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O metilfenidato (RITALINA®) na escola : percepção dos educadores da rede de ensino fundamental I e II

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Ciências Aplicadas

LISANDRE FRAZÃO BRUNELLI

“O Metilfenidato (RITALINA®) na escola: Percepção dos educadores da rede de Ensino fundamental I e II” Limeira, 2018

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LISANDRE FRAZÃO BRUNELLI

“O Metilfenidato (RITALINA®) na escola: Percepção dos educadores da rede de Ensino

fundamental I e II”

“Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas, como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestra em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas”

“Orientadora: Professora Doutora Marta Fuentes Rojas”

“ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA LISANDRE FRAZÃO BRUNELLI, E ORIENTADA PELA PROFESSORA DOUTORA MARTA FUENTES ROJAS”

Limeira, 2018

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Brunelli, Lisandre Frazão,

1970-B835m O Metifenidato (Ritalina®) na escola: Percepção dos educadores da rede de Ensino fundamental I e II / Lisandre Frazão Brunelli.–Limeira, SP: [97f.], 2018.

Orientadora: Marta FuentesRojas.

Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Aplicadas.

1. Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. 2. Metilfenidato. 3. Professores. 4. Grupos focais (Técnica de entrevista). I. Rojas, Marta Fuentes, 1957-. II. Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Aplicadas. III. Título.

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca da Faculdade de Ciências Aplicadas Renata Eleutério da Silva - CRB 8/9281

Informações para a Biblioteca Digital:

Título em outro idioma: Ritalin® at basic schools: What´s teachers perceptions Palavras-chave em inglês: Methylphenidate Ritalin® teachers focus groups

Área de concentração: Modernidade e Políticas Públicas Titulação: Mestra em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas Banca examinadora:

Marta Fuentes Rojas (Orientador) Fernando Cesar Chacra

João José Rodrigues Lima de Almeida Data da defesa: 26/02/2018

Programa de Pós-graduação: Mestrado Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

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FOLHA DA BANCA EXAMINADORA

Marta Fuentes Rojas (orientadora)

Fernando César Chacra

João José Rodrigues Lima de Almeida (FCA/ Unicamp)

A ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se noprocesso de vidaacadêmica do aluno.

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Aos meus avós (in memoriam); Aos meus pais, Adelmo e Raquel; Aos meus filhos, Isabella e Giovanni; Ao meu esposo Renato, Dedico este trabalho.

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Agradeço infinitamente aos meus familiares, amigos, professores e aos que de algum modo, estiveram envolvidos ao processo extremamente árduo que gerou este trabalho. Agradeço especialmente à Professora Doutora Marta Fuentes Rojas, pelo carinho, pela atenção e paciência. Não foi fácil. Nada é fácil. Mas, tudo passa.

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acometer crianças, adolescentes e adultos, sendo diagnosticado clinicamente. Minha pesquisa discute e critica o exagero por parte das escolas e da saúde em diagnosticar e rotular precocemente os alunos, visando a compreensão de qual seria a percepção dos professores quanto ao TDAH e seu tratamento.

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adolescents and adults, being diagnosed clinically. The present research intends to discuss the theme, as well as criticize exaggerated attitudes by education and health areas, increasing the use of psycotropics like Methylphenidate.

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sucedere ai bambini, adolescenti e adulti, essendo diagnosticato clinicamente. Questa ricerca intende, pertanto, di discutere il tema, corrente e preoccupante nella società contemporanea, oltre a criticare i comportamenti esagerati di alcune persone che si occupano della educazione e salute, a fare la diagnosi e etichettare precocemente gli studenti.

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ABDA Associação Brasileira de Déficit de Atenção ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária APA American Psychiatric Association

BRATS Boletim Brasileiro de Avaliação de Tecnologias em Saúde CDC Centers for Disease Control and Prevention

CF Constituição Federal

CID Código Internacional de Doenças CNE Conselho Nacional de Educação

DSM Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders FUNDEF Fundo de manutenção e desenvolvimento do Ensino

fundamental e de valorização do Magistério LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação e Cultura

NIM National Institutes of Health NIMH National Institute of Mental Health OAE Organização de Assistência Escolar OMS Organização Mundial de Saúde SESI Serviço Social da Indústria

SIAME Sistema Integrado de Atendimento Médico na Escola SNC Sistema Nervoso Central

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento livre esclarecido

TDAH Transtorno de Déficit de atenção e Hiperatividade UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

USP Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ... 12 OBJETIVOS ... 21 1 PROCESSO METODOLÓGICO ... 22 2 PANORAMA INICIAL ... 27

2.1 TDAH, Principais Conceitos para a Literatura Médica ... 27

2.2 Metilfenidato, mais conhecido como Ritalina® ... 35

2.3 A Liquidez dos diagnósticos e a Patologização do corpo e da alma ... 39

2.4 Enquanto isso na Educação ... 44

3 A EDUCAÇÃO ATRAVÉS DOS TEMPOS ... 50

3.1 Antiguidade e Idade Média... 50

3.2 O Renascimento e a Modernidade ... 56

3.3 O Século das Luzes e Jean-Jacques-Rousseau ... 58

3.4 O Processo educacional no século XX ... 60

3.5 Outras Contribuições no século XX, Piaget e Vygotsky ... 62

3.6 A Pós — Modernidade ... 64

3.7 A Educação no Brasil ... 68

3.7.1 A questão pedagógica brasileira ... 68

3.7.2 Métodos Pedagógicos para o agora ... 70

3.8 Eles: os alunos ... 72

4 ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO ... 75

4.1 Análise do conteúdo das falas dos professores ... 75

4.2 Discussão ... 83

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 85

REFERÊNCIAS ... 90

ANEXO 1 TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ... 98

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INTRODUÇÃO

O Brasil é atualmente, o segundo país no mundo com maior consumo de Metilfenidato (Ritalina®), psicotrópico amplamente prescrito para o tratamento do

TDAH ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, sendo o único

fármaco disponível na rede pública de saúde, exceto quando se tratam de aquisições provenientes da Farmácia de alto custo (HECKERT e ROCHA, 2012).

Alguns eventos preocupantes vêm contribuir para esta observação, a de que alguma coisa não vai bem na rotina das escolas, onde crianças e jovens vêm sendo encaminhados excessivamente, aos ambulatórios médicos especializados em Psiquiatria e Neurologia, para diagnóstico e tratamento dos comportamentos inadequados e da indisciplina, ambos tidos pelos professores como responsáveis pelo fracasso escolar.

A intensificação dos encaminhamentos para o diagnóstico médico especializado com a emissão de laudos que possam definir condutas para problemas vivenciados na escola e fornecer subsídios para a intervenção pedagógica, parecem ser a saída para os educadores, ansiosos por novas práticas ao lidar com comportamentos diferentes e superar as dificuldades do aprender (HECKERT e ROCHA, 2012).

A desigualdade e a vulnerabilidade social que caracterizam a sociedade atual estão se refletindo no território escolar e produzindo nos alunos, comportamentos como agressividade, violência, abandono, desatenção, agitação, indisciplina e uso de drogas. Além de desencadearem tais comportamentos, também excluem os estudantes não alinhados ao sistema educacional vigente (FREIRE, 1997 apud SAVIANI, 2010).

Inversamente, tais comportamentos produzidos como fruto desta sociedade líquida, geram nas crianças e jovens, atitudes difíceis de serem conduzidas pelos pais, familiares e professores.

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Indisciplinadas, desequilibram a rotina escolar estabelecida pelos mestres, sendo por eles analisadas sem muitos critérios, enviadas aos rótulos e aos medicamentos fortes, com o propósito de aquietarem-se.

Alunos impacientes e confusos reagem de modo incompreensível pelos educadores, também vítimas do sistema educacional brasileiro, sucateado e abandonado.

Para os estudiosos da área da educação, o papel da escola é contribuir com a formação de pessoas que possam viver em sociedade; para isto, o trabalho pedagógico torna-se uma ferramenta que permite ao professor cumprir com seus objetivos. De acordo com Saviani (2010, p.181):

Formar o cidadão é formar o ser humano para viver em sociedade. Esse é um objetivo que deve ser perseguido pelos professores em cada atividade e em cada disciplina por eles conduzida no trabalho pedagógico com os seus alunos (SAVIANI, 2010, p.181).

Muito embora diversos profissionais da educação estejam dispostos a perseguir com afinco, a meta de formar cidadãos de bem, assim como proposto acima por Saviani, outros não se enquadram neste papel, por questões pessoais ou profissionais, ao sentirem que tal objetivo tem ficado mais distante a cada dia.

Minha pesquisa tem como base, questionar a produção indiscriminada de encaminhamentos por parte das escolas aos ambulatórios médicos, levando estudantes a serem diagnosticados sem critérios e medicados sem necessidade, na tentativa de homogeneizar os ânimos infantis e fabricar uma geração obediente.

A sociedade precisa analisar algumas questões essenciais para a compreensão destes fatos. É necessário saber se a falta de disciplina é um dado relevante na criação de conflitos entre professores e alunos, conhecer quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelos educadores no cotidiano das salas de aula, verificar se existem medos e angústias por parte dos profissionais ao lidarem com crianças agressivas, impulsivas ou desatentas, pesquisar se a disciplina é ou não, um

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fator intimidador da liberdade do estudante e qual o real significado de ser um aluno indisciplinado.

Por outro lado, saber qual o conhecimento que os educadores têm sobre os sintomas do que pensam ser a hiperatividade, seu tratamento e os efeitos colaterais do Metilfenidato (Ritalina®), refletir sobre o que os professores esperam quando encaminham seus alunos para a avaliação médica especializada e solicitam laudos médicos e entender o que sabem sobre a realidade atual, onde um número grande de crianças fazem uso de psicotrópicos potentes, tornam-se aspectos de extrema relevância na produção das bases e conceitos sobre o assunto.

Estas importantes reflexões ampliam os caminhos para que possamos acessar quais são as percepções dos professores sobre o tema e o real papel das equipes pedagógicas como possíveis facilitadoras do uso indiscriminado deste medicamento pelos estudantes.

Talvez, questões um tanto óbvias, mas não menos merecedoras do interesse científico, a partir do fato facilmente constatado de que as pessoas em geral, não reconhecem o óbvio.

Para Collares e Moysés (1994), a educação e outras áreas sociais vêm sendo rapidamente medicalizadas, destacando-se o fracasso escolar e o processo de aprendizagem como os principais alvos destes procedimentos.

O termo medicalização refere-se ao processo de transformar questões não médicas, eminentemente de origem social e política, em questões médicas, isto é, tentar encontrar no campo médico as causas e soluções para problemas dessa natureza (COLLARES e MOYSÉS, 1994, p. 25).

Para Meira (2012), a relação entre problemas neuropsiquiátricos, o não aprender e o não se comportar bem na escola, é um fato cada vez mais frequente tanto nas escolas como nos serviços de saúde, para onde são encaminhados os estudantes com queixas escolares. Os comportamentos escolares inadequados ao

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sistema estabelecido, não são necessariamente transtornos ou psicopatologias, podendo apenas explicitar demonstrações de criatividade. Teles (2014) afirma que a grande parte dos professores ainda obedece ao mecanicismo e ao racionalismo, neutralizando o seu próprio poder imaginativo e simbólico, assim como o poder criativo do aluno. Chamou a minha atenção o apontado por Freinet (2000) ao se referir ao papel da educação:

A sua grande preocupação é fazer engolir a massa de conhecimentos que irá encher cabeças ingurgitadas até a indigestão e a náusea. A arte deles é a de empanturramento e condicionamento, e também da medicação suscetível de tornar assimiláveis as noções ingeridas (FREINET, 2000, p. 55).

A isto acrescenta a sua percepção sobre a criança:

Essas crianças se sentiam, fora da gaiola, uma curiosidade insaciável; dentro já não tem fome. Você acusa, em vão, a falta de vontade, a inteligência reduzida, uma distração congênita de que os psicólogos e psiquiatras estudam as causas e os remédios (FREINET, 2000, p. 51).

A ideia desta pesquisa surgiu diante de dúvidas e das observações obtidas através dos atendimentos de crianças e adolescentes nos ambulatórios de psiquiatria das cidades de São João da Boa Vista e Tapiratiba, no interior de São Paulo.

Ao longo de cerca de dois anos, fui percebendo que a quantidade de crianças encaminhadas a estes ambulatórios, pelas escolas municipais aumentava progressivamente. Vinham acompanhadas pelos familiares e portavam consigo, relatórios pedagógicos produzidos pela equipe escolar. As famílias acompanhantes do processo, nem sempre concordavam com a postura da escola, demonstrando preocupação e dúvida, principalmente pela possibilidade de que seu filho ou filha necessitasse de medicação. Em outros casos, o motivo da preocupação familiar era o fato da criança (ou do adolescente) não apresentarem em casa, o mesmo

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comportamento relatado pela escola, porém, optando por seguir as orientações recebidas e comparecer ao atendimento médico sugerido.

As crianças encaminhadas ao atendimento psiquiátrico eram geralmente, estudantes do ensino fundamental I e II, indo às consultas acompanhadas pelos pais ou responsáveis. Levavam as solicitações emitidas pelas escolas, em busca de laudos que justificassem o diagnóstico e a conduta médica a ser adotada.

Diante da observação do aumento desta demanda específica em vista da suspeita do TDAH, passei a entrar em contato com as escolas, procurando discutir com os educadores e conhecer quais seriam seus principais questionamentos a respeito de cada aluno encaminhado. Dialoguei pessoalmente, ou através de contato telefônico, com professores, psicopedagogos e diretores, sendo que muitos demonstraram satisfação ao poder esclarecer possíveis dúvidas sobre o TDAH e seu tratamento.

Os profissionais mostravam-se angustiados e a principal expectativa estava relacionada ao uso e aos efeitos do medicamento geralmente prescrito.

Procurei compreender, através dos vínculos estabelecidos com a educação, como eram produzidos os fluxos de encaminhamento de alunos com suspeita de TDAH. As principais indagações à época, foram:

Como os sintomas eram percebidos pelos professores, quais eram e por quanto tempo eram observados?

Se os professores procuravam se aproximar do aluno, proporcionando acolhimento, conversar com as famílias, buscar outros métodos pedagógicos a serem praticados com o objetivo de melhorar o rendimento escolar de cada estudante?

O que esperavam do tratamento medicamentoso, dentre outros nós, antes de encaminhá-los ao especialista?

Compartilhando saberes, entendi que haviam equívocos a serem desfeitos, referentes ao assunto TDAH, sendo que os principais, em meu ponto de vista eram: as suspeitas em relação aos sintomas e,a esperança dos educadores de que o medicamento (Ritalina®) pudesse disciplinar os inquietos.

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Assim, fui percebendo que os professores encaminhavam ao atendimento médico especializado, praticamente todos os alunos que apresentassem comportamentos alterados nas salas de aulas com características de agitação, agressividade, desatenção, dificuldade em aprender, irritabilidade, e principalmente, os “fracassados” e os indisciplinados.

Das crianças cujas dificuldades e sintomas, estavam sendo discutidos entre a saúde e a educação, nem todas foram diagnosticadas com TDAH, do ponto de vista médico tradicional, embora tivessem sido encaminhadas como tal. Tais crianças poderiam receber outro tipo de tratamento, baseado numa abordagem não química.

Infelizmente, conforme aumentava o fluxo e o número de atendimentos provenientes das escolas municipais, diminuía a possibilidade de contato com os profissionais da educação a cada caso novo, como vinha sendo feito. A falta de tempo suficiente para realizar as consultas da psiquiatria geral e da psiquiatria infantil, tornou inviável a minha prática em discutir com a educação, a respeito de todas as crianças que provinham das escolas. Entretanto, o conhecimento conquistado através do debate interdisciplinar, foi determinante para que eu me decidisse a pesquisar o tema.

Deste modo, pude adquirir novos conhecimentos teóricos e práticos que me qualificassem cada vez mais, facilitando minha interação com cada pequeno cliente. Além de não me exceder, medicando crianças sem necessidade, minhas reflexões também buscavam entender se realmente existe de fato, um transtorno mental chamado TDAH ou se não se trata apenas de mais uma tentativa imposta pela sociedade e acompanhada pela medicina, de agrupar sujeitos com características comportamentais semelhantes, por motivos em comum.

Outra preocupação desencadeada pelo problema de estudo, em evidência na minha prática médica, consistia em evitar julgamentos precoces, partindo sempre de uma postura séria e respeitosa como profissional da saúde que ainda ignora muitos aspectos da rotina escolar, priorizando a escuta atenta aos relatos e dando voz aos professores, verificando suas ideias sobre a diversidade de comportamentos infantis com as quais se deparam no dia a dia, decorrentes de suas vivências em salas de aula.

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Os conflitos, dificuldades e dúvidas em relação aos alunos, quando discutidos, podem contribuir e agregar informações com objetivos claros de promover a conscientização dos profissionais envolvidos, além de alcançar a redução da medicalização dos escolares e promover a despatologização infantil. Adoecer e excluir alunos que não estão alinhados ao processo educacional, pode estar sendo o caminho mais fácil para mascarar grandes problemas da educação brasileira.

Para Saviani (2010), as ideias inovadoras da educação contemporânea passaram a considerar a disciplina nas salas de aula, como fator intimidador da liberdade dos alunos, preconizando que o processo disciplinador deveria emergir espontaneamente de cada um. O fruto de tal mudança trouxe consigo, o agravamento da violência de alunos contra professores e a dificuldade que estes enfrentam ao reagir.

Este autor preconiza que a escola precisa voltar a ser um espaço de aprendizagem e convivência, com regras e normas suficientes para o bom andamento dos trabalhos, pois, existe um objetivo a ser alcançado através da difícil função de conduzir pedagogicamente a formação de estudantes.

Por ainda acreditar que é possível vencer os obstáculos que vêm se impondo às boas práticas de cidadania e cultivar sementes para o amanhã, considero a partir deste momento, determinado meu tema de estudo.

Determinei alguns objetivos a serem alcançados através da pesquisa e a escolha da metodologia passa a ser então, o ponto fundamental para que o assunto possa ser pesquisado com rigor.

Em minha prática profissional e acadêmica, somente havia tido contato com métodos quantitativos, pois, em Medicina, geralmente a pesquisa quantitativa é a primeira opção.

Para Ball (2010), temos que compreender e usar os métodos, ao invés de segui-los, sendo competentes, receptivos e não apegados aos processos formais. Sendo assim, decidi me lançar e buscar entendimento a respeito da melhor forma de investigar o tema escolhido, encontrando nos métodos qualitativos, boas

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possibilidades de viabilizar minha investigação, utilizando-me de instrumentos até então por mim, desconhecidos.

Especificamente, dentre os métodos qualitativos, os grupos focais se destacam como um interessante instrumento de coleta de informações.

Os grupos focais são pequenos grupos de pessoas são mobilizados para trazer à tona suas reações de agrado ou não sobre determinado assunto ou a percepção sobre algum problema em foco (BERINGER et al., 2012).

Para chegar às metas propostas e dar visibilidade ao assunto, alguns questionamentos serviram como referência para a reflexão e análise:

Os educadores realmente, tem encaminhado com mais frequência, estudantes indisciplinados, impulsivos, agitados e/ou desatentos para avaliação médica especializada, em neurologia ou psiquiatria?

Os educadores têm indagações suficientes sobre TDAH e sobre seu tratamento e geralmente, sabem como diferenciar alunos verdadeiramente hiperativos/desatentos daqueles que são indisciplinados/impulsivos/desatentos por outras causas?

A educação brasileira oferece respaldo técnico e capacitação suficiente para que os educadores tenham conhecimento e criem estratégias facilitadoras que possam auxiliar na identificação dos estudantes com características hiperativas?

De modo a produzir reflexões consistentes sobre as questões acima mencionadas, fez-se a pesquisa com professores do ensino fundamental I e II, em dois municípios do estado de São Paulo.

Para a coleta de dados foram realizados grupos focais e a análise das informações contou com o método de análise de conteúdo de Bardin.

Diante do exposto, o trabalho encontra-se dividido em 5 capítulos, além da

Introdução e dos Objetivos.

O primeiro Capítulo, denominado “Processo Metodológico”, descreve o método utilizado, sua escolha e concretização, criteriosamente baseadas nos conceitos teóricos disponíveis; ainda, quais os caminhos percorridos e quais os

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procedimentos e as estratégias, necessários para a construção de uma pesquisa fidedigna e de qualidade.

O segundo Capítulo, “Panorama Inicial”, evidencia os principais conceitos do TDAH para a literatura médica e sua história ao longo do tempo. O capítulo ainda trata dos principais aspectos da droga Metilfenidato ou Ritalina®, assim como da facilidade com que são realizados na sociedade contemporânea, encaminhamentos, diagnósticos médicos, medicalização de pessoas, adultos e crianças, e como estes fatores se articulam com a escola.

O terceiro Capítulo, intitulado “A Educação através dos Tempos”, promove uma breve revisão sobre a história da educação, da Grécia antiga até o agora, elencando tópicos e atores importantes a serem discutidos e procurando estabelecer para o leitor, o embasamento da pesquisa através das principais referências. Interessante apreciar todo o capítulo, especialmente os pontos sobre os grandes educadores, Dewey, Montessori e Freinet, tópicos seguidos pelas contribuições de Piaget e Vygotsky. O Capítulo finaliza apontando para as principais nuances da Educação brasileira, assim como, caracterizando os maus alunos de hoje. Para Aquino (1996), os maus alunos são aqueles estudantes, novos sujeitos históricos, com outros desejos e valores, que vem ocupando as escolas, arcaicas e despreparadas para acolher novas formas de existência social, transformando o perfil escolar já estabelecido e enraizado.

O Capítulo 4, nomeado “Discussão e Análise de dados”, descreve os resultados obtidos, já categorizados e analisados, aplicando-se a Análise de conteúdo de Lawrence Bardin.

O Capítulo 5, “Algumas Considerações Finais”, reflete sobre os dados, no intuito de contribuir com o futuro da educação e com a desmedicalização infantil, envolvendo profissionais e grupos interdisciplinares, acreditando no nascimento de novas ideias e perspectivas.

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OBJETIVOS

O objetivo fundamental do estudo foi identificar as percepções que o professor do ensino fundamental I e II tem do uso do Metilfendato (Ritalina®) pelos escolares.

Os objetivos específicos considerados essenciais foram:

1) Identificar o conhecimento possuído pelo professor sobre TDAH, sintomas e comportamentos característicos.

2) Verificar os critérios utilizados pelo professor para o reconhecimento do aluno com TDAH.

3) Discutir a atual situação do sistema educacional brasileiro. 4) Identificar as dificuldades vivenciadas pelo professor no cotidiano das salas de aula.

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1 PROCESSO METODOLÓGICO

Dadas as caraterísticas do objeto de estudo, relacionado com o aumento da frequência de encaminhamentos dos estudantes pelos professores para o serviço de psiquiatria; o nível de conhecimento sobre o TDAH é suficiente por parte dos professores; estes contam com respaldo técnico e capacitação suficiente. Para responder a estas e outras indagações a pesquisa qualitativa se coloca como a mais adequada para conseguir atingir os objetivos propostos. Dentre estes, pretendeu-se verificar as dificuldades vivenciadas pelos professores na sala de aula; compreender seu grau de conhecimento sobre o TDAH; analisar o perfil dos estudantes encaminhados ao serviço de psiquiatria, entre outros.

A abordagem metodológica qualitativa prioriza a profundidade e a riqueza de informações conferindo personalidade aos dados e contribui para que seja possível, no campo de pesquisa, uma representação bem fundamentada da realidade a ser estudada.

Para Minayo (2010), a pesquisa é um trabalho artesanal e realiza-se fundamentalmente por uma linguagem baseada em conceitos, hipóteses, métodos e técnicas, e que se constrói com ritmo próprio e particular. Este ritmo é considerado um ciclo de pesquisa, ou seja, um processo de trabalho em espiral que se inicia com uma pergunta e termina com uma resposta, produzindo novas indagações.

A autora preconiza que o processo de trabalho em pesquisa qualitativa pode ser dividido em 3 etapas ou fase exploratória, trabalho de campo e análise e tratamento do material empírico e documental, e as descreve sequencialmente.

A fase exploratória consiste em produzir o projeto de pesquisa e de todos os procedimentos necessários para preparar a entrada em campo, definir e delimitar o objeto, desenvolvê-lo teoricamente, colocar hipóteses ou pressupostos para seu encaminhamento, escolher e descrever os instrumentos de operacionalização da pesquisa, pensar o cronograma de ação e fazer os procedimentos exploratórios para a escolha do espaço e da amostra.

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O trabalho de campo consiste em colocar em prática tudo o que foi idealizado na primeira fase, combinando instrumentos de observação, entrevistas ou outras modalidades de comunicação e interlocução com os pesquisados, levantamento de material documental e outros.

A terceira etapa consiste em analisar, compreender e interpretar os dados empíricos, articulando-os à teoria que fundamentou o projeto ou com outras leituras cuja necessidade foi dada pelo trabalho de campo.

O tratamento do material nos conduz a uma busca da lógica peculiar e interna do grupo que estamos analisando, sendo a construção fundamental do pesquisador.

Neste ponto, torna-se relevante retornar à etapa do trabalho de campo para reforçar a importância de sua conceituação na pesquisa qualitativa, recorte especial que relaciona a abrangência da teoria que corresponde ao objeto de investigação, quando se trata de compreender o vínculo entre professores e alunos, por exemplo.

A pesquisa social trabalha com pessoas e suas perspectivas, produtos e ações, fazendo parte da intersubjetividade de interação com o pesquisador, resultando não na realidade concreta, mas sim numa construção com suas hipóteses e pressupostos teóricos, quadro conceitual, metodologia, observações e relações com os pares (MINAYO, 2014).

Um grupo de pesquisa social expõe a emergência de uma realidade parcial e subjetiva, mas que naquele momento, carrega consigo o poder de contextualizar o todo e constitui uma etapa crucial do trabalho de pesquisa qualitativa, quando a interação entre o pesquisador e os sujeitos pesquisados é vital.

“O corpo e o sangue da vida real componham o esqueleto das construções abstratas” (MALINOWSKI, 1975b, p. 37 apud MINAYO, 2014, p. 202).

Para Turato (2005), tem-se deparado de forma crescente com a busca pela pesquisa qualitativa no campo da saúde, tendo este método sendo bem aceito ultimamente, pelos jornais e revista médicas, diferentemente de épocas passadas

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quando estes estudos eram rejeitados e considerados não-científicos, como se fossem apenas historinhas, sem preocupações quanto ao rigor.

Este autor ainda evidencia o quanto o método qualitativo, em sua essência, pode contribuir com o aprofundamento e com o entendimento do setting e do processo saúde-doença.

Os métodos qualitativos devem ser utilizados quando o objeto de estudo não é bem conhecido. Por sua capacidade de fazer emergir aspectos novos, de ir ao fundo do significado e de estar na perspectiva do sujeito, são aptos para descobrir novos nexos e explicar significados. De fato, durante a pesquisa, frequentemente emergem relações entre variáveis, motivações e comportamentos completamente inesperados, que não surgiriam utilizando um questionário estruturado, cuja característica técnica é a uniformidade do estímulo (TURATO, 2000, p. 4).

Desde o início, dialogar com os educadores pareceu ser o caminho certo a ser seguido, além de muito interessante, pois tomar-se-ia conhecimento das dúvidas e questionamentos que os afligia em salas de aula.

Embora, o fato de gravar suas contribuições em áudio tenha causado algum desconforto, no geral, isto não foi motivo para que eles evitassem de discutir seus pontos de vista durante os encontros; os métodos qualitativos permitem que o pesquisador possa lidar com possíveis entraves e os resolva como possível.

Não houveram grandes dificuldades, a não ser conseguir reunir todos os sujeitos da pesquisa na mesma hora e lugar, devido às obrigações profissionais dos mesmos. A não ser essa, professores e professoras foram solícitos, assim como as diretoras de ensino e demais profissionais que participaram na organização dos encontros.

Estabelecidas as etapas e alinhando o estudo ao método escolhido, o processo da pesquisa é agora delineado para que o leitor possa compreendê-lo.

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e II dos Municípios de São João da Boa Vista e Tapiratiba no Estado de São Paulo, homens ou mulheres, de qualquer idade, cujos nomes foram preservados.

Foram localizados pelas Diretorias de Educação de cada Município respectivamente através de contato coletivo, notificados sobre o tema, quais os principais objetivos da pesquisa, e se participariam voluntariamente dos grupos para discussão.

A sessão do grupo focal é entendida como a atividade realizada pelo pesquisador ou avaliador que conduz o debate com um conjunto de pessoas, tendo por finalidade coletar opiniões sobre um fenômeno ou tópico. Durante um tempo pré-determinado e em um ambiente específico, de 8 a 12 participantes discutem sobre um tema (BYERS & WILCOX,1991).

Para Morgan (1996), a estratégia de pesquisa de grupo focal pode ser definida como uma técnica de coleta de dados através de interação grupal, em um tópico definido pelo pesquisador.

Uma vez reunidos os participantes do grupo, o pesquisador não pode abdicar de sua responsabilidade sobre os efeitos que a sua participação poderá causar na discussão (SCHOSTAK & BARBOUR, 2015).

Conforme é colocado por Latour (2000):

Quem está certo? Em quem deve o leitor acreditar? A resposta a essa pergunta não está em nenhuma das afirmações, mas naquilo que todos irão fazer com elas daí por diante. (. . .) o destino das coisas que dizemos e fazemos está nas mãos de quem as usar depois (. . .). Atentando apenas para eles, para suas propriedades internas, ninguém consegue decidir se são verdadeiros ou falsos, eficientes ou ineficientes (. . .). Essas características só são adquiridas pela incorporação em outras afirmações, outros processos e outras máquinas (LATOUR, 2000, p. 51-52).

A objetividade de um texto é garantida pela energia que ele traz a cada palavra, buscando manter o que há de subliminar nas conexões estabelecidas. Não se deve abordar um discurso coletivo como uma estrutura dura e apenas

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transcrevê-lo no papel. Faz-se necessário, seguir seus movimentos e alinhá-transcrevê-los aos instrumentos textuais disponíveis. Desta maneira, conforme aborda Latour (2000), busca-se criar um texto articulado ao evento estudado, mas não um relato fiel da realidade pesquisada (NOBRE e PEDRO, 2010).

Teorias são necessárias para explicar um fenômeno, um processo ou um conjunto deles, mas nem mesmo a soma de todas elas, seria capaz de compreender todos os objetos de pesquisa. Precisamos delas para o embasamento e a organização da malha de conhecimento e dúvida. E precisamos do método para alinhavar os dados colhidos desta realidade, trata-los e conectá-los aos saberes teóricos, sem nos apegarmos às estratégias puramente materialistas ou à busca pelo poder.

A análise qualitativa é a descoberta dos códigos sociais a partir de falas, símbolos e observações, sendo muito mais do que apenas a classificação da opinião dos informantes (MINAYO, 2011). Normalmente, esta análise é realizada através de técnicas específicas, sugeridas por diferentes autores, como por exemplo Bardin (1997) e Latour (1994).

O número de 10 educadores, homens e mulheres adultos em cada município, foi escolhido por se tratar de uma quantidade de profissionais suficiente para desencadear discussões produtivas.

Todos os educadores eram professores do ensino fundamental I e II, da rede municipal de ensino do estado de São Paulo.

As discussões foram gravadas em áudio e os conteúdos, totalmente transcritos sem edição pela pesquisadora, para posterior análise. Os discursos foram então catalogados e analisados pela técnica de análise de conteúdo de Bardin (1997).

A coleta de dados se deu em três encontros ou grupos focais, sendo dois no município de Tapiratiba e um encontro, em São João da boa Vista.

Estes ocorreram após aprovação e liberação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com parecer favorável CAAE 55953816.8.0000.5404, conforme o anexo I.

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No município de Tapiratiba, foram realizados dois encontros por decisão dos próprios participantes que optaram por dividirem-se por grupo de atuação, ensino fundamental I e II.

Todo o processo deste trabalho, especialmente as etapas referentes à coleta de dados só se realizaram após a leitura, esclarecimento por parte da pesquisadora e posterior assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), termo este que procurou levar a cada um dos participantes, todo o conhecimento necessário para que suas dúvidas fossem sanadas e para que o sigilo, a seriedade e a confiabilidade do estudo permanecessem intactos

Para iniciar a discussão no grupo focal, foi colocada uma primeira questão disparadora aos participantes e suas respostas foram consideradas até que o assunto se esgotasse; após o esgotamento do mesmo, novo questionamento era disparado e assim por diante. Este processo durou cerca de 90 minutos em cada um dos três encontros.

2 PANORAMA INICIAL

2.1 TDAH, Principais Conceitos para a Literatura Médica

O quadro clínico que hoje caracteriza o TDAH surgiu em 1902 com George Fredrick Still, estudando o comportamento de crianças agressivas, desafiadoras e excessivamente emotivas.

Segundo Still, esses pequenos pacientes apresentavam um problema maior e crônico na determinação de atitudes impulsivas, e as rotulou como portadoras do defeito do controle moral, comportamento associado à forma como tais crianças não aderiam às regras sociais impostas na época (SILVA et al., 2012).

Sadock e Sadock (2011) afirmaram que crianças impulsivas, desinibidas ou com danos neurológicos naquela época, foram todas incluídas num quadro de hiperatividade, sendo que em 1917, o médico Von Economo fez a primeira descrição clínica dessa síndrome, quando se deparou com uma série de casos em instituições

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psiquiátricas. Tais casos, segundo ele, não faziam parte de nenhuma outra síndrome conhecida.

Em 1917 e 1918, médicos americanos trataram crianças que apresentavam sintomas e comportamentos muito semelhantes àqueles descritos por Still em 1902, sobreviventes de uma pandemia de encefalite e que permaneceram com sequelas como prejuízos na atenção, no controle dos impulsos e na regulação da atividade corporal (SILVA, 2009).

Os sintomas que hoje caracterizamos como componentes do quadro clínico de TDAH, foram também observados nos anos de 1940, denominados naquele tempo, como Lesão cerebral mínima, hipótese diagnóstica modificada posteriormente para

Disfunção cerebral mínima em 1960, mas sem relação causal aparente (LEGNANI e ALMEIDA, 2008).

O conjunto de sintomas pertencentes à Disfunção cerebral mínima incluía má coordenação, incapacidade de aprendizagem e labilidade emocional, porém, sem danos neurológicos específicos.

Várias hipóteses etiológicas foram levantadas e dentre elas, a genética, envolvendo excitação neuronal anormal e incapacidade de modular a emoção. Assim como varias teorias sobre o assunto apoiadas na observação de que medicações estimulantes ajudavam a aumentar a atenção e sustentá-la por um período de tempo maior (LEGNANI e ALMEIDA, 2008). Observa-se que o conjunto de sinais e sintomas comportamentais que hoje constitui o TDAH, se ampliaram ao longo do tempo. Caraterísticas e sintomas partiram do quadro sindrômico que caracterizou a Disfunção cerebral mínima e hoje, é descrito como um transtorno psiquiátrico (ORTEGA et al., 2010).

O TDAH não é propriamente um transtorno de aprendizagem, mas causa dificuldades escolares devido aos sintomas envolvidos. Evolutivamente, lembremos que a atenção é uma função psíquica que possibilita a focalização da consciência em eventos ou atividades úteis para a sobrevivência. Portanto, qualquer prejuízo neste processo dificulta o aprendizado e a aquisição de informações, tornando o indivíduo

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vulnerável às variações do meio ambiente e aumentando sua exposição aos fatores de risco comuns à vida cotidiana (ASSUMPÇÃO JR., 2008).

No DSM-V, o TDAH foi incluído aos transtornos do neurodesenvolvimento (seção II), assim como os transtornos de aprendizagem, porém, separadamente.

Para a Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA, 2016), o TDAH é um transtorno neurobiológico de causas genéticas, que incide na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida, caracterizando-se por sintomas de desatenção, inquietude, impulsividade e sendo reconhecido oficialmente por vários países e pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Nos Estados Unidos, segundo a ABDA, portadores de TDAH são protegidos pela lei quanto a receberem tratamento diferenciado na escola e o transtorno é considerado o mais comum entre crianças e adolescentes encaminhados para serviços especializados.

Ainda para esta Associação, ocorre em 3 a 5% das crianças de várias regiões do mundo, sem diferenças quanto à prevalência numa região específica e em mais da metade dos casos, seus sintomas acompanham o indivíduo até a vida adulta, embora de modo mais brando. As principais causas envolvidas ao TDAH são: hereditariedade, substâncias ingeridas na gravidez como a nicotina e o álcool, sofrimento fetal, embora a relação ainda não seja clara, e a exposição ao chumbo.

Segundo Andrade et al. (2011), o TDAH é uma desordem neurobiológica com prevalência estimada na população geral de 4 a 12%, na faixa etária de 6 a 12 anos. Caracteriza-se por dificuldades em estabelecer um foco, sustentar níveis suficientes de atenção capazes de modular a aquisição cognitiva e controlar comportamentos impulsivos. Como consequência, haverá prejuízo global nas atividades que requerem atenção, produzindo comportamentos impulsivos, mal adaptados e inconsistentes para a idade e para o desenvolvimento esperado.

Os autores defendem que a desordem está no sistema neurobiológico executivo, e não no comprometimento primário da inteligência e da cognição, sendo variável a proporção entre os sexos. Todavia, vem sendo observado um aumento da incidência dos casos em meninas (ANDRADE et al., 2011).

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Segundo as pesquisas de Assumpção Jr. (2008), 3 a 6% das crianças em idade escolar apresentam sintomas de TDAH e demostram a persistência do transtorno na adolescência em até 70–80% dos casos.

Apesar de todos os exames que possam complementar a investigação, o diagnóstico é clínico segundo a American Academy of Child and Adolescent Psychiatry, obedecendo aos critérios do (DSM-V) e do Código Internacional de Doenças em sua décima edição (CID 10) segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-V), o TDAH foi incluído aos transtornos do neurodesenvolvimento (seção II), assim como os transtornos de aprendizagem, porém, separadamente.

Teixeira (2013) reafirma que não existem exames laboratoriais ou radiológicos que possam evidenciar as causas do TDAH. A investigação clínica com a criança, a família e a escola normalmente trazem os dados necessários e relevantes para o diagnóstico.

Os critérios para o diagnóstico do TDAH serão descritos abaixo, sendo que o paciente deve apresentar 6 ou mais sintomas em qualquer das categorias, desatenção e/ou hiperatividade (WHITBOURNE e HALGIN, 2015).

Os principais sintomas de desatenção são: com frequência, não dá atenção aos detalhes e comete erros no trabalho escolar; apresenta dificuldades para manter o foco em atividades recreativas; distraído quando alguém lhe fala; não segue instruções e deixa de terminar as tarefas; desorganizado; reluta em esforçar-se mentalmente de modo contínuo; perde coisas necessárias para as tarefas; desleixado.

Os sintomas de hiperatividade/impulsividade, no caso de indivíduos com 17 anos ou mais são os descritos abaixo, sendo que dentre eles serão escolhidos apenas cinco sintomas: mexe as mãos ou os pés; levanta-se da cadeira; corre onde é inadequado; não faz silencio; movimenta-se excessivamente; responde antes que as perguntas sejam completadas; não espera e intromete-se nos assuntos alheios (DSM-V, 2014).

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Em acordo com a literatura médica, desatenção, hiperatividade e impulsividade antes dos 12 anos, precisam causar prejuízo em dois ou mais contextos de vida da criança como na escola e na família, por pelo menos 6 meses em grau evidente e não serem melhor explicados por outro transtorno (WHITBOURNE e HALGIN, 2015).

Os sinais podem ser observados desde os 3 anos de idade, mas o diagnóstico só poderá ocorrer a partir do início do processo escolar, com o relato dos professores, fontes de informação para a avaliação das dificuldades de aprendizagem, comportamento e compreensão do conteúdo (SADOCK e SADOCK, 2011).

Nota-se de acordo com os autores acima, que os dados provenientes da escola são prioritários para o diagnóstico de crianças agitadas e desatentas na rotina escolar.

Andrade et al. (2011) reafirma que há ampla literatura sobre prevalência, presença ou não de comorbidades, perfil de genes, achados neuropsicológicos e de neuroimagem, todos sustentando que o TDAH é um transtorno neurobiológico com forte influência genética.

Contrariando esta ideia, Legnani e Almeida (2008) defendem que o TDAH surgiu sem pesquisas específicas e com a nítida meta de sanar conflitos na sociedade americana, quando filhos de políticos e indivíduos abastados passaram a apresentar problemas no rendimento escolar, precisando se diferenciar daquelas crianças provenientes das camadas mais pobres.

O diagnóstico (Disfunção cerebral mínima) ganhou aceitação social e assim, crianças portadoras dessa alteração puderam ser diferenciadas daquelas com deficiência intelectual ou de outras, socialmente excluídas por privação cultural. O termo passou então, a ser usado para explicar o fracasso escolar dos alunos provenientes das camadas empobrecidas ou das minorias étnicas.

Desta maneira, razões não médicas para novos diagnósticos também podem ser criadas de acordo com demandas puramente sociais e analisadas como fatores determinantes à origem de novas doenças.

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Salientando que o que se conhece a respeito do TDAH é bastante restrito em nosso país e dominado por poucos, este saber é divulgado ao público leigo sem muitos critérios.

De forma preocupante, sites de associações tentam ensinar aos professores como triar alunos e prever um diagnóstico diferencial entre a inquietação, desatenção, agressividade e o TDAH, por meio da utilização de instrumentos sem critérios científicos.

A este fenômeno, Caliman (2006) nomeou “biologização moral da atenção” (CALIMAN, 2006 apud HECKERT e ROCHA, 2012).

Para Gomes et al. (2007), no Brasil é insuficiente o conhecimento acerca do TDAH, tanto para a população geral, quanto para os profissionais envolvidos no seu diagnóstico e tratamento. O pesquisador complementa, alegando que embora médicos e psicólogos tenham demonstrado ser os grupos com maior nível de conhecimento, ainda há lacunas e contradições explicitadas nos relatos destes profissionais acerca do tema. Também sugere o estabelecimento de um programa de capacitação profissional, assim como um efetivo acompanhamento dos pais e das escolas, de forma a garantir o diagnóstico correto e o tratamento bem-sucedido dos portadores.

Para Andrade et al. (2011), apenas 9% da população geral disseram ter ouvido falar do transtorno. Entre os profissionais, 59% dos educadores, 43% dos psicólogos, 55% dos pediatras, 53% dos neurologistas e 42% dos psiquiatras ainda acreditavam que o TDAH ocorresse devido à ausência dos pais.

Frances (2016) demonstra que 83% das crianças e adolescentes podem se encaixar num diagnóstico de transtorno mental até os 21 anos, de acordo com os dados obtidos pelos DSM.Isto quer dizer que cada vez mais, sintomas e sinais vem sendo incluídos aos manuais diagnósticos, especialmente na psiquiatria, teoricamente para a facilitação do manuseio pelos médicos usuários.

Para este autor, principalmente os psiquiatras infantis, vão além dos limites ao criar sintomas novos para seus pacientes.

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A sociedade cria os problemas e a medicina cria as estratégias para discipliná-los; tais mecanismos, ao contrário do que se possa pensar, não demonstram a evolução dos saberes, mas sim, a construção de estruturas sociais que visam o ganho financeiro (GOETZCHE, 2016).

Collares e Moysés (1994) contribuem, utilizando a palavra patologização, ao fenômeno que se dá pelo aumento progressivo de novos diagnósticos, da vida diagnosticada que foge aos limites da prática médica. Faz-se presente, um processo que ativa e intensifica os especialismos e as práticas de desqualificação do saber fazer dos profissionais da educação.

Sintomas novos geram doenças e medicamentos novos, fatos que vêm de encontro ao problema pesquisado, pois para Guarido, em 2008, o diagnóstico tem sido a salvação para um não-saber dos educadores frente às situações que surgem no cotidiano escolar, amenizando tensões diante das quais os mesmos não sabem como intervir.

Os professores vêm se colocando como uma espécie de auxiliares do saber médico-psiquiátrico, e se contentando em observar o comportamento de crianças e jovens, identificando precocemente anomalias, distúrbios e riscos, orientando as famílias para a busca de intervenção técnica (HECKERT e ROCHA, 2012).

Caliman (2010), discute que ao longo da história médica, a hiperatividade, a impulsividade e a desatenção criaram laços entre si, sendo que cada um destes sintomas é considerado como o mais importante em diferentes momentos; pontualmente, nenhum deles foi definido como o sintoma diretor da síndrome, sem considerar que tanto a hiperatividade, a impulsividade e a desatenção, podem se desdobrar em outros quadros mais específicos.

Dumit (2000) apud Caliman (2010) acredita que a validação do TDAH como um diagnóstico médico está intimamente relacionado à construção da legitimidade científica da neurologia e das tecnologias em imagem cerebral, constituindo uma desordem sociomédica ou biomental.

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Ainda é relevante conhecer que os quadros de TDAH estão sendo relacionados ao fracasso escolar, promovendo o controle, a medicalização infantil e a imposição do poder institucional sobre as crianças indisciplinadas.

Analistas sociais preconizam que a história do TDAH vem se concretizando como aquela dos distúrbios produzidos pelos excessos de informações, consumo material sem sentido, perda da identidade, perda da autoridade da família, história típica do momento atual.

Uma pesquisa alarmante em Matos et al. (2012) calcula que “somente” 16,2 a 19,9% dos indivíduos afetados pelo TDAH no Brasil recebiam tratamento de primeira linha para o transtorno (ou seja, metilfenidato ou outros psicoestimulantes) em 2009 e 2010, sendo que este número calculado de forma conservadora, superestimou o número de pessoas que recebiam tratamento contínuo e subestimou o número de indivíduos com TDAH.

O número real de hiperativos, segundo a pesquisa supracitada, é provavelmente ainda menor, pois estes estimulantes também têm outras indicações, menos frequentes, de forma que as preocupações de que um número excessivo de indivíduos seria tratado com estimulantes para o TDAH em nosso país carecem ainda de base científica. Mais campanhas educativas são necessárias para identificar a proporção significativa dos indivíduos com TDAH não tratados no Brasil (MATOS et

al., 2012).

Observa-se que de modo dramático, alguns pesquisadores ainda acreditam que o TDAH é um transtorno sub diagnosticado, carecendo de meios para que novos portadores sejam encontrados e recebam tratamento medicamentoso. Profissionais da saúde, embasados em dados como estes, tornam-se receptivos e ávidos por diagnosticar novos casos, legitimando a patologização dos indivíduos incapazes de se enquadrar às expectativas morais, econômicas, sociais e políticas da sociedade capitalista (CALIMAN, 2010).

A busca pelos casos não tratados se torna mais evidente do que o seguimento dos casos tratados. Procura - se ativamente produzir e eliminar a doença, higienizando a sociedade e ampliando o campo de clientes medicados.

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A pergunta levantada pela Associação Americana de Psiquiatria é bastante curiosa e intrigante. Por um lado, porque questiona a realidade do distúrbio enquanto doença, seja no sentido epistemológico, seja pelo propósito de preservar o saber psiquiátrico de acusações relacionadas a outros distúrbios, síndromes, transtornos, desordens, que poderiam ser, da mesma forma produzidos por uma série de estratégias que não apenas a sugestionabilidade. Por outro lado, porque aceita, mesmo que involuntariamente, a possibilidade de que uma doença possa ser produzida artificialmente (AMARANTE e TORRE, 2010, p.156).

Uma patologia só pode ser entendida através da análise de sua biologia, das aspirações científicas em torno de sua pesquisa, das organizações que a financiam, do seu tratamento, das mudanças em suas práticas investigativas e das formas como a sociedade e seus indivíduos as experienciam (GOETZSCHE, 2016).

Moysés (2001) sustenta que devemos romper com as perspectivas individualizantes e biologizantes, entrando no campo da reflexão crítica sobre os valores e sobre as múltiplas determinantes que estão envolvidas ao processo saúde doença.

Guarido (2008) em sua dissertação, discute que o diagnóstico tem sido a salvação para um não-saber dos educadores frente às situações que surgem no cotidiano escolar, amenizando tensões diante das quais os mesmos não sabem como intervir.

Ao tudo, cabe apontar a necessidade de rever o que se sabe sobre a síndrome e sobre as formas de tratamento que possam esclarecer o uso o não do medicamento e ao mesmo tempo permita oferecer maior informação aos profissionais da educação sobre o TDAH, para que este não seja utilizado como uma salvação do não-saber.

2.2 Metilfenidato, mais conhecido como Ritalina®

No Boletim Brasileiro de Avaliação de Tecnologias em Saúde ou BRATS (2014), o Metilfenidato é um estimulante moderado do sistema nervoso central (SNC)

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indicado como coadjuvante às intervenções psicológicas, educacionais e sociais no tratamento do TDAH.

Acredita-se que o fármaco interfira com o metabolismo dos Neurotransmissores, possibilitando um aumento da quantidade e disponibilidade de dopamina e norepinefrina na fenda sináptica gerando efeito excitatório neuronal e consequentemente, aumento da atenção e diminuição da inquietação em crianças agitadas.

O Metilfenidato é comercializado no Brasil com os nomes: Ritalina®, Ritalina LA® e Concerta®, administrados por via oral e possuindo diferentes perfis de liberação, imediata ou prolongada.

O tratamento farmacológico é considerado a primeira linha de abordagem para o TDAH, segundo a literatura médica.

Os estimulantes do sistema nervoso central dentre os fármacos, são considerados a primeira escolha para o tratamento: a Dextroanfetamina para crianças a partir de 3 anos e o Metilfenidato, dos 6 anos em diante.

A ligação do Metilfenidato (Ritalina®) com o TDAH e a sua indissociabilidade, foi uma associação construída ao longo dos anos 1980 e 1990.

Assim como vem crescendo a quantidade de critérios para o diagnóstico do TDAH, cresce vertiginosamente o número de prescrições (ORTEGA et al., 2010). A Ritalina®, nome comercial do Metilfenidato ficou conhecida pela sua associação ao TDAH, mas é comercializada desde 1950 na Suíça, Alemanha e Estados Unidos, indicada para tratar fadiga em quadros psiquiátricos e cansaço crônico em adultos ou idosos, mesmo sem fundamentação diagnóstica. Nessa mesma época, o uso de tranquilizantes menores também começa a ser prescrito para o tratamento de crianças com problemas de comportamento (ORTEGA et al., 2010). Entretanto, logo foi percebido que os estimulantes ajudavam a aumentar a atenção e sustentá-la por um período de tempo maior; por isso começaram a ser prescritos para as síndromes hiperativas (LEGNANI & ALMEIDA, 2008). A Ritalina® está em

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evidência recentemente, pela sua associação ao TDAH. Nos anos 50, era um medicamento que não tinha um diagnóstico como destino certo.

Mas a partir da década de 50, a psiquiatria expandiu seu horizonte de atuação, com a revolução psicofarmacológica. Descobertos há mais de meio século, os psicofármacos ganharam espaço no tratamento na saúde mental nos últimos trinta anos, renegando a psicanálise (um dos poucos resquícios de conversação entre áreas da psicologia e medicina), rompendo com o diálogo até então existente entres essas duas áreas. Esse rompimento se deve a vários fatores, entre eles o de que os psicofármacos vêm atender ao rigor metodológico científica, fundamentado na biologia e na farmacologia, com rapidez e eficácia, bem de acordo com as exigências do contexto atual, nesse sentido, a psicanálise diverge, pois não atende a tais demandas de velocidade da sociedade (SILVA et al., 2012, s/p.).

Hoje sua utilização se fundamenta no tratamento da hiperatividade, assim como seu uso e confiabilidade passaram a referenciar e legitimar o diagnóstico, que passou a ser identificado também em adolescentes e adultos.

As evidências sobre a eficácia e segurança do tratamento com o metilfenidato em crianças e adolescentes, em geral, têm baixa qualidade metodológica, curto período de seguimento e pouca capacidade de generalização. Além disso, a heterogeneidade entre os estudos foi um dos problemas mais frequentes nas revisões sistemáticas selecionadas (BRATS, 2014, p. 9).

No Brasil, o Metilfenidato (Ritalina®) foi introduzido comercialmente em 1998 e num curto espaço de tempo, teve um aumento drástico de sua produção, demandando cuidado e reflexão sobre as possíveis causas deste crescimento absurdo (ORTEGA et al., 2010).

No Brasil, o uso de metilfenidato também tem crescido ao longo dos anos. Tendo sua comercialização aprovada desde 1998 (ANVISA, 2012), o consumo nacional em 2000 era de 23 kg. Segundo documento da ONU, apenas seis anos depois, o Brasil fabricava 226 kg e importava outros 91 kg

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do medicamento (LIMA, 2005). Mais recentemente, a ANVISA divulgou que em 2011 as vendas de metilfenidato chegaram a mais de 413 kg do produto (ANVISA 2012). O gasto estimado das famílias brasileiras com o produto, nesse mesmo ano, foi de R$ 28,5 milhões, o que equivale a um valor de R$ 778,75 por cada mil crianças com idade entre seis e 16 anos (CALIMAN e DOMITROVIC, 2013, p. 886).

Entre 2002 e 2003, a quantidade de Metilfenidato (Ritalina®) produzida duplicou e no período de 2002 a 2006, a produção deste medicamento cresceu mais de 400% (SILVA et al., 2012).

O Brasil figura como o segundo país de maior consumo deste psicotrópico largamente prescrito para tratamento do TDAH e discutem o fato de ter se intensificado por parte dos profissionais da educação, a demanda para a realização de diagnóstico médico e emissão de laudos que descrevam os problemas com os quais a escola tem que lidar.

Atualmente, há um consumo crescente do medicamento no país, que ainda não é comercializado, no mercado nacional, como similar ou genérico. Há evidências de que crianças que não possuem TDAH estariam sendo medicadas e casos da doença sendo tratados sem necessidade (BRATS, 2014, p.9).

Por todas essas questões e, considerando seu alto potencial de abuso e dependência, torna-se premente a adoção de debates que abordem a atual problemática do consumo indevido do metilfenidato, alertando a população para o mau uso, os efeitos adversos e as consequências jurídicas (BRATS, 2014, p. 9).

Em 1998, o Instituto Nacional de Saúde Americano (National Institutes of Health – NIH), publicou um documento nomeado Consensus DevelopmentStatement

on Diagnosis and Treatment of Attention Deficit Hyperactivity, demonstrando que as

possíveis causas do TDAH permanecem obscuras, criticando o excesso de critérios nas escalas de avaliação e de autoavaliação, concluindo que ainda existem muitas dúvidas quanto ao tema (ORTEGA et al., 2010).

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Neste percurso, se alastram encaminhamentos por parte das escolas, para neurologistas e psiquiatras, baseados na crença de que um diagnóstico fornecerá elementos suficientes para a intervenção pedagógica, com o objetivo de superar as dificuldades do aprender (HECKERT e ROCHA, 2012).

Segundo os autores, a indissociabilidade TDAH-Ritalina®, construída principalmente nos anos 80 e 90, fez com que o número de critérios para o diagnóstico se ampliasse, produzindo também o aumento nas prescrições.

2.3 A Liquidez dos diagnósticos e a Patologização do corpo e da alma

Medicaliza-se, hoje em dia, dos crimes à vida diária, os comportamentos sexuais, os sofrimentos pessoais e profissionais, o luto e a aprendizagem.

A generalização do uso de medicamentos psicotrópicos, vitaminas, anabolizantes, o “combate” ao envelhecimento, as cirurgias estéticas realizadas sem critério algum, o exercício físico que massacra, a indústria de cosméticos, o luto, a infância e a aprendizagem, tudo pode ser medicado, tudo pode ser utilizado para moldar os corpos e atenuar os “defeitos”. Nossos “erros” podem ser corrigidos, segundo as preferências da sociedade contemporânea (OLIVEIRA, 2009).

Para Birman (2012), estas práticas fazem parte de todo o processo de medicalização do Ocidente iniciado no século XIX, que passou a promover os ideais da saúde. O autor discute que as categorias de normal, anormal e patológico, passaram a fazer parte dos saberes médicos e das políticas públicas com o objetivo de “normalizar” a população. A qualidade de vida passou a ser o fundamento para a modernidade ocidental. O corpo disciplinado passou a ser matéria-prima para o biopoder, sendo o adestramento corporal, o modelo de excelência para uma população saudável. O discurso psiquiátrico orgulha-se de manejar medicamentos que podem regular o mal-estar, agindo diretamente em neurotransmissores e promovendo a melhora desejada, sem o esforço de uma psicoterapia.

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O autor ainda define a sociedade de controle como aquela que produz estratégias que vão atuar como dispositivos produtores de vidas desejantes, sempre na falta de algo que preencha o vazio do existir. Ser humano nesse mundo é dever desejar e sentir apenas aquilo que está dentro das normas do que pode ser desejado.

Não há mais lugar para frustrações e todos devem ser felizes. A vida de vitrine, porém produz sintomas físicos e mentais.

Este sujeito se vê frente a inúmeras possibilidades que provocam este vazio depressivo nas quais se inclui a falta do sentimento de existência autêntico, resultante das constantes frustrações. Desta forma, o sentimento de existência buscado dependeria de uma presença constante de um outro (objeto gratificante), e esta presença do outro acaba por se constituir o problema da sociedade atual, que, pela excessiva permissividade e gratificações, paradoxalmente, as tornam insuficientes, em função de que o desejo permanece insaciável (ESTEVES e GALVAN, 2006, p. 133).

Para facilitar o manejo dos sintomas mentais, os psiquiatras dispõem de um grande catálogo de sintomas, conhecido como DSM, na sua quinta atualização. Criado e produzido por médicos, os sintomas vão sendo ao longo dos anos, inseridos ou removidos deste manual, conforme os interesses da época. O DSM V incluiu praticamente todos os modismos e sintomas da vida cotidiana que passam a fazer parte da hiperprodução diagnóstica, estigmatizando sujeitos, incluindo crianças (FRANCES, 2016).

Segundo Gotzsche (2016), Allen Frances reconhece que o DSM IV já havia criado três falsas epidemias: a bipolaridade infantil, o autismo e TDAH, em decorrência da ampliação em demasia dos critérios diagnósticos.

O fato de termos crianças sentadas quietas na escola não pode ser tomado como evidência de que o diagnóstico estava correto; mostra apenas que a anfetamina tem esse efeito (e muitos outros, incluindo apatia, falta de humor e isolamento social) (GOTZSCHE, 2016, p.187).

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Frances (2016) defende que a imprecisão dos diagnósticos que vem sendo realizados inflacionou o uso excessivo de medicamentos, sendo que da população norte-americana, 6% é dependente de fármacos prescritos e que hoje em dia, há mais mortes por tais medicamentos do que por drogas urbanas ilegais. O autor considera que os psicofármacos são a maior fonte de renda dos fabricantes; os dados são de 2011 quando foram vendidos 18 bilhões de dólares em antipsicóticos, 11 bilhões em antidepressivos e 8 bilhões em medicamentos para TDAH. E aponta que esses remédios estão sendo prescritos em 80% dos casos por clínicos gerais com pouco treinamento para o uso adequado.

Gotzsche (2016), especialista em medicina interna, acredita que poucos psiquiatras estão dispostos a reconhecer que a especialidade está em descontrole e que estão prescrevendo cegamente.

Frances (2016) aceita que algo saiu errado e que agora resta aos interessados, promover saúde e salvar a psiquiatria, especialidade que quando bem praticada é de extrema eficácia, promovendo cura, compaixão e aconselhamento.

Na década de 1980, na edição do DSM III, a Academia Americana de Psiquiatria sugeriu a separação das perturbações por déficit de atenção e hiperatividade em relação aos distúrbios de aprendizagem e propõe uma orientação operacional para a realização dos diagnósticos, orientação esta que foi incorporada ao DSM IV, em nome de uma facilitação prática, incluindo os traços comportamentais apresentados pelos pacientes.

O DSM-V, publicado em 18 de maio de 2013, é a mais nova edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana, resultado de um processo de doze anos de estudos, revisões e pesquisas de campo realizados por centenas de profissionais. O objetivo final foi garantir que a nova classificação, com a inclusão, reformulação e exclusão de diagnósticos, fornecesse uma fonte cientificamente embasada para aplicação em pesquisa e, na prática clínica (ARAÚJO e LOTUFO NETO, 2014).

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Os critérios para o diagnóstico do TDAH se mantiveram similares aos do antigo manual, mantida a lista de dezoito sintomas divididos entre desatenção e hiperatividade/impulsividade.

O manual reconhece 3 tipos clínicos de pacientes com TDAH, dependendo das manifestações comportamentais predominantes, o tipo desatento, tipo hiperativo impulsivo e o tipo combinado, sendo que para enquadrar a criança em qualquer um dos tipos, o procedimento diagnóstico deve conter as informações emitidas pelos adultos de sua convivência, pais e professores, a avaliação neurológica para excluir outras causas orgânicas, a avaliação psicológica e os testes de inteligência (LEGNANI e ALMEIDA, 2010).

Os subtipos do transtorno foram substituídos por especificadores. Indivíduos até os dezessete anos de idade devem apresentar seis dos sintomas listados, enquanto indivíduos mais velhos devem apresentar cinco. No novo manual, o limite de idade foi expandido para os doze anos. Além disso, o DSM-V permitiu que o TDAH fosse diagnosticado como comorbidade. As alterações provocaram polêmica pelo risco de criarem uma super estimativa e aumento da incidência de TDAH na população geral, mas a Associação americana de Psiquiatria (APA) e diversos especialistas defendem a mudança como favorável (ARAÚJO e LOTUFO NETO, 2014).

Os autores defendem que o DSM-V é um instrumento desenvolvido para ser aplicado por profissionais habilitados, experientes e com sólido conhecimento da psicopatologia, sendo a principal crítica é a de que esta classificação se tornou pouco criteriosa, aumentando o número de pessoas que podem ser diagnosticados com algum transtorno mental.

O psiquiatra Allen Frances, chefe da equipe que elaborou o DSM-IV, expressa há tempos sua preocupação com o aumento de casos de crianças com o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e alerta para o possível aumento progressivo de diagnósticos e a redução do limite de sintomas necessários para a confirmação da doença. Segundo ele, o uso indevido do diagnóstico pode ocorrer de forma muito mais frequente seguindo os critérios do DSM-V (CAPONI, 2014).

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