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preliminar de inadequação da via eleita

No documento rdj101 (páginas 58-73)

A preliminar de inadequação da via eleita, arguida pelo Governador do Distrito Federal, não merece guarida.

Alega, no particular, que “com exceção dos artigos 19 e 51, §3º, os demais dispo- sitivos da Lei Orgânica do Distrito Federal invocados pelo requerente como parâ- metro de fiscalização não podem ser utilizados no julgamento”. Sustenta que os artigos 26, 48 e 49, todos da Lei Orgânica, são normas de devolução, na medida em que remetem à regulamentação da matéria ao “sistema jurídico federal”. Afir- ma, por fim, que o dispositivo legal objeto da presente ação, na verdade, está sen- do impugnado em face da Lei 8.666/93 e não da Lei Orgânica do Distrito Federal. Nada obstante façam referência a outras normas, os dispositivos já citados, inser- tos na Lei Orgânica, tratam da obrigatoriedade de licitação para compras e alie- nações por parte do Poder Público, o que, a meu sentir, os tornam idôneos como parâmetro do controle abstrato de normas.

Adequada a ação direta de inconstitucionalidade, deve a mesma ser julgada pelo e. Conselho Especial desta Corte, ex vi art. 8º, inciso I, alínea “l”, do Regimento Interno. Rejeito, pois, a preliminar.

mérito

Pretende o Procurador-Geral de Justiça a declaração de inconstitucionalidade do art. 31 da Lei distrital 4.900, de 16 de agosto de 2012, por ofensa aos arts. 19,

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caput, 26, 48, 49 e 51, parágrafo terceiro, todos da Lei Orgânica do Distrito Fe- deral1.

O dispositivo de lei atacado, inserto nas disposições finais da referida lei distrital, que dispõe sobre “a organização e o funcionamento dos mercados de hortifrutigran- jeiros geridos pelas Centrais de Abastecimento do Distrito Federal S.A. – CEASA-DF”, possibilita aos atuais ocupantes a obtenção do Termo de Permissão Remunerada de Uso – TPRU, independente de licitação. Confira-se o teor da norma:

Art. 31. Fica assegurada a emissão de TPRU e o enquadramento nas disposi- ções desta Lei aos atuais ocupantes que comprovem:

I – atuação com habitualidade no mercado da CEASA-DF;

II – regularidade fiscal com o Distrito Federal, com a Seguridade Social e com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço;

III – inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho; IV – inexistência de débito junto à CEASA-DF.

1 “Lei Orgânica do Distrito Federal:

Art. 19. A administração pública direta, indireta, fundacional, de qualquer dos Poderes do Distrito Federal, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e razoabilidade, motiva- ção e interesse público, e também ao seguinte:

[...]

Art. 26. Observada a legislação federal, as obras, compras, alienações e serviços da administração serão contratados mediante processo de licitação pública, nos termos da lei.

[...]

Art. 48. O uso de bens do Distrito Federal por terceiros poderá ser feito mediante concessão administra- tivo de uso, permissão ou autorização, conforme o caso e o interesse público, na forma da lei. Art. 49. A aquisição por compra ou permuta, bem como a alienação dos bens imóveis do Distrito Federal dependerão de prévia avaliação e autorização da Câmara Legislativa, subordinada à comprovação da existência de interesse público e à legislação pertinente à licitação.

[...]

Art. 51. Os bens do Distrito Federal destinar-se-ão prioritariamente ao uso público, respeitadas as normas de proteção ao meio ambiente, ao patrimônio histórico, cultural, arquitetônico e paisagístico, e garantido o interesso social.

[...]

§ 3º O Distrito Federal utilizará seus bens dominiais como instrumento para realização das políticas de ocupação ordenada do território.”

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§ 1º O ocupante de que trata este artigo deve requerer a regularização da sua atividade no prazo de sessenta dias, contados da data de publicação desta Lei.

§ 2º Ocorrendo a necessidade de diligências, a CEASA-DF deve abrir prazo de sessenta dias para serem cumpridas pelo requerente de que trata o § 1º. §3º O ocupante que não se enquadrar nas disposições desta Lei perde o di- reito ao espaço ocupado ao término da vigência do TPRU de que é portador.

Tenho que a declaração da inconstitucionalidade do dispositivo legal atacado é medida que se impõe.

Como se vê, o mencionado dispositivo legal não cuidou da necessidade de licita- ção para a obtenção do TPRU, bastando para aqueles que já exercem atividades na CEASA a inexistência de débitos, bem como a regularidade fiscal com o GDF, a Seguridade Social e o FGTS. Vale dizer, a norma verdadeiramente criou hipótese de dispensa de licitação.

A realização de procedimento licitatório prévio é regra constitucional. De acordo com o art. 175 da Magna Carta de 1988, incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de

licitação, a prestação de serviços públicos.

Ademais, nos termos do art. 22, inciso XXVII, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação, aplicáveis às ad- ministrações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municí- pios. Tal disciplinamento se deu por meio da edição da Lei 8.666/93, diploma que preconiza a necessidade de licitação para as obras, serviços, compras, alienações, concessões e permissões da Administração Pública.

Em sendo assim, os casos de dispensa e inexigibilidade de licitação constituem exceção, e cujas hipóteses estão elencadas nos arts. 24 e 25 da Lei 8.666/93. Con- quanto o rol de inexigibilidade seja apenas exemplificativo, forçoso convir que a organização e o funcionamento dos mercados de hortifrutigranjeiros geridos pela CEASA/DF não lhe estão abrangidos, uma vez que só é inexigível a licitação cuja competição se torna inviável.

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Acerca da permissão, hipótese específica dos autos, a Professora Maria Sylvia Za- nella Di Pietro2 ensina:

A permissão de serviço público é, tradicionalmente

,

considerada ato unila- teral, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público transfere a outrem a execução de um serviço público, para que o exerça em seu próprio nome e por sua conta e risco, mediante tarifa paga pelo usuário.

Com efeito, a permissão de uso de área pública se constitui em ato administrativo unilateral, discricionário e precário, que pode ser revogado a qualquer tempo con- soante a conveniência e oportunidade do Poder Público. O caráter de precarieda- de não afasta, todavia, a necessidade de procedimento licitatório. Nesse sentido, pontifica Di Pietro:

Note-se que a mesma ressalva não se contém no artigo 175 que, ao facultar a execução de serviço público por concessão ou permissão, exige que ela se faça “sempre através de licitação”. Desse modo, apenas em situações de inviabilidade de competição poderá deixar de ser realizada licitação.[ob. cit. p. 361]

Há que se ressaltar ainda que a norma impugnada não só violou o princípio cons- titucional da imprescindibilidade de licitação, como também outros que lhes são consectários lógicos. Ora, ao autorizar a permanência dos atuais ocupantes do mercado CEASA, dispensando-se o processo licitatório, foram violados os princí- pios constitucionais da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da razoabi- lidade, da motivação e do interesse público, infringindo frontalmente o art. 19 da Lei Orgânica.

Como bem salientaram os doutos representantes do Ministério Público, em pare- cer acostado 181/189, a emissão do Termo de Permissão Remunerada de Uso – TPRU para os atuais permissionários, garantindo-lhes a permanência por 15 anos, fere de morte tais princípios constitucionais, como se depreende do excerto que se segue:

Isso porque a licitação funciona como mecanismo garantidor da observân- cia desses princípios constitucionais. Cabe privativamente à União legislar

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sobrenormas gerais de licitação, aplicáveis às administrações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Assim, ao promulgar leis que dispensam de licitação para a prorrogação de permissões de uso de áreas públicas, o Distrito Federal atingiu frontalmente o princípio constitucionalda licitação e os dispositivos que lhe vedam criar preferências entre brasileiros e instituir tratamento discriminatório (CF, art. 19, inc. III e art. 5º, caput).

Em mais de uma oportunidade, este e. Conselho apreciou matéria semelhante quando tratou da dispensa de licitação para os já ocupantes de espaços públicos em trailers e quiosques. Nas ocasiões, ficou assentado que tal permanência enseja vício de inconstitucionalidade material. Confira-se:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL 4.257, DE 2.12.2008. ART. 28 E PARÁGRAFO ÚNICO. OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS. QUIOSQUES E TRAILERS. DISPENSA DE LICITAÇÃO AOS QUE JÁ OCUPAVAM E FORAM REMOVIDOS. VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. PROCE- DÊNCIA. RELEVANTE INTERESSE SOCIAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. 1. O pa- rágrafo único do artigo 28 da Lei Distrital 4.257, de 2 de dezembro de 2008, viola a Lei Orgânica do Distrito Federal e os princípios constitucionais da le- galidade, da isonomia, da impessoalidade, da moralidade, da razoabilidade, da motivação e do interesse público. 2. O dispositivo apontado ao assegurar, sem licitação, aos antigos ocupantes de espaços públicos que já exerciam as atividades e foram removidos, o direito a novas áreas em condições se- melhantes àquelas objeto da remoção encerra vício de inconstitucionalidade material. 3. Deve ser considerado o relevante interesse social que a questão encerra, uma vez que o dispositivo legal em comento assegura àqueles que já ocupam as áreas por longos anos, a permanecer no exercício da atividade

econômica da qual retiram o seu lucro e, quiçá, sua própria subsistência. 4. Hipótese que enseja a aplicação da técnica da modulação dos efeitos da de- claração de inconstitucionalidade, a fim de preservar situações consolida- das, sob pena de violação ao princípio da dignidade da pessoa humana e em homenagem ao postulado da segurança jurídica. 5. Ação direta de inconsti- tucionalidade com pedido julgado procedente, com modulação dos efeitos, em relação ao art. 28 e seu parágrafo único da Lei 4.257/2008, com eficácia

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erga omnes e efeitos ex nunc. (Acórdão 427293, 20090020119018ADI, Re-

lator Des. Mário-Zam Belmiro, Conselho Especial, julgado em 13/04/2010, DJ 16/06/2010 p. 63). Destaquei.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MÉRITO. LEI DISTRITAL 901 E SUAS ALTERAÇÕES. LEI DISTRITAL 3.313/04. LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL. INFRINGÊNCIA AOS ARTIGOS 19, Caput, 26, 49, 51, Caput e § 3º. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INFRINGÊNCIA AOS ARTIGOS 5º, Caput, 19, ITEM III E 37, ITEM XXI. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DECLARADA. EFEITOS EX TUNC E Erga omnes. LIMINAR CONFIRMADA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. As Leis Distritais s 901/95, 1.361/96, 1.365/97, 1.793/97, 1.830/98 e 3.313/04, elaboradas por iniciativa de Deputados Distritais, estabelecendo regras para ocupação de áreas públicas por traillers, quiosques e similares, permitindo novas autorizações mediante processo seletivo simplificado, não observa- ram os princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade, da mo- ralidade, da razoabilidade, da motivação e do interesse público, infringindo frontalmente a exigibilidade de licitação para alienação de bens públicos e os dispositivos constitucionais que proíbem tratamento discriminatório entre cidadãos. (Acórdão 243046, 20040020074626ADI, Relator Lécio Resende, Conselho Especial, julgado em 28/03/2006, DJ 16/05/2006 p. 71)

Nada obstante, entendo que é o caso de se aplicar a técnica da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, tal como requerido pelo Procu- rador-Geral do Distrito Federal às fls. 175/179. Além das inúmeras situações de produtores de hortifrutigranjeiros já consolidadas no tempo, há também que se considerar eventual descontinuidade na prestação do serviço de abastecimento no Distrito Federal e entorno, como bem ponderado pela CEASA/DF (fls. 259/279). Nesse sentido, dispõe o art. 27 da Lei 9.868/99:

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, tendo em vistas razões de segurança jurídica oude excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só te- nha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou deoutro momento que venha a ser fixado.

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Este e. Conselho Especial vem aplicando a técnica da modulação de efeitos em hi- póteses semelhantes, como no caso da ação direta em que se apreciou a questão das permissões de uso de espaços públicos em feiras livres e permanentes por particulares, sem licitação, cujo acórdão restou assim ementado:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL 4.478 de 02/02/2012. DESTINAÇÃO DE ÁREAS PÚBLICAS DO DISTRITO FEDERAL, EM FEIRAS, SEM PRÉVIA LICITAÇAO. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL FRENTE À LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL. DECLARAÇÃO PARCIAL DE INCONSTITUCIONALIDADE COM REDUÇÃO DE TEXTO. 1. A dis- pensa de licitação está definida no art. 24 da Lei 8.666/1993, sendo defe- so ampliar as hipóteses ali prescritas. 2. Procedente, em parte, a alegação de inconstitucionalidade material a contaminar dispositivos da Lei Distrital 4.748 de 2/2/2012, porque não compete ao Distrito Federal dispensar li- citação para transferência das permissões de uso de espaços públicos para herdeiros ou prepostos, nos casos de aposentadoria ou de desaparecimen-

to, invalidez ou outro fato que impossibilite o titular de exercer a ativida- de específica, a autorizar a permanência dos atuais ocupantes por quinze

anos, a exemplo que fez ao editar tal Lei. 3. Hipótese de modulação dos

efeitos dessa decisão, no tocante àqueles que ocupavam áreas por longos anos, por relevante interesse social e razões de segurança jurídica, per- mitindo-se que a mesma tenha efeitos ex nunc. 04. Declarada, com efeitos ex nunc e eficácia erga omnes, a inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, dos artigos 9º e 10º, excluindo-se as expressões “aposentadoria” e “desaparecimento, invalidez permanente ou qualquer outro fato que im- possibilite o titular da permissão de exercer a atividade”, respectivamente, e integralmente quanto aos artigos 11, 22 e 34 da Lei Distrital 4.748 de 02/02/2012. 5. Julgada parcialmente procedente, por maioria.

(

Acórdão n.648455, 20120020045043ADI, Relator Des. Mario Machado

,

Relator De- signado: Romeu Gonzaga Neiva, Conselho Especial, Data de Julgamento: 16/10/2012, Publicado no DJE: 31/01/2013. Pág.: 38). Destaquei.

Com efeito, a modulação visa fixar limites à retroação, normalmente ex tunc da declaração de inconstitucionalidade, tendo em vista aspectos de segurança jurí- dica e excepcional interesse social. Embora incompatíveis com a Lei Orgânica, tais

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normas geram expectativa de direito, porquanto gozam de presunção de constitu- cionalidade, até declaração em sentido contrário.

Posto isso, julgo procedente o pedido formulado na exordial para declarar a in- constitucionalidade do art. 31 da Lei Distrital 4.900, de 16 de agosto de 2012, com eficácia erga omnes e efeitos ex nunc.

É como voto.

Des. Lecir Manoel da Luz (Vogal)

Conforme relatado pelo eminente Desembar- gador Romeu Gonzaga Neiva, cuida-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios contra o artigo 31, da Lei distrital 4.900, de 16 de agosto de 2012, que dispõe “sobre a organização e o funcionamento dos mercados de hortifrutigranjeiros geridos pela Centrais de Abastecimento do Distrito Federal S.A. – CEASA-DF”, em face dos ar- tigos 19,

caput,

26, 48, 49 e 51, § 3º, todos da Lei Orgânica do Distrito Federal. Sustenta, inicialmente, que o dispositivo impugnado prorroga automaticamente por 15 (quinze) anos, e sem licitação, a utilização, pelos atuais ocupantes, de es- paços públicos do Distrito Federal para o exercício de atividade econômica, o que o torna materialmente inconstitucional por afrontar dispositivos da Lei Orgânica do Distrito Federal.

Distribuídos os autos ao eminente Relator, determinou-se a requisição de informa- ções às autoridades competentes.

A Mesa Diretora da Câmara Legislativa do Distrito Federal presta informações às fls. 22-28, nas quais sustenta que a norma inserida no artigo 31, da Lei distrital 4.900/2012, busca apenas a regularização da ocupação dos espaços públicos na CEASA-DF, por intermédio de uma transição entre a situação de fato instaurada e o novo regramento insculpido na referida norma, com o estabelecimento de um Termo de Permissão Remunerada de Uso – TPRU.

O Governador do Distrito Federal presta informações às fls. 54-73, arguindo, pre- liminarmente, a inadequação da via eleita, sob o argumento de não ser possível o controle concentrado de constitucionalidade pela via oblíqua, reflexa e indireta, visto que, se assim fosse feito, à exceção dos artigos 19 e 51, § 3º, os demais dispositivos da Lei Orgânica do Distrito Federal apontados na inicial deveriam ser

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analisados, primeiramente, à luz da Lei Federal 8.666/93, que dispõe sobre licita- ções e contratos. No mérito, afirmou a ausência de inconstitucionalidade do artigo impugnado, ao argumento, em síntese, de que apenas se permitiu a preservação de serviços ou atividades essenciais. Requer, caso seja considerado inconstitucio- nal o dispositivo em questão, sejam modulados os efeitos da declaração.

O Procurador-Geral do Distrito Federal manifestou-se, às fls. 165-179, pela im- procedência do pedido deduzido na petição inicial da presente ação direta de inconstitucionalidade.

Também o ilustre Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, ofi- ciando na condição de custos legis, ofertou Parecer às fls. 181-189, pronunciando- -se pelo conhecimento da ação direta e pela procedência do pedido.

Intervindo na qualidade de amicus curiae, Centrais de Abastecimento do Distrito Federal – CEASA/DF e Associação dos Empresários da CEASA/DF manifestaram-se nos autos.

É o breve Relatório.

preliminar de inadequação da via eleita

Analiso, prima facie, a preliminar de inadequação da via eleita, arguida pelo Go- vernador do Distrito Federal, por intermédio da qual suscita a impossibilidade de se fazer o controle concentrado de constitucionalidade pela via oblíqua, reflexa e indireta, visto que, se assim fosse feito, à exceção dos artigos 19 e 51, § 3º, os demais dispositivos da Lei Orgânica do Distrito Federal apontados na inicial de- veriam ser analisados, primeiramente, à luz da Lei Federal 8.666/93, que dispõe sobre licitações e contratos.

A meu ver, tal preliminar merece ser rejeitada, posto que o dispositivo impugnado deve ser compatível com a Lei Orgânica Distrital. Embora o ato normativo trate de matéria referente à utilização de espaços públicos para o desenvolvimento de atividade econômica sem o prévio procedimento licitatório, o que afrontaria a Lei Federal 8.666/93, e não seria passível de controle em ação direta de inconstitu- cionalidade, no presente caso, em verdade, há dispositivos da Lei Orgânica do Dis-

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trito Federal que estabelecem prescrições normativas que servem de paradigma para o exercício do controle concentrado de constitucionalidade.

Entendo que o fundamento de validade direto e imediato do dispositivo impug- nado não é a Lei 8.666/93, mas sim a LODF, que traz limites e diretrizes a serem observados na atividade legiferante.

Daí a possibilidade de ser impugnado por meio de ação direta de inconstitucio- nalidade.

Rejeito, pois, a preliminar.

mérito

As leis e os atos normativos federais ou estaduais podem ser objeto do controle abstrato de normas, conforme estipula a alínea “a”, do item I, do artigo 102 da Car- ta Magna, assim como resta caracterizada a possibilidade do controle da constitu- cionalidade de leis estaduais ou municipais, tendo como parâmetro a Lei Orgânica do Distrito Federal, por equivaler esta a um verdadeiro estatuto constitucional, es- sencialmente equiparável às constituições promulgadas pelos Estados-membros. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios é competente para julgar as demandas que versem sobre violação por lei local, da Lei Orgânica do Distrito Federal. Assim, deve ser admitido o controle abstrato pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

Pleiteia o Requerente a declaração de inconstitucionalidade do artigo 31, da Lei dis- trital 4.900, de 16 de agosto de 2012, que está redigido nos seguintes termos, verbis:

Lei 4.900, de 16 de agosto de 2012 (Autoria do Projeto: Poder Executivo)

Dispõe sobre a organização e o funcionamento dos mercados de hortifruti- granjeiros geridos pelas Centrais de Abastecimento do Distrito Federal S.A. – CEASA-DF.

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Faço saber que a Câmara Legislativa do Distrito Federal decreta e eu san- ciono a seguinte Lei:

[...]

Art. 31. Fica assegurada a emissão de TPRU e o enquadramento nas disposi- ções desta Lei aos atuais ocupantes que comprovem:

I – atuação com habitualidade no mercado da CEASA-DF;

II – regularidade fiscal com o Distrito Federal, com a Seguridade Social e com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço;

III – inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho; IV – inexistência de débito junto à CEASA-DF.

§ 1º O ocupante de que trata este artigo deve requerer a regularização da sua atividade no prazo de sessenta dias, contados da data de publicação desta Lei.

§ 2º Ocorrendo a necessidade de diligências, a CEASA-DF deve abrir prazo de sessenta dias para serem cumpridas pelo requerente de que trata o § 1º. § 3º O ocupante que não se enquadra nas disposições desta Lei perde o di- reito ao espaço ocupado ao término da vigência do TPRU de que é portador.

Argumentou-se que o mencionado dispositivo legal estaria a afrontar os seguintes dispositivos da Lei Orgânica do Distrito Federal, verbis:

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