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Arbitragem no regime de partilha de produção do Brasil: uma análise desse modelo mediante experiências do direito comparado da legislação e doutrina brasileira

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UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Faculdade de Direito

MARCELLA DA COSTA MOREIRA DE PAIVA

A ARBITRAGEM NO REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO DO BRASIL: UMA ANÁLISE DESSE MODELO MEDIANTE EXPERIÊNCIAS DO DIREITO

COMPARADO E DA LEGISLAÇÃO E DOUTRINA BRASILEIRA

Niterói 2016

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1 MARCELLA DA COSTA MOREIRA DE PAIVA

A ARBITRAGEM NO REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO DO BRASIL: UMA ANÁLISE DESSE MODELO MEDIANTE EXPERIÊNCIAS DO DIREITO

COMPARADO E DA LEGISLAÇÃO E DOUTRINA BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para requisição de grau em Bacharel em Direito.

Orientador:

Prof. Dr. Gilvan Luiz Hansen Coorientador:

Prof. Dr. Sérgio Gustavo de Mattos Pauseiro

Niterói 2016

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2 Universidade Federal Fluminense

Superintendência de Documentação Biblioteca da Faculdade de Direito

P149 Paiva, Marcella da Costa Moreira de

Arbitragem no regime de partilha de produção do Brasil: uma análise desse modelo mediante experiências do direito comparado da legislação e doutrina brasileira / Marcella da Costa Moreira de Paiva. – Niterói, 2016.

95 f.

TCC (Curso de Graduação em Direito ) – Universidade Federal Fluminense, 2016.

1. Direito internacional privado. 2. Arbitragem. 3. Arbitragem internacional. 4. Petróleo (Produção). 5. Regime de partilha de produção. 6. Joint Venture I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II. Título.

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3 Aos meus pais e às minhas irmãs com todo carinho.

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4 AGRADECIMENTOS

Aos meus pais e minhas irmãs, que jamais deixaram de me incentivar e que me seguraram em todos os momentos que minhas pernas falharam, com tamanho amor e carinho que somente pessoas incríveis como eles poderiam me dar.

À minha família, que me deu todo o apoio necessário para alcançar essa conquista, em especial ao meu avô Semonides, cujo maior sonho era ver suas netas formadas, porém, por motivos a minha vontade, está presenciando esse momento extracorporeamente.

Aos anjinhos que me foram presenteados pela UFF.

Aos amigos, que me acompanharam durante essa jornada e em outras trajetórias anteriores ou concomitantes.

Aos mestres da querida Faculdade de Direito da UFF, que compartilharam comigo e com meus colegas seus conhecimentos e fizeram de nós estudantes conscientes da relevância do Direito para a sociedade e de nosso papel e responsabilidade perante a esta.

Aos caríssimos professores e orientadores Gilvan Luiz Hansen e Sérgio Gustavo de Mattos Pauseiro, que foram essenciais para essa minha trajetória acadêmica e que me proporcionaram o contato com o tema que me fez me encantar ainda mais pelo Direito.

À banca examinadora, pela disponibilidade de participar da apresentação de meu trabalho e pelas contribuições realizadas para este.

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5 Ensina-se a paz quando se resolve e se previne a má administração dos conflitos; quando se busca o diálogo; quando se possibilita a discussão sobre direitos e deveres e sobre responsabilidade social; quando se substitui a competição pela cooperação

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6 RESUMO

Com a intensificação do comércio internacional, mediante o processo de globalização, passou-se a ser imprescindível a busca por novos modos de resolução de conflitos, que pudessem ser neutras a se se refere à jurisdição estatal, e de associação de empresas, para obter maior competitividade. Ambas precisavam de novos métodos para atender a complexidades das novas relações jurídicas que passaram a englobar elementos internacionais e transnacionais. Os modelos atuais de arbitragem e de joint ventures surgiram em meio a esse cenário jurídico-econômico. A primeira se tornou a principal forma de dirimir controvérsias nos contratos internacionais, das mais diversas áreas, em especial na indústria petrolífera. Quanto às joint ventures, são um meio de cooperação entre empresas altamente utilizada no Brasil e no mundo, principalmente, no campo do petróleo. Nesse, essa associação apresenta desdobramentos bastante populares e relevantes, como o joint operating agreement e o joint bidding agreement. Ao concerne ao petróleo, a fortificação do capitalismo e do industrialismo acarretou na necessidade de maior exploração e produção desse combustível fóssil e, com isso, os países hospedeiros precisaram formular novos arcabouços jurídico-regulatórios para garantirem a proteção dos seus interesses. Assim, na década de 1960, adveio do regime de partilha de produção, que envolve ambos os temas citados. Desse modo, no presente trabalho, realiza-se uma análise quanto à relação dos institutos supramencionados no modelo brasileiro, à luz das experiências internacionais e do ordenamento jurídico brasileiro.

Palavras-chave: arbitragem, joint venture, joint operating agreement, joint bidding agreement, exploração e produção de petróleo, contratos internacionais, petróleo, regime de partilha de produção.

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7 ABSTRACT

With the intensification of the international trade, under globalization process, the search for new ways of solving conflicts, that could be neutral to state jurisdiction, and of companies association, in order to enhance competitivity, turned into something essential. Both needed new method to attend the complexity of the brand new legal relationships that started to have international and transnational elements. The current model of arbitrations and joint ventures had arisen in this political and economic scenario. The first one turned into the main method to settle controversies in international contracts of many diverse areas, especially at petroleum industry. Regarding to joint ventures, they are a way of enterprise’s cooperation, which are extremely used in Brazil and abroad, principally, in oil area. Inside petroleum industry, this type of association has ramifications, such as joint operating agreement and joint bidding agreement. Concerning petroleum, capitalism and industrialism fortifications had led to needing a greater exploration and production of this fossil fuel. Due to this, the host countries were required to create new legal-regulatory framework to warrant theirs interests. Thus, in the 1960th, the production sharing contract was born, being a pact that relates all mentioned

issues. Therefore, in the study in question, it made an analysis concerning the relationship between the referred institutes at the Brazilian model, using as base international experiences and Brazil’s Law.

Key-words: arbitration, joint venture, joint operating agreement, joint bidding agreement, petroleum exploration and production, international contracts, petroleum, production sharng contract.

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8 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

E&P exploração e produção

MARC meio alternativo de resolução de conflitos

LBA Lei Brasileira de Arbitragem

ICC International Chamber of Commerce

AIPN Association of International Petroleum Negociators

FCPA Foreign Corrupt Practices Act

JOA joint operating agreement

JBA joint bidding agreement

PSA Production sharing agreement

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9 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ... 10 2. ARBITRAGEM ... 13 2.1 ASPECTOS GERAIS ... 14 2.2 ARBITRAGEM DOMÉSTICA ... 21 2.3 ARBITRAGEM INTERNACIONAL ... 27 2.3.1 Lex petrolea ... 30

2.3.2 Association of International Petroleum Negociators ………..……. 33

3. JOINT VENTURE E REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO NO DIREITO COMPARADO ... 34

3.1 JOINT VENTURES ... 34

3.1.1 Classificação ... 39

3.1.2 Arbitragem ... 40

3.2 REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO ... 42

3.2.1. Arbitragem ... 46

4. JOINT OPERATING AGREEMENT ... 47

4. 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ... 47

4.2 CLÁUSULAS E ASPECTOS RELEVANTES ... 49

4.2.1. Cláusula arbitral ... 55

4.3 JOINT OPERATING AGREEMENT NO DIREITO COMPARADO ... 58

4.4 JOINT OPERATING AGREEMENT NO BRASIL ... 60

5. JOINT VENTURE E REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO NO BRASIL .... 61

5.1 JOINT VENTURE ... 61

5.2 REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO ... 65

5.2.1 Breve histórico da E&P de petróleo no Brasil ... 65

5.2.2 Aspectos gerais do modelo brasileiro ... 70

5.2.3 Arbitragem no regime de partilha de produção brasileiro ... 75

CONCLUSÃO ... 81

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10 1. INTRODUÇÃO

Nesses últimos anos, há um panorama de crise mundial na indústria do petróleo e dos hidrocarbonetos fluidos, tendo em vista a expressiva queda do valor do barril, chegando à casa dos trinta dólares em janeiro e fevereiro de 2016, conforme dados do Banco Mundial. 1 Entretanto, a relevância desse setor permanece incontestável, seja internacional ou nacionalmente, pois influi diretamente na economia dos países produtores e consumidores. As inovações nesses segmentos da economia não cessam, incluindo os avanços na engenharia e no arcabouço jurídico que fundamenta as operações realizadas na indústria petrolífera.

Vale ressaltar que o uso do petróleo em larga escala teve início com a Segunda Revolução Industrial e com o advento do motor à explosão, que passara a depender do combustível fóssil em tela. Com tal uso, passou-se a necessitar de uma exploração e produção de petróleo cada vez mais maior para a alimentar a crescente indústria automobilística e, posteriormente, a aviação. Inicialmente, a extração era onshore – produção em terra – e, principalmente, na Pensilvânia, os Estados Unidos da Américas consistiam nos maiores produtores de petróleo e, adicionalmente, os maiores consumidores.

A globalização intensificou ainda mais esse processo de crescimento industrial e ampliou o comércio internacional, possibilitando contratos entres diversos países do mundo, bem como a criação de empresas multinacionais e transnacionais. Com o aumento da circulação de pessoas e de capitais e das relações comerciais entre os países, a concorrência entre as empresas se tornou maior e, consequentemente, mais difícil se tornou lograr sucesso no mercado. Por conseguinte, as empresas e os empresários passaram a buscar meios de enfrentar a concorrência das companhias estrangeiras, como as associações. Assim, buscou-se novas formas de associação entre empresas nacionais ou entre nacionais e internacionais ou entre internacionais e aperfeiçoou-se aquelas já existentes.

As joint ventures, cuja origem remonta a um período muito anterior às Revoluções Industriais, foram uma dessas formas de lidar com a competição, seja no mercado interno quanto no externo. A utilização do referido instituto foi ampliada de forma expressiva nos diversos segmentos da economia mundial, em um primeiro momento, nos EUA e na Inglaterra. Na indústria do petróleo, seu uso se deu como forma de aumentar a competitividade das empresas participantes, bem como um modo de compartilhamento de tecnologias, de riscos e de custos, fundamentalmente, com a necessidade de perfurações de

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11 poços mais profundos e com o início da exploração e produção do petróleo offshore – petróleo extraído do fundo do oceano.

Com essas novas formas de associação, surgiram acordos para fundamentar e para regulamentar as diferentes relações da complexidade que são essas associações de empresas e empresários. Merece destaque os dois principais pactos que não se referem apenas às joint ventures, mas ainda concerne aos contratos de upstream, ou seja, às avenças de exploração e produção de hidrocarbonetos fluidos, os quais são os joint bidding agreements e os joint operations agreements. Ressalta-se que esse último foi criado, conforme a doutrina, para dispor sobre E&P de óleos.

Enquanto ocorrem as mencionadas alterações no comércio exterior e o crescimento vertiginoso do uso de combustíveis fósseis, em especial do petróleo, há processos nos países hospedeiros de constituições de modelos de contratos de exploração e produção de hidrocarbonetos fluidos de modo a atrair o capital estrangeiro e, concomitantemente, trazer benefícios para o país.

Nesse passo, foram desenvolvidos regimes jurídicos-regulatórios por países hospedeiros – como são denominados os Estados em que as empresas estrangeiras vão explorar e produzir óleos –, isto é, foram criados arcabouços jurídicos para regulamentar a E&P, de modo a assegurar determinados direitos e deveres para os contratantes. Os modelos jurídicos-regulatórios distinguem conforme as necessidades e expectativas do Estado hospedeiro, podendo o país possuir mais de um regime vigente.

O Brasil se trata de um país de regime misto, apresentando, assim, dois regimes jurídicos-regulatórios vigentes. O segundo foi inaugurado com a Lei n. 12.351 de 2010 com base nas necessidades trazidas pela descoberta do pré-sal, que se refere ao petróleo encontrado em águas profundas abaixo da camada de sal a 2000 metros de profundidades. Tal descobrimento acarretou na imprescindibilidade de um novo modelo que trouxesse menos riscos e custos para o governo brasileiro e maior controle, resultando na escolha da instauração do regime de partilha de produção, cujas características serão abordados em um momento mais propício, já utilizado por outros países.

Entretanto, ao realizar o estudo do regime em questão, observa-se a sua relação com os institutos acima mencionados e com um meio alternativo de resolução de controvérsias em específico, que também está, de certo modo, entrelaçado com as joint ventures e com os joint operations agreements. O MARC a qual se refere é a arbitragem que vem sendo cada vez mais utilizada no Direito Comparado para dirimir conflitos que envolvem empresas de

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12 nacionalidades distintos devido a não se encontrar vinculada a uma jurisdição específica e às suas qualidades, que serão delineadas posteriormente.

Ao que concerne ao arbitramento 2 no Brasil, há a sua ampla utilização nos mais diversos conflitos que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis, ocupando o país o quarto lugar no ranking da International Chamber of Commerce (ICC) entre os Estados que mais usam o procedimento arbitral no mundo, somente atrás dos Estados Unidos, da Alemanha e do Canadá. Com base em dados da mesma câmara arbitral, entre 2008 e 2014 houve o crescimento de 45% nos casos submetidos a um tribunal arbitral.

Colocadas essas considerações, cumpre trazer as expressões, cuja compreensão é suma relevância, que se farão presentes no presente estudo. Os hidrocarbonetos fluidos se referem as substâncias líquidas e gasosas formadas unicamente por átomos de carbono e hidrogênio, as quais podem ser: petróleo, gás natural, xisto, dentre outros. Os óleos, dentro do tema em tela, são os hidrocarbonetos de aspectos oleosos, o próprio petróleo aqui se insere. Vale mencionar que este, quando extraído, é chamado de óleo cru. Por fim, há o petróleo que é a mais restrita e específica das expressões supramencionadas. Trata-se de um hidrocarboneto fluido de aspecto oleoso, inflamável, variando entre o tom castanho claro e o negro.

No presente trabalho, serão utilizados os três termos elucidados, no entanto, quando mencionados, não serão em conformidade com as peculiaridades trazidas. Usará todos no sentido de hidrocarbonetos fluidos.

Cumpre realçar que a substância em questão permanece como a principal fonte energética mundial, apesar dos incentivos a formas mais ecológica, menos poluentes e abrasivas ao meio ambiente. O petróleo se tratou de uma das maiores motivações para diversas guerras, principalmente, no Oriente Médio, como a Guerra do Golfo, ocorrida em 1990 e 1991.

Retornando para a análise do estudo em si, busca-se fazer uma análise das particularidades envolvidas em uma arbitragem no regime de partilha de produção, assim como uma verificação de como se darão os procedimentos arbitrais no modelo brasileiro, que é um tanto recente e somente teve uma rodada de licitações até o presente momento. Para atingir tal objetivo, optou-se por trabalhar questões doutrinárias e casuísticas a respeito do tema e por dividir o trabalho em tela em quatro capítulos.

Ao se tratar de um tema de tamanha importância e dependência no cenário mundial, se faz imprescindível abordar o meio pelo qual se soluciona grande parte das tensões causadas

2 O arbitramento aqui não se confunde com aquele do processo civil, que corresponde a constatação do valor de

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13 no decorrer de sua exploração e de sua produção. Desse modo, no primeiro capítulo, considerou-se necessário cuidar da arbitragem, de forma geral, e a doméstica e a internacional, tendo em vista que esse assunto seria citado em cada um dos tópicos seguintes. Outro motivo se refere a tal método de resolução de controvérsias ser amplamente utilizado na político-econômica internacional para gestão de conflitos relativos à petróleo e a outros temas, a exemplo do Brasil e da Venezuela que inserem cláusulas arbitrais em seus contratos de E&P. Cumpre mencionar que são trazidos aspectos do arbitramento nos contratos de petróleo, principalmente, naqueles que se pautam na lex petrolea e nas minutas de contrato da Association of International Petroleum Negociators, que serão constantemente citados nos outros três capítulos que integram o presente trabalho..

No capítulo posterior, trata-se das joint ventures e do regime de partilha de produção no Direito Comparado, perpassando por breves históricos dos referidos institutos e por suas características de forma geral e em alguns ordenamentos jurídicos. Salienta-se que se cuidou da arbitragem em ambos, com fulcro no praticado nos ordenamentos jurídicos alienígenas.

No tocante ao terceiro capítulo, o enfoque se direciona para os joint operating agreements da indústria petrolífera, com anterior traço do panorama geral dessa modalidade de acordo. Em adição, aqui há um detalhamento das principais cláusulas que integram o JOA, assim como da cláusula compromissória, que consiste em uma das modalidades de convenção de arbitragem.

Por fim, decidiu-se por cuidar das joint ventures e do regime de partilha de produção brasileiro com delineamento de aspectos específicos e gerais que fazem parte do modelo vigente. Esse quarto capítulo reuniu elementos de todos os capítulos anteriores, em razão da complexidade do sistema do Brasil.

No decurso do presente trabalho, busca-se, assim, fazer uma análise dos elementos que integram o regime brasileiro de partilha de produção, considerando os contratos privados que o rodeiam, e com enfoque no meio de resolução de controvérsias utilizado.

2. ARBITRAGEM

No presente capítulo, passa-se a cuidar da arbitragem em si devido ao estudo dessa ser basilar para o desenvolvimento e compreensão do trabalho em questão. Primeiramente, se tratará do conceito doutrinário desse instituto e de aspectos essenciais para o seu

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14 entendimento deste. Em seguida, serão trazidas as experiências internacionais e domésticas quanto ao procedimento.

2.1 ASPECTOS GERAIS

Para maior elucidação do presente trabalho, faz-se imprescindível a abordagem sobre alguns aspectos do meio alternativo de resolução de conflitos em questão. Deste modo, deve se trazer à baila o conceito deste, o qual vem sendo cada vez mais utilizado, principalmente, em razão da intensificação das relações comerciais internacionais.

Conforme Carlos Alberto Carmona, a arbitragem consiste em um:

“A arbitragem – meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja, para solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor.” (Carmona, 2009, p. 31)

Verifica-se que se trata de um meio de heterocompositivo e extrajudicial de resolução de controvérsias, tendo em vista que o conflito será dirimido por um ou mais terceiros (árbitros), investidos de jurisdição pela convenção de arbitragem. 3

Ao tratar da arbitralidade dos agronegócios, Timm e Benetti (In Timm, 2009, p. 33), enfatiza a característica da não interferência do Estado no procedimento arbitral, colocando-o como “uma modalidade não estatal de exercício de jurisdição”.

Nádia Araújo segue a mesma linha do conceito trazido por Carmona, no entanto, destaca a presença da vontade das partes.

“A arbitragem é um meio jurídico de solução de controvérsias presentes ou futuras, baseado na vontade das partes envolvidas, as quais elegem por si mesmas e diretamente, ou através de mecanismos por elas determinados, árbitros para serem os juízes da controvérsia, confiando-lhes a missão de decidir de forma obrigatória, o litígio através da prolação de um laudo arbitral” (Araújo apud Casella, 1996, p. 90).

A autora realçou a vontade, nesse instituto, como a base do desenvolvimento do procedimento arbitral, seja em sede cláusula compromissória ou de compromisso arbitral;

3 A convenção de arbitragem engloba tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral e consiste

no pacto pelo qual as partes decidem afastar a jurisdição estatal em caso de eventuais conflitos ou já havendo alguma controvérsia.

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15 bem como delineou que, a partir do momento que os árbitros aceitam a sua nomeação pelas partes, tem o dever de decidir o conflito.

Constata-se, portanto, que o acordo de vontade das partes é essencial para tal modalidade de MARC, assim como a ausência de intervenção do Estado em seu procedimento, pois se trata de um meio extrajudicial de resolução de controvérsias. Deste modo, a partir da convenção de arbitragem, os contratantes abdicam em submeter o conflito ao exame da jurisdição estatal em casos excepcionais.

Diante do exposto, conceitua-se a arbitragem como um meio alternativo de resolução de conflitos, pautado em acordos de vontade entre os contraentes, os quais decidem submeter à controvérsia, através de uma convenção de arbitragem, a um terceiro ou mais terceiros escolhidos – árbitros – para pacificar a questão, conforme um determinado regulamento escolhido, em certo local – sede da arbitragem –, com base em um ordenamento jurídico eleito pelos contratantes para embasar o procedimento.

Outra importante questão se refere à finalidade do procedimento arbitral, devendo ser abordada de forma breve. Em decorrência de ser um meio de resolução de conflitos, um dos intuitos se trata da pacificação social. Ademais, busca fazê-lo de modo célere e de acordo com a autonomia da vontade das partes.

Paulo Osternack Amaral (apud Flausino, 2015, p. 103-104) que considera a autonomia da vontade como “(...) princípio pilar que sustenta todo o bem engendrado no sistema arbitral”. A partir de acordos de vontade das partes, serão decididas questões do procedimento arbitral como o prazo para a sentença, a sede da arbitragem, o direito aplicável e dentre outros elementos, mas, principalmente, é por meio desta que os envolvidos optam por submeter o conflito a um juízo arbitral. 4

Nota-se que o referido princípio é de extrema significância na esfera do Direito Privado, essencialmente, no que tange os contratos e a arbitragem. Ambos não podem ser desvinculados da autonomia da vontade das partes, haja vista que dependem de manifestação de vontade dos contratantes para a elaboração do contrato e da própria cláusula compromissória e do compromisso arbitral. Há quem entenda, inclusive, que a arbitragem consista em uma garantia do preceito em questão, fundamentalmente, no âmbito dos contratos internacionais (Stohrer, 2014).

Entretanto, a vontade das partes não é ilimitada, há restrições nas regras procedimentais e no direito escolhido para ser o embasamento da arbitragem, assim como a

4 É suma importância lembrar que a autonomia de vontade não é ilimitada, esta encontra restrições na ordem

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16 própria finalidade dessa modalidade de MARC, conforme os ensinamentos de Carmona (2009, p. 23).

O arbitramento, como enfatizado anteriormente, possibilita que as partes escolham o terceiro ou os terceiros a dirimir a controvérsia. Estas nomeiam o(s) árbitro(s) que poderão aceitar ou não a indicação realizada por meio da convenção de arbitragem ou por outro meio, a qual, com a aceitação, investirá esse terceiro de poder para julgar o litígio. Carmem Tibúrcio (2006, p.1) delineia que, justamente, por ser deste modo é que o árbitro tende a exercer a função mais rapidamente e com maior presteza possível.

Tal situação é de extrema significância, fundamentalmente, no que concerne a matérias de alta complexidade ou que exijam conhecimentos específicos para além da área jurídica, como na esfera dos contratos de exploração e produção petrolífera, os quais apresentam diversas peculiaridades e nomenclaturas de áreas como a engenharia e a geologia. Por conseguinte, os envolvidos podem optar por profissionais que detenham noções mais extensas sobre a matéria.

Nessa mesma linha, Jobim e Timm (In Timm, 2009, p. 28) ressaltam que as partes detêm autonomia da vontade para nomear os árbitros, sendo estes eleitos por algum motivo específico, o qual é a expertise destes sobre a matéria em tela.6 Ferrer (apud Klein, in Talamini, 2010, p. 64) salienta, inclusive, que há a precariedade de informações sobre os assuntos mais distintos do Poder Judiciário, considerando que não há como se exigir que os magistrados detenham expertise sobre os mais variados assuntos. Há quem considere, nesse aspecto, que a escolha dos árbitros integra uma característica do procedimento arbitral denominada de especialidade, justamente, em razão desses, devido a sua expertise, poderem julgar a matéria de forma mais específica à luz de Ana Carolina Weber (2006, p. 199),

Vagner Flausino explica de forma breve a relação entre a escolha dos julgadores na arbitragem e a segurança jurídica:

“A experiência técnica do árbitro, referente à matéria colocada em discussão, permite que a sentença arbitral possua maior grau de precisão. Determinados temas demandam alto grau de especialização, sendo importante, para que se tenha uma decisão técnica, que o julgador possua conhecimento profundo sobre envolve a demanda, o que garante maior eficácia da decisão e, consequente, segurança quanto ao resultado.” (2015, p. 68)

Por conseguinte, cumpre destacar que há na doutrina outros posicionamentos seguindo uma perspectiva semelhante à apresentada anteriormente. Tal entendimento é, de certo modo,

6 Paulo Osternack Amaral (apud Flausino, 2015, p. 68) elenca a possibilidade da escolha dos árbitros como o

principal motivo da opção pela arbitragem em casos de grande complexidade, considerando que proporciona um exame mais detalhado e específico da matéria.

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17 concludente, tendo em consideração que uma decisão embasada em um exame mais específico e detalhado sobre a matéria acarreta em uma maior eficácia, já que se encontraria uma menor possibilidade de haver erros técnicos. E, consequentemente, decorre em uma maior chance de cumprimento da sentença e de pacificação do conflito.

Ainda sobre a questão da eleição dos árbitros pelas partes para dirimir a questão conflituosa, Grinover destaca que estes devem ser pessoas de confiança das partes (2003, p. 2).

Carlos Alberto Salles (apud Flausino, 2015, p. 69) apresenta outra garantia ao que concerne à indicação pelos contraentes, a neutralidade, que conceitua como: “(...) garantia da imparcialidade e independência na decisão e da condução do processo.” Em sede de contratos internacionais, a neutralidade importa em uma qualidade da arbitragem a ser enfatizada, haja vista que, conforme Steiner E Vagts apud Flausino (2015, p.70), esta se trata de uma forma de diminuição da possibilidade do árbitro nacional do mesmo país da parte que o nomeou atuar segundo os interesses desta. 7

Considerando que os árbitros não apresentam competência no mesmo sentido do Poder Judiciário 8, e por serem escolhidos pelas partes envolvidas, poderia se depreender que a imparcialidade destes estaria contaminada e que a discricionariedade seria maior. Os árbitros poderão inclusive decidir sobre a sua própria competência para julgar um determinado conflito, seja a controvérsia para a qual o tribunal arbitral fora chamado a decidir ou uma que surgiu ao longo do procedimento. O princípio da competência-competência ou kompetenz-kompetenz, como é conhecido no Direito Comparado e no Direito Internacional, preceituam justamente tal competência do árbitros em verificar a sua própria competência.

Entretanto, tal entendimento está intensamente equivocado, passa-se, assim, a tratar dos motivos desse erro. Ao que se refere à imparcialidade, a atuação dos árbitros encontra limitações na Lei, nas regras procedimentais, na natureza e na finalidade da arbitragem (Carmona, 2009, p. 23).

7 “Em uma transação internacional a questão da neutralidade do árbitro pode tornar-se fundamental. Pode ocorrer

que nenhuma das partes deseje submeter-se aos riscos de litigar no local onde se situa a parte adversária, utilizando procedimentos não familiares e perante juízes pertencentes ao sistema social, econômico e político da outra parte.” (Steiner E Vagts apud Flausino, 2015, p. 70). Esse posicionamento vislumbra uma relação da nomeação de árbitros pelos contratantes com a escolha da sede da arbitragem, sendo ambas relevantes no que diz respeito a contratos com partes de países distintos.

8 A competência dos árbitros, para dirimir uma determinada controvérsia, advém da vontade das partes que

afastaram a jurisdição estatal por meio de uma convenção de arbitragem e que o nomearam. Em contrapartida, a competência do Poder Judiciário se baseia no contrato social e na separação de poderes, bem como na Constituição.

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18 Quanto à discricionariedade dos terceiros investidos pela convenção de arbitragem, deve-se trazer o posicionamento de Timm e Benetti.

“O instituto da arbitragem tem a vantagem de reduzir a margem de discricionariedade dos julgadores, substituindo-a pelas disposições do contrato (que, em princípio e presumivelmente, foi fruto da vontade e da negociação das partes). Como o árbitro tira sua competência e sua legitimidade do contrato que o elegeu como julgador, ele tem o dever de se ater com maior compromisso prático e moral ao texto do documento, o que acabará por trazer maior controle das próprias partes referentemente ao regramento da sua relação (...).” (Benetti; Timm In Timm, 2009, p. 39)

Desta forma, o fato dos julgadores estarem adstritos ao contrato e à convenção de arbitragem reduz a discricionariedade destes ao julgar o conflito. Esses fatores se apresentam como limitadores da extensão do litígio, bem como aqueles mencionados anteriormente ao abordar a imparcialidade.

É cediço que a arbitragem consiste em um meio de resolução de controvérsias de custo alto, no entanto, apresenta um bom custo-benefício, em razão da celeridade do procedimento, da expertise dos árbitros e da dirimência do litígio sem desfazimento do vínculo de (reciprocidade), possibilitando que a resolução se dê de forma mais adequada para as partes.

A característica da celeridade apresenta íntima relação com as finalidades do procedimento arbitral mencionadas anteriormente, e acarreta, várias vezes, na consideração da arbitragem como meio mais atrativo do que a jurisdição estatal. Tal aspecto se deve, essencialmente, à irrecorribilidade das decisões do tribunal arbitral e do prazo que se pode estabelecer para a prolatação do laudo arbitral. Em regra, não há recursos contra a sentença arbitral, no entanto, as partes podem convencionar tal possibilidade.

Seguindo esse sentido, Paulo Furtado e Uadi Lammêgo Bulos (apud Flausino, 2015, p. 72) salientam que a rapidez da arbitragem “(...) poderá evitar desgastes pela demora na solução dos litígios, o que muitas vezes para aqueles que pretendem obter uma resposta do Judiciário.”

Ao abordar a relevância da vontade das partes, mencionou-se que a arbitragem proporciona que haja a escolha do direito aplicável, assim como o regulamento do procedimento arbitral e a sede da arbitragem. A flexibilidade apresenta íntima relação com a autonomia de vontade, tendo em vista que corresponde justamente a essa possibilidade dos envolvidos determinarem aspectos da arbitragem.

Nesse sentido, passa-se a cuidá-la, Carmona traz a característica da flexibilidade como um benefício do procedimento arbitral, à luz do excerto abaixo.

“Avulta assim a importância da concessão feita pela Lei de Arbitragem, que aumenta consideravelmente o campo de incidência da vontade das partes e

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19 permite maior segurança nas contratações, já que a escolha prévia da lei aplicável não submeterá os litigantes aos azares dos mais diversos mecanismos decorrentes de sistemas de conflitos de leis.” (Carmona, 2009, p. 65)

A flexibilidade consiste na possibilidade das partes, pautada na autonomia da vontade, optarem pela arbitragem e escolherem aspectos do procedimento, como o prazo para a prolação da sentença arbitral, a nomeação dos árbitros, a escolha das regras procedimentais, do direito aplicável e da sede da arbitragem.

Importante salientar que a questão da escolha da sede da arbitragem não é somente essencial para saber onde se instituirá o tribunal arbitral, em função desta influir, adicionalmente, na jurisdição para dirimir conflitos relativos ao procedimento arbitral.

A determinação do local onde se dará a arbitragem apresenta ainda mais relevância na esfera dos contratos internacionais, haja vista que a escolha da sede decorre em uma consequência processual, a qual é a definição do país que terá a competência para conhecer de litígios referentes à convenção de arbitragem. Possui, assim, relação com o princípio da soberania do estado (Martins In Ribeiro, 2005, p. 709).

Ainda dentro do tema da flexibilidade faz-se indispensável cuidar modelos de arbitragem que podem ser escolhidas pelas partes, os contraentes podem optar pela ad hoc ou pela institucional, quanto ao local em que se dará o tribunal.

Na primeira, as partes e/ou os árbitros possuem a liberdade de determinar as regras a serem utilizadas, podendo optar pela Lei Modelo de Arbitragem da UNCITRAL – Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional – que serve de parâmetro para as legislações. Sobre os benefícios da arbitragem ad hoc, merece destaque o excerto abaixo de Martin Hunter:

“Such a specially drawn set of rules will usually be set out in a formal Submission to Arbitration”, which will be negotiated and agreed once a dispute has arisen. Amongst other things, it will usually confirm the establishment of the arbitral tribunal, set out the substantive law and the place (or ‘seat’) of the arbitration, and detail any procedural rules upon which the parties have agreed for the exchange of documents, witness statements, and so forth. It may also provide for the Tribunal to be assisted by an administrative assistant.” (Hunter, 2009, p. 53) 9

O doutrinador ressalta que os envolvidos podem escolher cada etapa do procedimento, no momento da submissão à arbitragem, confirmando o tribunal arbitral, a sede, e outras

9 Em tradução livre: Como um conjunto de regras especialmente formuladas serão estabelecidas em uma formal

submissão à arbitragem, que serão negociadas e acordadas assim que já houver a disputa. Juntamente com outras questões, serão confirmados o tribunal arbitral, a lei do procedimento e a sede de arbitragem, e detalharão as regras procedimentais pactuadas pelas partes para os documentos, oitiva de testemunhas, e etc. Também devem providenciar um assistente administrativo para o tribunal.

(21)

20 questões relevantes. Constata-se, assim, que aqui as partes apresentam um papel ainda mais relevante, devendo cooperar e acordar em cada aspecto.

A arbitragem institucional diz respeito ao arbitramento que se dá em uma câmara arbitral, ou seja, em uma instituição de arbitragem, como a Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (CAMARB) e a International Chamber of Commerce (ICC). Os contraentes optam por utilizar do regulamento da câmara, assim como dos árbitros vinculados a esta. Em sua maioria, a própria instituição apresenta uma cláusula compromissória padrão recomendável para aqueles que queiram realizar a arbitragem na câmara, por exemplo, há a cláusula da ICC.

“Todos os litígios emergentes do presente contrato ou com ele relacionados serão definitivamente resolvidos de acordo com o Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, por um ou mais árbitros nomeados nos termos desse Regulamento.”

Ultrapassada a questão da flexibilidade, inicia-se aqui a abordagem de outro ponto relevante para o arbitramento, a confidencialidade. Cabe, primeiramente, trazer a diferenciação feita por Selma Ferreira Lemes entre confidencialidade e privacidade:

“A privacidade está relacionada com o local em que a arbitragem é processada e quanto à matéria discutida, no sentido de não permitir a presença de pessoas estranhas nas audiências. Por sua vez, o sigilo (confidencialidade), refere-se à sentença arbitral e aos documentos apresentados no processo, vinculando as pessoas que gerenciam o processo, os árbitros, procuradores e até as partes.” (Lemes apud Borges In Guimarães; Talamini, 2010, p. 123)

Para Borges (In Guimarães; Talamini, 2010, p. 125), a privacidade das partes está, de certo modo, inserida no sigilo. Nesse sentido, Jobim e Timm (In Timm, 2009, p. 25) vislumbram, inclusive, o sigilo como um fator redutor dos custos da transação econômica, eis que a divulgação de informações sobre o contrato pode causar prejuízos para ambas as partes. Os autores trouxeram a cabo para exemplificar o dano em questão uma elucidação de Steven Shavell (p. 26), grande doutrinador no âmbito de Law and Economics, nessa linha:

“Imaginemos que uma empresa tenha feito um produto contendo defeito.

Possivelmente, a mesma não queira que a informação venha ao conhecimento público, pois será potencialmente prejudicial às suas atividades, demandando potenciais gastos em marketing e/ou desgaste da marca.” (Shavell apud Jobim; Timm In Timm, 2009)

Cumpre ressaltar que a confidencialidade não se trata de uma questão obrigatória no procedimento arbitral. Ora, não faz sentido que uma vantagem frente ao Poder Judiciário em um instituto cuja submissão a este é fruto da autonomia das partes não possa ser afastada.

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21 Como bem destaca Paulo Osternack Amaral (In Talamini; Pereira, 2010, p. 340), a confidencialidade se trata de uma garantia, um benefício.

Diante da importância do acordo de vontades no âmbito da arbitragem, deve se tratar de outro ponto relacionado com esse elemento, a facultatividade.

A doutrina possui uma diferenciação da arbitragem quanto à vontade das partes em instituí-la, havendo duas modalidades: a arbitragem voluntária e a arbitragem necessária ou obrigatória. A primeira consiste naquela em que esse meio resulta do acordo de vontade das partes, já a segunda ocorre quando a lei ou um contrato impõe a submissão de um eventual conflito à arbitragem. Pedro Batista Martins (In Pereira; Talamini, 2010, p. 706) assenta que a obrigatoriedade do instituto arbitral afronta a Constituição e suas finalidades.

Klein (In Pereira; Talamini, 2010, p. 68) destaca que o direito comparado vislumbra a arbitragem obrigatória com um certo receio, questionando a constitucionalidade esta, no entanto, traz o exemplo da Itália que atribuiu uma interpretação conforme para os casos que a lei determina o uso do procedimento arbitral.

Ressalta-se, novamente, que a autonomia da vontade se trata de um princípio basilar do instituto arbitral, assim como o acordo de vontades é elemento imprescindível ao próprio conceito de arbitragem. Não se podem dissociar tais questões desse meio extrajudicial de conflitos.

Feitas essas considerações, volta-se para uma análise das arbitragens doméstica e internacional, as quais apresentam as suas peculiaridades.

2.2. ARBITRAGEM DOMÉSTICA

Primeiramente, é necessário trazer o que se entende por arbitragem doméstica, também denominada de nacional ou interna. Compreende o arbitramento que não tem elementos internacionais, ou seja, as partes têm estabelecimento no local da sede da arbitragem, que será o mesmo lugar da execução das obrigações e da prolação da sentença arbitral.

A Lei n. 9.307/96, também denominada Lei Marco Macial, se trata da norma que dispõe quanto à arbitragem no Brasil, trazendo a regulamentação dos diferentes aspectos do procedimento arbitral. Nesta, é considerada arbitragem brasileira aquela cuja sentença seja proferida no território brasileiro, à luz do artigo 34, parágrafo único.

(23)

22 O art. 1º traz a arbitralidade objetiva e a subjetiva, podendo a arbitragem unicamente versar sobre direitos patrimoniais disponíveis e podendo a Administração Pública ser parte, bem como pessoa físicas e jurídicas.

Ao que se refere à convenção de arbitragem, o ordenamento jurídico brasileiro adotou a duplicidade, havendo assim duas modalidades dessa, previstas no art. 3º, da Lei 9.307/96 10, a cláusula compromissória e o compromisso arbitral. A primeira se refere à convenção de arbitragem anterior a existência do conflito, em que as partes acordam em submeter eventuais controvérsias a um árbitro ou tribunal arbitral. De forma distinta, o compromisso arbitral é firmado posteriormente ao litígio, não havendo cláusula compromissória, e, por meio deste, manifestam as partes a vontade em submeter à arbitragem.

No que tange a relevância da vontade das partes no instituto arbitral, esta se dá, principalmente, em razão da arbitragem ser uma exceção à garantia constitucionalmente elencada no art. 5°, LX, ou seja, uma exceção ao princípio constitucional do acesso ao Judiciário. Ao decidir submeter o conflito a um terceiro, cuja jurisdição é assegurada por meio de um negócio jurídico bilateral – convenção de arbitragem, as partes afastam a intervenção estatal.

Ora, seria ilógico admitir a não incidência ou aplicação de um princípio constitucional não havendo uma manifestação real de vontade de ambas as partes. Deste modo, exige-se que os interessados possuam capacidade civil, de modo que possam exprimir a sua vontade.

Ao tratar da vontade das partes, faz-se imprescindível cuidar, novamente, do princípio da autonomia da vontade das partes, norteador do instituto arbitral e princípio do direito obrigacional. Para tanto, deve-se trazer à baila a doutrina de Silvio Rodrigues:

“O princípio da autonomia da vontade consiste na prerrogativa conferida aos indivíduos de criarem relações na órbita do direito desde que se submetam às regras impostas pela lei e que seus fins coincidam com o interesse geral, ou não o contradigam. Desse modo, qualquer pessoa capaz pode, pela manifestação de sua vontade, tendo objeto lícito, criar relações a que a lei empresta validade.” (Rodrigues, 2004, p. 15)

Nesse sentido, não se admite no Brasil o instituto da arbitragem obrigatória – a qual, segundo Carmona (2009, p. 36), foi extinta no país em 1866 – a opção por tal meio é sempre voluntária. Tal fato se deve, principalmente, por ser uma exceção a garantia do acesso ao Poder Judiciário, conforme mencionado anteriormente.

10 “Art. 3º. As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante

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23 No Brasil, o instituto em tela tem caráter facultativo, tendo em vista que se trata de um direito obrigacional (apud Klein, in Talamini, 2010, p. 68). Conforme demonstrado anteriormente, o acordo de vontade das partes é essencial para o procedimento, conforme exposto anteriormente.

Quanto à indicação dos árbitros, a LBA estabelece que esta deva se dar por meio da cláusula compromissória 11 ou por outro meio 12. Desta forma, a vontade das partes investe o árbitro de poder, concede a este terceiro uma jurisdição, que se equipara a estatal, tendo a sentença arbitral os mesmos efeitos daquela proferida pelo Poder Judiciário (art. 31, da Lei Brasileira de Arbitragem).

A partir da aceitação da indicação, o árbitro deve seguir os ditames do artigo 13, §6º, da Lei nº 9.307/96 13, que estabelece cinco exigências para o desempenho da função e o art.

21, §2º, da mesma Lei, dispõe que a imparcialidade dos julgadores consiste em um dos princípios regentes do procedimento arbitral. 14 Ressalta-se que a não observação do último

dispositivo mencionado pode acarretar a nulidade da sentença arbitral (art. 32, VIII, LBA). Em sede judicial, embora haja o princípio da congruência pelo qual os magistrados estão restritos ao pedido contido na petição inicial, estes podem adentrar em outros impasses correlacionados com a lide que não se refira somente ao contrato objeto da controvérsia. Um exemplo seria a arguição de inconstitucionalidade de uma dada norma pela qual o juiz teria que atravessar para pacificar o conflito.

Ao que se refere aos dispositivos que demonstram a flexibilidade na Lei n. 9.307/96, há o artigo 23 que apresenta a possibilidade de estipular um prazo para a prolação da sentença arbitral, desse modo, podem os contraentes pré-definir prazos para a conclusão de cada etapa do procedimento. O não cumprimento deste resulta na nulidade da própria decisão, com base no art. 32, VII, da Lei nº 9.307/96.

No que tange à eleição das regras procedimentais, o art. 21 da LBA dispõe o seguinte:

“Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem, que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, facultando-se, ainda, às

11 Tibúrcio (2006, p. 1) destaca que não é aconselhável que as partes escolham os árbitros em sede de cláusula

compromissória, e nem ao menos comum. Em caso de arbitragens institucionais, normalmente, deixam para a câmara indicar os árbitros.

12 As partes podem optar por indicar os árbitros de outra, podendo até mesmo estabelecer um processo distinto

para a escolha destes ou utilizar as regras da câmara arbitral (art. 13,§3º da Lei 9.307/96). Cumpre salientar que deverão acordar quanto ao meio escolhido, em razão do princípio da autonomia da vontade das partes.

13 “Art. 13. § 6º. No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência,

competência, diligência e discrição.”

14 “Art. 21. § 2º. Serão, sempre, respeitados no procedimento arbitral os princípios do contraditório, da igualdade

(25)

24

partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribunal arbitral, regular o procedimento.”

Verifica-se que fica a cargo da vontade das partes a decisão sobre a regra procedimental a ser adotada, bem como a cargo dos próprios árbitros, se os envolvidos incumbirem estes de tal função. Os contratantes podem estabelecer na própria cláusula compromissória, Carmona (2009, p. 290) observa que normalmente esse critério não é utilizado, optando as partes por definir em momento posterior, haja vista que usualmente a cláusula compromissória é o último elemento da avença a ser elaborado. É muito comum que adotem as regras da câmara arbitral que decidiram submeter o conflito, ou, até mesmo, se tratando de arbitragem ad hoc, sendo mais seguro se utilizar de regras de órgãos institucionais (Carmona, 2009, pp. 290-291).

Independentemente das normas procedimentais escolhidas, o processo arbitral deve obediência aos princípios do contraditório, ampla defesa, paridade de armas, imparcialidade do árbitro e livre convencimento, encontrando a autonomia de vontade limites no art. 32, VIII, combinado com o art. 33, §2º, I, da LBA (Carmona, 2009, pp. 294-298).

É digno de nota que, embora se esteja realçando a celeridade do referido meio alternativo de resolução de controvérsias, cumpre salientar que este não apresenta o propósito de substituir o Poder Judiciário e é cediço que este não possui a capacidade de desafogar o sistema judicial brasileiro15. No Brasil, somente 310 casos foram submetidos ao procedimento

arbitral em 2014, à luz do estudo realizado pela Câmara de Comércio Internacional, sendo um número extremamente inferior a de lides cujas partes recorreram ao Judiciário.

Conforme mencionado anteriormente, arbitragem consiste em um meio de resolução de controvérsias um tanto custoso, sendo, em sua maioria, o Poder Judiciário mais barato. Entretanto, em alguns casos, ocorre do MARC em questão ser mais proveitoso do que a jurisdição estatal, tendo, assim, um melhor custo-benefício.

Nessa mesma linha, Timm e Jobim (In Timm, 2009, p. 17) enfatizam que o custo da disputa no Judiciário possui quatro fatores a serem considerados, os quais são: as taxas judiciárias, as despesas processuais, a perspectiva de vencer o litígio e de como se dará a distribuição do valor entre o vencedor e perdedor. A conjunção destes com a morosidade do curso do processo judicial tornam a jurisdição estatal pouco proveitosa para determinados

15 “Entendemos que a arbitragem não substitui com êxito a totalidade da atividade jurisdicional do Estado, mas

que agrega, diferentemente da utilização do Poder Judiciário, o sigilo e a rapidez na solução de litígios.” (JOBIM e TIMM, In TIMM, 2009, p. 23). Nesse diapasão, há o entendimento de Paulo Furtado e Uadi Lammêgo Bulos (apud Flausino 2015, p. 72): “(...) ao falar que o juízo arbitral contribui para a celeridade não estamos dizendo que ele seja o remédio para todos os males da justiça. O instituto não tem varinha de condão para extirpar a unanimidade dos problemas do Poder Judiciário.”

(26)

25 conflitos que dependem de uma rápida resolução, de maneira que não haja grandes perdas para ambas as partes.

Outra questão que merece destaque dentro do tema da flexibilidade, se refere às modalidades de arbitragem, as quais são de direito, por equidade, nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio. Não se entrará em detalhes sobre todos os tipos mencionados, somente por equidade e de direito.

A arbitragem por equidade se trata daquela em que os árbitros pautam a decisão naquilo que consideram justo, sendo assim um tanto subjetiva, está prevista no ordenamento jurídico brasileiro no artigo 2º, caput, da LBA. O art. 2º, parágrafo 3º, da Lei nº 9.307/96 veda de forma implícita tal modalidade na Administração Pública, haja vista que somente permite a de direito.

Em relação à escolha da lei aplicável para a resolução dos conflitos pelas partes, o art. 2º,§1º, da Lei 9.307/96 dispõe que há liberdade para que as partes a designem. Entretanto, o mesmo dispositivo impõe restrições, esta não deve afrontar a ordem pública e os bons costumes. Na doutrina, há posicionamento no sentido de que deveriam ser incluídos nesse rol os interesses nacionais 16, Carmona (2009, p. 412) ensina que as partes “(...) não poderão exceder as raias dos interesses que o Estado quer preservar, já que a garantia da igualdade, da legalidade e da supremacia da Constituição são inerentes à democracia moderna.”

É digno de nota que o legislador não previu na Lei Brasileira de Arbitragem nenhum dispositivo que permita a anulação ou nulidade da sentença arbitral em razão da afetação da ordem pública ou dos bons costumes.

No entanto, vislumbra-se a possibilidade, de impugnação de uma sentença arbitral pautada em lei ou regra procedimental que viole os preceitos supracitados, embora a Lei n. 9307/96 não preveja tal situação. Ora, é consequente entender possível tal situação, em decorrência de alguns dispositivos do direito brasileiro. O Brasil, por exemplo, aderiu à Convenção de Nova Iorque de 1958 e inseriu o art. 39, II que veda a homologação de sentença arbitral que viole a ordem pública nacional. Há outras legislações vigentes no ordenamento jurídico brasileiro que seguem a mesma linha, como a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial internacional, a Convenção Interamericana sobre

16 Nesse sentido, há o posicionamento de Carlos Alberto Carmona com base nos ensinamentos de Amílcar de

Castro (2009, p. 411): “Parafraseando Amílcar de Castro, a liberdade das partes na escolha da lei que querem ver aplicada ao contrato é a mesma coisa que um pássaro na gaiola. Com tal alegoria, o mestre mineiro lembrava que a vontade das partes, seja nos termos da Lei de Introdução do Código Civil, Seja no âmbito da legislação privada, não conduzia os contratantes a voo muito alto, pois o legislador procurava tolher a escolha impondo o cerco feroz à vontade dos contratantes, sempre temendo fraude ou lesão à ordem pública, aos bons costumes e aos interesses nacionais.”

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26 Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros (Carmona, 2009, p. 417).

Merece destaque a Lei-Modelo da Comissão das Nações Unidas para o desenvolvimento do Comércio Internacional (UNCITRAL) sobre Arbitragem Comercial Internacional que, seu artigo 34, consta a possibilidade do Poder Judiciário anular uma sentença arbitral que ofenda a ordem pública do Estado. À luz da abordagem de Carlos Alberto Carmona (2009, pp. 411-418), brevemente explicitada, nota-se que não há legislação que vede que tais sentenças violadoras dos bons costumes e da ordem pública brasileira. Diversamente, o legislador demonstrou uma inclinação para essa possibilidade.

Registre-se que, no campo da arbitragem na Administração Pública, há uma determinada relativização da mencionada vantagem. Tal fato se deve em razão do princípio constitucional da publicidade processual, previsto no art. 93, IX da Carta Magna, que somente pode ser excepcionado nos casos dos incisos do art. 155 do Código de Processo Civil.

Por conseguinte, o sigilo poderá e deverá ser afastado nesses casos, sem obstar o prosseguimento da arbitragem. A Lei 9.307/96, com as alterações realizadas pela Lei 13.129 de 2015, passou a prever no seu art. 2º, §3º a obrigatoriedade da obediência do princípio da publicidade nas arbitragens que envolvam a Administração Pública.

Nesse diapasão, há o posicionamento de Talamini (apud Amaral In Talamini; Pereira, 2010, p. 341) que entende que embora haja o sigilo, este não é absoluto, tendo em vista que é assegurado às partes, aos procuradores, dentre outros, a possibilidade de ter acesso aos autos do procedimento arbitral ou os dados do processo.

Outro importante aspecto concerne ao objeto, ou seja, à arbitralidade objetiva, tendo em consideração que há delimitações a seu respeito. O art. 1° da Lei Brasileira de Arbitragem determina quais tipos de litígios que podem ser dimiridos por árbitros.

“Art. 1. As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

§ 1o. A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da

arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis.” (Grifos nossos)

Deste modo, somente podem ser objeto de arbitragem aqueles litígios referentes a direitos patrimoniais disponíveis, deve-se, em face do exposto, cuidar da patrimonialidade e disponibilidade.

Considera-se que um determinado direito é disponível, segundo Alcides de Mendonça Lima (apud Carmona, 2009, p 38), “quando ele pode ser ou não exercido livremente pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o cumprimento do preceito, sob pena de

(28)

27 nulidade ou anulabilidade do ato praticado com a sua infringência”. Portanto, disponibilidade se refere à liberdade de disposição de algo, de forma que não é necessária autorização para tanto e nem ao menos há nulidade no caso de prática do ato.

A patrimonialidade é constantemente confundida com a disponibilidade, tendo em vista que normalmente são abordadas conjuntamente. Somente podem ser submetidos à arbitragem aqueles direitos que apresentam caráter patrimonial, ou sejam, aqueles que possuem valor econômico.

Deste modo, conforme Carlos Alberto Carmona (2009, p 38), “são disponíveis aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante plena capacidade jurídica para tanto”.

2.3. ARBITRAGEM INTERNACIONAL

Anteriormente, foram analisadas questões relativas ao processo arbitral de forma geral e das características desse no direito brasileiro, passa-se, assim, a tratar das práticas do arbitramento no Direito Comparado.

Primeiramente, deve-se tratar da relevância da definição da nacionalidade da arbitragem para, posteriormente trazer o conceito de arbitragem internacional. Jacob Dolinger dispõe o seguinte sobre o tema em questão:

"A nacionalidade da arbitragem é importante por três razões: 1) determina a lei que regula a arbitragem, que será, em princípio, a lei dessa nacionalidade; 2) determina o tribunal estatal que poderá vir a ter jurisdição sobre o processo arbitral, caso uma intervenção se faça necessária; e 3) identifica o procedimento a ser seguido para a execução do laudo arbitral, pois normalmente um laudo proferido internamente é mais facilmente executável do que um proferido alhures." (Dolinger, 2003, p. 91)

Diante da dicção de Dolinger, pode-se verificar que o critério utilizado pelo jurista para identificar a modalidade da arbitragem consiste no territorial, pois se pode depreender que a determinação da sede influirá na nacionalidade do arbitramento. Nota-se, em adição, que a nacionalidade interfere no direito que regula a arbitragem, na jurisdição estatal para julgar eventuais conflitos decorrentes do procedimento e na execução do laudo arbitral.

A doutrina internacional vislumbra três modalidades de arbitragem, a nacional, a internacional e a transnacional. A primeira fora abordada anteriormente e se refere ao arbitramento doméstico, sem que haja elementos que possam caracterizá-la distintamente. A

(29)

28 transnacional não será tema do presente trabalho. Por fim, há arbitragem internacional, assunto do presente tópico, cujo conceito será explanado abaixo.

Primeiramente, deve-se trazer a conceituação da Lei Modelo da UNCITRAL sobre Arbitragem Comercial Internacional, um dos principais regramentos do Direito Internacional. A arbitragem internacional é definida em seu artigo 3, de modo a definir a sua área de aplicação, que se trata do Direito Comercial Internacional.

“3 – Uma arbitragem é internacional se:

a) as partes numa convenção de arbitragem tiverem, no momento da conclusão desta Convenção, o seu estabelecimento em Estados diferentes; ou b) um dos lugares a seguir referidos estiver situado fora do Estado no qual as partes têm o seu estabelecimento:

I) o lugar da arbitragem, se estiver fixado na convenção de arbitragem ou for determinável de acordo com esta;

II) qualquer lugar onde deva ser executada uma parte das obrigações resultantes da relação comercial ou o lugar com o qual o objeto do litígio se ache mais estreitamente conexo; ou

c) as partes tiverem condicionado expressamente que o objeto da convenção da arbitragem tem conexões com mais de um país.”

Depreende-se que, pela Lei Modelo da UNCITRAL, há três possibilidades para uma arbitragem ser classificada como internacional, as quais são: partes em Estados distintos no momento da conclusão da convenção de arbitragem; lugar da arbitragem ou lugar da execução de parte das obrigações ou lugar onde o objeto do conflito esteja mais intimamente conectado seja em Estado distinto do estabelecimento das partes; pactuação expressa sobre o objeto da convenção da arbitragem ter conexões com mais de um país.

Gilberto Giusti assevera que não há ao certo um conceito de arbitragem internacional e, adicionalmente, a própria Lei Brasileira de Arbitragem não entrou em detalhes a respeito.

"Não existe um conceito preciso e unânime do que vem a ser uma arbitragem internacional. A Lei 9.307/96 não se preocupou com essa definição, senão apenas com a distinção entre sentença arbitral doméstica (proferida dentro do território nacional) e a sentença arbitral estrangeira (proferida fora do território nacional, conforme art. 34, parágrafo único). Parece-nos que deve ser considerada internacional a arbitragem que tenha elementos, materiais ou jurídicos, que toquem a mais de uma jurisdição nacional, como o domicilio das partes, o local de celebração ou execução do contrato, a eventualidade de aplicar-se a legislação de outro país que não aquele em que se realiza a arbitragem. Assim é que será internacional a arbitragem que tenha o Brasil como local, mas que envolva uma parte brasileira e outra estrangeira, eventualmente adotando-se a lei material de outro país ou mesmo as regras internacionais do comércio." (Giusti, 2006, p. 130)

Segundo o que fora exposto anteriormente, a Lei Brasileira de Arbitragem buscou cuidar do que seria essa arbitragem internacional para o direito brasileiro, somente dispôs que

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29 a sentença estrangeira consiste naquela proferida fora do território brasileiro (art. 34, parágrafo único).

A Convenção de Nova Iorque de 10.06.1958 sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, internalizada pelo Brasil, determina que nenhum Estado é obrigado a reconhecer sentenças arbitrais estrangeiras. Cumpre realçar que estas passam no Brasil por um processo de homologação, decidido pelo Superior Tribunal de Justiça.

A arbitragem consagrou tamanho destaque no cenário internacional em razão dos aspectos citados no tópico anterior e, principalmente, pela não necessidade da parte se submeter à jurisdição de um Estado e ao seu ordenamento jurídico de forma involuntária, quando há uma cláusula arbitral. 17 Tal questão torna o arbitramento ainda mais benéfico para

as partes e proporciona maior segurança jurídica para os envolvidos, pois a sentença será prolatada pelo tribunal arbitral escolhido, conforme o direito aplicável e o regulamento procedimental avençados, no local determinado e na língua pactuada.

No âmbito da arbitragem internacional, a escolha da sede de arbitragem é de extrema importância, conforme o mencionado anteriormente. A definição da sede implica na determinação do Estado que terá a jurisdição para julgar conflitos que não possam ser analisados pelo tribunal arbitral. Mediante tal escolha, uma das partes – ou ambas -pode acabar por renunciar a submissão de eventuais controvérsias relativas à arbitragem à jurisdição de seu país.

No que tange à indicação do direito aplicável, de forma semelhante ao direito brasileiro, há a liberdade das partes optarem pela aplicação de um determinado direito. Autonomia essa, que, em caso de silêncio dos pactuantes, será emprestada para os árbitros, que poderão determiná-lo. Thiago Marinho Nunes destaca que o árbitro, em uma arbitragem internacional, possui uma dupla autonomia:

“i) o árbitro é autônomo em relação às regras estatais de conflito (ausência de lex fori), mesmo a da sede da arbitragem; ii) o árbitro pode livremente escolher a regra de conflito que aplicará ou mesmo descartar qualquer regra conflitual e aplicar, por exemplo, a lex mercatoria. Em termos práticos, em arbitragem internacional, a autonomia e liberdade dos árbitros para apreciar as questões de fundo do litígio são ainda maiores.” (Nunes, 2015)

Deste modo, não está vinculado a nenhum ordenamento jurídico estatal, podendo optar pelo direito aplicável e pelo regulamento de procedimento arbitral que preferir, desde que haja silêncio dos envolvidos. Ressalta-se que não necessariamente quando a arbitragem é nacional

17 Não se coloca aqui as expressões cláusula compromissória e compromisso arbitral devido a alguns países não

adotarem duas nomenclaturas distintas para designar a cláusula arbitral em seus dois momentos – pactuada anteriormente ao eventual conflito ou depois de sua existêncial.

(31)

30 de algum lugar, é obrigatória a escolha do direito aplicável daquele país, podendo as partes optar pela lex mercatoria ou pela aplicação de tratados internacionais, por exemplo.

Ainda sobre a escolha do direito aplicável e do regulamento procedimental, destaca-se que as partes e os árbitros não necessitam se preocupar quanto à possibilidade de violação à ordem pública, aos bons costumes e à lei. No momento da homologação ou da execução da sentença arbitral internacional, deverá o Estado verificar a existência alguma ofensa ou violação nesse sentido.

Ora, tal fato não significa que a sentença internacional não deve observância a nenhum conjunto de regras, princípios ou costumes, deverá estar em conformidade com as regras, os princípios e com os costumes internacionais do setor em que o objeto da arbitragem se insere, bem como aos princípios do UNIDROIT - Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado. Por exemplo, há a indústria do petróleo na qual as arbitragens devem estar de acordo com as determinações da lex petrolea.

Ao que se refere aos regulamentos do procedimento arbitral, diversas instituições arbitrais possuem as suas próprias regras procedimentais, as quais costumam ser utilizadas até mesmo para arbitragens ad hoc. Um dos regramentos mais conhecidos e empregados se trata do Regulamento da International Chamber of Commerce.

2.3.1. Lex Petrolea

O termo lex petrolea surgiu pela primeira vez, em 1958, no caso ARAMCO v. Arábia Saudita, no qual se notou a existência de um conjunto de costumes e regras vigentes no setor petrolífero, sem nomeá-lo ou defini-lo. Em 1982, no caso Kuwait v. AMINOIL, “o governo apresentou como argumento um conjunto de decisões arbitrais proferidas em litígios da indústria petrolífera que teria originado a lex petrolea, como uma especialização da lex mercatoria (Alves; Marinho; Vassallo, 2007, p. 37).” Foi caracterizada pelo governo do Kuwait como “an international and customary character, specific to the oil industry”, traduzindo, como detentora de natureza internacional e consuetudinária e específica da indústria do petróleo. Salienta-se que o tribunal arbitral não reconheceu a existência de conjunto de regras, princípios, etc. vigente no âmbito do petróleo, porém, após a arbitragem, iniciou-se uma discussão a respeito (Hunter, 2015, p. 26).

Cumpre ressaltar que a lex petrolea apresenta um caráter transnacional, tendo em vista que não é vinculada a nenhum Estado. Nessa mesma linha, Tina Hunter (2015, p. 23) a

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