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O direito ao trabalho do preso como concretização do direito ao desenvolvimento : a necessidade de um regime jurídico específico

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Academic year: 2021

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O DIREITO AO TRABALHO DO PRESO COMO CONCRETIZAÇÃO

DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO: a necessidade de um regime

jurídico específico

São Cristóvão

2017

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O DIREITO AO TRABALHO DO PRESO COMO CONCRETIZAÇÃO

DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO: a necessidade de um regime

jurídico específico

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal de Sergipe, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação do Professor Doutor Carlos Augusto Alcântara Machado.

São Cristóvão

2017

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BANCA EXAMINADORA

________________________________________

________________________________________

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responsável pelas ideias aqui apresentadas. As discussões travadas em sala de aula com os colegas mestrandos e com todos os professores do programa foram essenciais para esta dissertação.

À Tássia, por tudo. O seu companheirismo e afeto de uma década já fazem parte da minha personalidade. Sem você nenhum trabalho faria sentido. Sem a sua paciência e amor eu não estaria aqui. Obrigado.

Ao professor, orientador e amigo, Carlos Augusto Alcântara Machado, pelas aulas, ajuda, confiança, paciência e sempre preciosas lições.

Aos professores Luciana Aboim Machado Gonçalves da Silva pelas valiosas contribuições por todo a jornada do Mestrado e Henrique Ribeiro Cardoso pelas observações no Exame de Qualificação.

Aos amigos da Defensoria Pública de Sergipe, companheiros de lutas e indignações com o mundo jurídico.

Aos colegas de Mestrado, pela ajuda durante todo o curso.

Por fim, aos meus pais, Eunice e Antônio Carlos, aos meus avós, Theobaldo, Sônia, Creuza e Murilo e à toda a minha família pela formação de caráter durante toda a minha vida. Obrigado por todo o suporte afetivo sempre presente.

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AO DESENVOLVIMENTO: a necessidade de um regime jurídico específico RESUMO

A presente dissertação, adotando o método dedutivo, tem como objetivo estudar os referenciais teóricos do direito ao trabalho do indivíduo penalmente condenado, defendendo, inicialmente, a fundamentalidade de tal direito como expressão da etapa fraternal do constitucionalismo contemporâneo, bem como a sua exigibilidade perante o Estado, uma vez que este, ao privar o indivíduo de sua liberdade, estabelece com o condenado uma relação jurídica especial, assumindo para o si o dever de dar plena efetividade aos direitos dos presos, tanto como forma de garantir a ressocialização destes, como também concretizar o direito ao desenvolvimento por eles titularizado, particularmente em razão da sua condição de grupo socialmente vulnerável. Por fim, discute-se o regime jurídico aplicado ao trabalho encarcerado em uma perspectiva constitucional, uma vez que a ausência de disciplina normativa sobre o tema, bem como a inadequação das normas atualmente vigentes com a Constituição Federal de 1988 provocam uma proteção insuficiente da ordem jurídica direito de trabalhar do apenado.

Palavras-chave: Direito ao trabalho. População carcerária. Desenvolvimento humano. Regime jurídico.

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RIGHT TO THE DEVELOPMENT: necessity of a specific legal regime abstract This dissertation, adopting the deductive method, aims to study the theoretical framework of the right to work of the incarcerated individuals, defending, initially, the fundamentality of such right as an expression of the fraternal stage of contemporary constitutionalism, as well as its enforceability towoards the State since, by depriving the individual of his freedom, he establishes with the condemned a special juridical relation, assuming the duty to give full effect to the rights of the prisoners, both as a way of guaranteeing their re-socialization, as well as implement the right to development that they hold, particularly because of their status as a socially vulnerable group. Finally, it's discussed the legal regime applied to the incarcerated work in a constitutional perspective, since the absence of normative discipline on the subject, as well as the inadequacy of the norms currently in force with the Federal Constitution of 1988, causes insufficient protection of the legal order to the right to work of the imprisoned.

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2 O DIREITO FUNDAMENTAL AO TRABALHO...11 2.1 Do Estado Liberal ao Estado Fraternal...12 2.1.1 A Fraternidade da Constituição Federal de 1988...17 2.2 O Trabalho como direito fundamental de caráter social………….…..………21 2.3 O Direito do trabalho nas normas internacionais……….………...…33 2.3.1 Instrumentos internacionais do direito ao trabalho em geral……..…..….…...34 2.3.2 Normas internacionais sobre o trabalho encarcerado………..……….36 3 DIREITO AO DESENVOLVIMENTO DOS GRUPOS VULNERÁVEIS.….……..…38 3.1 O Direito ao desenvolvimento……….….….…..….…38 3.1.1 Desenvolvimento humano, crescimento econômico e direito econômico do desenvolvimento………...……….44 3.1.2 Direito ao desenvolvimento e direitos humanos………...………46 3.2 Direito ao desenvolvimento dos grupos vulneráveis: a população carcerária………...…………63 3.2.1 População carcerária como grupo vulnerável………..……..…65 3.2.2 A responsabilidade estatal no desenvolvimento do preso………..…….…68 4 A NECESSIDADE DE UM REGIME JURÍDICO DO TRABALHO ENCARCERADO………..………86 4.1 Constitucionalização do Direito………...……87 4.2 A Lei de Execuções Penais frente à Constituição Federal de 1988…...…….90 4.3 O direito de trabalhar e o dever de trabalhar………...……….94 4.4 A Necessidade de Estatuto Jurídico do preso trabalhador…………..….….102 4.4.1 Regime jurídico do trabalhador condenado em regime aberto ou semiaberto...103 4.4.2 Regime jurídico do trabalhador condenado em regime fechado………...……105 4.4.2.1 A criação de Estatuto Jurídico do preso trabalhador………...……111 4.4.2.2 Interpretação conforme da CLT e não recepção da LEP…………....….…..113 5 CONCLUSÃO………...…115 REFERÊNCIAS………...………118

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1 INTRODUÇÃO

Esta dissertação busca discutir a efetividade do direito ao trabalho da população carcerária. Três são os focos principais do trabalho. Inicialmente, pretende-se demonstrar que o direito ao trabalho foi incorporado ao ordenamento jurídico como direito fundamental de segunda dimensão. Após, serão realizadas algumas considerações sobre o trabalho como método de se concretizar o desenvolvimento humano da pessoa presa. Por fim, será discutido o regime jurídico aplicado ao trabalho realizado no cárcere.

Cumpre destacar que o presente trabalho não pretende discutir os motivos pelo qual o indivíduo teve a sua liberdade privada, ou seja, não se trata, aqui, de um trabalho de criminologia em que se discute a reação social aos fatos tidos como criminosos.

Parte-se do pressuposto de que o direito ao trabalho foi reconhecido pela Constituição Federal de 1988 - CF/88 - como um direito fundamental, compondo a segunda dimensão de tais direitos, também denominados de direitos econômicos, sociais e culturais.

A marca característica destes direitos é a sua dimensão positiva, pela qual o Estado deve garantir a todos o exercício da liberdade plena mediante prestação dos bens jurídicos garantidos pelo ordenamento jurídico. O objetivo dos direitos sociais é que seja alcançada a igualdade em sua perspectiva material, e não meramente formal, como ocorre nos direitos de primeira dimensão.

Diferentemente dos demais direitos sociais, como a saúde, educação e moradia, o direito ao trabalho não exige, em regra, uma prestação direta por parte do Estado, uma vez que a real oferta de empregos está condicionada a diversos fatores econômicos e sociais em que o Estado possui ingerência meramente reflexa, através de suas políticas macroeconômicas.

No entanto, acredita-se que, ao privar a liberdade de um indivíduo, o Estado passa a ter a obrigação de prover as condições necessárias para que esta pessoa tenha a possibilidade de concretizar o seu direito social ao trabalho, uma vez que o indivíduo passa a ter uma relação especial de sujeição ao Estado. Outrossim, por determinação da Lei de Execuções Penais - LEP, o trabalho, além de dever social, deve possuir finalidade educativa e produtiva. Ou seja, o trabalho oferecido pelo

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Estado deve, também, efetivamente capacitar o condenado a ingressar no mercado de trabalho.

Em outra vertente, se buscará analisar o conteúdo e a exigibilidade do direito ao trabalho em razão do direito ao desenvolvimento, demonstrando que os indivíduos privados de sua liberdade, por se tratarem de pessoas em especial situação de vulnerabilidade, merecem tratamento diferenciado na busca da concretização do direito ao desenvolvimento, o que transforma o direito em debate em autêntico direito subjetivo, exigível, portanto, pelos indivíduos encarcerados em face do Estado.

Outrossim, outro ponto a ser discutido é a aplicação ou não da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT - ao trabalho exercido pela população carcerária, uma vez que o §2º do art. 28 da LEP dispõe expressamente que não se aplica este diploma legislativo ao trabalho do preso. Pretende-se discutir a validade desta norma em uma perspectiva constitucional, além de ser feita uma diferenciação entre trabalho interno e externo, uma vez que neste há a possibilidade de contratação do encarcerado, ainda que em regime fechado, por órgãos da Administração Direta ou Indireta e até mesmo por entidades privadas. Assim, pretende-se analisar se a não aplicação da CLT nesses casos viola ou não o princípio da igualdade, pois estabelece regimes jurídicos diversos a pessoas em situações assemelhadas.

Cumpre destacar que, no plano internacional, diversos instrumentos normativos reconhecem o direito ao trabalho em geral, tais como a Declaração Universal de Direitos Humanos, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador).

Especificamente sobre o tema proposto, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas aprovou as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos, adotadas pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, estabelecendo que “deve ser dado trabalho suficiente de natureza útil aos reclusos de modo a conservá-los ativos durante o dia normal de trabalho”.

A população carcerária constitui uma parte da sociedade civil que, em regra, não possui poder de pressão sobre o Estado de forma a reivindicar que sejam efetivados os seus direitos sociais constitucionalmente assegurados. Assim, a

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presente dissertação tem como objetivo geral defender a concretização de tais direitos para esse grupo populacional que costumeiramente fica excluído da participação da sociedade.

Os objetivos específicos desta dissertação são estudar os referenciais teóricos acerca da função estruturante do Estado na concretização dos direitos fundamentais, verificar o alcance dos direitos social ao trabalho insculpido no art. 6º da Constituição Federal de 1988 e a sua efetividade em relação aos indivíduos privados de sua liberdade, compatibilizar a obrigação de trabalhar dos indivíduos encarcerados (art. 39, V da LEP) com a vedação das penas de trabalhos forçados (art. 5º, XLVII, “c” da CF/88 e art. 1º da Convenção nº 29 da OIT sobre o trabalho forçado ou obrigatório), bem como examinar a necessidade de proteção do trabalho do preso através de estatuto jurídico próprio.

Esta dissertação adotou o método dedutivo, tendo como fonte primária a revisão bibliográfica de autores que se debruçaram sobre o tema discutido. Como fonte secundária, foi analisada a jurisprudência dos tribunais a respeito das questões aqui discutidas.

O primeiro capítulo temático demonstrará a fundamentalidade do direito ao trabalho, apresentando a evolução dos modelos de Estado, do liberalismo ao fraternalismo, para, ao final, defender o direito ao trabalho do preso como forma de concretização da igualdade do indivíduo na sociedade.

Em seguida, como consequência da perspectiva igualitária do direito defendido, o segundo capítulo apresentará o direito ao desenvolvimento e demonstrará que o trabalho do indivíduo encarcerado possibilita o seu desenvolvimento humano.

O capítulo final discutirá o estatuto jurídico a ser aplicado ao trabalho encarcerado, uma vez que a vedação da aplicação da CLT sem que seja criado um novo estatuto para regulamentar a relação laboral revelar-se-ia incompatível com o princípio da igualdade.

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2 O DIREITO FUNDAMENTAL AO TRABALHO

O direito à vida é o direito mais básico do ser humano. Contudo, especialmente na sociedade capitalista, os meios de se garantir tal direito advém primordialmente dos frutos do trabalho.

O labor é o primeiro direito social reclamado pelos indivíduos. Se a subsistência do direito à vida depende do trabalho, o direito ao trabalho deve ser garantido a todos. Desta forma, cria-se uma relação íntima de conexão entre a vida e o trabalho.

O trabalho é a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana. No entanto, o sistema de produção atual não possibilita liberdade real ao indivíduo, pois lhe retira a possibilidade de escolher entre usufruir da vida ou trabalhar, na medida em que o labor se tornou necessidade que se impõe como forma de garantia da mera subsistência. É nesse sentido a lição de Ivan de Carvalho Junqueira (2005, p. 73):

É o labor inerente à vida humana, essencial mesmo à desenvoltura do Homem com um mínimo de dignidade. Inobstante hoje estar ele reduzido à mera garantia da subsistência, pela não possibilidade do efetivo gozo frente a outras necessidades das mais prazerosas, reveste-se, sem dúvida, de imperiosa importância prática. E bastante acirrada tem-se mostrado a disputa por postos de trabalho à vigência da ordem capitalista, sendo exigida, então, mão-de-obra cada vez mais qualificada, o que, por outro lado, exclui milhares de outros trabalhadores.

Levando em consideração que os bens materiais se revelam indispensáveis à proteção do direito à vida, e tendo em vista que a aquisição de tais bens depende, em regra, dos ganhos salariais decorrentes do trabalho, assegurar o direito ao trabalho significa assegurar a própria existência do ser humano.

Afastando-se do capitalismo puro, a reivindicação do trabalho como direito social a ser prestado, direta ou indiretamente, pelo Estado surge como exigência de proteção da vida do ser humano. Diante disso, compete às políticas públicas estatais promover intervenções na economia como forma de estimular a criação de empregos.

Não se pode admitir que a proteção da propriedade privada ganhe maior importância do que a proteção da vida dos membros da sociedade. Assim, Rafael

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Sastre Ibarreche (1996, p. 26) ensina que o Estado deve garantir que os indivíduos, especialmente os mais necessitados, possam vender a sua força de trabalho ao mercado. Contudo, não conseguindo fazê-lo, cabe ao próprio Estado garantir a satisfação das necessidades vitais dos indivíduos1.

2.1 Do Estado Liberal ao Estado Fraternal

Na perspectiva liberal clássica, o mercado asseguraria a possibilidade de trabalho para todos aqueles que assim quisessem. Desta forma, somente de forma excepcional deveria o Estado intervir, já que, em regra, sempre haveria emprego para aqueles que se disponibilizassem a vender a sua força de trabalho.

No entanto, a história demonstra que a autorregulamentação do mercado se demonstrou inapta a suprir as demandas sociais dos indivíduos.

Em seu início, o Estado Liberal era fortemente marcado pelo critério do acúmulo de riquezas. A cidadania (participação da vida política do Estado) somente se expressava através da propriedade, no instituto do voto censitário.

Entretanto, diante da luta por direitos da classe trabalhadora, o Estado Liberal se viu obrigado a evoluir nos seus conceitos. Como o objetivo não era alterar o status quo da classe dominante ou promover qualquer forma de revolução no próprio sistema de produção, houve uma ampliação do sujeito de direitos civis e políticos, incorporando os trabalhadores nos critérios de exercício da cidadania.

Assim, incorporou-se ao ordenamento jurídico as reivindicações do proletariado, incluindo nos textos constitucionais e na legislação infraconstitucional os direitos sociais e econômicos.

Com isso, houve uma mudança de paradigma, o Estado Liberal, marcado pela limitação do poder estatal através dos direitos fundamentais de primeira dimensão, se converteu em Estado Social, cuja característica é a tentativa, ao menos a nível teórico, da participação de todos no exercício da vida política e do poder do Estado.

1 “Incluyendo el derecho al trabajo, puesto que, si el Estado ha de garantizar la reproducción de la fuerza laboral, tiene que facilitar que los menesterosos puedan verderla en el mercado; pero si éste falla, él mismo tiene que proporcionar trabajo para permitirles satisfacer sus necesidades vitales.”

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O constitucionalismo não ignorou essa mudança paradigmática. O Estado constitucional, representativo ou de Direito surge como Estado Liberal, empenhado em limitar o poder político tanto internamente, pela sua divisão de poderes, como externamente, através da redução ao mínimo das suas funções perante a sociedade.

O constitucionalismo liberal evoluiu para o constitucionalismo social, que, por sua vez, evoluiu para o neoconstitucionalismo2.

Da antiguidade clássica até o final do século XVIII não existiam constituições escritas, mas apenas um conjunto de princípios com forte influência religiosa que garantiam a existência de direitos perante o monarca, limitando o seu poder.

O constitucionalismo liberal, surgido com as revoluções liberais do final do século XVIII, tinha como foco os direitos civis e políticos, também conhecidos como direitos de defesa, pregando o Estado mínimo, que sustenta que o Estado devese limitar à defesa da ordem e segurança públicas, ou seja, deveria haver um Estado abstencionista, que interviria de forma mínima na economia e nas relações sociais.

O constitucionalismo clássico decaiu porque as desigualdades sociais aumentaram em decorrência de uma grave crise econômica gerada pelo liberalismo puro. Observando-se que a igualdade de partes, pressuposto desta fase do constitucionalismo, ficou limitada ao nível teórico, deu-se a crise do liberalismo, que motivou a evolução para o constitucionalismo social.

Na fase do constitucionalismo social foram incluídos no rol dos direitos fundamentais direitos sociais, econômicos e culturais, que exigem, via de regra, uma atividade positiva por parte do Estado.

Os direitos sociais representam, essencialmente, a luta pela igualdade material e consequente expansão das possibilidades de cada indivíduo. Tais direitos ganharam relevo na história constitucional a partir dos movimentos organizados da

2 Não se ignora que parte da doutrina, seguindo a proposta do jurista argentino José Roberto Dromi, passou a defender a possibilidade de um Constitucionalismo Universal como sucessor do neoconstitucionalismo, o que recebeu a denominação de Constitucionalismo do Futuro. No entanto, como se trata de teoria que, segundo o próprio autor, ainda não é aplicável aos sistemas jurídicos, deixa-se de trabalhar com tal conceito na presente dissertação. Sobre o tema, ver: DROMI, José Roberto. La Reforma Constitucional: El Constitucionalismo del “por-venir”. In: ENTERRIA, Eduardo Garcia de; ARÉVALO, Manuel Clavero (coord). El derecho Público de Finales de Siglo: Una Perpectiva

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sociedade civil em favor dos grupos minoritários ou sem forte expressão e poder político. Neste tema, ensina Boaventura de Sousa Santos (2013, p. 78-79):

A luta pela igualdade, enquanto luta pela redução das desigualdades socioeconômicas, veio muito mais tarde com os direitos sociais e econômicos. Mas tudo isto ocorre dentro do paradigma da igualdade. Este paradigma só foi questionado quando grupos sociais discriminados e excluídos se organizaram, não só para lutar contra a discriminação e a exclusão, mas também para pôr em causa os critérios dominantes de igualdade e diferença e os diferentes tipos de inclusão e exclusão que o legitimam.

[…]

Há já alguns anos, resumi esta grande transformação na luta pelos direitos humanos com a seguinte formulação: temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza e temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos trivializa.

A característica básica do Estado Social é a intervenção nos âmbitos social, econômico e laboral com o objetivo de se garantir um mínimo de bem-estar aos indivíduos que compõe o corpo da sociedade (Welfare State).

As experiências vividas na segunda guerra mundial demonstraram a necessidade de se consagrar a dignidade da pessoa humana como base da reconstrução dos direitos humanos. Assim, com o reconhecimento definitivo da força normativa da Constituição, esta passou a servir de centro gravitacional da ordem jurídica. Ou seja, a Constituição passou a abranger normas de diversos ramos do direito, no fenômeno da constitucionalização do direito, bem como restou assentada a ideia de interpretação das normas conforme a Constituição.

Luís Roberto Barroso ensina que este movimento foi denominado de neoconstitucionalismo que, como modelo constitucional, tem três marcos: o histórico, o filosófico e o teórico.

O marco histórico na Europa Continental foi o constitucionalismo do pós-guerra. No Brasil, este marco foi a Constituição Federal de 1988 e o processo de redemocratização pós ditadura militar.

Ainda seguindo a lição de Luís Roberto Barroso, o marco filosófico é o pós-positivismo, com a aproximação entre o direito e a ética, além da valorização dos direitos fundamentais.

Por fim, o marco teórico do novo constitucionalismo é marcado pelo reconhecimento da força normativa da Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação

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constitucional, baseada no reconhecimento da normatividade dos princípios e na valorização da argumentação e ponderação entre normas constitucionais3.

Se ao constitucionalismo liberal correspondeu o Estado Liberal e ao constitucionalismo social o Estado Social, ao neoconstitucionalismo não corresponde uma nova forma de Estado estabelecida, em que pese a evidente necessidade.

As características das fases do constitucionalismo demonstradas acima indicam que as constituições do Estado Liberal eram marcadas pelos direitos baseados na ideia da liberdade, enquanto que as Constituições do Estado Social eram marcadas pela inclusão dos direitos com fundamento na busca da igualdade material entre os indivíduos.

Por outro lado, o neoconstitucionalismo como nova fase do Direito Constitucional não apresentou novos elementos às Constituições, mas sim uma nova forma de leitura de suas normas, com a incorporação dos valores morais através de princípios constitucionais e de direitos fundamentais.

Ao enunciar as dimensões (ou gerações) de direitos humanos, costuma-se fazer referência aos lemas da revolução francesa: ”liberté, égalité, fraternité”, ou seja, liberdade, igualdade e fraternidade.

Entretanto, apesar da existência do Estado Liberal e do Estado Social, não houve a consolidação do terceiro lema da revolução.

O Estado Fraternal, e, consequentemente, o constitucionalismo fraternal representa a inclusão dos direitos de solidariedade social aos textos constitucionais, além da leitura dos direitos individuais e sociais com a perspectiva fraternal.

Sobre a evolução do constitucionalismo culminando na etapa fraternal, leciona Carlos Ayres Britto (2003, p. 216):

Efetivamente, se consideramos a evolução histórica do Constitucionalismo, podemos facilmente ajuizar que ele foi liberal, inicialmente, e depois social. Chegando nos dias presentes à etapa fraternal esta fase em que as constituições incorporam às franquias liberais e sociais de cada povo soberano a dimensão da

3 Sobre o tema, ver: BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e

constitucionalização do direito: O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil.

Disponível em: <http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/themes/LRB/pdf/neoconstitucionalismo_e_constitucionalizacao_do_direito_pt.pdf> Acesso em: 09 abr. 2016.

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Fraternidade; isto é, a dimensão das ações estatais afirmativas, que são atividades assecuratórias da abertura de oportunidades para os segmentos sociais historicamente desfavorecidos, como, por exemplo, os negros, os deficientes físicos e as mulheres (para além, portanto, da mera proibição de preconceitos). De par com isso, o constitucionalismo fraternal alcança a dimensão da luta pela afirmação do valor do Desenvolvimento, do Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, da Democracia e até de certos aspectos do urbanismo como direitos fundamentais. Tudo na perspectiva de se fazer a interação de uma verdadeira comunidade; isto é, uma comunhão de pela consciência de que, estando todos em um mesmo barco, não têm como escapar da mesma sorte ou destino histórico.

A luta pelos direitos das minorias são travadas tradicionalmente no âmbito coletivo, já que, a nível individual, tais segmentos sociais historicamente desfavorecidos mencionados acima por Carlos Ayres Britto dificilmente conseguem o reconhecimento dos seus direitos. É nesse sentido a lição de Boaventura Sousa Santos (2013, p. 62-64):

Porque os direitos coletivos não entram no cânone originário dos direitos humanos, a tensão entre direitos individuais e direitos coletivos decorre da luta histórica dos grupos sociais que, por serem excluídos ou discriminados enquanto grupos, não podiam ser adequadamente protegidos por direitos humanos individuais.

[…]

Os direitos coletivos existem para minorar ou eliminar a insegurança e a injustiça de coletivos de indivíduos que são discriminados e vítimas sistemáticas de opressão por serem o que são e não por fazerem o que fazem.

O tema da fraternidade foi exaustivamente discutido pelo Procurador de Justiça Carlos Augusto Alcântara Machado em sua tese de doutorado “A garantia constitucional da fraternidade: constitucionalismo fraternal”. Citando o ex-ministro Carlos Ayres Britto acima mencionado, discorre o professor (2014, p. 170):

Especificamente na doutrina pátria, define Carlos Ayres Britto, em conferências e entrevistas, o Constitucionalismo Fraternal como “a terceira e possivelmente a última fase, o clímax do constitucionalismo”. Acrescenta, que o Constitucionalismo Fraternal, como evolução histórica do constitucionalismo, é a “fase em que as Constituições incorporam às franquias liberais e sociais de cada povo soberano a dimensão da Fraternidade”. O constitucionalismo fraternal traz consigo um novo modelo de Estado: o Estado Fraternal.

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O Estado Fraternal tem como característica diferenciadora a inclusão de direitos de titularidade coletiva no rol dos direitos protegidos pelo ordenamento jurídico. Foram incluídos entre os objetivos do Estado assegurar a igualdade de oportunidades para os grupos sociais vulneráveis (negros, mulheres, homossexuais, deficientes físicos etc.) mediante ações positivas por parte dos poderes constituídos. Ou seja, o Estado não deve mais se limitar a garantir a liberdade e a igualdade a todos os indivíduos, passando a se obrigar, também, a atuar mediante ações afirmativas com a finalidade de possibilitar o desenvolvimento humanos de todos os grupos, concretizando-se, assim, a dignidade inerente à toda pessoa humana.

A fraternidade tem como fundamento não apenas a igualdade formal entre todos, mas sim a igualdade jurídica, ou, nas palavras de Carlos Augusto Alcântara Machado, a “igualdade em dignidade”. É neste sentido a sua lição (2014, p. 117):

No entanto, para enfrentar tão singular tema, considerado ainda por muitos – e particularmente pelos juristas em geral (é de se insistir) – como extrajurídico ou meta jurídico, impõe-se a fixação de premissa, sem a qual a fraternidade não poderá ser perseguida: o reconhecimento da igualdade jurídica entre todos os seres humanos. Evidentemente que tal igualdade é antes de tudo uma igualdade em dignidade. Mas dignidade compreendida numa perspectiva dinâmica e não estática. Ou, por outra, entender a pessoa – e as pessoas em geral (considerando a conduta humana em interferência intersubjetiva) em comunidade, numa dimensão comunitária, em um contexto relacional.

Apesar dos poucos estudos sobre o tema, nota-se que este novo modelo de Estado foi apresentado na Constituição Federal de 1988.

2.1.1 A Fraternidade da Constituição Federal de 1988

Conforme exposto, um dos aspectos que permitem se falar em um novo modelo de Estado é o fato de que houve a incorporação de novos elementos às Constituições. Alguns exemplos podem ser mencionados na própria Constituição Federal de 1988. Com efeito, a consagração da defesa do meio ambiente como

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forma de proteção intergeracional representa um dos elementos do constitucionalismo fraternal4.

No entanto, este não é o único exemplo presente na Lei Fundamental brasileira. Neste tema, ensina Carlos Ayres Britto (MACHADO, 2014, p. 170 apud BRITTO, 2007, p. 34-35):

Democracia fraternal, caracterizada pela positivação dos mecanismos de defesa e preservação do meio ambiente, mais a consagração de um pluralismo conciliado com o não-preconceito, especialmente servido por políticas públicas de ações afirmativas que operem como fórmula de compensação das desvantagens historicamente sofridas por certos grupamentos sociais, como os multirreferidos segmentos dos negros, dos índios, das mulheres e dos portadores de deficiência física (espécie de igualdade civil-moral, como ponto de arremate da igualdade política e econômico-social).

Ademais, ainda seguindo as lições de Carlos Augusto Alcântara Machado, deve-se mencionar que a intenção da Constituição Federal de 1988 em criar um constitucionalismo fraternal pode ser evidenciada já em seu preâmbulo, que demonstra a pretensão de se instituir no Brasil um Estado de Direito democrático “destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”.

Após o preâmbulo, já no art. 3º, inciso I, a Lei Fundamental de 1988 anuncia como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Trata-se, aqui, da positivação do já conhecido lema da Revolução Francesa. Consagrou-se a finalidade estatal de se garantir a liberdade, a igualdade (em sua acepção material, ou seja, justiça na concretude) e a fraternidade (representada, aqui, pela solidariedade interpessoal).

A fraternidade pode ser justificada na perspectiva Kantiana, que ensina que a dignidade da pessoa humana é inerente a todos os indivíduos. Desta forma, não podem os homens ser considerados diferentes uns aos outros por critérios subjetivos adotados por um outro grupo. Explica-se.

4 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

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Se todos os homens são iguais em dignidade, o que justifica o tratamento fraternal aos indivíduos, não se pode criar formas arbitrárias de discriminação, como a cor da pele, a orientação sexual, o gênero, a religião ou a classe social a que pertence o indivíduo.

Neste tema, a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, de 4 de julho de 1776, já reconhecia a inerente igualdade entre os indivíduos, afirmando: “consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, como a vida, a liberdade e a procura da felicidade” (tradução livre)5.

Não se falava, à época, de direitos transindividuais, mas nota-se na declaração a presença da premissa do fraternalismo: todos os homens são evidentemente iguais.

Importa salientar que a evolução das fases do constitucionalismo não importaram supressão das conquistas das fases anteriores, em que pese tenham havido mudanças substanciais, em especial em relação à postura do Estado perante o indivíduo. As formas do Estado evoluem, mas não substituem umas pelas outras. Ou seja, o Estado Social não ignorou as conquistas do Estado Liberal, ao contrário, incorporou ao seu modelo os direitos já conquistados. Da mesma forma, o Estado Fraternal não ignora as conquistas do Estado Social, ao contrário, as aprofunda, incluindo um viés humanista ao constitucionalismo.

Diante de tal panorama, o objeto de estudo do presente texto, qual seja, o direito ao trabalho da população carcerária, por se tratar de direito social, tem aproximação ideológica com o constitucionalismo social.

No entanto, aprofundando-se o tema, defende-se, aqui, a conexão do direito em debate com o Estado Fraternal acima explicitado, uma vez que o tratamento jurídico emprestado ao direito ao trabalho encarcerado é essencialmente distinto daquele dado ao trabalhador livre.

Inicialmente, enquanto o trabalhador livre pode, em tese, escolher com o que quer trabalhar e aonde exercerá seu labor, o indivíduo privado de sua liberdade não tem igual oportunidade. Como o Estado é o responsável pelo encarceramento, é ele

5 Diz o texto original: “We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness”.

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quem disponibiliza o trabalho ao preso, não havendo, por parte deste, qualquer escolha.

Dessa forma, qual seria, então, o fundamento da disponibilização do trabalho para o indivíduo encarcerado? Se o objetivo é tratar a pessoa com dignidade, reinserindo-o na sociedade como igual membro dela, não se trata apenas de buscar a igualdade entre todos, o que caracterizaria o constitucionalismo social, mas sim garantir a dignidade humana entre iguais, sem preconceitos, observando-se a marca característica da fraternidade, qual seja, tratar a todos como iguais em prol do bem comum.

Em Vidas do Carandiru: Histórias Reais, Humberto Rodrigues destaca o evidente, mas por muitas vezes esquecido: o preso é um ser humano, que deve ser tratado de forma digna, até porque, inevitavelmente, voltará ao convívio em sociedade. Diz Rodrigues (2002, p. 260):

Se errar é humano e perdoar é divino, ser obrigado a prosseguir com o erro é sobre-humano.

Portanto, cabe aos legisladores, às leis e à Justiça restituir ao ser humano o seu devido valor, a sua dignidade. Se é que através dos tempos ele teve o seu valor reconhecido.

Devemos repudiar o crime, abominar o delito. Todavia, não podemos esquecer que, sempre atrás desses eventos, haverá o ser humano, que, como tal, deverá ser tratado e recuperado para o seu convívio com a sociedade.

Anabela Miranda Rodrigues defende que o Estado possui um dever de auxiliar o retorno do apenado à sociedade, estando tal dever fundado justamente na solidariedade, uma vez que a ressocialização do preso significa não só a concretização de seus direitos fundamentais, como também serve ao melhor interesse da sociedade. Leciona Rodrigues (2001, p. 54):

Para além do «dever ético de solidariedade» a que, entre nós, se referia Eduardo Correia, incumbe ao Estado um específico dever jurídico de prestação ao cidadão recluso: a oferta do auxílio

necessário para que este, querendo, conduza a sua vida futura sem praticar crimes. Um dever duplamente fundado: por um lado, nos

direitos fundamentais do recluso; por outro, em interesses da sociedade constituída em Estado.

(21)

Ademais, conforme será exposto adiante, o indivíduo privado de sua liberdade faz parte de um grupo social vulnerável, que merece tratamento diferenciado por parte do Estado na forma de ações afirmativas, método típico de concretização do viés fraternal da Constituição.

2.2 O Trabalho como direito fundamental de caráter social

O labor é um direito social por excelência. Não por outro motivo, o art. 6º da Constituição Federal de 1988, que inaugura o Capítulo dos Direitos Sociais, desde a sua redação originária, faz menção ao direito ao trabalho6. Como direito social, o

trabalho é, também, direito fundamental.

Sobre a fundamentalidade do direito ao trabalho na ordem constitucional brasileira, defende Maria Hemília Fonseca (2009, p. 142):

No tocante ao direito ao trabalho, as análises realizadas até o presente momento nos autorizam a concluir que se trata de um direito elevado à categoria de fundamental em nosso ordenamento jurídico, eis que a sua normativa base está prevista no art. 6º, do Capítulo II, do Título II, ou seja, está contido no catálogo de direitos da Constituição de 1988.

A menção expressa ao direito ao trabalho como direito fundamental não é exclusividade brasileira. A título de exemplo, as Constituições espanhola de 19787,

6 Algumas Emendas Constitucionais alteraram o art. 6º da Constituição Federal. A redação originária do dispositivo era a seguinte: “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. As Emendas Constitucionais nº 26, 64 e 90 incluiram, respectivamente, a moradia, a alimentação e o transporte ao rol dos direitos sociais.

7 Artículo 35.

1. Todos los españoles tienen el deber de trabajar y el derecho al trabajo, a la libre elección de profesión u oficio, a la promoción a través del trabajo y a una remuneración suficiente para satisfacer sus necesidades y las de su familia, sin que en ningún caso pueda hacer-se discriminación por razón de sexo.

2. La ley regulará un estatuto de los trabajadores. Artículo 40.

1. Los poderes públicos promoverán las condiciones favorables para el progreso social y económico y para una distribución de la renta regional y personal más equitativa, en el marco de una política de estabilidad económica. De manera especial realizarán una política orientada al pleno empleo.

(22)

italiana de 19478 e portuguesa de 19769 (com a VII Revisão Constitucional de 2005)

tratam expressamente do direito ao trabalho, determinando, em essência, que todos os seus nacionais tem o direito fundamental ao trabalho, devendo o Estado adotar políticas que garantam a concretização de tal direito de forma digna, sempre tendo em mente a liberdade individual de cada trabalhador.

O direito ao trabalho se apresenta no ordenamento jurídico brasileiro como um direito fundamental, decorrente da valorização do princípio da dignidade da pessoa humana no direito pátrio. Neste ponto, Maria Hemília Fonseca (2009, p. 98) defende que “a exigência de um direito a trabalhar, além do simples objetivo da sobrevivência física, vincula-se à ideia de dignidade da pessoa humana e, consequentemente, à valoração do trabalho como forma de realização pessoal”.

Os direitos fundamentais, nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet (2011, p. 105), “ao menos de modo geral, podem (e assim efetivamente o são) ser considerados concretizações das exigências do princípio da dignidade da pessoa humana”.

Tamanha é a importância do princípio da dignidade da pessoa humana que, nos termos do art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, ele serve de fundamento da República Brasileira, o que significa que o Estado brasileiro existe para atender as aspirações dos seus cidadãos, concretizando a dignidade que lhe são inerentes.

8 Art. 4.

La Repubblica riconosce a tutti i cittadini il diritto al lavoro e promuove le condizioni che rendano effettivo questo diritto.

Ogni cittadino ha il dovere di svolgere, secondo le proprie possibilità e la propria scelta, una attività o una funzione che concorra al progresso materiale o spirituale della società.

9 Artigo 58.

(Direito ao trabalho)

1. Todos têm direito ao trabalho.

2. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover: a) A execução de políticas de pleno emprego;

b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais;

c) A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores. Artigo 59.

(Direitos dos trabalhadores) […]

2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente: […]

(23)

O pensamento jusnaturalista fortaleceu o desenvolvimento da ideia de dignidade da pessoa humana. Neste sentido, para Immanuel Kant, “o homem não é uma coisa, não é, por conseguinte, objeto para ser tratado unicamente como meio, senão que, pelo contrário, deve ser considerado sempre, em todos os seus atos, como fim em si.”10

Ora, a dignidade é uma qualidade intrínseca que todo ser humano possui e não um direito atribuído pelo ordenamento. Com efeito, a Constituição não atribui, especificamente, a dignidade às pessoas, mas a promove e a protege por meio dos direitos fundamentais. Portanto, a dignidade da pessoa humana possui uma íntima relação com tais direitos, uma vez que eles existem para promover e proteger a dignidade. Por sua vez,a dignidade da pessoa humana é o fundamento, o núcleo, de todos os direitos fundamentais.

Sobre o tema, Rafael Sastre Ibarreche também entende que o valor dignidade é o substrato básico sobre o qual se assentam todos os demais direitos fundamentais (1996, p. 74):

El valor dignidad constituye el sustrato básico sobre el que, en términos globales, se asientan los derechos fundamentales […]

Desta forma, uma das consequência jurídicas decorrentes do princípio da dignidade da pessoa humana é o dever de proteção e promoção de tal princípio por parte do Estado. Nesse contexto, a concretização dos direitos sociais se revela essencial para que se tenha uma proteção suficiente da dignidade da pessoa humana por parte do Poder Público.

Importante destacar a característica de fundamentalidade também presente nos direitos sociais. A disposição topográfica dos direitos sociais (Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais) já revela a evidente fundamentalidade dos direitos sociais no ordenamento jurídico brasileiro.

Não por outro motivo, o Ministro do Supremo Tribunal Federal - STF, Gilmar Ferreira Mendes, no julgamento do pedido de suspensão de tutela antecipada n.

10 KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Tradução de Antônio Pinto de Carvalho. Companhia Editora Nacional. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_kant_metafisica_costumes.pdf>.

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238, sustentou que os “direitos fundamentais sociais foram acolhidos pela Constituição Federal de 1988 como autênticos direitos fundamentais”11.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 57) vai além, afirmando que “os direitos sociais fazem parte do acervo histórico, jurídico, ético e cultural dos povos civilizados. Integram o patrimônio cultural do povo brasileiro”.

Há direitos fundamentais que criam obrigações positivas ao Estado, exigindo, muitas vezes, a disponibilização de recursos para a sua completa implementação. Apesar de tal característica estar acentuada quanto aos direitos sociais, há outros direitos fundamentais que também exigem uma prestação do Estado com a alocação de recursos. Com efeito, o direito à participação política (direito fundamental de primeira dimensão) exige uma ampla participação ativa do Estado para a sua concretização.

Por outro lado, há direitos sociais que não necessitam, em regra, de alocação de recursos ou de concretização legislativa para a sua plena efetividade, reclamando apenas uma abstenção por parte do Estado. Exemplificando-se, o direito de greve é um típico direito social que não depende de gastos públicos para a sua garantia, requer apenas uma conduta omissiva por parte do Estado ou do empregador para que se efetive.

Ingo Wolfgang Sarlet (2011, p. 185), entendendo que a liberdade dos indivíduos depende de uma postura ativa por parte do Estado, sustenta que os direitos sociais a prestações positivas do Estado objetivam “não apenas a liberdade-autonomia (liberdade perante o Estado), mas também, da liberdade por intermédio do Estado”.

O já citado desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, utilizando a classificação de Dieter Murswiek, divide as prestações estatais em quatro grupos (SARLET, 2001, p. 283-284):

a) prestações sociais em sentido estrito, tais como a assistência social, aposentadoria, saúde, fomento da educação e do ensino, etc; b) subvenções materiais em geral, não previstos no item anterior; c) prestações de cunho existencial no âmbito da providência social (Daseinsvorsorge), como a utilização de bens públicos e instituições, além do fornecimento de gás, luz, água, etc.; d) participação em bens

11 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Suspensão de Tutela Antecipada 238. Relator(a): Min. PRESIDENTE, Presidente Min. GILMAR MENDES, julgado em 21/10/2008, publicado em DJe-204 DIVULG 28/10/2008 PUBLIC 29/10/2008 RDDP n. 70, 2009, p. 169-177.

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comunitários que não se enquadram no item anterior, como, por exemplo, a participação (no sentido de quota-parte), em recursos naturais de domínio público.

Robert Alexy (2008, p. 444), por sua vez, divide o direito a prestações em sentido amplo em três grupos: direitos a proteção, que são direitos fundamentais em face do Estado, exigindo deste a proteção contra a intervenção de terceiros em seus bens pessoais através de uma atuação positiva; direitos a organização e procedimento, que se trata de uma normatização como meio de concretizar os direitos fundamentais; e direitos a prestações em sentido estrito.

Diz o autor alemão (ALEXY, 2008, p. 499):

Direitos a prestação em sentido estrito são direitos do indivíduo, em face do Estado, a algo que o indivíduo, se dispusesse de meios financeiros suficientes e se houvesse uma oferta suficiente no mercado, poderia também obter de particulares. Quando se fala em direitos fundamentais sociais, como, por exemplo, direitos à assistência à saúde, ao trabalho, à moradia e à educação, quer-se primariamente fazer menção a direitos a prestação em sentido estrito.

Estes direitos a prestações positivas em sentido estrito estão intrinsicamente relacionados ao Estado do Bem-Estar social e a busca da igualdade real através da correção das desigualdades fáticas.

Cumpre ressaltar que, conforme amplamente difundido, as normas constitucionais não são meras sugestões ou declarações de boas intenções. Assim, positivados os direitos sociais no texto constitucional, surge a obrigação do Estado em garantir a plena efetividade de tais direitos. É neste sentido a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 11):

A Constituição não é um simples ideário. Não é apenas uma expressão de anseios, de aspirações, de propósitos. É a transformação de um ideário, é a conversão de anseios e aspirações em regras impositivas. Em comandos. Em preceitos obrigatórios para todos: órgãos do Poder e cidadãos. […] Como se sabe, as normas jurídicas não são conselhos, opinamentos, sugestões. São determinações. O traço característico do Direito é precisamente o de ser disciplina obrigatória de condutas.

(26)

Ademais, os direitos sociais não se tratam de direitos irrealizáveis. Todos eles, por mais que possuam custos, podem ser garantidos pelo Estado através de suas políticas públicas. Neste sentido, critica-se a proposta de emenda constitucional n°19 de 2010 justamente pela falta de efeitos práticos que ela é capaz de gerar.

Esta proposta de emenda pretende alterar o artigo 6° para incluir a expressão “essenciais à busca da felicidade”, ficando o artigo com a seguinte redação:

Art. 6º São direitos sociais, essenciais à busca da felicidade, a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (sem destaque no original).

Com esta redação haveria o reconhecimento de que os direitos sociais servem para a busca da felicidade, mas qual seria então a prestação a que o Estado estaria obrigado? Evidentemente, o Estado não poderia ser compelido a uma prestação egoísta de um indivíduo sob o pretexto de garantir a sua felicidade. Por outro lado, prestações envolvendo os demais direitos sociais encontram neles o seu fundamento constitucional, se revelando desnecessária a alteração constitucional. Assim, haveriapouca efetividade na norma proposta, algo inconcebível em uma Constituição, em razão de sua força normativa.

Este amplo rol de direitos sociais previsto no art. 6º da Lei Fundamental é alvo de diversas críticas por doutrinadores que entendem que, em razão da diferença entre a realidade socioeconômica nacional e os direitos garantidos constitucionalmente, a norma constitucional não poderia determinar a realização de algo faticamente impossível, uma vez que tal conduta comprometeria a sua efetividade.

Affonso Arinos, em discurso proferido na sessão de 05 de outubro de 1988 do Congresso Nacional, também criticou este extenso rol de direitos sociais e a sua possível falta de efetividade, in verbis:

Hoje poderíamos juntar algo de mais grave, que é o seguinte: a aplicabilidade dos textos depende, paradoxalmente, da sua aplicação. Esta situação anômala manifesta-se fortemente no texto de 1988, confirmando-se aquilo que Oliveira Viana chamou de “idealismo constitucional”. É importante insistir neste ponto. A garantia dos direitos individuais é cada vez mais eficaz e operativa nas Constituições contemporâneas, mas a garantia dos direitos

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coletivos e sociais, fortemente capitulada nos textos, sobretudo nos países em desenvolvimento e, particularmente, nas condições do Brasil, torna-se extremamente duvidosa (para usarmos uma expressão branda), quaisquer que sejam as afirmações gráficas existentes nos documentos, como este que estamos, hoje, comemorando. Afirmar o contrário é ingenuidade, ilusão, ou falta de sinceridade, quem sabe de coragem. Direito individual assegurado, direito social sem garantia – eis a situação12.

A Constituição não pode esquecer a realidade social e impor algo impossível ao Estado, mas ela também não deve ficar adstrita ao grau de realização dos direitos fundamentais à época de sua promulgação, pois possui como objetivo primordial a alteração da sociedade em busca dos objetivos traçados pelo próprio constituinte.

Ou seja, nas palavras de Konrad Hesse (1991, p.5), “a Constituição não configura, portanto, apenas expressão de um ser, mas também de um dever ser”. Assim, “graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura imprimir ordem e conformação à realidade política e social”.

Diversos direitos sociais (aqueles ditos prestacionais) pressupõe uma conduta positiva por parte do Estado, consistindo em uma prestação de natureza fática em favor do indivíduo através da disponibilização efetiva ou potencial do objeto da norma aos indivíduos.

Os direitos prestacionais são, para Rafael Sastre Ibarreche, direitos fundamentais que exigem, em geral, uma ação do Poder Público como condição necessária para a sua efetivação (1996, p. 74):

La acción de los poderes públicos se presenta, de este modo, como condición necesaria para la efectividad de los derechos fundamentales, en general, y, especialmente, de los derechos económicos y sociales.

Versando sobre os direitos sociais, José Eduardo Faria (1994, p. 105) ensina que tais direitos “não configuram um direito de igualdade, baseado em regras de julgamento que implicam um tratamento uniforme; são, isto sim, um direito das

12 Discurso proferido na sessão de 5 de outubro de 1988, publicado no DANC de 5 de outubro de 1988, p. 14377-14378. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-

legislativa/plenario/discursos/escrevendohistoria/25-anos-da-constituicao-de-

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preferências e das desigualdades, ou seja, um direito discriminatório com propósitos compensatórios”.

No âmbito prisional, os direitos fundamentais titularizados pelos apenados gera para o Estado o dever de possibilitar a sua concretização, seja através de uma abstenção, nos casos dos direitos de primeira dimensão, seja através de uma atuação positiva, nos casos dos direitos sociais. É neste sentido a lição de Anabela Miranda Rodrigues (2001, p. 165):

Para além disso, a titularidade de direitos fundamentais por parte do recluso impõe ao Estado deveres de abstenção relativamente a intervenções lesivas desses direitos (nihil nocere) e deveres de prestação que permitam a sua efectiva realização, sobretudo - mas não só - no que diz respeito aos chamados direitos sociais, nomeadamente o direito à saúde, à educação e ao trabalho (omnia

prodesse).

Não se pode negar que o melhor meio de prestar os direitos sociais é através de políticas públicas de caráter universal, desde que efetivamente respeitem as normas constitucionais e não se limitem ao denominado mínimo existencial, observando, por consequência, o princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais.

Ainda que as políticas públicas tenham por escopo a proteção coletiva dos direitos fundamentais, há de se garantir a possibilidade de proteção individual de tais direitos, sempre através da análise do caso concreto, com todas as circunstâncias que o circulam.

Deve-se reconhecer que a própria Constituição cria um direito subjetivo a uma prestação social, passível de concretização independentemente de atuação legislativa posterior. Trata-se de um direito individual subjetivo exigível inclusive judicialmente.

Costuma-se apontar como óbice à efetividade dos direitos sociais a característica inerente à tais direitos consistente na não exigibilidade imediata da prestação, pois esta não se constituiria um direito subjetivo do cidadão. Sobre o tema, Maria Hemília Fonseca defende a exigibilidade dos direitos sociais, independentemente da natureza da obrigação correspondente. Leciona a autora (2009, p. 80):

(29)

Existem níveis de obrigações comuns a todos os direitos: estes compreendem ao menos uma obrigação de respeito, uma obrigação de proteção e uma obrigação de satisfação. De tal modo que nenhuma categoria de direito é mais ou menos exigível, pois a cada direito correspondem distintos tipos de obrigações exigíveis.

É possível perceber, portanto, que o Estado tem a obrigação de efetivar tais direitos, seja através de mecanismos políticos e jurídicos, e de resguardar o seu cumprimento nas relações entre particulares.

Celso Antônio Bandeira de Mello, defendendo uma atualização da noção de direito subjetivo, leciona que deve-se dar ao direito público subjetivo a mesma funcionalidade já deferida ao direito subjetivo na esfera privada, sob pena de, não o fazendo, criar-se ruptura da legalidade. Sobre o tema, sustenta Bandeira de Mello (2009, p. 43-44):

Em sua, entre nós, deve-se considerar que está em pauta arguição de direito subjetivo quando

(a) a ruptura da legalidade cause ao administrado um agravo pessoal do qual estaria livre se fosse mantida íntegra a ordem jurídica ou

(b) lhe seja subtraída uma vantagem a que acederia ou a que

pretenderia aceder nos termos da lei e que pessoalmente desfrutaria ou faria jus a disputá-la se não houvesse ruptura da legalidade, nada importando que a ilegalidade arguida alcance a

um ou a um conjunto de indivíduos conjuntamente afetados, por se encontrarem na mesma situação objetiva e abstrata.

As normas constitucionais que dispõe acerca de direitos sociais inegavelmente possuem alto grau de generalidade, sendo cabível a densificação dos preceitos através das normas infraconstitucionais, havendo, neste ponto, a discricionariedade do Poder Legislativo. No entanto, esta discricionariedade não se confunde com arbitrariedade, estando, assim, limitada pela própria Constituição. Ao Poder Público é vedado o descumprimento dos imperativos constitucionais, ou seja, a discricionariedade que lhe é dada não inclui o non facere.

Foi nesse sentido o voto do Ministro Celso de Mello no Agravo no Recurso Extraordinário nº 271.286-8 RS13, in verbis:

Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o

reconhecimento formal de um direito. Torna-se essencial que,

13 RE 271286 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/09/2000, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJ 24-11-2000 PP-00101 EMENT VOL-02013-07 PP-01409.

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paraalém da simples declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente respeitado e plenamente garantido, especialmente

naqueles casos em que o direito – como o direito à saúde – se qualifica como prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir, do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo próprio ordenamento constitucional.

Ora, quando o direito social é previsto constitucionalmente, o Estado fica obrigado a emprestar efetividade a tais normas, pois, caso não o faça, estará em situação de violação direta aos termos da Constituição Federal.

As obrigações criadas aos poderes estatais através da previsão constitucional do direito ao trabalho são elencadas por Rafael Sastre Ibarreche, para quem o Poder Legislativo recebe duas obrigações, uma negativa, consistente na proibição de revogar normas já existentes dirigidas a facilitar a criação de empregos, e uma positiva, consistente no dever de produzir normas que favoreçam o direito ao trabalho. Ao Poder Executivo, é dada a obrigação de adotar políticas com limitações semelhantes àquelas aplicáveis ao Poder Legislativo. O Poder Judiciário, por sua vez, recebe a obrigação de interpretar as normas no sentido que mais favorável à pretensão de criação de empregos, bem como a obrigação de deixar de aplicar normas violadoras do texto constitucional. Diz o autor (1996, p. 122-123):

De este modo, el reconocimiento constitucional del derecho al trabajo genera una serie de obligaciones y, por lo tanto, de pretensiones a comportamientos correlativos, susceptibles de esquematizarse de la siguiente forma. Respecto del poder legistativo, hace surgir obligaciones tanto de signo negativo - no derogar normas ya existentes dirigidas a provocar o facilitar ocasiones de trabajo sin sustituirlas por otras similares - como positivo - orientar las intervenciones prescritas en la Constitución hacia el objetivo del máximo empleo -, aun cuando el efectivo cumplimiento de la obligación de producir normas favorecedoras del derecho al trabajo presenta arduas dificultades. Por lo que se refiere a la Administración, se trataría de que el ejercicio de Su postedad reglamentaria y de Su función ejecutiva se orientara al favorecimento de la ocupación, en la línea de lo indicado para el poder legislativo. Y, por último, en relación al poder judicial, obrigaría a interpretar las normas según el sentido más favorable para satisfacer la pretensión al trabajo, esto es, a dar prioridad al interés relativo a la exigencia del trabajo y a no aplicar la normas contrarias al derecho constitucional.

Maria Hemília Fonseca, discorrendo sobre os sujeitos passivos do direito ao trabalho previsto na Constituição Federal de 1988, defende que o Estado possui

(31)

diversos deveres de atuação como forma de proteger tal direito, seja por atitudes positivas, seja negativas. Diz a autora (FONSECA, 2009, p. 175-176):

Visto que o direito ao trabalho foi elevado à categoria de fundamental no referido texto, ele impõe ao poder legislativo obrigações tanto de caráter negativo - não derrogar normas já existentes dirigidas a provocar ou facilitar ocasiões de trabalho sem substituí-las por outras similares - como positivo - orientar as intervenções prescritas na Constituição até o objetivo do máximo emprego.

A indeterminação interna dos direitos sociais de caráter prestacional é reconhecida por Rafael Sastre Ibarreche como um problema à determinação da própria existência de normatividade, eficácia e garantias de tais direitos (1996, p. 75):

En primer término, y como contraste respecto de los derechos de libertad clpasicos, los derechos de prestación plantean una compleja problemática relativa a su propia indeterminación interna, que se plasma en la existencia de numerosas dudas acerca de su normatividad, eficacia y garantías.

Conforme já exposto, o trabalho é o direito social por excelência, estando previsto em diversos diplomas internacionais tais como a Declaração Universal de Direitos Humanos, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador).

A Constituição Federal de 1988 dispõe acerca do trabalho e do direito ao trabalho em diversas ocasiões. Trata-se de um fundamento da república14, de um

direito fundamental de primeira dimensão (com base na liberdade)15, da base da

ordem social16, além de um direito social previsto no art. 6º e disciplinado no art. 7º.

14 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(…)

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

15 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(32)

A Constituição espanhola também prevê o direito ao trabalho, disciplinando-o como direito fundamental, especificando, ainda, que os presos tem o direito constitucional ao trabalho. Sobre o assunto, José Luis de la Cuesta Arzamendi leciona (1996, p. 211):

El derecho al trabajo de los penados encuentra, además, una peculiaridad adicional, cual es su previsión explícita y “en todo caso” por el art. 25.2 de la Constitución, precepto incluindo en la sección correspondiente a los “derechos fundamentales y libertades públicas”, susceptible, em principio, del máximo nivel de protección constitucional.

No âmbito prisional, diversos são os fundamentos atuais para o trabalho encarcerado. Inicialmente, o trabalho serve como forma de ressocialização do preso, preparando-o para o seu retorno à sociedade como membro ativo, já que o trabalho implica capacitação do indivíduo para o exercício de atividade remunerada quando em liberdade. Ademais, o trabalho serve também para o preso galgar benefícios durante o cumprimento da pena, como a remição da pena. Sobre o tema, Aldacy Rachid Coutinho defende que o trabalho não apenas é importante para a reinserção social do preso, mas também para a constituição da personalidade do preso. Diz Coutinho (1999, p. 13):

Atendido na sua dignidade humana, o trabalho se instaura como instrumento de constituição da própria personalidade e, nestes termos, consubstancia-se em um instrumento de auxílio eficaz no atendimento do escopo de reinserção social dos apenados.

O direito ao trabalho teve os seus fundamentos alterados conforme período histórico ou linha política e de forma de produção adotada. Maria Hemília Fonseca sintetiza tal discussão da seguinte forma (2009, p. 99):

De todas as formas, o significado do direito ao trabalho no decorrer da história sofreu variações expressivas segundo o campo político-ideológico adotado. Inicialmente, ele foi concebido como um direito a exercer um trabalho ou ofício (liberdade de trabalho), em seguida XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

16 Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.

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