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A compreensão das informações colhidas nos grupos focais foi facilitada pela análise categorial segundo Bardin (2010). Para tanto, foi realizada a dissecção do texto, produto da transcrição das falas dos participantes, em unidades nucleares que possibilitaram a reorganização do conteúdo através de agrupamentos ou categorias.

A unidade, base de registro, nas pesquisas de Bardin (2010) é de dimensão variável e deve manter a ordem semântica, podendo ser uma palavra-chave, um tema, um recorte, objetos, personagens, um acontecimento, etc.

A fase da categorização é uma prática operacional para a classificação dos elementos repetitivos, organizada em reagrupamentos. A íntima relação entre o pesquisador e o material coletado é de extrema relevância para a utilização desta ferramenta de análise, nesta e nas demais fases da estruturação do estudo.

As perguntas disparadoras para os três grupos apresentaram essencialmente os mesmos conteúdos de interesse. As principais falas serão descritas na sequência e correlacionadas às questões, separadas por assunto.

Na análise das falas foi possível identificar cinco aspectos ou categorias de análise relacionadas com: percepções quanto ao comportamento das crianças nas salas de aula; percepção quanto aos pais/ família quanto à parceria com a escola; percepções quanto ao aluno entendido (pelos educadores) como portador de TDAH; sobre medicar ou não com Ritalina®; percepções relacionadas à educação brasileira; sobre a relação das crianças com a tecnologia.

A seguir estão os depoimentos dos professores em relação a cada categoria e em seguida será feita uma reflexão sobre cada aspecto identificado.

1.º Aspecto — Percepções quanto ao comportamento das crianças nas salas de aula:

“...estão mais agitados a cada ano, se jogam em tudo que vão fazer, estão dispersos”. “...é no cognitivo, dificuldade de aprendizagem mesmo”.

“A grande maioria está dispersa”.

“É uma nova geração que o professor tem que aprender a lidar. Os alunos estão chegando muito além do que o professor quer fazer. Não existe mais aquilo, minha sala é assim e ponto final”.

“Temos muitos alunos em sala”.

“Dificuldades de concentração, desinteresse, desmotivação”. “Levantam à toda hora e mexem com os colegas”.

“As crianças estão o tempo todo conectadas”.

“Fora das salas de aula, os alunos têm muita liberdade, porque recebem muitas informações sem maturidade suficiente e ficando indisciplinados”.

“As informações prazerosas ficam em primeiro lugar e as necessárias ficam de lado”. “O mundo sofreu uma transformação num curto espaço de tempo, mas a escola não acompanhou, não evoluiu”.

“Conversam muito”.

“Agridem os professores e batem nos colegas”.

“Temos crianças muito criativas, que contam histórias e que se sobressaem, sabe?” “Tem alunos precoces, no sentido de virar adulto”.

“Temos crianças em condições de vida muito difícil, que não se alimentam direito e vão para a escola com dor de cabeça”.

“O aluno não gosta da matéria quando tem dificuldade, e a dificuldade ele carrega não é de agora, pois, passou de ano sem conseguir entender o básico”.

“Eu sei os alunos que não vão progredir, então eu sei diferenciar sem maltratar ou excluir, mas ele acaba excluído porque não faz as atividades”.

“Quando o aluno não é compreendido, ele fica agressivo”.

”...as vezes, o que está sendo proposto não é interessante para ela“.

“Se a gente percebe algo, temos uma conversa interna antes de avisar os pais”. “Eu vejo mais encaminhamentos para a saúde do que conversa com os pais ou atitude pedagógicas”.

“Existe um pequeno esforço em levantar possibilidades e grande número de encaminhamentos para a saúde”.

“Das crianças encaminhadas, são poucas as que têm transtorno mesmo”. “Todo mundo tem que estar feliz, contente, sossegado e produzindo, temos que estar produzindo a qualquer hora”.

“Alguns professores ou mesmo a direção comentam que é melhor esperar que a mãe leve ao médico para tomar medicamento, esperando o diagnóstico”.

2.º Aspecto — Percepção quanto aos pais/ família quanto à parceria com a escola:

“Falta apoio dos pais, parceria até em relação ao medicamento, o professor insiste, mas a família não vai atrás”.

“Falta de apoio dos pais, o professor cobra, mas a família não vai atrás e fica um círculo vicioso”.

“Família entucha remédio“.

“O professor não pode falar para os pais que a criança é hiperativa, só que tem comportamento hiperativo”.

“A família dá remédio e para por conta própria, depois volta a dar; isso porque o remédio não chega no posto e a família não compra”.

“As famílias delegam responsabilidade aos professores”.

“Se damos notas vermelhas ou chamamos a atenção dos alunos, os pais vão querer saber porque”.

“Dependendo de como o professor trabalha, acaba arrumando inimigos nos pais ou em outros professores”.

“Para alguns pais, o filho faz de propósito”. “Tem mãe que nunca aparece nas reuniões”. “A família está abandonando as crianças”.

“Temos que ter cuidado, pois, já ouvi mães dizerem que pensam que seu filho tem que tomar Ritalina®”.

“Faltam pais que assumam seus filhos, tendo boa vontade, amor e comprometimento, não só no trabalho e na sociedade”.

“Tem pais que acham mais fácil dar o medicamento para o filho não encher o saco”. “No caso das famílias mais pobres, a mãe não tem alternativa e dá remédio mesmo, só assim pode ver sua novela”.

“As crianças têm necessidade de família, mas os pais trocam acolhimento por tecnologia”.

“Os pais não percebem nada, até porque nem eles são alfabetizados. Aí procuram o professor para questionar porquê o filho não sabe ler nem escrever.

“Nesta hora, precisam de um diagnóstico para explicar”.

“Famílias estão desorganizadas, com pais alcoólatras e dependentes de drogas”. “Pais permissivos com inversão de valores”.

“Algumas famílias sabem que seus filhos precisam ser medicados, mas não aceitam”. “Outras famílias escondem que a criança faz tratamento, por puro preconceito”.

3.º Aspecto - Percepções quanto ao aluno entendido (pelos educadores) como portador de TDAH:

“É aquele que precisa de um remédio para fazer a tarefa”. “...bate em todo mundo”.

“À toda hora está de castigo e como não tem limite em casa, extravasa, pois, o professor não pode fazer nada”.

“Não tem auto- domínio e atrapalha a aula”.

“O professor não vence o hiperativo, o indisciplinado sim”.

“O hiperativo é maldoso, cansativo, não se concentra e vão do amor ao ódio”. “Mal-educados, desafiadores, podem tudo e não param de falar”.

“Vivem no mundo da lua e nem sempre têm dificuldade na matéria”. “Fica batendo com a caneta na mesa ou fazendo barulhos com a boca”. “A hiperatividade é uma agitação que a criança não tem controle”.

“Posso ver uma constância no hiperativo, se ele sai da classe, continua agitado no pátio”.

“São diferentes, não socializam e ficam no mundo deles”.

“A hiperatividade não é consequência do mundo da tecnologia, a criança nasce assim”.

“A gente vê o desatento como desinteressado, nem sempre com dificuldade de aprendizagem, pode ser só em determinado assunto”.

“Dão trabalho na aula”.

4.º Aspecto - Sobre medicar ou não com Ritalina®:

“Os professores têm um olhar diferente sobre aquele aluno que precisa”. “Eu sou contra a Ritalina®.

“Alivia, tem professoras que encaminham para a criança ficar quieta”.

“Alguns professores pensam que vai resolver a indisciplina na sala de aula”.

“Alguns falam que tem que tomar medicamento, isso em relação às crianças que tem problemas”.

“Primeiro vamos tentar a mudança com a pedagogia mesma, colocar o aluno para sentar na primeira carteira”.

“Não ter cartazes ou coisas que chamem a atenção, atividades muito extensas ou cansativas”.

“Com direcionamento não precisam de remédio”. “Sou a favor, desde que seja controlado pelo médico”. “Acho que fazem apologia do medicamento”.

“Tive um aluno que ficava agitado”.

“Tem muitos efeitos colaterais como mal humor, dor de barriga. “A Ritalina® é uma anfetamina e o Haldol® é um alucinógeno“. “Funciona mesmo, a criança fica legal”.

“Emagrece”.

“Alguns não comem e fica prostrados, o medicamento pode fazer mal para umas e bem para outras”.

“Há 20 anos, a propaganda da Ritalina® foi muito forte. Hoje, aquelas crianças provavelmente tomam doses maiores”.

“A criança de hoje está ficando cada vez mais dependente das medicações, mas se não usar não vai dar continuidade aos estudos”.

“Algumas coisas essenciais estão se quebrando, as crianças vão muito imaturas para o 1.º ano, é uma época de brincadeiras”.

“Ficam perdidas e não são alfabetizadas, porque precisam brincar”.

“Acho que o problema não está nas crianças, o sistema é que está errado”. “Alivia, tem professoras que encaminham para a criança ficar quieta”.

“O currículo que as crianças são obrigadas a cumprir é um absurdo, elas não dão conta e aí, vão para a Ritalina®“.

“Antes os médicos tinham medo de medicar, agora a banalizou”. “A Ritalina® é um antidepressivo muito bom, sou a favor do remédio“.

5º Aspecto - Percepções relacionadas à educação brasileira:

“As salas são muito heterogêneas, com níveis muito diferentes de alunos”.

“A formação não capacita o professor e faltam profissionais especializados para orientar os professores e familiares”.

“Não tem incentivo e são muitos entraves”.

“Os alunos são separados na sala, como o professor acha que tem que ser”. “O encaminhamento para a saúde é muito lento”.

“A gente erra muito e não notamos nossas atitudes por não saber”. “Tem a sala com os alunos bons e tem a sala com os alunos-problema”. “Lidamos com as dificuldades quase que intuitivamente”.

“Os alunos sabem que não repetem nem levam faltas”. “A educação inverteu os papéis, virou política”.

“Os países emergentes investem na educação, mas aqui, a coisa tá feia, formamos muitos analfabetos funcionais”.

“Somos muito cobrados e fazemos provas, pois, a nota da escola não pode cair”. “No meio disso tudo, tem aqueles alunos com um monte de problemas”.

“O professor permite muitas coisas e fica desvalorizado”. “Nossos prédios não são projetados para período integral”.

“O professor está sobrecarregado e o gerenciamento das escolas deixa uma lacuna gigante, a vítima acaba sendo a criança”.

“A escola cobra sim, porque existe uma meta e as crianças vão ser avaliadas com ou sem TDAH”.

“A questão financeira limita muito a escola pública, não há suporte para os professores, nem estudo ou orientação; a maioria busca sozinho”.

“Tem que achar um culpado e a criança fica sendo a vítima, mas o professor também é vítima”.

“Do jeito que está, não vamos ter mais escola, vai virar um manicômio mesmo, a gente adoece em meio a tantas crianças doentes”.

“O professor se vê sozinho e acaba fazendo uso de medicamentos”.

“Precisamos refletir sobre que sociedade queremos construir, porque também precisamos de suporte e a educação só é vista em época de eleição”.

“Tudo já foi decidido em Brasília, somos apenas fantoches”.

“Cumprimos com os conteúdos, mas não sabemos se a criança assimilou ou não”. “Se eu fosse ver meu salário, eu nem trabalhava”.

“Não vamos mudar o Brasil nem o estado, mas o município, podemos tentar falar com o gestor, falar a mesma língua, ter um plano único, porque não é o que acontece, cada escola tem um projeto diferente”.

“A gente erra muito e não notamos nossas atitudes por não saber”.

6º Aspecto – Percepções quanto à influência da tecnologia:

“Ficam grudados no celular e não se concentram, não socializam” “Eu acho que o problema é proibir”.

“As crianças estão o tempo todo conectadas”.

“Minha preocupação é a criança sair da realidade, cada hora tem uma coisa nova”. “As crianças não praticam mais atividade física, não brincam, ficam em frente ao computador e os desenhos são violentos”.