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Do regime jurídico partidário na democracia brasileira

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação

ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES

DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO

NA DEMOCRACIA BRASILEIRA

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ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES

DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO

NA DEMOCRACIA BRASILEIRA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito.

ORIENTADORA: Profa. Dra. Monica Herman Salem Caggiano

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ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES

DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO

NA DEMOCRACIA BRASILEIRA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Monica Herman Salem Caggiano

Aprovada em

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Monica Herman Salem Caggiano

Universidade Presbiteriana Mackenzie

_______________________________________________ Prof. Dr Cláudio Salvador Lembo

Universidade Presbiteriana Mackenzie

_______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Eunice Aparecida de Jesus Prudente

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AGRADECIMENTOS

À Deus, minha fonte eterna de vida e luz, por mais essa conquista. Aos meus pais, meus referenciais, pelo incentivo e apoio constantes. Aos meus irmãos, cunhados e sobrinhos, família linda, pela companhia e alegria que de perto ou de longe nunca faltaram. Patrícia, em especial, pelo carinho na revisão deste trabalho. Eliana, co-irmã querida, pelo alicerce cotidiano.

À Prof.ª Dr.ª Monica Herman, minha inestimável Orientadora, pela coragem de me guiar na vida acadêmica, externando preocupação singular e constante nos estudos realizados, instigando o fomento por novas leituras e acompanhando, sem poupar esforços, as reflexões que lhe apresentava.

Ao Prof. Dr. Cláudio Lembo, pela memorável oportunidade de ser sua aluna e receber, com privilégio, ensinamentos tão importantes que jamais deixarão de fazer parte dos meus estudos.

À Prof.ª Dr.ª Eunice Prudente, pelo apreço às valiosas ponderações feitas na etapa prévia de Qualificação, que sem dúvida alguma foram impactantes no desenvolvimento e conclusão desta pesquisa científica.

Às amigas, jovens doutoras, Vivian e Ana Paula, pelo compatilhamento no aprendizado, confidencialidades, incentivos mútuos e companheirismo desde o início de nossa trilha acadêmica. Raquel, minha alma gêmea, sobretudo na convivência e divisão das atividades mackenzistas. Álvaro e Vanessa, pelas alegres coincidências e acentuada confiança. Sandra, pela lealdade que não tem fim.

Aos colegas de trabalho, pelos ouvidos sempre pacientes às minhas angústias, proferindo palavras de consolo com o objetivo de minimizar todo e qualquer efeito negativo decorrente das fadigas do dia a dia. Fábio e Rodrigo, pelo profissionalismo e incansável auxílio na movimentação das causas judicantes, principalmente quando minhas ausências eram inevitáveis. Bárbara, Adriano e Simone, pela feliz convivência e laços jamais imaginados, jamais esperados.

À todos os demais colegas que, independentemente da citação direta proferida neste momento, estiveram ainda assim presentes durante toda esta jornada laboral, acreditando no seu resultado.

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“A felicidade é como as folhas de uma árvore

no outono: algumas caem, mas sabe-se que outras nascerão no lugar”

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RESUMO

Três minirreformas eleitorais foram implementadas pelo ordenamento jurídico brasileiro com o escopo de alterar disposições referentes ao Código Eleitoral, à Lei dos Partidos Políticos e à Lei das Eleições. Regulamentaram, de certo modo, a dinâmica, organização e funcionamento dos partidos políticos. A recente Lei Federal nº 13.165/15 reintroduziu novos mecanismos para serem observados pelos partidos políticos, v.g., limite de gastos e financiamento das campanhas eleitorais, procedimentos administrativos perante a Justiça Eleitoral, filiação partidária, propaganda eleitoral, participação feminina, prestação de contas, registro de candidaturas etc. Além disso, três Propostas de Emenda à Constituição tramitam nas Casas Legislativas Federais, abarcando estes e outros mais variados mecanismos; contudo, alguns já previamente rejeitados, como a adoção do sistema proporcional de lista e majoritário distrital, a cláusula de desempenho, as coligações proporcionais e o tempo de mandato. Certo é que, a cada nova legislatura, referidos temas têm retornado à pauta do dia como forma de atender o desapreço popular pelo processo eleitoral e partidário vigentes, e os partidos políticos acabam assumindo o epicentro dessa discussão. Até podem, segundo o momento histórico-político vivenciado, perder o viço, mas jamais a vida eterna. Afinal, são eles os responsáveis diretos pela implementação do processo de representação política, importando no canal de ascensão legítima pelo poder e exercício pleno da democracia. Sustentam-na, de fato. E é pela importância que assumem no cenário eleitoral contemporâneo, especialmente no brasileiro, que recebem os partidos políticos a presente homenagem, devidamente acompanhada das irresignações à imposição de mecanismos limitadores da sua atuação funcional pelo regime jurídico em vigor, ainda que repetidos sejam os modelos de ação restritiva sofridos no passado.

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RIASSUNTO

Tre mini riforme elettorali sono state introdotte dall'ordinamento giuridico Brasiliano con lo scopo di alterare disposizioni che si riferivano al Codice Elettorale, alla legge sui partiti politici ed alla legge sulle elezioni. Hanno regolamentato, in un certo modo, la dinamica, organizzazione e funzionamento dei partiti politici. La recente legge federale n. 13165/15, ha reintrodotto nuovi meccanismi che i partiti politici devono osservare, v.g. limita le spese e finanziamento delle campagne elettorali, procedimenti amministrativi davanti alla giustizia elettorale, filiazione al partito, propaganda elettorale, partecipazione femminile, rendiconto delle spese, registro delle candidature etc. Oltro a questo, tre proposte di modifica costituzionale sono all esame del parlamento, comprendendo queste ed altri più svariati meccanismi; nel frattempo, alcuni già precedentemente rigettati, come l’introduzione del sistema proporzionale della lista e maggioritario distrettuale, la clausola dell esecuzione, le alleanze proporzionali ed il tempo del mandato. Certo è che, ogni nuova legislatura, i citati temi sono ritornati di attualità come risposta all allontanamento popolare dal processo elettorale e dei partiti vigenti, ed i partiti politici finiscono assumendo l’epicentro di questa discussione. Possono anche, dato il momento storico-politico vissuto, perdere il vizio, ma giammai la vita eterna. Infine, sono loro i diretti responsabili per l’introduzione del processo di rappresentanza politica , importando nel cammino dell ascensione legittima al potere e esercizio pieno della democrazia. Si supportano di fatto. Ed è per la importanza che assumono nella scena elettorale contemporanea, specialmente in quella brasiliana, che ricevono i partiti politici il presente omaggio, meritatamente accompagnato dalla rivolta alla imposizione dei meccanismi limitativi della sua attuazione funzionale da parte del regime giuridico in vigore, nonostante siano ripetuti i modelli restrittivi sofferti nel passato.

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ABSTRACT

Three minor electoral reforms have been enacted by Brazilian judicial order with the purpose of modifying provisions referring to the Electoral Code, the Law of Political Parties and the Election Law. These have, to some extent, regulated the dynamic, organisation and the functioning of political parties. The recent Federal Law No. 13.165/15 re-introduced new mechanisms to be observed by the political parties, viz spending limits and financing of electoral campaigns, administrative procedures before the Electoral Court, party affiliation, electoral propaganda, the participation of women, accountability, candidate registration etc. In addition, three Proposals for Amending the Constitution are going through the Federal Legislative Houses, incorporating the latter and other more varied mechanisms; some which had nevertheless previously been rejected, such as the adoption of a proportional list system and majority per district, the performance clause, proportional coalitions and length of mandate. It is true that with each new legislature, the aforementioned subjects have found their way back onto the agenda as a means of addressing popular discontent with the electoral and party processes in force. Political parties have ended up taking centre stage in this discussion. They may even, if the recent historical-political experience is anything to go by, lose their vigour but not their eternal life. Ultimately, they are the ones who are directly responsible for the implementation of the process of political representation, recognising the importance of coming to power via the legitimate channel and the full exercise of democracy. They support it in fact. And it is for the importance they take on the contemporary electoral scene, especially in the case of Brazil, that political parties receive the present homage, duly accompanied by the rejection of the imposition of mechanisms restricting their functional activities by the current legal system, even if the models of restrictive action undergone in the past are repeated.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Vínculo partidário dos candidatos eleitos à Presidência da República no período da Primeira República ... 117

Tabela 2 Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1945 a 1964 ... 137

Tabela 3 Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1964 a 1979 ... 146

Tabela 4 Partidos políticos com participação ativa nas eleições do período de 1982 a 2006 ... 158

Tabela 5 Registro dos partidos políticos e atual configuração partidária ... 159

Tabela 6 Agremiações partidárias formadas entre 2006 e 2015 ... 162

Tabela 7 PEC 182/2007, aprovada em primeiro turno da Câmara dos

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LISTA DE ABREVIATURAS

AC Ato Complementar

ADB Aliança Democrática Brasileira (1945-1964) ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade

AI Ato Institucional

AIB Aliança Integralista Brasileira

AIPB Ação Imperial Patrianovista Brasileira ANL Aliança Nacional Libertadora

ARENA Aliança Renovadora Nacional (1964-1985) ASD Aliança Social Democrata (1945-1964) CDU União Democrata-Cristã

CFOAB Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil CNOP Comissão Nacional de Organização Provisória

CNPJ Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica

CSD Confraternização Social Democrata (1945-1964) DC Democracia Cristã Italiana

DEM Partido Democratas Dep Deputado

EC Emenda Constitucional EMA Emenda Aglutinativa

Labour Party Partido Trabalhista Britânico

LOPP Lei Orgânica dos Partidos Políticos

MDB Movimento Democrático Brasileiro (1964-1985) MTR Movimento Trabalhista Renovador (1945-1964)

NEPEC Núcleo Eleitoral Pró-Emancipação Carioca (1945-1964) NOVO Partido Novo

PAN Partido Agrário Nacional (1945-1964) PBV Partido da Boa Vontade (1945-1964) PC Partido Comunista (desde Império) PC do B Partido Comunista do Brasil

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PCF Partido Comunista Francês PCI Partido Comunista Italiano PCO Partido da Causa Operária PD Partido Democrático

PDC Partido Democrata Cristão (desde 1945-1964) PDP Partido Democrático Progressista (1945-1964) PDS Partido Democrata Social

PDT Partido Democrático Trabalhista PEC Proposta de Emenda Constitucional PEN Partido Ecológico Nacional

PFL Partido da Frente Liberal

PGT Partido Geral dos Trabalhadores PHS Partido Humanista da Solidariedade

PIAD Partido Industrial Agrícola Democrático (1945-1964) PJ Partido da Juventude

PL Partido Liberal (1985-2006) PL Partido Libertador (1945-1964) PL Projeto de Lei

PLIC Partido da Lavoura, Indústria e Comércio (1945-1964) PLS Projeto de Lei do Senado

PMB Partido da Mulher Brasileira

PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro PMN Partido da Mobilização Nacional

PMR Partido Municipalista Renovador PN Partido Nacionalista (1964-1985) PNC Partido Nacional Classista (1945-1964) PNE Partido Nacional Evolucionista (1945-1964)

PNPD Partido Nacional Popular Democrático (1945-1964) POPSF Organização Político-Social Feminina (1945-1964) POT Partido Orientador Trabalhista (1945-1964)

PP Partido Popular

PP Partido Progressista (1982-2006) PP Partido Progressista (desde 2003)

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PPB Partido Proletário do Brasil (1945-1964) PPL Partido da Pátria Livre

PPP Partido Popular Progressista (1945-1964) PPR Partido Progressista Reformador (1992) PPR Partido Progressista Renovador

PPS Partido Popular Sindicalista (1945-1964) PPS Partido Popular Socialista (1982-2006) PR Partido da República (desde 2006) PR Partido Regenerador (1945-1964) PR Partido Republicano (1945-1964)

PRB Partido Republicano Brasileiro (desde 1982-2006) PRB Partido Ruralista Brasileiro (1945-1964)

PRD Partido Republicano Democrático (1945-1964) PRF Partido Republicano Federal

PRM Partido Republicano Mineiro (Império) PRN Partido da Reconstrução Nacional

PRONA Partido da Reedificação da Ordem Nacional PROS Partido Republicano da Ordem Social

PRP Partido da Representação Popular (1945-1964) PRP Partido Republicano Paulista (Império)

PRP Partido Republicano Progressista PRProg Partido Republicano Progressista PRR Partido Republicano Riograndense

PRT Partido Republicano Trabalhista (1945-1964)

PRT Partido Revolucionário dos Trabalhadores (atual PSTU) PRT Partido Rural Trabalhista (1945-1964)

PRTB Partido Renovador Trabalhista Brasileiro PS do B Partido Socialista do Brasil (1945-1964)

PSB Partido Socialista Brasileiro (desde 1945-1964) PSC Partido Social Cristão (desde 1982-2006) PSC Partido Socialista Cristão (1945-1964)

PSD Partido Social Democrático (desde 1945-1964) PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

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PSI Partido Socialista Italiano PSL Partido Social Liberal PSN Partido Social Nacionalista

PSN Partido Solidarista Nacional (Partido da Solidariedade Nacional) PSOL Partido Socialismo e Liberdade

PSP Partido Social Progressista (1945-1964) PST Partido Social Trabalhista (desde 1945-1964) PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado PT Partido dos Trabalhadores

PT do B Partido Trabalhista do Brasil PTB Partido Trabalhista Brasileiro PTC Partido Trabalhista Cristão

PTN Partido Trabalhista Nacional (desde 1945-1964) PTR Partido Trabalhista Renovador (até 1992)

PTR Partido Trabalhista Republicano (1964-1985) PV Partido Verde

REDE Rede Sustentabilidade SBT Substitutivo

SD Solidariedade

SFIO Seção Francesa da Internacional Operária SPD Partido Socialdemocrata Alemão

STF Supremo Tribunal Federal TRE Tribunal Regional Eleitoral TSE Tribunal Superior Eleitoral UDN União Democrática Nacional

UNT União Nacional do Trabalho (1945-1964)

(16)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 17

2. ANOTAÇÕES PRELIMINARES ... 24

2.1 EVOLUÇÃO E GRAUS DA DEMOCRACIA ... 24

2.2 O DINAMISMO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA NA FÓRMULA DEMOCRÁTICA ... 30

2.2.1 A importância dos Parlamentos e a presença dos Partidos Políticos ... 38

2.3 A DEMOCRACIA BRASILEIRA ... 42

3. PARTIDOS POLÍTICOS ... 49

3.1. ORIGEM E INSTITUCIONALIZAÇÃO ... 49

3.1.1. Natureza Jurídica ... 63

3.1.2. Legitimidade jurídico-constitucional ... 67

3.2. SISTEMA DE PARTIDOS ... 70

3.2.1. Sistema Partidário X Regimes de Governo ... 72

3.2.2. Alianças ou Coligações Eleitorais ... 77

3.3. O PODER DAS ELITES NO SISTEMA PARTIDÁRIO ... 80

3.3.1. Governo da Maioria X Participação da Minoria ... 88

4. PARTIDOS POLÍTICOS NO BRASIL ... 91

4.1. PARTIDOS POLÍTICOS NO IMPÉRIO ... 93

4.2. PARTIDOS POLÍTICOS NA REPÚBLICA ... 107

4.2.1. A Primeira República (1889-1930) ... 110

4.2.2. O Golpe de Estado (1930-1945) ... 119

4.2.3. A Redemocratização (1945-1964) ... 128

4.2.4. O Período Militar (1964-1985) ... 143

(17)

5. REFORMA POLÍTICA NO ESPECTRO ELEITORAL-PARTIDÁRIO ... 165

5.1. MINIRREFORMAS ELEITORAIS ... 166

5.2. PROPOSTAS DE EMENDAS CONSTITUCIONAIS ... 179

6. CONCLUSÃO ... 187

(18)

1. INTRODUÇÃO

Na vertente de uma democracia representativa, a regência dos negócios governamentais cabe aos representantes eleitos pelo povo. Detentores de mandatos, assumem a responsabilidade de conduzir, politicamente, os interesses gerais desse povo.

Filiados a partidos políticos, coligados ou não, é pelo pleito eleitoral realizado sob forma livre, igualitária e competitiva que alcançam o poder, seja para chefiar o Governo, seja para guardar assento em qualquer das cadeiras dos Parlamentos.

Assim, não só a democracia corresponde, verdadeiramente, “à exigência de sintonia entre a atuação governamental e a preferência dos cidadãos”1, como, na

contemporaneidade, essa sintonia encontrou no polo da representação política o modo legítimo para a sua efetivação e, nos partidos políticos, o veículo necessário e preferencial para a titularidade da representação política.

Historicamente, conforme lembrado por CAGGIANO2, os partidos ganharam espaços e fortalecimento com a nova concepção de Estado trazida pelos movimentos revolucionários do século XVIII. Foi a pessoa do novo soberano, o povo, que fomentou a instalação de um instrumento mais apto à concretização da competição política no Estado Liberal e em formação, de modo que agregadas fossem suas características próprias e diferenciadas: “difuso, temporal, composto, variável e com mandato revogável”3.

Segundo a autora, embora houvessem manifestações bastante refratárias e de silêncio à figura dos partidos políticos no final do século XIX e início do século XX, os períodos de reconstrução democrática decorrentes do segundo conflito bélico mundial – décadas de 50 e 60 do século XX – teriam marcado o momento de maior reflexão à importância e aptidão do partido político na promoção do desenvolvimento da democracia e correspondente legitimação do poder pela via eleitoral.

1 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado

Federal, Centro Gráfico, 1987. p.15. 2

CAGGIANO, Monica Herman Salem. É possível reinventar o Partido?: o Partido Político no século XXI. Disponível em: <http://www.cepes.org.br/home/index.php?option=com_content&view= article&id=364:e-possivel-reinventar-o-Partido-&catid=35:artigos&Itemid=55>. Acesso em: 03 jun. 2014.

3

(19)

O constitucionalismo norte-americano, no século XIX, foi o primeiro a mostrar os primeiros sinais de reconhecimento legal aos partidos políticos nos Estados da Califórnia e de Nova Iorque. Na França, embora existente legislação específica à formação de associações desde 1901, o reconhecimento dos partidos, enquanto entidades político-partidárias, ocorreu apenas em 1910. No mesmo sentido, se delineou a formação dos grupos parlamentares e comitês eleitorais nas eleições gerais de 1837 e 1869 na Espanha, que faziam alusão à formação de partidos informais até efetiva regularização a partir de 1931. Na América Latina, especificamente na Argentina, é possível ver a presença marcante dos partidos políticos com a União Cívica Radical (UCR) em 1890 até verdadeira conquista do status constitucional em 1934, assim como na história do Chile, com o Partido Radical em 1863; México, com o sistema único no século XIX; Peru, com o Partido Civilista em 1895 e o Partido Democrático de Piérola de 1912; e em Cuba, com o sistema bipartidário no século XIX4.

No Brasil, o período colonial teria marcado a formação de dois grupos opositores: os monarquistas, que sustentavam a instalação de uma monarquia constitucional sob regência do Imperador Dom Pedro I, e dos exaltados e moderados ou independentes, que reclamavam o fortalecimento dos poderes locais e provinciais até a instalação dos dois primeiros partidos políticos no período imperial, o Partido Liberal em 1831 e o Partido Conservador em 18375. Na doutrina

de LEMBO, verifica-se que os primeiros vereadores à Câmara Municipal de São Vicente já teriam se instalado em 1532, fruto do processo eleitoral que vinha sendo comandado pelas determinações das Ordenações Manuelinas6.

Enfim, na democracia brasileira atual, os partidos políticos tornaram-se os únicos entes da sociedade organizada a conquistar o exercício da ação política, mesmo diante de tantos outros grupos voluntários por ela também criados. Não apenas se consagraram os responsáveis pela formatação do sistema partidário de sustentação das bases democráticas como, indiretamente, colaboraram com o desenho do sistema eleitoral a ser praticado. Com este, em verdade, se interliga o

4

CAGGIANO, Monica Herman Salem. É possível reinventar o Partido?: o Partido Político no século XXI. Disponível em: <http://www.cepes.org.br/home/index.php?option=com_content&view= article&id=364:e-possivel-reinventar-o-Partido-&catid=35:artigos&Itemid=55>. Acesso em: 03 jun. 2014, p. 5-7.

5

CAGGIANO, ibidem, p.7. 6

(20)

sistema de partidos, em constante processo de realimentação um do outro, sendo plenamente possível distanciar a expressão da vontade popular dos grupos políticos que a articulam, consoante delineado por FERREIRA FILHO, porém jamais o inverso, justamente porque eleições na democracia contemporânea importam, irremediavelmente, em partidos7. Afinal, das lições de DUVERGER também se extrai que “o desenvolvimento dos partidos políticos transformou, profundamente, a estrutura dos regimes políticos”8.

No entanto, porque plasmados em ambientes envoltos pelo fenômeno da corrupção, um estigma do qual não lhe é exclusivo mas apenas inclusivo e familiar, sofrem os partidos políticos constantes ataques que acabam por contaminar a sua imagem e, consequentemente, a própria democracia que sustentam. Com isso, mergulham no rótulo de fragilidades e de desconfiança por minimamente se distanciarem da condição de partido pasteurizado, ou seja, de partido livre de impurezas, como assinalado por CAGGIANO9. De fato, seguindo o pensamento da autora, tais efeitos perversos, em verdade, não fomentam a exterminação dos partidos, senão a promoção de controles passíveis de lhes alertar quanto ao dever de fiel desempenho de suas tarefas.

Por esse vetor central, várias são as aclamações por reformas políticas. Para a sociedade, o modelo eleitoral-partidário existente não mais agrada.

Daí a primeira questão que se coloca ao examinar o regime partidário brasileiro, neste trabalho, é se uma modificação na organização e no funcionamento dos partidos políticos geraria impacto de melhoria do regime democrático pré-estabelecido, já que se encontram intrinsecamente ligados.

A segunda questão está no quão valoroso se colocaria o quadro de reformas políticas que se vivencia, notadamente seus reflexos frente à idealização de um modelo mais resolutivo ao vigente, capaz de proporcionar um exercício da democracia representativa mais escorreito.

7

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Democracia, Partidos e Sistema Eleitoral. In CAGGIANO, Monica Herman Salem (Coord.); MESSA, Ana Flávia; MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias (Org.). Direito Eleitoral em Debate: estudos em homenagem a Cláudio Lembo. São Paulo: Saraiva, 2013, p 367-395.

8 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão

técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 386. 9

(21)

Até o momento, nas casas legislativas federais, inúmeras são as propostas de modificação do ordenamento jurídico-constitucional vigente em matéria eleitoral. Mesmo tendo sido objeto de arquivamento, propostas são constantemente reavivadas, integrando novas postulações como apensos. Na essência, pouco, senão quase nada, inovam. Experiências do passado permanecem em discussão, como o voto majoritário (conjugado ou não com o proporcional) para o Legislativo10, o voto proporcional com lista fechada11, o voto distrital12, a candidatura avulsa13 e a duração dos mandatos eletivos14.

Algumas arriscam repaginar o sistema vigente, propondo o financiamento público às campanhas majoritárias15, a possibilidade de coligações eleitorais apenas nas eleições majoritárias16, o voto facultativo17, a coincidência dos mandatos eletivos em âmbito nacional com os mandatos dos demais entes federativos18, o voto distrital misto19, a elegibilidade de determinados cargos políticos sob novos parâmetros de idade20, a supressão do quociente eleitoral e introdução do sistema majoritário nas eleições proporcionais21, a instituição de cláusula de desempenho aos partidos

10 P.E.C. nº 54/2007; P.E.C. nº 258/2013, de autoria do Deputado Marcus Pestana

– PSDB/MG, apensada à P.E.C. 182/07.

11 P.E.C nº 43/11, P.L.S. nº 293/11 e P.L. nº 4.636/2009, apensado ao P.L. nº 2.887/00.

12 P.E.C. nº 133/2003, do Deputado Jaime Martins (PL/MG); P.E.C. nº 585/2006, do Deputado

Arnaldo Madeira (PSDB/SP).

13 P.E.C. nº 229/08

– Dep. Leo Alcântara (PR/CE).

14 P.E.C. nº 211/95, do Deputado José Janene (PP/PR); P.E.C. nº 337/96, do Deputado Raul Belém

(PFL/MG); P.E.C. nº 283/2000, do Deputado José Índio (PMDB/SP).

15 P.L. 1538/07, do Deputado Alexandre Silveira (PPS-MG).

16 P.E.C. 14/2015, epigrafada originariamente com o nº 40/2011, de autoria do Senado Federal,

devidamente encaminhada, por ofício, pelo Presidente Senador Renan Calheiros e apensada à P.E.C. nº 182/07.

17 P.E.C.s nºs 70/1999, do Deputado Ary Kara (PPB/SP) e 430/2005, do Deputado Moreira Franco

(PMDB/RJ); P.E.C. nº 444/2014, do Deputado Leonardo Picciani (PMDB/RJ).

18 P.E.C. nº 211/1995, do Deputado José Janene (PP/PR); P.E.C. 6/2003, do Deputado Maurício

Rands (PT/PE); P.E.C. nº 19/2003, do Deputado Dilceu Sperafico (PPB/PR); P.E.C. nº 77/2007, do Deputado Carlos Brandão (PSDB/MA); P.E.C. nº 220/08, do Deputado Jovair Arantes (PTB/GO).

19 P.E.C. nº 10/95, Dep. Adhemar de Barros Filho (PPB/SP), com apensos P.E.C. nº 133/03, P.E.C. nº

585/06, P.E.C. nº 523/06 e P.E.C. nº 365/09; P.E.C. nº 168/1995, do Deputado Mendonça Filho (DEM/PE); P.E.C. nº 289/1995, do Deputado Osvaldo Reis (PPB/TO).

20 P.E.C. nº 20/2007, da De

putada Manuela D’ávila (PCdoB/RS); P.E.C. nº 220/2008, do Deputado

Jovair Arantes (PTB/GO); P.E.C. nº 168/2012, do Deputado Wilson Filho (PMDB/PB).

21 P.E.C. nº 294/2000, do Deputado De Velasco (PSL/SP); P.E.C. nº 105/2007, do Deputado Mário

(22)

políticos e de um sistema eleitoral com quota para mulheres22 e a revogabilidade do

mandato eletivo (recall)23.

Outras conferem a um ato normativo determinado apenas status constitucional, como é o caso da fidelidade partidária já disciplinada pela Resolução nº 22.260 do Tribunal Superior Eleitoral24, ou a inversa derrogação desse status, a

exemplo do fim da reeleição aos cargos majoritários, assegurada por força da Emenda Constitucional nº 16/9725 e da supressão de limite de Deputados para cada ente da Federação (de oito a setenta), determinada pelo art. 45, §1º da Constituição Federal26.

De qualquer modo, é inegável: todas, direta ou indiretamente, interferem na formação do sistema partidário ao seu tempo.

Concessa venia, imprescindível se faz apenas enxergar se a aplicação do novo ou do “velho renovado” adapta-se ao status do ordenamento jurídico-constitucional vigente, por seus próprios fundamentos.

De nada adianta, conforme lembrado por NUNES LEAL27, insistir na

repetição de um regime político já experimentado e não bem sucedido no passado28, ou, então, de acordo com o destacado por OLIVEIRA VIANNA29, copiar modelo

22 Ofício nº 02/11 CRP do Senador Francisco Dornelles, Presidente da Comissão, que deu ensejo à

formação das PECs nºs 37 a 42/2011 e PLS nºs 265 a 267/2011; em relação à candidatura avulsa, destaca-se a P.E.C. nº 06/2015, proposta pelo Senador Reguffe do PDT-DF, favorável à candidatura avulsa para os cargos majoritários e proporcionais daqueles que obtiverem apoio e assinatura de, pelo menos, 1% do eleitor municipal, estadual ou nacional.

23 P.E.C. nº 08/2015, de autoria do Senador Reguffe e outros.

24 P.E.C. nº 60/1995, do Deputado Silvio Torres (PSDB/SP); P.E.C. nº 90/1995, do Deputado Paulo

Gouvêa (PFL/SC); P.E.C. nº 242/2000, do Deputado Mauro Benevides (PMSB/CE); P.E.C. nº 182/2007, do Senador Marco Maciel – DEM/PE, que segue apensada de vários outros projetos de Emenda à Constituição, editados no período de 1995 a 2012.

25 P.E.C. nº 19/2003, já destacada; P.E.C. nº 246/2004, do Deputado Jutahy Júnior (PSDB/BA) e

P.E.C. nº 72/2007, do Deputado Regis de Oliveira (PSC/SP); P.E.C. nº 160/2007, do Deputado Renato Molling (PP/RS).

26 P.E.C. nº 476/2001, do Deputado José Carlos Aleluia (PFL/BA); P.E.C. nº 485/2002, do Deputado

João Eduardo Dado (Bloco-PDT/SP); P.E.C. n º 223/2008, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB/SP).

27 NUNES LEAL, Victor. Coronelismo, enxada e voto: o Município e o regime representativo no Brasil.

3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 266-267.

28 Como destacado por NUNES (ibidem), eleição direta e indireta, voto devassável e sigiloso,

circunscrições eleitorais amplas e restritas, divididas em distritos com, inclusive, a indicação de deputado único, escrutínio de lista, voto uninominal, lista incompleta, voto cumulativo, representação proporcional, já repetidas na República e mal sucedidas no Império.

29

Em 1922, quando da edição de sua obra “O idealismo: na evolução politica do Imperio e da

Republica” [sic], OLIVEIRA VIANNA diferenciava entre duas as espécies de idealismo, ambas firmadas sob conceito absolutamente antagônico: o “utópico”, que não se fundaria na experiência,

e o “orgânico”, que nasceriam da própria evolução da sociedade, por suas aspirações e atividades

(23)

estrangeirista, provido de realidade sociocultural absolutamente adversa da apresentada em solo doméstico.

Toda modificação exige cautela e reflexão, especialmente no que tange ao resguardo da liberdade de expressão política, a pedra angular do ambiente democrático.

Entender como se constituem os partidos políticos, sua organização, funcionamento e evolução no tempo e espaço é fundamental para afinar a compreensão de que forma eles se interagem no espectro da democracia representativa, reafirmando sua importância e essencialidade.

ARRIAGADA30, num artigo sobre partidos políticos e crises de representatividade especificamente na democracia chilena, não poupou esforços em destacar que “os partidos políticos não vão desaparecer, porque se desaparecerem desaparece também a democracia; é inconcebível uma democracia sem partidos. O que pode desaparecer é o sistema de partidos que existe hoje em dia”31, porque, da

mesma forma que nasce e se consolida, também morre e surge outro novo.

Nesse contexto é que se propõe estudar o regime jurídico dos partidos políticos na democracia brasileira. Para tanto, foi dividido referido trabalho de pesquisa em quatro capítulos.

O primeiro cuidará dos elementos que justificam a expressão e, portanto, a operacionalização da democracia, enquanto alicerce que é do presente trabalho de pesquisa. A preocupação não se direciona em verificar a forma de criação particularizada de cada regime democrático, segundo o viés social e suas vicissitudes em comparação aos demais regimes autocráticos de governo, mas o modo como a democracia e seu sistema representativo, uma vez implantados, se sustentam e sobrevivem no ambiente que melhor reflete as decisões do povo – o Parlamento – e também pelos principais atores na organização dessas manifestações – os Partidos Políticos. Nesse sentido é que a democracia brasileira também será examinada, na sequência e em subcapítulo próprio.

política de seu povo, concepção clara de sua estrutura, sua mentalidade, seu viver, suas crises e

suas endemias naturais e sociais, mas por “obras feitas” de outros povos mais senhores da sua

dignidade.

30 ARRIAGADA, Genaro. Partidos políticos y crisis de representatividad. In CHILE. ODCA

Organização Democrata Cristã da América. La Reforma de Los Partidos Políticos. Santiago: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2003. p. 55.

31

Tradução livre do texto original: “los partidos políticos no van a desaparecer, porque si

desaparecen, desaparece la democracia también; es inconcebible uma democracia sin partidos.

(24)

O segundo capítulo trará uma releitura sobre os partidos políticos, iniciando os estudos de sua origem e formação em conjunto à integração que possuem com o ambiente externo, merecendo também destaque a forma pela qual se estruturaram e se institucionalizaram ao longo do tempo. Destaques receberão os diversos arranjos políticos – alianças, coligações etc. – existentes à legitimação do exercício da ação política.

O terceiro capítulo, por sua vez, se ocupará de examinar a entrada dos partidos políticos em solo brasileiro, melhor dizendo, a formatação do sistema partidário conforme o desenho assumido pelo sistema eleitoral de cada momento histórico.

O quarto e último capítulo restringir-se-á a pontuar os aspectos da reforma política e sua incidência, direta ou indireta, no regime jurídico dos partidos políticos, examinando os pontos que insinuam plena inovação ou, simplesmente, copiam modelos de insucesso do passado brasileiro ou de estrangeirismos desprovidos do real conhecimento das necessidades e prioridades do povo face ao meio em que vive.

(25)

2. ANOTAÇÕES PRELIMINARES

A representação política, o ambiente parlamentar e os partidos políticos são as ferramentas basilares à operacionalização de qualquer ambiente democrático.

Nesse sentido, DUVERGER32 não poderia ter sido mais didático ao

apontar quais seriam os vetores do regime democrático, correlacionando-os, in verbis:

É a seguinte a definição mais simples e mais realista de democracia: regime em que os governantes são escolhidos pelos governados, por intermédio de eleições honestas e livres. Sobre esse mecanismo de escolha, os juristas, após os filósofos do século XVIII, desenvolveram uma teoria de representação, o eleitor dando ao eleito mandato para falar e agir em seu nome; dessa maneira, o Parlamento, mandatário da nação, exprime a soberania nacional. O fato da eleição, como a doutrina da representação, foram profundamente transformados pelo desenvolvimento dos Partidos. Não se trata doravante de um diálogo entre eleitor e eleito, Nação e Parlamento: um terceiro se introduziu entre eles, que modifica, radicalmente, a natureza de suas relações.

Pela importância, melhor dizendo, pelo alicerce com que referidos temas dão suporte à presente dissertação, não se poderia deixar de reservar um capítulo próprio, e obviamente inaugural, para o tratamento da dinâmica do regime democrático de governo, notadamente, os seus graus, a representação política e o ambiente parlamentar, inclusive em solo brasileiro.

2.1 EVOLUÇÃO E GRAUS DA DEMOCRACIA

Viver a sociedade e em sociedade, participando direta e indiretamente, opinando e decidindo sobre seu destino, com direitos e liberdades plenamente

32 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica.

(26)

assegurados e em igualdade de condições é a fórmula que o ambiente democrático efetivamente instituiu para a regência do poder soberano no Estado de Direito.

Decisão ampla, de natureza coletiva, vinculada a todo o corpo social, proferida por uma maioria representada a partir de eleições amplas, igualitárias e constantes consolida, por fim, os elementos essenciais à sua caracterização.

Para BOBBIO33, a democracia exige um elemento que vai além dessas regras: “é preciso que aqueles que são chamados a decidir ou a eleger os que deverão decidir sejam colocados diante de alternativas reais e postos em condição de poder escolher entre uma e outra”. Somente assim, com garantia dos direitos de livre manifestação de opinião, de reunião e de associação é que os mecanismos caracterizadores do regime democrático estariam plenamente consolidados.

Fato é que, em suma, nenhuma outra fórmula política à regência de um governo, até o momento, conseguiu atingir esse ideal comum ou sequer a ele propor melhorias.

A democracia tem sido o palco exclusivo das liberdades. É fato.

Quer-se crer que, por essa razão, tenha se tornado o modelo de referência para muitos povos, para muitas outras Nações.

Sua origem remonta à Grécia antiga, Atenas. Por dois séculos, desde as reformas de Clístenes, 509 a. C., à paz de 322 a. C., durante a vida e pensamento filosófico de Platão (429-347 a.C.), Sócrates (470-399 a.C.) e Aristóteles (384-322 a. C.), até a transformação das instituições políticas por Antípatro, o general da Macedônia e apoiador dos reis Filipe II e Alexandre (o Grande), a democracia foi estabelecida como o primeiro modelo de governabilidade, assim permanecendo durante todo o limiar do século XVIII34.

A etimolologia do termo “democracia” combina os radicais gregos demo e kracia, significando, respectivamente, povo e governo e, portanto, a ideia de um governo feito por seu próprio povo.

De fato, fazendo-se um comparativo entre as três atuais, e mais comuns, formas de regime de governo, verifica-se que nem o regime autoritário nem o totalitário conseguem alcançar o ideal proposto para um regime democrático.

33 BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6ª ed. Tradução de

Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997 (Coleção Pensamento Crítico: vol. 63). p. 19/20.

34 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 36ª ed., São Paulo:

(27)

FERREIRA FILHO35, com a didática que lhe é peculiar, envolvendo as

interfaces da força política encontrada em cada regime de governo, além de também reafirmar que no regime democrático as liberdades de expressão e de compartilhamento de informações, estabelecidas “com o objetivo de propiciar a disputa, a intervalos regulares, entre líderes e partidos a fim de alcançar o poder por meios não violentos” estão presentes, lembrou que no regime autoritário, embora existente um pluralismo político, a manifestação é limitada a um grupo governante, consolidado “dentro de limites mal definidos, conquanto previsíveis”, desprovido de uma ideologia elaborada e de uma mobilização política significativa, e no regime totalitário, a ideologia oficial nenhuma liberdade de manifestação resguarda ao cidadão, senão ao “partido político único, de massa, que controla toda a mobilização política e o poder concentrado em mãos de um pequeno grupo que não pode ser afastado do poder por meios institucionalizados e pacíficos”.

Em outras palavras, o espaço de governabilidade proferido por uma minoria no poder é o que caracteriza a forma aristocrática de governo, quer seja por seu regime autoritário ou totalitário de governo, denotando traços, de fato, verdadeiramente distantes ao comportamento das liberdades pacíficas que são asseguradas em um ambiente democrático.

ROUSSEAU36, considerado o pai da democracia moderna, critica apenas

a forma como se quer assentir a democracia: pelo viés da representação política. Por acreditar que à soberania não se cabe qualquer forma de representação, em razão disso sustenta que uma verdadeira democracia, em regra, nunca existiu e nunca existirá, na medida em que, para sua compatibilidade, há a necessidade de se pressupor um Estado pequeno e pobre. Caso contrário, a degenerescência natural do governo o remete não apenas à aristocracia, mas também ao pendor natural da realeza de uma monarquia, sem a mínima possibilidade de volta. In verbis:

O governo, com efeito, só muda de forma quando, perdida a elasticidade da mola, esta o deixa excessivamente enfraquecido para poder conservar aquela. Ora, se se estendendo, ela afrouxasse mais ainda, sua força se tornaria inteiramente nula e ela não teria condições de subsistir. É necessário, pois, remontar e comprimir a

35 FERREIRA FILHO, ibidem, p. 105.

36 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Tradução de Rolando Roque da Silva. Edição

(28)

mola, à medida que esta cede; de outro modo, o Estado que ela sustém desabaria em ruína.

Entretanto, por mais que ROUSSEAU considerasse a verdadeira democracia impraticável, questionando, em especial, o seu funcionamento pelo viés da representação política ou, ainda, defendesse a impossibilidade da soberania ser representada, haja vista institucionalizar uma submissão completa da vontade geral dos súditos à vontade particular do soberano, tanto a ideia de democracia representativa quanto o seu exercício pleno quebraram barreiras, fazendo-se predominar em praticamente todos os povos. Se bem ou mal, conforme também refletido por BOBBIO, se verdadeiramente cumprido, teria sido o ideal democrático pela “democracia real”37, ela existiu e sobreviveu com os seus defeitos.

Consoante ASSIS BRASIL38, o ideal democrático só avançou porque consolidava, de fato, o regime das liberdades e dos direitos, individuais e coletivos. Nas suas observações:

Seja como fôr, e apezar de quaesquer anathemas que contra a democracia se vibrem, é facto positivo que as nações livres do nosso tempo revelam todas, por signaes evidentes, indole democratica. Por toda parte o povo é chamado a influir na constituição dos orgams do governo e administração; por toda parte perdem terreno os ultimos laivos de dominação pessoal, e os próprios individuos que se levantam para repellir a palavra democracia, não raro, são os primeiros em reclamar contra as intrusões do despotismo e em favor da liberdade. [sic]

37 Segundo BOBBIO (1997, p. 22/33), seis promessas de uma democracia ideal não foram cumpridas

pela democracia real. A primeira se destaca no campo da distribuição do poder, haja vista a criação de grupos contrapostos e concorrentes protagonizando a disputa do poder em lugar da unidade ideal de participação que devia ter sido mantida para cada indivíduo; outra, diz respeito à representação, que acabou sendo desvirtuada do fluxo de defesa dos interesses da Nação para atender os interesses particulares do grupo representado; a terceira, é relativa à permanência do poder oligárquico de uma minoria monopolizando o poder, recebendo dele suas vantagens e direcionando a vida privada da maioria que de seus desígnios depende; outra, é a incapacidade de ter ocupado todos os espaços, sem que o indivíduo fosse visto enquanto fiel trabalhador, estudante, soldado, consumidor, doente etc., mas simplesmente no seu papel geral de cidadão, com possibilidade, espaços gerais, para exercer o seu direito de participação plena; a quinta,

reflete a promessa de se eliminar o poder invisível, aquele decorrente de “máfia, camorra, lojas

maçônicas anômalas, serviços secretos incontroláveis e acobertadores dos subversivos que

deveriam combater” (ibidem, p. 29); a última, relaciona-se com a educação para a cidadania.

38 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia).

(29)

Nesse sentido, DALLARI39, além de afirmar que a única relação existente

entre a democracia antiga e a moderna seria “a noção de governo do povo” e não, exatamente, “a noção do povo que deveria governar”, o Estado Democrático moderno teria nascido das irresignações contra o absolutismo, “sobretudo através da afirmação dos direitos naturais da pessoa humana”, justamente porque tem por fundamento a razão de resguardar “a supremacia da vontade popular”, “a preservação da liberdade” e “a igualdade de direitos”.

Para TILLY40, o exame do vigor de uma democracia o levou, sem poupar esforços, a registrar que sua plenitude só é alcançada se significativas mudanças na forma do relacionamento político entre o Estado e seus cidadãos vierem a ser promovidas. De modo que implantados, e consequentemente alicerçados, devem ser os instrumentos jurídicos que garantam consultas amplas, igualitárias, protegidas e mutuamente vinculantes. A contrario sensu, qualquer forma de descrédito nessa relação, vale dizer, na integração harmoniosa desses vetores, o reflexo imediato será o da sua desdemocratização.

Para o autor, o exame de uma democracia vai além. Não deve ser visto apenas a partir do atendimento de pré-requisitos estanques e englobados de uma lista estática.

Tomando-se por base a doutrina da “democracia poliárquica” de Robert Alan Dahl, que preordena a necessidade de atendimento a todas as seis instituições do regime de governo para que democrático seja ele considerado, que são “oficiais eleitos; eleições livres, justas e frequentes; liberdade de expressão; fontes de informação alternativas; autonomia associativa; e cidadania inclusiva”41, na visão de

TILLY, o critério que deve ser adotado para se verificar o status de um regime democrático como, inclusive, proposta de melhoria a essa doutrina poliárquica é a sua definição orientada pelo processo. Vale dizer, in verbis:

Se queremos ter informações sobre as causas e os efeitos da democratização ou desdemocratização, não temos outra escolha senão reconhecê-los como processos contínuos, e não apenas como simples passos em um caminho que leva numa ou noutra direção.

39 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,

2015. p. 146/150.

(30)

Em suma, para propósitos comparativos e explicativos, não podemos ficar apenas com uma checklist de variáveis cruciais42.

De modo que os juízos envolvidos no comportamento que um Estado deve ter em relação às demandas de seus cidadãos para que consolidados sejam os elementos do ideal democrático consistentes na amplitude, igualdade, proteção e caráter mutualmente vinculante das consultas, para TILLY43, em primeiro lugar,

indispensável verificar “qual a extensão da manifestação desses conjuntos de demandas”; na sequência, “quão equitativamente diferentes grupos de cidadãos experienciam a tradução de suas demandas em ação do Estado”; assim como “em que extensão a própria extensão das demandas recebe a proteção política do Estado”; e, por fim, “o quanto o processo de tradução envolve ambos os lados, os cidadãos e o Estado”.

Havendo qualquer fragilidade nesse engendramento de consultas amplas, igualitárias, protegidas e mutuamente vinculantes, o regime democrático se submeteria, quando muito, a um processo que ele convencionou chamar de desdemocratização. Na hipótese desse Estado mergulhar em um período autocrático, sinalizando o início de um viés negativo ao processo de democratização anteriormente conquistado, numa visão bastante otimista, TILLY defende a possibilidade de sua reoxigenação, com restabelecimento do status quo ante, ou, até mesmo, alcance de melhorias democráticas jamais experimentadas.

Por consultas e participação política ativa dos cidadãos nos negócios do Estado, tem-se então a assertiva de que eleições amplas e igualitárias, livres, justas e frequentes são elementos próprios do regime democrático, apenas dele.

Assim foi como se mostrou a democracia desde a sua raiz: da experiência encontrada no modelo dito direto ateniense aos modelos liberais de democracia representativa dos séculos XVIII e XIX e, subsequentemente, contemporâneos, listados por CASTANHO44 como, resumidamente, a democracia elitista de Joseph

Alois Schumpeter, a democracia pluralista de Robert Alan Dahl, as teorias democráticas de Giovanni Sartori, a visão de Estado e de democracia por Norberto Bobbio, a democracia deliberativa de Jügen Habermas, a democracia participativa

42 TILLY, Charles. Democracia. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013. p. 24. 43 TILLY, ibidem, p. 27-28.

44 CASTANHO, Maria Augusta Ferreira da Silva. E-Democracia: a democracia do futuro?. Dissertação

(31)

de Carole Pateman, a democracia semidireta e, ainda, as democracias de natureza liberal, marxista, popular, providencialista, industrial, partidária, plebiscitária, dualista, de referência e eletrônica (e-democracia).

LIJPHART45 vai além, demonstrando, a partir de trinta e seis modelos democráticos diversos, as múltiplas maneiras de funcionamento e desempenho de uma democracia, segundo suas instituições governamentais e, notadamente, concentração de poder.

Afinal, consoante enfatizado por CASTANHO46, a igualdade política assim como o privilégio dado às liberdades pela democracia do século XVIII foi assentida no século seguinte, especificamente no momento de institucionalização das democracias modernas, quando países mais evoluídos já iniciavam a adoção de um sistema eleitoral institucionalizado por instrumentos “como o sufrágio universal, sistema partidário, eleições periódicas e confiáveis e respeito aos direitos individuais”.

Mesmo com prós e contras, a democracia constitui um ambiente sedutor, sedutor pelas liberdades que assegura existirem.

2.2 O DINAMISMO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA NA FÓRMULA DEMOCRÁTICA

O sistema representativo tem ligadura imediata com a democracia desde sua origem, no local considerado como o berço da civilização ocidental e palco de atuação de um dos principais líderes democráticos da História, o estadista Péricles (499-429 a. C.): Atenas, na Grécia antiga.

45 Concluiu pela existência e distribuição da organização política, e, portanto, do poder, sob duas

vertentes distintas: a primeira, a partir da seara de um modelo majoritário, tencionado a conduzir o poder à regência de um único partido e, consequentemente, à formação de um legislativo bipartidário, capaz de proporcionar melhor condição de governabilidade ao país; e, a segunda, a partir de um modelo consensual, ou consociativo, de concentração do poder nas forças multipartidárias que se encontram espalhadas no legislativo e que, para condição de governabilidade, acaba exigindo a formação de uma base de apoio integrada pela maioria, em consórcio ou coalizão, de partidos (LIJPHART, Arend. Modelos de Democracia: desempenho e padrões de governo em 36 países. Tradução de Roberto Franco. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003).

46 CASTANHO, Maria Augusta Ferreira da Silva. E-Democracia: a democracia do futuro?. Dissertação

(32)

De acordo com o rememorado por FERREIRA FILHO47, o povo se reunia

em assembleia na praça central denominada Ágora, para discutir e deliberar sobre questões fundamentais da comunidade local, escolhendo o seu governante por sorteio, e não por eleição, por acreditar ser esse o meio mais legítimo – e isonômico – de seleção e funcionamento da democracia dita direta. A governabilidade local, portanto, a ele era confiada.

MONTESQUIEU, analisando as leis que impactavam diretamente a natureza do governo, já havia alertado que numa democracia:

[...] o povo é admirável quando escolhe aqueles aos quais deve delegar uma parte de sua autoridade. Ele deve ser determinado apenas por coisas que não pode ignorar e por fatos que se encontram à vista, pois todas essas coisas são fatos sobre os quais se está mais bem informado em praça pública do que um monarca em seu palácio48.

Forçoso reconhecer que, mesmo no modo da democracia direta ateniense, dava-se início, portanto, ao processo de governabilidade legitimado pelo viés da representação política.

TILLY49 aferia a história de modo contrário.

É um feroz contestador à inserção da civilização ateniense como sendo a precursora na criação e implantação da democracia, de modo que autorizado fosse o recebimento do status de ancestral das democracias modernas. Assim o faz em decorrência das deficiências vistas no modo de constituição da representação política, já que o exercício dos direitos políticos se concentrava nas mãos de poucos cidadãos, assim considerados os homens adultos, livres e proprietários dos escravos que integravam aproximadamente a metade da população ateniense.

Para TILLY, a Europa e a América do Norte, especificamente no período do século XVIII, é que deveriam representar os lugares centrais de implantação da democracia, por terem sido as pioneiras à criação de instituições que assegurassem o pleno exercício do direito de participação política na democracia representativa, ao promoverem significativas mudanças na forma de relacionamento político entre

47. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A Democracia no Limiar do Século XXI. São Paulo:

Saraiva: 2001. p. 15.

48 MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. Tradução Cristina Murachco.

2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 2ª tiragem: 2000. p. 20.

(33)

Estado e seus cidadãos, consolidando os instrumentos jurídicos que garantiam efetivamente o engendramento de “consultas amplas, igualitárias, protegidas e mutuamente vinculantes”.

Entretanto, com todo o respeito, por mais simplista que pudesse revelar o modo de participação política ateniense, conforme dito por ASSIS BRASIL50, tratava-se de um modelo que tratava-se encontrava no tratava-seu estado puro, atravessando período rudimentar, porém com capacidade plena para corresponder ao paradigma da democracia moderna.

Assim, o que se verifica das acepções doutrinárias em torno do nascedouro de uma democracia é que o sistema representativo, provavelmente já existente, diga-se de passagem, evoluiu pari passu ao desenvolvimento e maturidade do corpo social, trazendo uma consequência natural aos regimes democráticos: sua repaginação.

Acredita-se que o modo de representação política engendrada a cada período democrático tenha sido o veículo motor responsável por essa evolução, essa repaginação.

Para DALLARI51, a supremacia da vontade popular, enquanto um dos

pilares de sustentação do Estado Democrático, é que teria colocado o problema da participação popular no governo, “suscitando acesas controvérsias e dando margem às mais variadas experiências, tanto no tocante à representatividade, quanto à extensão do direito de sufrágio e aos sistemas eleitorais e partidários”.

Daí porque é possível concluir que a democracia e a representação política na contemporaneidade caminham juntas, por estrita dependência sua.

A representação política operacionaliza-se pela via da delegação de poderes que é outorga a uma pessoa por outrem. É um instrumento de substituição da pessoa na expectativa de que a representante, em seu nome, pratique os atos que lhes foram autorizados.

Tem seu conceito originário no Direito Privado, especificamente no Direito Civil, nas causas de sucessão, vale dizer, de substituição da pessoa do falecido com a convocação de seus herdeiros ou sucessores para que façam jus ao direito à herança. Sob denominação de mandato, também é um instrumento de uso no

50 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia).

Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998, p. 17.

51 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,

(34)

Direito Comercial, especificamente na realização de negócios por outrem, o legítimo comerciante, para terceiros52.

A acepção primitiva, privada, do mandato era o de ser um contrato firmado pelo ônus da amizade, com fundamento na lealdade e fidelidade do amigo, a exemplo da defesa criminal advogada pelo romano Marco Túlio Cícero, no Pro Roscio Amerino53 e a ação do jurista romano Prudentissimus Julius Paulus,

conhecido como simplesmente Paulo, no Digesto54.

Na seara do Direito Público, o mandato é a forma utilizada pelo Direito Internacional Público para que o Estado soberano, por via da representação diplomática, possa exercer suas finalidades na vida internacional e, consequentemente, na sociedade dos Estados.

No Direito Constitucional de certas nações, conforme assinala DE PLÁCIDO E SILVA, ganha contorno de destaque na representação das minorias em um regime eleitoral, visto que “assegura a certas classes ou organizações políticas, o direito de elegerem seus candidatos aos corpos legislativos ou eletivos, mesmo que não consigam o número de votos necessários para composição de uma maioria”55.

Enfim, a força dos poderes conferidos no mandato é que legitima a efetividade da representação.

Embora reconheça DALLARI56 haver na doutrina divergência quanto à

acepção do uso do termo “mandato político”, posto considerar imprópria a transposição de um instituto do direito privado à seara do direito público, a seu ver, referida denominação é plenamente aceitável, na medida em que alguns mandatos utilizados para a representação política popular guardavam, também, natureza contratual, com plena coincidência de origem, como, por exemplo, o mandato imperativo.

Independentemente deste fato, sustenta o autor, o mandato político possui características peculiares suficientes a lhe conferir autonomia plena,

52 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993 (4º vol.). p.

103/104.

53 CARPINETTI, Luís Carlos Lima. A defesa de Sexto Róscio Amerino. Cadernos do CNLF, vol. XII, nº

13. Rio de Janeiro: CIFEFIL, 2009. Disponível em: < http://www.filologia.org.br/xiicnlf/13/02.pdf>. Acesso em: 20-fev-2016.

54 DE PLÁCIDO E SILVA, ibidem, 3º vol., p. 137/147. 55 DE PLÁCIDO E SILVA, loc.cit.

56 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,

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desvinculada da origem privada, que são: (1) a expressão da vontade popular de toda a circunscrição eleitoral pelo mandatário onde foi candidato para tomada de decisões, embora eleito por uma parte deste povo, desvinculando-se, assim, o mandato do número de votos obtidos pelo mandatário; (2) a autonomia e a independência do mandatário de decidir em nome do povo, praticando ato que deverá ser por todos obrigatoriamente atendido; (3) o caráter geral aos poderes recebidos pelo mandato, dentro da esfera de competência do cargo para o qual o mandatário foi eleito; (4) a irresponsabilidade do mandatário de dizer porque optou por uma ou por outra orientação no momento de sua decisão; e (5) a irrevogabilidade do mandato conferido por prazo determinado, salvo os casos de aplicabilidade do instituto do recall visto em alguns Estados norte-americanos “e é de alcance muito restrito, não chegando a desfigurar o princípio geral da irrevogabilidade”57.

Ganhando novos contornos e naturezas jurídicas distintas a cada momento de consagração da democracia, quatro núcleos diferenciados de mandato representativo foram experimentados até se chegar à formula contemporânea vigente. Foram eles: mandato imperativo, mandato deliberativo, mandato por investidura e mandato por delegação.

Nas ponderações de CAGGIANO58 é que se busca a síntese do

necessário, suficiente à compreensão e distinção de cada uma dessas formas de mandato na consolidação da representação política.

A seu ver, a primeira forma de mandato existente era o mandato representativo imperativo, que consagrava a linha de pensamento de Jean Jacques Rousseau. Correspondia àquela no qual o representante, ora mandatário, se limitava a atender a vontade do grupo por ele representado. Pronunciava-se exclusivamente sobre as questões predeterminadas por esse grupo, assumindo o compromisso de prestar contas de suas atividades, sob pena de destituição do cargo de mandatário a qualquer momento. Referido mandatário era concebido como simples procurador dos interesses da sua comunidade nomeante59.

57 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,

2015. p. 158.

58CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado

Federal, Centro Gráfico, 1987. p. 17-25.

59 Id. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 36ª ed., São Paulo:

(36)

A segunda forma de mandato seria o mandato deliberativo, sustentado na doutrina do abade Emmanuel Joseph Sieyès. Introduzida era a ideia de mandato livre, pautada na doutrina da soberania nacional, de representação de uma coletividade e não mais de um cidadão. Sua origem decorria dos movimentos revolucionários do século XVIII, consistindo na apresentação de um mandato “desvinculado da vontade do grupo que elege o representante, podendo este decidir as questões nacionais livremente, sem imposições quanto ao atendimento de instruções de antemão estabelecidas”60. Para esse modelo representativo, na voz de

CANOTILHO61, “a representação política tem como ponto de partida a teoria da soberania nacional e a soberania nacional conduz ao governo representativo”.

A terceira forma de mandato representativo, prossegue CAGGIANO62, seria o mandato por investidura, que ganhava vez a partir da institucionalização do partido político e da importante missão que assumia como colaborador direto no processo de seleção do governante. Trazia, à guisa de linha de comando, uma nova forma de exteriorização das opiniões pelo cidadão, qual seja, a de jungir a composição governamental não mais às ordens exclusivas dos eleitos, mas também às ordens ditadas por seus partidos. Assim, reforçou a autora63, ex vi:

Ao Partido, no novo contexto, compete: não só o enquadramento dos eleitores/representados como o dos eleitos/representantes, os dois polos da equação que se estabelece no jogo da conquista e do exercício do poder no ambiente das sociedades.

De outro lado e com fundamento nas lições de Maurice Hauriou, CAGGIANO complementou informando que a delegação de poderes da Nação para o Governo não era suficiente para equilibrar e harmonizar a comunidade social, senão a articulação de dois poderes distintos e opostos, o majoritário, ou da Nação, e o poder minoritário, ou do Governo. Melhor dizendo:

(...) o representante resta investido do poder de querer pelo todo, incorreto qualquer vínculo jurídico entre a vontade do eleitor, expressa pelo sufrágio, e a atuação do parlamentar. Como explicam

60 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília:

Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p. 17.

61 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.

ed.Coimbra: Almedina, 2000. p. 113.

62 CAGGIANO, loc.cit.

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Tabela 1 - Vínculo e evolução partidária dos candidatos eleitos à Presidência da República  no período da Primeira República
Tabela 1 - Vínculo e evolução partidária dos candidatos eleitos à Presidência da República  no período da Primeira República  (“continuação”)
Tabela  2  -  Apresentação  e  situação  jurídica  dos  partidos  políticos  no  período  de  1945  a  1964
Tabela  2  -  Apresentação  e  situação  jurídica  dos  partidos  políticos  no  período  de  1945  a  1964  (“continuação”)
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