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(1)

101

jan

◆ abr

2013

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

revista de doutrina

e jurisprudência

ISSN 0101-8868

Poder Judiciário da União

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Revista de Doutrina

101

e Jurisprudência

janeiro a abril de 2013

Poder Judiciário da União

(3)

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Revista de Doutrina e Jurisprudência nº 101

comissão de jurisprudência

* A capa reproduz, em ilustração vetorial, o painel existente na sala de sessões do Tribunal Pleno do TJDFT. A obra sem título é de autoria de Hermano Montenegro e traz em sua composição duas imagens que se complementam. A cidade representa a população, enquanto as chamas representam a justiça do DF. Na íntegra, a obra representa a justiça alcançando a população do DF.

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Revista de Doutrina e Jurisprudência/Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. – vol. 1, nº 1

(1966) – Brasília: O Tribunal, 1994.

Quadrimestral ISSN 0101-8868

1. Direito – Periódicos. 2. Direito – Jurisprudência.I. Brasil. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

CDD 340.05

Des. Romeu Gonzaga Neiva – Presidente Desa. Carmelita Indiano Americano do Brasil Dias

Desa. Sandra De Santis Mendes de Farias Mello Desa. Vera Lúcia Andrighi

Suplente

redação

Des. Sérgio Bittencourt

1º Vice-Presidente do TJDFT

Ellen Cristina Lima Carneiro

Secretária de Jurisprudência e Biblioteca

Renata de Paula Oliveira Caçador Carvalho

Subsecretária de Doutrina e Jurisprudência

Fernanda Freire Falcão

Supervisora do Serviço de Revista e Ementário

expediente

Produção Gráfica

Subsecretaria de Serviços Gráficos

Projeto Gráfico, Arte da Capa* e Diagramação Serviço de Editoração e Composição

Impressão

Serviço de Impressão

Encadernação

Serviço de Encadernação e Restauração

Acabamento

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composição administrativa tjdft

Dácio Vieira Des. Presidente Sérgio Bittencourt Des. 1º Vice-Presidente Romeu Gonzaga Neiva Des. 2º Vice-Presidente Lecir Manoel da Luz Des. Corregedor da Justiça Charleston Reis Coutinho Secretário-Geral

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câmara criminal

Presidente Des. João Timóteo de Oliveira Composição Des. Mario Machado

Des. George Lopes Leite Desa. Sandra De Santis Des. Roberval Casemiro Belinati Des. Silvanio Barbosa dos Santos Des. Romão C. Oliveira Des. Souza e Avila Des. Humberto Adjuto Ulhôa Desa. Nilsoni de Freitas Custódio Des. João Batista Teixeira Des. Jesuino Rissato

primeira turma criminal

Presidente Des. Mario Machado Composição Des. George Lopes Leite

Desa. Sandra De Santis Des. Romão C. Oliveira

segunda turma criminal

Presidente Des. Silvanio Barbosa dos Santos Composição Des. Roberval Casemiro Belinati

Des. João Timóteo de Oliveira Des. Souza e Avila

terceira turma criminal

Presidente Des. Humberto Adjuto Ulhôa Composição Desa. Nilsoni de Freitas Custódio

Des. João Batista Teixeira Des. Jesuino Rissato

câmaras e turmas tjdft

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primeira câmara cível

Presidente Des. Romeu Gonzaga Neiva Composição Des. Getúlio de Moraes Oliveira

Des. Otávio Augusto Desa. Simone Lucindo Des. Mário-Zam Belmiro Des. Flavio Rostirola Desa. Nídia Corrêa Lima Des. Angelo Passareli Des. João Egmont

Des. Luciano Moreira Vasconcellos Des. Teófilo Caetano

Des. Alfeu Machado

segunda câmara cível

Presidente Desa. Carmelita Brasil Composição Des. Cruz Macedo

Des. Waldir Leôncio Lopes Júnior Des. J. J. Costa Carvalho Desa. Ana Maria D. Amarante Brito Des. Jair Soares

Desa. Vera Andrighi Des. José Divino de Oliveira Des. Sérgio Rocha Des. Arnoldo Camanho Des. Fernando Habibe Des. Antoninho Lopes

primeira turma cível

Presidente Des. Teófilo Caetano Composição Des. Flavio Rostirola

Desa. Simone Lucindo Des. Alfeu Machado

segunda turma cível

Presidente Des. Sérgio Rocha Composição Desa. Carmelita Brasil

Des. Waldir Leôncio Lopes Júnior Des. J. J. Costa Carvalho

terceira turma cível

Presidente Des. Getúlio de Moraes Oliveira Composição Des. Mário-Zam Belmiro

Desa. Nídia Corrêa Lima Des. Otávio Augusto

quarta turma cível

Presidente Des. Antoninho Lopes Composição Des. Cruz Macedo

Des. Fernando Habibe Des. Arnoldo Camanho de Assis

quinta turma cível

Presidente Des. João Egmont Composição Des. Romeu Gonzaga Neiva

Des. Angelo Passareli Des. Luciano Vasconcellos

sexta turma cível

Presidente Desa. Vera Andrighi

Composição Desa. Ana Maria D. Amarante Brito

Des. Jair Soares

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lista de antiguidade tjdft*

Des. Otávio Augusto Barbosa 27/08/1992 Des. Getúlio Vargas de Moraes Oliveira 24/09/1992 Des. Romão Cícero de Oliveira 12/05/1994 Des. Dácio Vieira 12/05/1994 Des. Mario Machado Vieira Netto 18/09/1997 Des. Sérgio Bittencourt 17/04/1998 Des. Lecir Manoel da Luz 17/04/1998 Des. Romeu Gonzaga Neiva 16/12/1998 Desa. Carmelita Indiano Americano do Brasil Dias 27/06/2002 Des. José Cruz Macedo 14/10/2002 Des. Waldir Leôncio Cordeiro Lopes Júnior 22/08/2003 Des. Humberto Adjuto Ulhôa 19/09/2003 Des. José Jacinto Costa Carvalho 19/02/2004 Desa. Sandra De Santis Mendes de Farias Mello 19/02/2004 Desa. Ana Maria Duarte Amarante Brito 19/02/2004 Des. Jair Oliveira Soares 19/02/2004 Desa. Vera Lúcia Andrighi 19/02/2004 Des. Mário-Zam Belmiro Rosa 19/11/2004

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Des. Flavio Renato Jaquet Rostirola 29/04/2005 Desa. Nídia Corrêa Lima 19/08/2005 Des. George Lopes Leite 26/10/2006 Des. Angelo Canducci Passareli 19/12/2006 Des. José Divino de Oliveira 21/06/2007 Des. Roberval Casemiro Belinati 07/03/2008 Des. Silvanio Barbosa dos Santos 23/06/2008 Des. Sérgio Xavier de Souza Rocha 19/09/2008 Des. Arnoldo Camanho de Assis 24/10/2008 Des. Fernando Antonio Habibe Pereira 13/03/2009 Des. João Timóteo de Oliveira 06/11/2009 Des. Antoninho Lopes 09/04/2010 Des. João Egmont Leôncio Lopes 09/07/2010 Des. Luciano Moreira Vasconcellos 25/03/2011 Des. José Carlos Souza e Avila 27/05/2011 Des. Teófilo Rodrigues Caetano Neto 27/05/2011 Desa. Nilsoni de Freitas Custódio 16/12/2011 Des. João Batista Teixeira 16/12/2011 Des. Jesuino Aparecido Rissato 16/12/2011 Desa. Simone Costa Lucindo Ferreira 22/06/2012 Des. Alfeu Gonzaga Machado 21/09/2012 Des. Sebastião Coelho da Silva 24/05/2013

* Lista de antiguidade das autoridades judiciárias do Distrito Federal até 30 de abril de 2013, organizada de acordo com o art. 47, incisos de I a VII, e § 1º, 2º e 3º da Lei nº 8.185, 14 de maio de 1991 e de acordo com o art. 45 da Lei 8.407 de 10 de janeiro de 1992.

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sumário

doutrina

Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos 11 que Ofendem o Direito à Vida no Projeto

do Novo Código Penal Brasileiro Roberval Casemiro Belinati

jurisprudência

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios 21

índices

Numérico dos Acórdãos 663 Alfabético 669

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doutrina • Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos • 13 – 20

11

necessidade de supressão e de correção de

normativos que ofendem o direito à vida no

projeto do novo código penal brasileiro

Roberval Casemiro Belinati1

Caríssimos Senadores, Deputados Federais, Deputados Distritais, religiosos e senhoras e senhores,

Agradeço à eminente deputada distrital Eliana Pedrosa, da Câmara Legislativa do Distrito Federal, pelo convite para participar da Audiência Pública de “Instalação da Frente Parlamentar em Defesa da Vida, com destaque para o tema no Novo Código Penal Brasileiro”. Também agradeço à Comissão de Bioética da Arquidiocese de Brasília pelo convite para representá-la neste evento.

Esse movimento, que tem a defesa da vida como principal objetivo, oportuniza o debate e a mobilização da sociedade do Distrito Federal contra as ações que não visualizam o direito à vida humana como o mais importante.

aborto

Verifica-se que o Projeto do Novo Código Penal reduz ainda mais as penas já tão reduzidas. O aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, atual-mente punido com detenção de um a três anos, passa a ter pena de prisão de seis meses a dois anos  (art. 125). O terceiro que provoca aborto com o consentimento da gestante, atualmente punido com reclusão de um a quatro anos, passa a sofrer pena de prisão de seis meses a dois anos  (art. 126). Se o aborto for provocado sem o consentimento da gestante, o terceiro é punido com prisão, de quatro a dez anos (art. 127). Curiosamente, ele recebe um aumento de pena de um a dois terços se, “em consequência do aborto ou da tentativa de aborto, resultar má formação do feto sobrevivente” (art. 127, §1º). Esse parágrafo parece ter sido incluído para es-timular o aborteiro a fazer abortos “bem feitos”, evitando que, por “descuido”, ele deixe a criança com vida e malformada.

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tjdft • Revista de Doutrina e Jurisprudência nº 101 • jan – abr • 2013

As maiores mudanças, porém, estão no artigo 128. Ele deixa de começar por “não se pune o aborto” e passa a começar por “não há crime de aborto”. O que hoje são hipóteses de não aplicação da pena (escusas absolutórias) passa a ser hipóteses de exclusão do crime. E a lista é tremendamente alargada. Basta que haja risco à “saúde” (e não apenas à “vida”) da gestante (inciso I), que haja “violação da digni-dade sexual” (inciso II), que a criança sofra anomalia grave, incluindo a anencefalia (inciso III) ou simplesmente que haja vontade da gestante de abortar (inciso IV). Neste último inciso o aborto é livre até a décima segunda semana (três meses). Basta que um médico ou psicólogo ateste que a gestante não tem condições “psi-cológicas” (!) de arcar com a maternidade.

razões jurídicas contra o aborto

A proposta pela liberação do aborto, em qualquer caso, não pode prosperar, pois, em primeiro lugar, ofende a Deus, que fez o homem e a mulher à sua imagem e semelhança e os abençoou dizendo: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a” (Gn 1,28). E determinou: “Não matarás.” (Êxodo , 20,13).

O aborto é o assassinato de um ser humano, é o homicídio de um ser indefeso e inocente.

O direito à vida é direito fundamental, desde a concepção até a morte natural. Cada pessoa é um dom valioso de Deus e é única, insubstituível e irrepetível. O direito à vida é o primeiro entre todos os direitos.

A ciência médica ensina que com doze semanas de gestação o bebê já está bem formado. Todos os sistemas orgânicos funcionam. Ele já respira e urina. O corpinho da criança já está bem evoluído e possui até impressões digitais. Quando sua mãe dorme, o bebê também dorme, mas quando a mãe desce uma escada, ele ouve um ruído forte e acorda. Com doze semanas de gestação, o bebê sente dor e é sensível à luz, ao calor e ao barulho. Eliminá-lo não significa destruir um monte de células sem vida humana, conforme alguns afirmam. Significa sim o assassinato de um ser humano inocente e indefeso.

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doutrina • Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos • 13 – 20

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Não podemos admitir que os grandes matem os pequenos, os fortes eliminem os fracos e os conscientes destruam os inconscientes. Este preceito deve ser obser-vado em qualquer tempo pelas civilizações inteligentes.

A Constituição Federal garante a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida.

Não importa se o nascituro apresenta deficiência física, cerebral, anomalia grave, se vai viver somente por alguns instantes, se vai ser rico ou pobre. Em qualquer circunstância o nascituro tem o direito de nascer e de viver.

O direito à vida é cláusula pétrea, que não pode ser modificada por emenda cons-titucional, por lei ordinária e muito menos por um código penal.

O aborto, além de ofender a Carta Magna, macula o Código Civil Brasileiro, no seu artigo 2º, que proclama que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.” Antes de nascer, o nascituro já é protegido pelo direito civil, e depois de nascer, será sujeito de direitos e deveres.

O aborto desrespeita o Estatuto da Criança e do Adolescente, que alerta que “é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida”.

O Estado tem obrigação de oferecer condições para a gestante ter o filho sadio e para que o filho desenvolva-se dignamente. Não tem o direito de oferecer condi-ções para a mãe matar o filho.

O aborto também ofende a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pac-to de São José da Costa Rica, que o Brasil acolheu, e que diz que “Pac-toda pessoa tem o direito de que respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”. O extermínio de seres inocentes e indefesos também viola a Convenção sobre os Direitos da Criança, que o Brasil adotou da Assembleia-Geral das Nações Unidas. Ela preceitua que “toda criança tem o direito inerente à vida.”

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Igualmente desrespeita o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, que também declara que “o direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deverá ser protegido por lei. Ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida.” Ora, defender a vida humana não é questão meramente religiosa, como alguns afirmam. Defender a vida humana é respeitar a Deus, é respeitar o semelhante, é observar o direito brasileiro, o direito internacional, é, acima de tudo, amar. Além do aspecto jurídico, nenhuma razão social pode justificar a prática do aborto, sendo inaceitável a alegação de que o aborto é necessário para controlar a nata-lidade, para combater a pobreza, para combater a fome, para combater o desem-prego, para melhorar a raça, para solucionar conflito decorrente de infidelidade conjugal, para resolver gravidez não desejada ou para não permitir o nascimento de pessoa com deficiência. Todos esses argumentos são absurdos!

Infeliz ainda é a alegação de que a mulher é dona de seu corpo e deve ter liber-dade para decidir sobre a continuiliber-dade ou não da gravidez. Ora, a mulher é uma pessoa e o feto é outra. Ela tem o dom sagrado de gerar o filho, mas não tem o direito de matá-lo. Esse argumento é falso, não é verdadeiro!

Também não é correta a alegação de que a liberação do aborto no Brasil reduziria a taxa de mortalidade materna, diminuiria o número de abortos e proporcionaria grande economia para os cofres públicos. Se na clandestinidade são praticados milhares de abortos, provavelmente mais de um milhão por ano, imagine o que aconteceria após a liberação?

A liberação do aborto só iria favorecer a “indústria do aborto” e seria um prêmio para aqueles que desejam se enriquecer, ganhar muito dinheiro com o assassinato de seres inocentes e indefesos.

Nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, paga-se de 100 a 1.200 dólares por um aborto. Imagine uma clínica realizando de 10 a 20 abortos por dia, quanto lucraria com o hediondo crime!

O Congresso Nacional deve tomar o máximo de cuidado para não ser iludido por aqueles que representam os interesses do poder econômico e desejam fazer for-tuna com a liberação do aborto.

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doutrina • Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos • 13 – 20

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eutanásia e ortotanásia

Outro dispositivo que precisa ser excluído do Projeto do Novo Código Penal re-fere-se à concessão de perdão judicial a quem pratica eutanásia em pessoa da família ou em alguém com quem se mantém estreitos laços de afeição, conforme está expresso no § 1º do artigo 122.

A extinção da punibilidade neste caso poderia estimular a prática da eutanásia, sobretudo para fins egoísticos, para favorecer, por exemplo, a abertura de inven-tário, para adiantar o pagamento de pensão, o recebimento dos bens do falecido, para fazer cessar o cansaço físico do responsável pelos cuidados do doente, enfim condutas absolutamente inaceitáveis e reprováveis.

Por essa razão não pode o Estado tolerar a eutanásia, pois, em sentido contrário, milhares de doentes correrão o risco de serem assassinados por pessoas da pró-pria família, sob a falsa alegação de compaixão ou piedade.

A pessoa gravemente doente normalmente não tem condições físicas nem psico-lógicas para decidir sobre o seu próprio destino, daí ser inaceitável a alegação de que o ato foi praticado para atender a seu pedido, para abreviar-lhe o sofrimento. Deixar de punir com prisão aquele que mata, seja por piedade ou compaixão, é violentar a Constituição Federal brasileira.

Também não pode o Estado deixar de punir com prisão aquele que pratica a or-totanásia, isto é, a ação daquele que deixa de oferecer tratamento ao doente, em estado irreversível, para não prolongar a sua vida, segundo o disposto no § 2º do referido artigo 122.

Ora, ninguém tem o direito de suprimir a vida a não ser Deus.

infanticídio indígena

Há tribos indígenas que costumam matar recém-nascidos quando estes, por algum motivo, são considerados uma maldição. De acordo com o projeto, tais crianças fi-cam sem proteção penal, desde que se comprove que o índio agiu “de acordo com

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os costumes, crenças e tradições de seu povo” (art. 36). Isto precisa ser revisto e modificado para não se permitir o extermínio de recém-nascidos indígenas.

induzimento, instigação ou auxílio a suicídio

Também é necessária a exclusão dos §§ 1º e 2º do artigo 123 do Projeto do Novo Código Penal, que autorizam a concessão de perdão judicial no caso de eutanásia ou ortotanásia no auxílio a suicídio.

no cenário internacional

Por essas razões, a prática da eutanásia é rejeitada na maioria dos países do mun-do, sendo pouquíssimos os que a aceitam, como a Holanda, Bélgica e Luxemburgo. Na Suíça, por exemplo, admite-se o chamado “suicídio assistido”, que se diferencia da eutanásia porque nesta o agente é responsável pelo procedimento que abrevia a vida do paciente, enquanto naquela o agente apenas fornece os meios necessá-rios para que o paciente tire a própria vida, o que tem gerado inclusive o chamado “turismo da morte”, em que pessoas se deslocam à Suíça para se submeterem a essa prática. Não se pode admitir que aconteça o mesmo no Brasil.

terrorismo e invasão de terras

O terrorismo é criminalizado (art. 239). Mas as condutas descritas (sequestrar, in-cendiar, saquear, depredar, explodir...) deixam de constituir crime de terrorismo se “movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios” (art. 239, §7º). Os invasores de terra são favorecidos, uma vez que “a simples inversão da posse do bem não caracteriza, por si só, a consumação do delito” (art. 24, parágrafo único).

descriminalização do uso de droga

Outra proposta que deve ser excluída do Projeto do Novo Código Penal refere-se à descriminalização do porte ou plantio de drogas para uso próprio, prevista nos §§ 2º, 3º e 4º do artigo 212, assim redigidos:

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doutrina • Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos • 13 – 20

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§ 2º Não há crime se o agente:

I – adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo drogas para consumo pessoal;

II – semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de drogas para consumo pessoal.

§ 3º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, à conduta, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, bem como às cir-cunstâncias sociais e pessoais do agente.

§ 4º Salvo prova em contrário, presume-se a destinação da droga para uso pessoal quando a quantidade apreendida for suficiente para o consumo médio individual por cinco dias, conforme definido pela autoridade admi-nistrativa de saúde.

A liberação do consumo de drogas traria consequências ainda mais nefastas, pois é sabido que a droga aniquila o usuário, faz sofrer a sua família e causa enormes danos e prejuízos a sociedade.

Seria ingênuo pensar que a descriminalização não aumentaria o consumo e o trá-fico. Há poucos dias, a imprensa divulgou estatística informando que o Brasil já é o segundo maior consumidor de drogas do mundo. Imagine o que aconteceria se a droga fosse amplamente liberada!

O problema é de saúde pública e de segurança pública, porque o consumo e o tráfico são os maiores responsáveis pelo aumento da violência e da criminalidade. O Estado tem obrigação de implantar políticas públicas para combater o tráfico e o consumo de substâncias entorpecentes, e jamais criar condições para a sua legalização.

prostituição infantil

Atualmente comete estupro de vulnerável quem pratica conjunção carnal com menor de 14 anos (art. 217-A, CP). O projeto baixa a idade: só considera

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vulnerá-18

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vel a pessoa que tenha “até doze anos”. Isso vale para o estupro de vulnerável (art. 186), manipulação ou introdução de objetos em vulnerável (art. 187) e molesta-mento sexual de vulnerável (art. 188).

Deixa de ser crime manter casa de prostituição (art. 229, CP) ou tirar proveito da prostituição alheia (art. 230, CP). Quanto ao favorecimento da prostituição ou da exploração sexual de vulnerável, a redação é ainda mais assustadora: só será cri-me se a vítima for “cri-menor de doze anos” (art. 189). Deixa de ser cricri-me, portanto, a exploração sexual de crianças a partir de doze anos. Isto precisa ser modificado. Disparidade na aplicação das penas

Segundo a linha ideológica do PLS 236/2012, o ser humano vale menos que os animais. A omissão de socorro a uma pessoa (art. 132) é punida com prisão, de um a seis meses, ou multa. A omissão de socorro a um animal (art. 394) é punida com prisão, de um a quatro anos. Conduzir um veículo sem habilitação, pondo em risco a segurança de pessoas (art. 204) é conduta punida com prisão, de um a dois anos. Transportar um animal em condições inadequadas, pondo em risco sua saúde ou integridade física (art. 392), é conduta punida com prisão, de um a quatro anos. Os ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre não podem ser vendidos, adqui-ridos, transportados nem guardados, sob pena de prisão, de dois a quatro anos (art. 388, §1º, III). Os embriões humanos, porém, podem ser comercializados, submetidos à engenharia genética ou clonados sem qualquer sanção penal, uma vez que ficam revogados (art. 544) os artigos 24 a 29 de Lei de Biossegurança (Lei 11.101/2005).

Mais um exemplo na disparidade na aplicação das penas: matar ou caçar algum animal silvestre sem permissão da autoridade competente será punido com dois a quatro anos de prisão. A pena poderá chegar a 12 anos se o crime for praticado com exercício de caça profissional, segundo o artigo 388. No entanto, matar um ser humano indefeso ou inocente, no ventre da mãe, pelo aborto, disposto nos artigos 125 e 126, a pena de prisão será de seis meses a dois anos.

Essa disparidade precisa ser corrigida, pois a vida humana é o maior bem que Deus concedeu aos homens e merece maior proteção por parte do Estado, com punições mais severas para aqueles que a ofendem.

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doutrina • Necessidade de Supressão e de Correção de Normativos • 13 – 20

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A pena legalmente cominada indica a importância que a ordem jurídica atribui ao preceito e ao bem jurídico tutelado, e quanto maior a importância do valor jurídico violado, maior deve ser a pena cominada ao crime.

pena máxima de 40 anos

Outra parte do Projeto do Novo Código Penal que precisa ser modificada refere--se ao aumento do limite máximo de trinta para quarenta anos de prisão, no caso de unificação da pena, sobrevindo condenação por fato posterior, conforme está expresso no § 2º do artigo 91.

Obrigar o condenado a cumprir até 40 anos de prisão é estabelecer prisão perpé-tua, é decretar a pena de morte progressiva, em flagrante desrespeito ao direito constitucional da dignidade humana.

Raríssimos presos conseguem suportar no cárcere o limite máximo de 30 anos, previsto na legislação em vigor. Imagine aumentar esse prazo para 40 anos! Não se está defendo a impunidade daqueles que cometem crimes quando já en-carcerados, mas é a oportunidade para reclamar a adoção de políticas públicas mais eficientes que combatam a criminalidade e auxiliem com mais resultados a reeducação dos condenados. A simples majoração das penas tem sido insuficiente para esse fim.

conclusão

A sociedade brasileira está ansiosa pela reforma do Código Penal Brasileiro, que data de 1940 e está em vigor desde 1942, com inúmeras modificações.

Mas espera uma reforma profunda, bem estudada, bem discutida, sem pressa e sem vaidade.

Aguarda, sobretudo, uma reforma sem aberrações, uma reforma verdadeira, que reconheça o direito à vida humana como o maior dentre todos os demais direitos.

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Confiamos que a Frente Parlamentar em Defesa da Vida, instalada neste egrégio Parlamento, estará em permanente vigília, com o apoio da sociedade do Distrito Federal, para defender o respeito e a preservação da vida humana.

Que Deus abençoe a todos! Muito Obrigado.

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jurisprudência • ADI 2012002019948-4 • Des. Romeu Gonzaga • 21 – 71

21

ação direta de inconstitucionalidade

2012002019948-4 Relator – Des. Romeu Gonzaga Neiva Conselho Especial

ementa

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Preliminar de Inadequação da via eleita. Inocorrência. Mérito. Lei Distrital 4.900 de 16/08/2012. Destinação de espaços públicos na CEASA-DF sem prévia licitação. Alegação de inconstitucionalidade ma-terial frente à Lei Orgânica do Distrito Federal. Declaração de inconstitucionalida-de. Modulação dos efeitos. Possibilidainconstitucionalida-de.

1. Não há de se falar em inadequação da via eleita, porquanto impugnado o art. 31 da Lei Distrital 4.900 à luz dos artigos 19, caput, 26, 48, 49 e 51, parágrafo 3º, todos da Lei Orgânica. A dispensa de licitação está definida no art. 24 da Lei 8.666/1993, sendo defeso ampliar as hipóteses ali prescritas.

2. É procedente a alegação de inconstitucionalidade material a contaminar dispo-sitivo da Lei Distrital 4.900 de 16/8/2012, porque não compete ao Distrito Federal dispensar licitação, em caso de permissionários de espaços públicos da CEASA-DF, autorizando a permanência dos atuais ocupantes por quinze anos, a exemplo que fez ao editar tal Lei, vulnerando os arts. 19, caput, 26, 42 e 48 da Lei Orgânica do Distrito Federal.

3. Hipótese de modulação dos efeitos dessa decisão, no tocante àqueles que ocu-pavam áreas por longos anos, por relevante interesse social e razões de segurança jurídica, permitindo-se que a mesma tenha efeitos ex nunc.

4. Declarada, com efeitos ex nunc e eficácia erga omnes, a inconstitucionalidade do art. 31 da Lei 4.900, de 16/8/2012.

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acórdão

Acordam os Senhores Desembargadores do Conselho Especial do Tribunal de Jus-tiça do Distrito Federal e dos Territórios, Romeu Gonzaga Neiva – Relator, Flavio Rostirola – Vogal, Ana Maria Duarte Amarante Brito – Vogal, Jair Soares Vogal, Má-rio-Zam Belmiro – Vogal, George Lopes Leite – Vogal, Roberval Casemiro Belinati – Vogal, Antoninho Lopes – Vogal, João Egmont – Vogal, Getúlio de Moraes Oliveira – Vogal, Romão C. Oliveira – Vogal, Mario Machado – Vogal, Sérgio Bittencourt – Vogal, Lecir Manoel da Luz – Vogal e Dácio Vieira – Vogal sob a presidência Des. Dácio Vieira, em proferir a seguinte decisão: preliminar afastada, por unanimidade. Julgado procedente com efeitos ex nunc, por maioria, de acordo com a ata do jul-gamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 23 de abril de 2013.

relatório

O Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios propõe a presente ação direta de inconstitucionalidade, do artigo 31 da Lei Distrital 4.900, de 16 de agosto de 2012, em face dos artigos 19, caput, 26, 48, 49 e 51, §3º, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal.

A Lei Distrital 4.900, de 16/08/2012, cuja declaração de inconstitucionalidade é pretendida, “dispõe sobre a organização e o funcionamento dos mercados de hortifrutigranjeiros geridos pelas Centrais de Abastecimento do Distrito Federal S.A – CEASA-DF.” (fl. 03). O projeto da referida lei é da autoria do Poder Executivo. Sustenta, o requerente, inconstitucionalidade material do referido artigo, porque assegura a prorrogação, sem licitação, das permissões de uso de espaços públicos em mercados de hortifrutigranjeiros, geridos pela CEASA, pelo prazo de quinze anos, para o exercício de atividade econômica por particulares.

Acentua que o normativo em questão assegura “utilização de espaços públicos por particulares para fins de exploração deve decorrer de concessão ou de per-missão conferida pela entidade de direito público, mediante prévia realização de

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licitação onde sejam asseguradas iguais oportunidades a todos os interessados” e que “A lei distrital que afasta essa exigência constitucional em hipóteses não pre-vistas na norma geral de licitações, afronta a Constituição Federal e a Lei Orgânica do Distrito Federal e deve ser invalidada pelo Poder Judiciário.” (fl. 07).

Requer, assim, a declaração, com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes, da inconsti-tucionalidade do referido dispositivo legal.

A petição inicial veio instruída com os documentos de fl. 11/15.

À fl. 18, determinei a apresentação das informações do Excelentíssimo Senhor Go-vernador do Distrito Federal e do Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal. No mesmo ato, determinei, após a entrega das referidas informações, a oitiva do Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral do Distrito Federal e o encami-nhamento do feito à Procuradoria-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, para parecer.

O Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal apresentou informações, às fls. 22/28 afirmando a constitucionalidade do art. 31 da Lei Distrital 4.900/2012.

Assevera que a Lei 4.900/2012 busca estabelecer transição entre a situação de fato instaurada e o novo regramento, de forma a atender à regularização de ocu-pação de espaços públicos, ocupados por antigos permissionários pequenos e médios, cuja atividade lucrativa única é a venda de produtos agrícolas. Dessa for-ma a instauração de procedimento licitatório para a atribuição de TPRU (Termo de Permissão Remunerada de Uso), com a substituição dos atuais ocupantes dos boxes, sem a instituição de um período de transição, determinaria conflitos em descompasso com o interesse social.

Acrescenta que a licitação é inexigível, pois não se presta ao fim a que se des-tina, ou seja, a regularização ou estabelecimento de transição para a CEASA/DF, faltando-lhe pressuposto jurídico.

O Excelentíssimo Senhor Governador do Distrito Federal manifestou-se, às fls. 54/47, argui a preliminar de não cabimento da presente ação de controle de cons-titucionalidade, uma vez que a alegada afronta aos artigos 26, 48 e 49 da Lei Or-gânica do DF caracteriza mera ofensa reflexa ao texto constitucional.

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No mérito, sustenta a constitucionalidade do artigo em exame ou, subsidiariamen-te, a modulação dos efeitos de eventual de procedência do pedido, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99 (fls. 54/151).

Aduz que o exercício de atividade econômica, efetivada por meio de permissão não qualificada de uso de bem público, prescinde de processo licitatório, em razão da ausência de dispositivo legal nesse sentido.

A Procuradoria-Geral do Distrito Federal pronunciou-se pelo conhecimento da ação e pela improcedência dos pedidos. Subsidiariamente, manifestou-se pela declaração da inconstitucionalidade com efeitos ex nunc (fls. 165/179).

Houve o ingresso na qualidade de custus legis da CEASA/DF e da ASSUCENA (As-sociação dos Empresários da CEASA/DF), os quais se manifestaram nos prazos que lhes foram concedidos.

A Procuradoria Geral de Justiça do Distrito Federal manifestou-se pela admissibili-dade da ação e procedência do pedido (fls. 181/189).

É o relatório.

votos

Des. Romeu Gonzaga Neiva (Relator) – Ouvi, com atenção, os pronunciamentos da tribuna.

Senhor Presidente, ouvi, com a merecida atenção, o pronunciamento dos Senho-res Advogados que assomaram à tribuna. Os três causídicos colocaram a questão nos seus limites e acrescentaram argumentos e fundamentos ponderáveis e rele-vantes, merecedores de reflexão.

Penso que os questionamentos feitos, da tribuna, poderão encontrar a devida res-posta no decorrer do voto.

Prefacialmente, a questão referente à falta de interesse de agir, na vertente inade-quação da via eleita da presente ação direta de inconstitucionalidade, não merece acolhimento.

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Com efeito, conquanto o Governador do Distrito Federal alegue a tese deduzida na inicial em relação à afronta aos arts. 26, 48 e 49 da Lei Orgânica do Distrito Fe-deral, na verdade demonstra desconformidade com a Lei Federal 8.666/93, sendo, pois, reflexa a constitucionalidade, não é isso que ocorre.

Verifico que, em verdade, o parâmetro de controle apontado na petição inicial é a Lei Orgânica do Distrito Federal, de modo que o fundamento jurídico se con-substancia na incompatibilidade vertical do dispositivo legal impugnado. Como se sabe, a Lei Máxima local iguala-se, para efeitos de controle de constitucionalidade na via direta ou concentrada, à Constituição Federal, que, em ultima análise, é fundamento de validade de todos os atos normativos emanados no âmbito local. Portanto, não se pode dizer que a questão da constitucionalidade tem como pa-râmetro a Lei 8.666/93, porquanto, como dito, o exame se dá à luz da Carta Políti-ca loPolíti-cal. Nessa linha de consideração, mesmo que haja princípios constitucionais repetidos na Lei de Licitações, isto, por si só, não caracteriza inadequação da via eleita, eis que se trata de estrita obediência às diretrizes traçadas em dispositivos da Lei Orgânica que, inclusive, devem obrigatoriamente constar de seu texto, a fim de guardar compatibilidade com a Constituição Federal.

Ressalto, por oportuno, que o tema não é novo nesta Corte de Justiça, como se vê do seguinte aresto:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRI-TAL 4.056/2007. PRELIMINAR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AFRONTA À LEI FEDERAL. INCOMPETÊNCIA DO TJDFT. REJEIÇÃO. MÉRITO. RENOVAÇÃO DE PERMISSÃO PARA EXPLORAÇÃO DE SERVIÇO DE TÁXI E TRANSFÊRENCIA DA CONCESSÃO ENTRE PERMISSIONÁRIOS SEM LICITAÇÃO. PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO. VIOLAÇÃO. INCONS-TITUCIONALIDADE MATERIAL. 1. A Lei Orgânica do Distrito Federal veicula prescrições normativas impregnadas de parametricidade, cujo teor permite qualificá-las como paradigma de confronto para fins de instauração, perante este Eg. Tribunal de Justiça, do concernente processo objetivo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, tal como o autoriza o § 2º do art. 125 da Constituição da República. 2. A declaração de inconstitucionalidade de uma lei alcança os atos pretéritos com base nela praticados, eis que o

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mento desse supremo vício jurídico, que inquina de total nulidade os atos emanados do Poder Público, desampara as situações constituídas sob sua égide e inibe – ante a sua inaptidão para produzir efeitos jurídicos validos – a possibilidade de invocação de qualquer direito. 3. A licitação assegura a igual-dade de condições a todos os interessados para selecionar a proposta mais vantajosa para o interesse público. Desse modo, a sua inobservância, quando obrigatória, viola a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e, em última análise, o interesse público. 4. A possibilidade de transferência direta da per-missão, sem licitação, frustra os demais interessados em contratar, impedin-do-os de concorrer a prestação de serviço público, implicando em verdadeira barreira à livre concorrência, violando diretamente a isonomia, o princípio da competitividade, a impessoalidade e, por conseguinte, o interesse público, uma vez que a finalidade da licitação consiste justamente em selecionar a proposta mais vantajosa para o bem-estar coletivo, e a eficiência, já que aten-de o interesse aten-de poucos, não obtendo a presteza, a segurança e a eficiência necessária ao atendimento comum. 5. Julgado procedente o pedido da ação para declarar inconstitucional o artigo 6º, parágrafo único, o artigo 13, e seus parágrafos, e o artigo 16, e seus parágrafos, da Lei 4.056, de 14 de dezem-bro de 2007, por vício material, com efeitos ex tunc e erga omnes, frente ao princípio da obrigatoriedade da licitação, previsto nos artigos 19, caput, 25, 26, 186, caput, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal. (Acórdão n.369470, 20090020005137ADI, Relator: Flavio Rostirola, Conselho Especial, Publicado no DJE: 04/10/2011. Pág.: 39)

Necessário dizer, por derradeiro, que a competência para processar e julgar a pre-sente ação direta de inconstitucionalidade é deste e. Tribunal de Justiça.

A Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, dando concretude ao art. 125, §2º da Constituição Federal, dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de in-constitucionalidade e da ação declaratória de in-constitucionalidade perante o STF, acrescentou ao inciso I do artigo 8º da Lei 8.185/91 a alínea “n”, que prevê a competência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios para processar e julgar, originariamente, “a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato nor-mativo do Distrito Federal em face da sua Lei Orgânica”.

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Portanto, tendo por base a sistemática constitucional e legal vigente, o controle concentrado de lei ou ato normativo distrital em face da Constituição Federal com-pete ao Supremo Tribunal Federal, enquanto o controle concentrado das mesmas normas em face da Lei Orgânica do Distrito Federal compete ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. No âmbito desta Corte, cabe ao Conselho Especial processar e julgar as ações diretas de inconstitucionalidade, na forma do artigo 8º, inciso I, alínea “l”, do Regimento Interno.

Admito, destarte, o processamento da presente ação direta de inconstitucionali-dade, pois, presentes os pressupostos e as condições da presente ação direta de inconstitucionalidade

Afirma o requerente a inconstitucionalidade material a contaminar o art. 31 da Lei Distrital 4.900, de 16/8/2012, por afronta aos princípios da licitação. Eis a íntegra das normas legais atacadas, verbis:

Lei 4.900, de 16 de agosto de 2012 (Autoria do Projeto: Poder Executivo)

Dispõe sobre a organização e o funcionamento dos mercados de hortifruti-granjeiros geridos pelas Centrais de Abastecimento do Distrito Federal S.A – CEASA-DF, a organização e o funcionamento das feiras livres e permanentes no Distrito Federal.

O GOVERNADOR DO DISTRITO FEDERAL,

Faço saber que a Câmara Legislativa do Distrito Federal decreta e eu san-ciono a seguinte Lei:

[...]

Art. 31. Fica assegurada a emissão de TPRU e o enquadramento nas disposi-ções desta Lei aos ocupantes que comprovem:

I – atuação com habitualidade no mercado da CEASA-DF;

II – regularidade fiscal com o Distrito Federal, com a Seguridade Social e com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço;

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III – inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho; IV – inexistência de débito junto à CEASA-DF.

§1º O ocupante de que trata este artigo deve requerer a regularização de sua atividade no prazo de sessenta dias, contados da data de publicação desta Lei.

§2º Ocorrendo a necessidade de diligências, a CEASA-DF deve abrir prazo de sessenta dias para serem cumpridas pelo requerente de que trata o §1º. §3º O ocupante que não se enquadrar nas disposições desta Lei perde o direito ao espaço ocupado ate o término da vigência da TPRU de que é portador. Nos casos de aposentadoria, invalidez ou falecimento do feirante, a permissão de uso poderá ser transferida a qualquer herdeiro necessário que preencha os requisitos previstos nesta Lei.

Destaco que a questão foi devidamente examinada no parecer ministerial, da lavra da e. Vice-Procuradora-Geral de Justiça do Distrito Federal, Dra. Zenaide Souto Martins, cujos fundamentos, lançados às fls. 185/187, a seguir transcrevo:

No mérito, assiste razão ao requerente. Conforme demonstrado na exordial, a matéria sob análise já foi objeto de apreciação em pelo menos duas ou-tras ações diretas de inconstitucionalidade apreciadas pelo Conselho Espe-cial do Tribunal de Justiça local, que impugnavam leis semelhantes. Em situações análogas, em que se discutia a ocupação de áreas publicas por quiosques e similares para fins de exploração de atividade econômica, assim decidiu o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, verbis:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL 4.257, DE 2.12.2008. ART. 28 E PARÁGRAFO ÚNICO. OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLI-COS. QUIOSQUES E TRAILERS. DISPENSA DE LICITAÇÃO AOS QUE JÁ OCUPA-VAM E FORAM REMOVIDOS. VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. PROCEDÊNCIA. RELEVANTE INTERESSE SOCIAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. 1. O parágrafo único do artigo 28 da Lei Distrital 4.257, de 2 de dezembro de 2008, viola a Lei Orgânica do Distrito Federal e os princípios

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cionais da legalidade, da isonomia, da impessoalidade, da moralidade, da razoabilidade, da motivação e do interesse público. 2. O dispositivo aponta-do ao assegurar, sem licitação, aos antigos ocupantes de espaços públicos que já exerciam as atividades e foram removidos, o direito a novas áreas em condições semelhantes àquelas objeto da remoção encerra vício de in-constitucionalidade material. 3. Deve ser considerado o relevante interesse social que a questão encerra, uma vez que o dispositivo legal em comento assegura àqueles que já ocupam as áreas por longos anos, a permanecer no exercício da atividade econômica da qual retiram o seu lucro e, quiçá, sua própria subsistência. 4. Hipótese que enseja a aplicação da técnica da mo-dulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, a fim de preser-var situações consolidadas, sob pena de violação ao princípio da dignidade da pessoa humana e em homenagem ao postulado da segurança jurídica. 5. Ação direta de inconstitucionalidade com pedido julgado procedente, com modulação dos efeitos, em relação ao art. 28 e seu parágrafo único da Lei 4.257/2008, com eficácia erga omnes e efeitos ex nunc. (Acórdão n.427293, 20090020119018ADI, Relator: Mário-Zam Belmiro, Conselho Especial, Pu-blicado no DJE: 16/06/2010. Pág.: 63)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LIMINAR. LEI DISTRITAL 901 E SUAS ALTERAÇÕES. LEI DISTRITAL 3.313/04. LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL. VÍCIO DE INICIATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. LIMI-NAR DEFERIDA. MAIORIA. As Leis Distritais s 901/95, 1.361/96, 1.365/97, 1.793/97, 1.830/98 e 3.313/04, foram elaboradas por iniciativa de Depu-tados Distritais, estabelecendo regras para ocupação de áreas públicas por traillers, quiosques e similares, permitindo novas autorizações mediante processo seletivo simplificado, deixando de observar as principais normas gerais acerca da legitimidade para propositura de leis que disponham sobre áreas públicas do Distrito Federal, cuja iniciativa é privativa do Chefe do Po-der Executivo, e sobre a alienação de bens públicos, segundo as quais even-tual alienação deve se dar mediante prévia licitação. (Acórdão n.215765, 20040020074626ADI, Relator: Lécio Resende, Conselho Especial, Publica-do no DJU SEÇÃO 3: 07/06/2005. Pág.: 172)”

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No caso em tela, o artigo 31 da Lei Distrital 4.900, ao assegurar a

prorroga-ção de permissões de uso de espaços públicos ocupados por comerciantes em mercados de hortifrutigranjeiros geridos pela CEASA-DF sem licita-ção, violou os princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade,

da moralidade e da razoabilidade, da motivação e do interesse público, ex-pressos no art. 19 da Lei Orgânica distrital.

Na espécie, merece ser declarado materialmente inconstitucional o referido dispositivo, que assegura a emissão de Termo de Permissão Remunerada de Uso – TPRU de área pública aos atuais permissionários, garantindo, assim, a prorrogação automática de tais permissões por 15 (quinze) anos, sem licitação.

Isso porque, a licitação funciona como mecanismo garantidor da observân-cia desses princípios constitucionais. Cabe privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação, aplicáveis às administrações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Assim, ao promulgar leis que dispensam de licitação para a prorrogação de permissões de uso de áreas públicas, o Distrito Federal atingiu frontalmente o princípio constitucional da licitação e os dispositivos que lhe vedam criar preferências entre brasileiros e instituir tratamento discriminatório (CF, art. 19, inc. III e art. 5º, caput).

O Supremo Tribunal Federal analisando a necessidade de licitação deixou o seguinte entendimento à matéria. Veja-se trecho dessa ementa:

“[...] 5. Não podem a lei, o decreto, os atos regimentais ou instruções nor-mativas e muito menos acordo firmado entre partes, sobrepor-se a preceito constitucional, instituindo privilégios para uns em detrimento de outros, posto que além de odiosos e iníquos, atentam contra os princípios éti-cos e morais que precipuamente devem reger os atos relacionados com a Administração Pública. 6. O art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal, de

conteúdo conceptual extensível primacialmente aos procedimentos lici-tatórios, insculpiu o princípio da isonomia assecuratória da igualdade de tratamento entre todos os concorrentes, em sintonia com o seu caput – obediência aos critérios da legalidade, impessoalidade e moralidade – e

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ao de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natu-reza. (CF, artigo 5º, caput).

[...] (STF, MS 22.493/RJ, Min. Maurício Corrêa, julg. 26.9.1996, maioria, publ. DJU 11.12.1996, pág. 49765 – grifos acrescentados) transferência das permissões de uso dos espaços públicos para herdeiros ou prepostos e a permanência dos atuais ocupantes por quinze anos, independentemente de processo licitatório, afrontam diretamente diversos dispositivos da Lei Orgânica do Distrito Federal.

O Ministro do Tribunal de Contas de União, Benjamim Zymler, por ocasião de prolação do Acórdão 1.054/2004 – Plenário (Processo 005.752/2004-0), bem abordou a questão. Veja-se (grifos nossos):

‘O art. 2º da Lei 8.666/93, estabelece o seguinte:

‘As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, conces-sões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.

Pela redação do dispositivo transcrito, observa-se que as permissões efe-tuadas pela Administração Pública somente deverão ser objeto de licitação quando sua formalização for realizada por meio de contrato. É o caso, por exemplo, das permissões de serviço público, contempladas pelo art. 175 da Constituição Federal.

Permissões de uso de bem público, em regra, manifestam-se por meio de ato administrativo unilateral, discricionário e precário. Desta sorte, não há falar em procedimento licitatório. Tais permissões não são abarcadas pelo art. 2º da Lei de Licitações.

Entretanto, desviando-se da regra geral, existem as permissões de uso

qualificadas. Estas, eis que caracterizadas pela existência da realização de benfeitorias por parte do permissionário e de prazo de término, apro-ximam-se do instituto da concessão de uso. A existência de prazo, e tam-bém da realização das ditas benfeitorias, faz com que a precariedade do ato diminua, de modo que, como dito, a permissão passe a se assemelhar

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à concessão de uso. Essas permissões qualificadas, ao contrário das ou-tras, devem ser precedidas de procedimento licitatório. Sofrem, portan-to, a incidência do art. 2º da Lei de Licitações. Neste sentido, permito-me

citar Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito Administrativo, 17ª Ed., p. 591): “Além disso, a permissão de uso, embora seja ato unilateral, portanto

ex-cluído da abrangência do artigo 2º, às vezes assume a forma contratual, com características iguais ou semelhantes à concessão de uso; é o que ocorre na permissão qualificada, com prazo estabelecido. Neste caso, a licitação torna-se obrigatória. A Lei 8.666/93 parece ter em vista

precisa-mente essa situação quando, no artigo 2º, parágrafo único, define o contrato como ‘todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a deno-minação utilizada. Quer dizer: ainda que se fale em permissão, a licitação

será obrigatória se a ela for dada a forma contratual, sendo dispensada a

licitação na hipótese do art. 17, I, f, da Lei 8.666/93, alterada pela Lei 8.883, de 8-6-94.”

É induvidoso: a prorrogação da utilização de espaços públicos por parti-culares, para fins de exploração econômica, sem licitação, como previsto na norma impugnada, institucionaliza verdadeiro privilégio para alguns em detrimento de toda a coletividade.

Não se questiona, na presente ação, a evidente necessidade de regulariza-ção da ocuparegulariza-ção dos referidos espaços públicos. O que se busca, tão so-mente, é impedir que a solução para esse problema ocorra ao arrepio das disposições da Lei Orgânica do Distrito Federal e da Constituição Federal que tratam do tema.

Nessas condições, o dispositivo impugnado revela-se materialmente in-constitucional, por apresentar incompatibilidade vertical com os artigos 19,

caput, 26 e 48, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal, com fartamente demonstrado na inicial.

Comungo de idêntico entendimento, na medida em que o art. 31 a Lei Distrital 4.900/2012 assegura a emissão, automática e sem licitação, do termo de

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são de uso para os atuais ocupantes, em flagrante afronta aos princípios constitu-cionais que regem a Administração Pública.

Cediço que a Lei Orgânica do Distrito Federal, em seu artigo 48, dispõe que o “uso de bens do Distrito Federal por terceiros poderá ser feito mediante concessão administrativa de uso, permissão ou autorização, conforme o caso e o interesse público, na forma da lei”, impondo prévia licitação. Da mesma forma, prevê, em seu artigo 17, § 1º, que “o Distrito Federal, no exercício de sua competência suple-mentar, observará as normas gerais estabelecidas pela União.”

O que o art. 31 da Lei 4.900/2012 faz é criar exceção à regra, eis que dispensa a licitação em caso específico de permissão de uso para os atuais ocupantes de espaços públicos na CEASA-DF, violando a lei que institui normas para licitações e contratos da administração pública e atingindo frontalmente o princípio cons-titucional da licitação e os dispositivos que lhe vedam criar preferências entre brasileiros e instituir tratamento discriminatório (CF, art. 19, inc. III e art. 5º, caput). Não é novidade alguma que a Constituição Federal, em seu art. 22, XXVII, estabele-ce a competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de licitação e contratação em todas modalidades, para administração pública, direta e indireta, e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, nas diversas esferas de governo. Já no seu artigo 37, XXI está expresso o conhecido princípio da obrigato-riedade da licitação.

Acrescento que a Lei 8.666/93 estabelece normas gerais sobre licitações e contra-tos administrativos, pertinentes a obras e serviços, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios, e, em seus artigos 17, I e II, 24, 25 e 26, tratam dos casos de dispensa e inexigibilida-de inexigibilida-de licitação, estabelecendo exceções à regra inexigibilida-de sua obrigatoriedainexigibilida-de.

Por outro lado, a licitação funciona como mecanismo garantidor da observância dos princípios constitucionais da isonomia, da moralidade e da impessoalidade. Cabe privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação, aplicáveis às ad-ministrações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Ademais, a Carta Política distrital veda o uso de espaços públicos, via conces-são ou permisconces-são, sem licitação, e proclama observância à Lei 8.666/1993 de

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que ressai a nulidade absoluta das permissões firmadas sem o prévio procedi-mento licitatório.

Nessas condições, o dispositivo impugnado revela-se materialmente inconstitu-cional, por apresentar incompatibilidade vertical com os artigos 19, caput, 26 e 48, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal, bem como atingiu frontalmente o princípio constitucional da licitação e os dispositivos que lhe vedam criar prefe-rências entre brasileiros e instituir tratamento discriminatório (CF, art. 19, inc. III e art. 5º, caput).

De ver-se que esta Corte Especial vem decidindo, reiteradamente, que a permis-são de uso de área pública para fins econômicos, nada obstante a natureza discri-cionária e precária de que se reveste, não afasta a necessidade de procedimento licitatório. Confira-se:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRI-TAL 4.056/2007. PRELIMINAR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AFRONTA À LEI FEDERAL. INCOMPETÊNCIA DO TJDFT. REJEIÇÃO. MÉRITO. RENOVAÇÃO DE PERMISSÃO PARA EXPLORAÇÃO DE SERVIÇO DE TÁXI E TRANSFÊRENCIA DA CONCESSÃO ENTRE PERMISSIONÁRIOS SEM LICITAÇÃO. PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO. VIOLAÇÃO. INCONS-TITUCIONALIDADE MATERIAL. 1. A Lei Orgânica do Distrito Federal veicula prescrições normativas impregnadas de parametricidade, cujo teor permite qualificá-las como paradigma de confronto para fins de instauração, perante este Eg. Tribunal de Justiça, do concernente processo objetivo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, tal como o autoriza o § 2º do art. 125 da Constituição da República. 2. A declaração de inconstitucionalidade de uma lei alcança os atos pretéritos com base nela praticados, eis que o reconheci-mento desse supremo vício jurídico, que inquina de total nulidade os atos emanados do poder público, desampara as situações constituídas sob sua égide e inibe – ante a sua inaptidão para produzir efeitos jurídicos validos – a possibilidade de invocação de qualquer direito. 3. A licitação assegura a igualdade de condições a todos os interessados para selecionar a proposta mais vantajosa para o interesse público. Desse modo, a sua inobservância, quando obrigatória, viola a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e, em última análise, o interesse público. 4. A possibilidade de transferência

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ta da permissão, sem licitação, frustra os demais interessados em contratar, impedindo-os de concorrer à prestação de serviço público, implicando em verdadeira barreira à livre concorrência, violando diretamente a isonomia, o princípio da competitividade, a impessoalidade e, por conseguinte, o inte-resse público, uma vez que a finalidade da licitação consiste justamente em selecionar a proposta mais vantajosa para o bem-estar coletivo, e a eficiência, já que atende o interesse de poucos, não obtendo a presteza, a segurança e a eficiência necessária ao atendimento comum. 5. Julgado procedente o pedido da ação para declarar inconstitucional o artigo 6º, parágrafo único, o artigo 13, e seus parágrafos, e o artigo 16, e seus parágrafos, da Lei 4.056, de 14 de dezembro de 2007, por vício material, com efeitos ex tunc e erga

omnes, frente ao princípio da obrigatoriedade da licitação, previsto nos arti-gos 19, caput, 25, 26, 186, caput, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal. (20090020005137ADI, Relator Flavio Rostirola, Conselho Especial, julgado em 16/06/2009, DJ 17/08/2009 p. 21).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL 4.257, DE 2.12.2008. ART. 28 E PARÁGRAFO ÚNICO. OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLI-COS. QUIOSQUES E TRAILERS. DISPENSA DE LICITAÇÃO AOS QUE JÁ OCUPA-VAM E FORAM REMOVIDOS. VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. PROCEDÊNCIA. RELEVANTE INTERESSE SOCIAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. 1. O parágrafo único do artigo 28 da Lei Distrital 4.257, de 2 de dezembro de 2008, viola a Lei Orgânica do Distrito Federal e os princípios constitu-cionais da legalidade, da isonomia, da impessoalidade, da moralidade, da razoabilidade, da motivação e do interesse público. 2. O dispositivo aponta-do ao assegurar, sem licitação, aos antigos ocupantes de espaços públicos que já exerciam as atividades e foram removidos, o direito a novas áreas em condições semelhantes àquelas objeto da remoção encerra vício de in-constitucionalidade material. 3. Deve ser considerado o relevante interesse social que a questão encerra, uma vez que o dispositivo legal em comento assegura àqueles que já ocupam as áreas por longos anos, a permanecer no exercício da atividade econômica da qual retiram o seu lucro e, quiçá, sua própria subsistência. 4. Hipótese que enseja a aplicação da técnica da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, a fim de preservar situações consolidadas, sob pena de violação ao princípio

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da dignidade da pessoa humana e em homenagem ao postulado da segu-rança jurídica. 5. Ação direta de inconstitucionalidade com pedido julgado procedente, com modulação dos efeitos, em relação ao art. 28 e seu pará-grafo único da Lei 4.257/2008, com eficácia erga omnes e efeitos ex nunc. (20090020119018ADI, Relator Mário-Zam Belmiro, Conselho Especial, jul-gado em 13/04/2010, DJ 16/06/2010 p. 63)

O e. STF, em recente julgado, assim decidiu, in vebis:

A licitação é um procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia. Está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso – o melhor negócio – e o de assegurar aos administrados a oportu-nidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendi-da pela administração. [...] Procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia, a função da licitação é a de viabilizar, através da mais ampla disputa, envolvendo o maior número possí-vel de agentes econômicos capacitados, a satisfação do interesse público. A competição visada pela licitação, a instrumentar a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, impõe-se seja desenrolada de modo que reste assegurada a igualdade (isonomia) de todos quantos pretendam aces-so às contratações da administração. A conversão automática de permissões municipais em permissões intermunicipais afronta a igualdade – art. 5º –, bem assim o preceito veiculado pelo art. 175 da Constituição do Brasil. [...] Afronta ao princípio da isonomia, igualdade entre todos quantos pretendam acesso às contratações da administração. A lei pode, sem violação do prin-cípio da igualdade, distinguir situações, a fim de conferir a uma tratamento diverso do que atribui a outra. Para que possa fazê-lo, contudo, sem que tal violação se manifeste, é necessário que a discriminação guarde com-patibilidade com o conteúdo do princípio. A Constituição do Brasil exclui quaisquer exigências de qualificação técnica e econômica que não sejam indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. A discriminação, no julgamento da concorrência, que exceda essa limitação é inadmissível. (ADI 2.716, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 29-11-2007, Plenário, DJE

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de 7-3-2008.) No mesmo sentido: RE 607.126-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 2-12-2010, Primeira Turma, DJE de 1º-2-2011. (Grifo nosso)

Por fim esclareço que o presente caso não cuida de permissão de uso, pura e sim-ples, senão de uma modalidade condicionada – a prazo certo –, pois a lei impug-nada, em seu art. 4º, §3º ao reiterar sua natureza pessoal, fixa em 15 (quinze) anos o prazo de sua validade,

A propósito, trago a seguinte doutrina, in litteris:

[...] No entanto, existem verdadeiras concessões de uso que são disfarça-das sob a denominação de permissão de uso, tendo a natureza contratual; isto ocorre especialmente quando ela é concedida com prazo estabelecido, gerando para o particular direito a indenização em caso de revogação da permissão antes do prazo estabelecido. Neste caso, a permissão de uso está sujeita a licitação. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; Temas Polêmicos sobre Licitações e Contratos, 3. ed., São Paulo: Malheiros, p. 40-41)

Conforme relatado, o Exmº. Sr. Governador do Distrito Federal e o Sr. Procurador--Geral do Distrito Federal, subsidiariamente, requereram, em caso de procedência da ação, a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, o que penso ser viável, e dou os motivos.

Primeiramente, a peculiaridade da situação jurídica dos permissionários da CEA-SA-DF e a importância da atividade que desempenham, uma vez que a considerar os efeitos ex tunc, não serão protegidas as situações de fato já consolidadas, ou seja, as permissões concedidas de forma regular, com base no dispositivo legal impugnado, causando abalos sociais de significativas proporções.

Assim, penso que os efeitos da decisão na presente ação, devem ser modulados nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99, até mesmo para permitir que, daqui para frente, se realize devidamente o procedimento licitatório, a partir do trânsito em julgado, mantendo os atuais contratos de permissão de uso qualificada, devida-mente regularizados na forma dos parágrafos 1º e 2º da lei examinada.

Forte nessas considerações, rejeito a preliminar de falta de interesse de agir, por inadequação da via eleita, e julgo procedente o pedido, para declarar, com efeitos daqui para frente ou ex nunc, ou seja, modulando os efeitos da decisão, a fim de que

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realize devidamente o procedimento licitatório, a partir do trânsito em julgado, man-tendo os atuais contratos de permissão de uso qualificada e eficácia erga omnes, a inconstitucionalidade material do artigo 31, da Lei Distrital 4.900, de 16/8/2012. É como voto.

Des. Flavio Rostirola (Vogal) – Eminente Presidente, ouvi com atenção as brilhan-tes sustentações orais, da tribuna, que bem dispuseram sobre a matéria, e a pre-ocupação dos ocupantes desses boxes das Centrais de Abastecimento do Distrito Federal (CEASA-DF)

A Constituição Federal contempla como direitos sociais, entre outros, o direito à alimentação. Nas disposições transitórias, o legislador tratou de dar proteção aos miniprodutores rurais e também tratou de determinar que houvesse lei que contemplasse a regulação do abastecimento. Entretanto, parece-nos que há uma lacuna legislativa nesse tocante.  Até o presente momento, não se tratou de se criar uma legislação que assegurasse a regulamentação da ocupação da questão do abastecimento nas grandes cidades.

A Lei 8.666/93 não contempla, em nenhum momento, a especificidade deste caso nem a excepcionalidade que este caso requer. Aqui, trata-se de uma ocupação com certo grau de características totalmente diferenciadas da ocupação normal de bens públicos. Para se garantir o abastecimento da população a alimentos, é ne-cessário que os produtores tenham um determinado local onde possam entregar a sua mercadoria e comercializá-la.

Não posso licitar, sem uma legislação específica, detalhada, um local público para comercialização de soja, tomate, arroz, banana, abacate etc. É necessário que a cada licitação se estabeleça um regramento de ocupação daquele local, daí a ra-zão por que não vislumbro possibilidades que se possam dar como inconstitu-cional a norma que está contemplando uma situação de excepinconstitu-cionalidade, uma legislação absolutamente transitória.

Aqui, o que legislador apenas fez foi estabelecer um período determinado para que ele possa regular a ocupação desses bens públicos, segundo as necessidades locais, sem afrontar a legislação de licitações, e sim adequá-la.

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Excelências, trata-se de uma excepcionalidade que fez com que o legislador esta-belecesse esse regramento momentâneo para evitar medidas judiciais, dado que viriam dezenas de medidas judiciais, porque, afinal de contas, estaria afrontando a boa-fé daqueles que contrataram até o presente momento.

Com essas razões, entendo que os dispositivos arguidos como inconstitucionais não apresentam nenhum tipo de vício e, por via de consequência, reputo-os cons-titucionais e voto pelo improvimento da medida.

Caso vencido, oportunamente me manifestarei quanto aos efeitos.

Desa. Ana Maria Duarte Amarante (Vogal)

Senhor Presidente, colendo Conse-lho, não desconheço a extensão da questão socioeconômica subjacente ao pro-blema ora em debate, ligada diretamente ao abastecimento, principalmente, dos produtos perecíveis de hortifrutigranjeiros. Mas a questão é que estamos em sede judicial e não poderá ser buscada a solução por via de um precário e instável ati-vismo judicial, senão pelas vias legislativas adequadas.

Não há como se deixar de reconhecer a supremacia da norma emanada do Poder Constituinte Derivado Decorrente, que é a Lei Orgânica do Distrito Federal, que alcançou esse grau de autonomia ímpar a partir da Constituição Federal de 1988. Permitir que uma norma ordinária afrontasse seus ditames seria negar a própria supremacia desse poder que a editou, já que qualquer emenda, nos limites per-mitidos para esse poder de emenda, haveria de observar o procedimento solene, bem mais complicado do que aquele de edição de uma lei ordinária.

No caso, se tem uma permissão de uso que, de acordo com a doutrina administra-tivista clássica – aquela que aprendi nos meus bancos escolares –, era mesmo um ato discricionário precário da administração, diferenciando-se da autorização ape-nas pela prevalência do interesse público. Mas, com o tempo, essa precariedade de que se revestia a permissão de uso, e que afastaria o enquadramento no art. 3º da Lei 8.666/93, foi se reduzindo. O fato é que se aproximou e se enquadrou, final-mente, na espécie contratual, partilhando mais a natureza de uma concessão de uso, tais os limites, as garantias de que foi se revestindo, inclusive com a garantia temporal. Com esse enquadramento, não vejo como desconsiderar a exigência do prévio procedimento licitatório para outorga dessa forma de uso de bem público.

Referências

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