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Para Bauman (2009), nunca na história humana, os educadores haviam estado diante de desafios tão grandes que possam ser comparáveis a estes do nosso tempo. Simplesmente não se viveu em situação semelhante até agora.

A arte de estar vivo em um mundo saturado de informações ainda deve ser compreendida pelo homem atual, assim como a difícil arte de educar uma criança neste novo modo de viver.

O principal aspecto a ser evidenciado segundo Bauman (2005) é que, não se pode falar ou fazer nada que evite a ruína humana, pois, as verdadeiras causas dos problemas estão fora do nosso alcance.

Para Souza (2012), as incertezas epistemológicas presentes no pensar contemporâneo se refletem imediatamente na educação, não havendo propostas para o ato de educar, exceto a própria incerteza, que se fundamenta como meta para a construção do ser pensante e do pensamento transgressor. Não há como evitar que as mudanças culturais e sociais invadam a escola, transformando o pensar institucional de acordo com as necessidades de seus estudantes, promovendo novas possibilidades de interpretação da realidade. O novo educando ávido em transgredir, esbarra na estrutura escolar, a mesma que lhe aniquila o processo de criar e pensar em novas ideias, de ressignificar coisas, pela pura e simples possibilidade de ofender quem controla os intramuros da instituição.

O sociólogo Florestan Fernandes (s/d) apud Rodrigues (2011) afirma que as práticas educacionais estão diretamente relacionadas às técnicas, normas e valores vigentes que são compartilhados pelos indivíduos de uma sociedade, cultura ou tempo-histórico. Cada indivíduo deve perceber a realidade de acordo com a sua consciência crítica ou sua aprendizagem criativa.

Novas percepções da realidade ficam evidentes e a educação passa a ser concebida como instrumento de investimento na racionalidade com o objetivo de alcançar o melhor para o ser humano, aquele que precisa ser feliz a qualquer custo e para tanto, há de dominar as leis da natureza, utilizando-se do processo educacional como recurso, elemento da vida social responsável pela organização criativa da rotina das crianças (GOERGEN, 2001).

Assim, constitui-se a sociedade atual que para Beck (2009) tem suas peculiaridades com base nos riscos por ela proporcionados, sendo o homem um ser paradoxalmente, angustiado e indiferente diante das incertezas. Estas peculiaridades são modelos para o pensar contemporâneo, onde tudo e todos podem se tornar descartáveis, sem opinião própria, vítimas do mercado das possibilidades do “vir a ser melhor que se é”.

Bauman (2009) afirma que no ambiente líquido-moderno, a incerteza contribui para a dominação humana, sendo a mais importante estratégia para a produção de políticas de precarização, inclusive da educação.

A sociedade, como refúgio, talvez precise medicar o fracasso escolar, se utilizando covardemente de psicotrópicos para homogeneizar os humores nas salas de aulas, aniquilando a complexidade humana e transformando a aprendizagem num simples produto.

Para De La Taille (2009), o planeta está doente, as cidades estão violentas, o trabalho está desvalorizado, há abuso do uso de medicamentos para problemas reais ou não, e principalmente, a educação foi abandonada.

Vasconcelos (2002) defende que a quantidade de informações, estímulos e inovações tecnológicas são destinadas sem filtros, ao homem contemporâneo, atravessando violentamente os seus sentidos e o seu equipamento de percepção que se tornam ineficazes e precisam ser reparados.

Arendt (2016) discute, em seu livro “A Vida do Espírito” as escolhas como fatores decisivos de auto apresentação. Arendt não só discute o tema, mas sabiamente dialoga com o agora. Para ela, as aparências têm as funções de internalizar algo a ser escondido e externalizar o que pode ser demonstrado: o envelhecimento é transformado em doença, a aprendizagem em fracasso e a morte precisa ser exorcizada.

Os corpos não funcionam direito e a culpa do homem contemporâneo não ser o que deveria, é articulada e utilizada como estratégia para campanhas publicitárias como justificativa para a medicalização da sociedade (BIRMAN, 2012).

Tais estratégias também são produzidas pelas instituições educacionais e seus agentes, sobre os quais se apoia o exercício do autoritarismo na transmissão da cultura escolar, seus conteúdos, programas, métodos, relações pedagógicas e práticas linguísticas (VASCONCELOS, 2002).

A sociedade de hoje expõe uma crise de valores, conforme afirma Leonardo Boff (2012), sendo difícil saber o que é ou não correto e quais os limites para que as relações sociais se organizem de modo claro, sem a interferência de interesses particulares, tendências dominantes da economia e do mercado, regidas pela competição, mais que cooperação e harmonia. Como consequência, os setores especializados do conhecimento e o sistema educacional foram organizados e compartimentados, isolados por um domínio que não sabe agregar, impedindo a articulação global entre os saberes.

De acordo com Morin (2003), uma educação capaz de ser globalizada precisa refletir o pensamento sistêmico, produzido quando se conhece o todo, mas especialmente as partes.

[...] um sistema não é somente constituído de partes. Ele tem qualidades, propriedades ditas emergentes, que não existem nas partes isoladas: em outras palavras, o todo é mais do que a soma das partes. Porém, algumas qualidades ou propriedades das partes são, com frequência, também inibidas pelo todo: portanto, vale também menos do que a soma das partes (MORIN, 2003, p.150).

Com tudo, torna-se urgente que o sistema educacional possa ser amplamente discutido e questionado, porque ao que parece, os estudantes não têm sido contemplados com um modelo condizente com os dias atuais, promovendo a construção de doenças e por tanto do aumento da medicalização que toma conta do processo educativo.

3.7 A Educação no Brasil

3.7.1 A questão pedagógica brasileira

A pedagogia, como área de convergência de vários saberes que conversam e respondem ao fenômeno educativo, permeia um emaranhado conceitual, tentando reproduzir seus significados, a partir da multiplicidade de sentidos que se sobressaem (SOUZA, 2012).

O termo pedagogia, no Brasil, só se manifestou após a independência, em 1826. Neste tempo histórico, a intenção de Januário da Cunha Barbosa era instituir um modelo completo de educação distribuído em quatro graus, sendo que o primeiro, referente ao básico que deveria ser aprendido por todos, chamou-se pedagogias, termo substituído imediatamente por primeiras letras, por ordem do deputado Ferreira França (SAVIANI, 2008).

O autor explica que na formação dos professores, estes deveriam ser preparados didaticamente, com custeio próprio, nas capitais de cada província. Em 1834, foi definido que a instrução primária seria responsabilidade das províncias e as mesmas adotaram então, o modo europeu de formação ou Escolas Normais.

As Escolas Normais ainda não possuíam especificidade quanto aos moldes pedagógicos e, os educadores dominariam apenas os conteúdos a serem transmitidos às crianças da fase básica.

Fazendo uma pequena digressão histórica sobre a formação de professores no Brasil, lembramos que a formação de docentes para o ensino das “primeiras letras” em cursos específicos foi proposta no final do século XIX com a criação das Escolas Normais. Estas correspondiam na época ao nível secundário e, posteriormente, ao ensino médio, a partir de meados do século XX. Continuaram a promover a formação dos professores para os primeiros anos do ensino fundamental e a educação infantil até recentemente, quando, a partir da Lei n. 9.394 de 1996, postula-se a formação desses docentes em nível superior, com um prazo de dez anos para esse ajuste (GATTI, 2010, p. 1356).