de a democracia se enveredar por um caminho totalitário.

Sadek (2005) faz uma distinção entre democracia política e democracia social. Aquela diz respeito ao sistema de governo e envolve, antes de tudo, competição e eleições limpas. A democracia social, por seu turno, diz respeito aos direitos sociais, à possibilidade de participação de maneira igualitária nos bens de uma sociedade. Afirma serem conexas, mas não há um paralelismo entre elas, podendo haver avanços em uma que não são acompanhados por avanços na outra.

Prossegue afirmando que uma sociedade com baixa participação política possui um grau de democracia política muito baixo, e a inclusão significa, acima de tudo, o reconhecimento dos direitos políticos, entendidos como aqueles que facultam a todo e qualquer indivíduo, ter igual participação na vida política.

Para Häberle (1997, p. 36), a democracia não se desenvolve apenas no contexto de delegação de responsabilidade formal do povo para os órgãos estatais até a Corte Constitucional. “Numa sociedade aberta, ela se desenvolve também por meio de formas refinadas de mediação do processo público e pluralista da política e da práxis cotidiana, especialmente mediante a realização dos Direitos Fundamentais”.

O povo, na visão de Häberle (1997), não é só um referencial quantitativo que vota e dá legitimidade democrática ao processo de decisão, mas sim um elemento pluralista para a interpretação que se faz presente de forma legitimadora no processo constitucional: como partido político, como opinião científica, como grupo de interesse, como cidadão.

Comparato (2000, p. 307) afirma que, em uma democracia, como já observou Montesquieu, o povo é, sob certos aspectos, monarca, pelos seus sufrágios, que exprimem sua vontade, e, sob outros aspectos, é súdito. “Daí porque as leis que regulam o modo de proceder das eleições são tão fundamentais no regime democrático, quanto a lei de sucessão dinástica numa monarquia”. Não há falar-se em democracia sem eleições, pois é através delas que a democracia legitima-se.

Três princípios são essenciais para o desenvolvimento da legitimidade de um governo democrático: igualdade, no sentido de que todos os cidadãos devem ter as mesmas

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oportunidades de influenciar as decisões políticas e de ocupar cargos públicos; liberdade, no sentido de que os homens são livres para expressar suas opiniões; e dignidade da pessoa humana, porque a democracia não pode desrespeitar os valores inerentes ao homem (VELLOSO, 2010).

Muito se fala hoje que a democracia está em crise e se questiona, até mesmo, qual será o seu futuro. Bobbio (2015, p. 23) afirma que, se a democracia “não goza no mundo de boa saúde”, também não significa que esteja “à beira do túmulo”.

A democracia real está longe de corresponder à democracia ideal. Para Bobbio (2015), há promessas do ideal democrático não cumpridas. Merecem destaque como dificuldades da democracia real a revanche de interesses particulares e a existência de um poder invisível, situações estas tão presentes na realidade brasileira.

Quanto ao poder invisível, as grandes decisões políticas devem ser tomadas de forma pública, transparente. Uma ação que, forçosamente, precisa manter-se secreta é “certamente não apenas uma ação injusta, mas sobretudo uma ação que se fosse tornada pública suscitaria uma reação tão grande que tornaria impossível a sua execução” (BOBBIO, 2015, p. 53).

Na democracia representativa, a participação dos cidadãos canaliza-se através dos partidos políticos, que captam os interesses mais importantes da sociedade e se propõem defender tais interesses através de uma agenda. De se ressaltar que os representantes não podem estar vinculados aos interesses particulares dos representados, ou seja, os representantes, quando eleitos, não devem assumir seus cargos endividados, vale dizer, comprometidos em retribuir os favores que receberam por ocasião do financiamento de campanha eleitoral.

Apenas com a instituição e o exercício da democracia representativa, as divisões deslocam-se da aldeia para o parlamento, onde o dissenso é constitucionalizado, isto é, legitimado, e onde nascem os partidos políticos (e não mais facções12), constituindo o trâmite entre cidadãos e o Estado e permitindo a permanência da democracia, ou seja, de um sistema poliárquico em uma sociedade de massa (Bobbio 2000).

Consoante Huntington (1994), um sistema político do século XX é democrático quando seus principais tomadores de decisões forem selecionados através de eleições periódicas, honestas e imparciais, nas quais os candidatos concorram livremente pelos votos e

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Bonavides (2014) observa que Madison, na obra Federalista, emprega indistintamente as expressões facção e partido e ressalta que os dois conceitos são distintos, sendo a facção o lado negativo, e o partido o lado positivo da participação política organizada, na medida em que a facção é dotada de fins egoísticos, interesses privados, e os partidos têm por finalidade a satisfação do interesse público. Por fim, observa o autor que um partido pode se transformar em facção e vice-versa.

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em que, em tese, toda a população tenha o direito de votar. A democracia é uma virtude pública, com limitações de poder implícitas dentro de um ambiente de estabilidade.

Concorda-se com Sarmento (2010, p. 116-117) no sentido de que uma análise histórica desapaixonada permite concluir que:

Se ainda estamos longe de atingir o ideário do Estado Democrático de Direito, a distância hoje é menor do que já foi em qualquer outro momento da trajetória institucional do país. [...] O patrimonialismo e a confusão entre o público e o privado continuam vicejando, a despeito do discurso constitucional republicano [...]. Vive-se uma séria crise de representatividade do Poder Legistativo, que hoje não conta com a confiança da população. E a Constituição é modificada com uma frequência muito maior do que seria saudável.

2.4 Ética

Ética é palavra que vem do grego ethos e significa modo de ser ou caráter. É a parte da filosofia que investiga os princípios que motivam, distorcem ou disciplinam o comportamento humano, refletindo especialmente a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social.

Pode ser vista como disciplina da Filosofia, como uma qualidade atribuível a determinada conduta e, ainda, como conjunto de critérios normativos que devem nortear a conduta humana.

Impossível reconstituir passo a passo o caminho das comunidades humanas, mas o fato é que os grupos humanos surgem sempre na cena da história já dotados de seu ethos, isto é, de seus costumes, hábitos, constituindo, como dizia Aristóteles, sua “segunda natureza”.

Curioso notar que a definição de ética dada pelos filósofos clássicos é sempre atual. Transforma-se a sociedade através dos tempos, mas o conceito de ética permanece o mesmo.

Para Lewandowski (2017b), a ética corresponde a uma disciplina comportamental que estuda as escolhas morais sob o prisma da razão, com vistas a orientar as ações humanas na direção do bem comum.

Vaz (1996) afirma que o mundo ético não é uma dádiva da natureza, mas sim uma dura conquista da civilização.

Reale (1957) afirma que Ética, cujo objeto de estudo é o bem comum, significa ciência normativa de conduta ou do comportamento humano, sendo gênero que contém espécies, dentre as quais a moral e o direito.

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Para Michael Sandel13, professor de filosofia política na Universidade de Harvard, filosofia não é um assunto abstrato, que lida com temas utópicos, mas sim uma atividade que pertence às cidades e é praticada através do diálogo. Deve-se permitir ao cidadão comum que discuta grandes questões filosóficas, que participe do debate de tais questões. Sendo assim, pode-se incluir entre elas a questão da ética.

Para referido professor, há, hoje, uma falta de confiança com relação à política e aos partidos políticos; há uma frustração com o vazio do discurso público, que se revela fracassado para enfrentar grandes questões de valor, ética, significado do bem comum e do que seja ser um cidadão. Pode-se claramente afirmar que, hoje, no Brasil, vive-se uma crise de credibilidade das instituições.

Faz-se necessário manter a confiança na capacidade humana de agir e aprender e de ter como meta que os cidadãos participem da gestão da coisa pública em todas as esferas: econômica, política e cultural (PUGLIESI, 2009).

A sociedade como um todo, atualmente, carece de ética. Segundo Bauman14, vive-se, atualmente, em um estado de interregno, de modo que as ações têm sido reagir às crises mais recentes. Concorda-se com o sociólogo, quando afirma que há dois fatores relativamente independentes que dão forma à vida humana: destino, sobre o qual não se tem controle, e caráter, que está sob o controle de cada um. As formas de sobrevivência aprendidas antigamente, de como lidar com os desafios da realidade, hoje, não funcionam mais, e novas formas ainda estão engatinhando. Não se tem, e nem é possível ter, uma visão de longo prazo, prossegue o sociólogo.

Segundo Karnal, “o mundo está vivendo a crise da transição num cenário turbulento de ambiguidades que leva a diferentes leituras éticas simultâneas. Talvez nunca se tenha discutido tanto o que vale e o que não vale com o agravante de as próprias instituições atravessarem séria crise de credibilidade”.15

A questão da ética está ligada à noção de Bem e Justo, segundo Platão. As pessoas agem com uma certa finalidade, o que pressupõe que agem movidas por razões. Se a finalidade for o Bem e houver uma proporcionalidade entre as razões e o Bem, estar-se-á diante do justo, o qual leva em conta a distribuição equitativa ou proporcional do Bem. O injusto é o desmesurado (a tirania, a omissão, por exemplo).

13

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=KZiU6WnZkoI&t=1789s>. Acesso em: 09 abr. 2017. 14A fluidez do 'mundo líquido' de Zygmunt Bauman.

Disponível em: <http://globosatplay.globo.com/globonews/v/4660773/>. Acesso em: 01 abr. 2017.

15

Trecho de palestra proferida pelo historiador Leandro Karnal em 2015, no XIV Fórum Internacional de Administração.

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Olinto Pegoraro16, apud Fonteles (1996, p. 260-261), afirma que:

Da ordem emana também a justiça, que consiste em respeitar o lugar de cada coisa. Daí, deriva também a ética, da qual só o homem é capaz. Só o homem entende a ordem e só ele é capaz de respeitá-la conscientemente ou violá-la propositalmente. Portanto, só o homem tem condições de ser ético ou aético. A ética centra-se em três atitudes humanas. A primeira é uma atitude de dominação dos seres inferiores a ele (animais, vegetais e materiais); a segunda é de respeito aos seres que possuem idêntica natureza e, portanto, idêntica posição scala rerum. Isso é, o homem deve respeito a outro ser humano. Finalmente, pela terceira atitude o homem presta culto ao ser superior e divino. Nisto se concentra toda a ética natural.

Portanto, a ética natural não se refere só aos seres humanos ou aos viventes de outras espécies, abrange a totalidade da scala rerum.

Numa palavra, a síntese da ética é a justiça como princípio objetivo de respeito à ordem cósmica (scala rerum) e como virtude subjetiva que leva o homem ao respeito de si, do seu semelhante e de toda a natureza. Toda forma de violência contra o ser humano é injustiça.

Perelman (2005, p. 66-67) afirma:

A justiça é uma noção prestigiosa e confusa [...] A justiça de um ato consiste na igualdade de tratamento que ele reserva a todos os membros de uma mesma categoria essencial. Essa igualdade resulta, por sua vez, da regularidade do ato, do fato de que coincide com uma consequência de uma determinada regra de justiça.

Segundo Rawls (2016), a Justiça é a primeira virtude das instituições sociais, assim como a verdade o é dos sistemas de pensamento.

Ética, além de estar ligada à noção de justiça, liga-se à de virtude. A justiça, praticada em relação ao próximo e por disposição de caráter, não deixa de ser uma virtude.

Para Kelsen (2000b), a justiça deve ser um valor inconstante, relativo, dissolúvel e mutável. Essa postura kelseniana a respeito da justiça é consequência da sua postura positivista.

Dentre as várias concepções de justiça, pode-se extrair que haverá justiça quando houver igualdade de tratamento a todos que estão em uma mesma situação. Vale dizer, a justiça, em seu aspecto formal, aparece como um valor ético-social de proporcionalidade, que corresponde a atribuir a alguém o que lhe é devido. Proporcionalidade aqui no sentido de que a diferença de tratamento deve ser proporcional, ou seja, de comparação à desigualdade de

16

(33)

circunstâncias. A conformidade, ou não, com critérios sobre o que e a quem é devido é o problema do aspecto material da justiça.

Consoante Bobbio (2000), a justiça está ligada à noção de lei, ordem e igualdade, numa relação de conexão e reciprocidade. É justo o que está conforme as leis, as quais devem ser iguais para todos e imparcialmente aplicadas. Além disso, a virtude da justiça é a virtude que preside a constituição de uma totalidade composta de partes que se mantenham juntas, não se dissolvam e não voltem ao caos, constituindo uma ordem.

Para Reale (1957), a justiça é o valor do próprio direito. O eminente jurista afirma, ainda, que “a justiça é um valor franciscano”, em alusão a São Francisco, o qual pregava que a razão do amor aos homens culminava no espontâneo ato de dar, de ir ao encontro do outro para ajudá-lo. Com essa afirmação, defende que a justiça não é um valor que tenha um fim em si mesmo, mas sim “um valor supremo, cuja valia consiste em permitir que todos os valores valham, numa harmonia coerente de ideias e atitudes” (Reale, 1994, p. 128). Sem base de justiça não há ordem nem segurança.

Dito de outra forma, para Reale (1994, p. 128), “o Direito é a concretização da ideia de justiça na pluridiversidade de seu dever-ser histórico, tendo a pessoa como fonte de todos os valores”.

Consoante Ferraz Júnior, T. S. (1991, p. 322), a justiça é o princípio regulativo do Direito. Sua presença “como uma espécie de código de ordem superior cujo desrespeito ou violação produz resistência e cuja ausência conduz à desorientação e ao sem-sentido das regras de convivência pode nos levar a admiti-la como um princípio doador de sentido para o universo jurídico”.

A justiça é uma virtude completa, porém não em absoluto e, sim, em relação ao próximo. É completa, porque aquele que a possui pode exercer sua virtude não só sobre si mesmo, mas também sobre o seu próximo. É o bem do outro, visto que se relaciona com o nosso próximo.

Afirma Olinto Pegoraro17, apud Fonteles (1996, p. 263), que “somente a justiça é virtude que relaciona o indivíduo com os outros. Somente a justiça abre a pessoa à comunidade; ninguém é justo para si, mas em relação aos outros. A justiça é a virtude da cidadania que regula toda a convivência política”.

17

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A ética, além de estar relacionada à virtude e à justiça, também está atrelada à moral, a qual decorre da própria natureza racional do homem. Ao abordarem o sistema de filosofia do Direito de Hegel, afirmam Bobbio et al. (1992, p. 350):

O Direito, em sentido amplo, compreende não apenas o Direito privado e o Direito público, mas também a moralidade; não apenas o Direito em sentido estrito, que corresponde grosso modo ao Direito privado, mas também a esfera da eticidade. É um fato digno de anotação que, se o Direito em sentido amplo é o ‘reino da liberdade realizada’, ele se realiza plenamente e só no Estado.

Atribui-se a Maquiavel, para quem os fins justificam os meios, a descoberta da distinção entre moral e política. Há quem sustente que uma ação pode ser considerada boa do ponto de vista político, mas imoral se considerada a partir do dever independentemente do resultado.

Sabe-se que os agentes públicos são julgados pelo sucesso alcançado, pelos resultados positivos que obtêm, mas é difícil dissociar imoralidade de ilicitude quando se trata de política.

A moral diz respeito ao âmbito interno do indivíduo, à sua vontade interna, independentemente da existência de lei. Muito embora destituída de sanção, sujeita os transgressores à reprovação da sociedade. Já o Direito diz respeito à liberdade externa da vontade (Grau, 2014), submetida ao império da lei.

Discorda-se da afirmação de que para o Direito basta a legalidade, sem nenhuma obrigação moral, sem nenhum atendimento aos motivos éticos. Inegável que a moral é independente do Direito, mas não se pode imaginar a produção do Direito desprovida de moral e ética. E isso é fundamental, porque o juiz, ao solucionar um conflito, deverá ater-se ao direito positivo, ao direito posto. Considerando não ser o Direito autopoiético e relacionado à política, é preciso que as leis sejam feitas pelo Parlamento e que estas leis, editadas em consonância com a Constituição Federal e dentro do maior rigor ético e moral, possam ser aplicadas pelos juízes, porque, aí sim, no âmbito da aplicação do Direito, o magistrado deve ater-se simplesmente à legalidade, não podendo fundamentar suas decisões simplesmente com base na ética e moral, sob pena de estarmos abrindo brechas para o arbítrio, para um ativismo exacerbado.

Ainda no tocante à moralidade, de se ressaltar que ela configura um dos princípios que regem a administração pública, nos termos do art. 37 da Constituição Federal de 1988, ao lado dos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência.

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