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O órgão de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) e sua adequação para a resolução de conflitos ambientais

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

PAULO AUGUSTO CARLOS MONTEIRO FILHO

O ÓRGÃO DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO (OMC) E SUA ADEQUAÇÃO PARA A RESOLUÇÃO DE

CONFLITOS AMBIENTAIS

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PAULO AUGUSTO CARLOS MONTEIRO FILHO

O ÓRGÃO DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO (OMC) E SUA ADEQUAÇÃO PARA A RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

AMBIENTAIS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina MONOGRAFIA JURÍDICA do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de BACHAREL EM DIREITO.

Orientador: Profa. Tarin Cristino Frota Mont’Alverne

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

M772o Monteiro Filho, Paulo Augusto Carlos.

O órgão de solução de controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) e sua adequação para a resolução de conflitos ambientais / Paulo Augusto Carlos Monteiro Filho. – 2015.

67 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito Internacional.

Orientação: Profa. Dra. Tarin Cristino Frota Mont’Alverne.

1. Organização Mundial do Comércio. 2. Comércio internacional. 3. Direito ambiental internacional.

I. Mont’Alverne, Tarin Cristino Frota (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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PAULO AUGUSTO CARLOS MONTEIRO FILHO

O ÓRGÃO DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO (OMC) E SUA ADEQUAÇÃO PARA A RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

AMBIENTAIS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina MONOGRAFIA JURÍDICA do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de BACHAREL EM DIREITO.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Tarin Cristino Frota Mont’Alverne (Orientadora) Professora da Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Theresa Rachel Couto Correia

Professora da Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Felipe Felix e Silva

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente gostaria de agradecer aos meus pais, Cláudia Estevam Carlos Monteiro e Paulo Augusto Carlos Monteiro, por todo o amor, cuidado e dedicação, bem como por todos os ensinamentos e valores que carrego comigo e tentarei sempre transmitir.

Às minhas irmãs, Clarissa Estevam Carlos Monteiro e Vanessa Estevam Carlos Monteiro, por quem tenho um carinho verdadeiro. Contar com vocês é sempre muito bom. Apesar de todas as brigas, apesar de todos os erros, tenho certeza que fariam muita coisa por mim e que me apoiarão não importa a situação.

À Profa. Tarin Cristino Frota Mont’Alverne, pela excelente orientação no presente trabalho e por ter me acompanhado de perto em tantos momentos da minha vida acadêmica.

Aos professores participantes da banca examinadora Theresa Rachel Couto Correia e Felipe Felix e Silva pelo tempo e pelas valiosas colaborações.

Aos meus eternos amigos do ‘MeSEG’: Victor Almeida, Rayssa Viana, Luis Carlos Queiroz, Edson Pereira Cutrim, Vinicios Cavalcante, Walessa Miranda, Ludmila Ipiranga, Thiago Parente e Matheus Pereira. Muito obrigado por todo o respeito, por todo o apoio incondicional e, acima de tudo, por terem permitido que nossa amizade se concretizasse e se transformasse no que é hoje. Durante os últimos 5 anos tivemos desentendimentos, compartilhamos derrotas e frustrações, mas também celebramos conquistas e aproveitamos intensamente cada minuto que estávamos juntos, fosse na faculdade ou em uma de nossas viagens. Sentirei eterna nostalgia de todos esses momentos, mas tenho a certeza de que outros ainda estão por vir, pois somos mais do que meros colegas de curso, somos uma irmandade.

Às lindas e puritanas Nayara Alves, Nara Gomes, Letícia Pequeno e Vanessa Almeida, por tornarem meus dias mais divertidos e pelo apoio incondicional.

Aos meus amigos Felipe Soares, Tyna Scortegagna, Bruno Moura, Leandro Targino e Isabella Collman, pelos momentos de alegria, pelo suporte e pela paciência ao longo dessa trajetória.

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Aos meus colegas do Grupo de Estudos em Direito e Assuntos Internacionais (GEDAI), grupo de extensão da Faculdade de Direito do qual tenho a imensa honra de participar e por ser o principal responsável por grande parte do meu conhecimento em pesquisa e estudo do direito internacional.

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“Happiness is only real when shared.”

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo central analisar questões relacionadas ao comércio internacional e meio ambiente, e de que forma a Organização Mundial do Comércio, através do seu o Sistema de Solução de Controvérsias, pode ser considerado um locus adequado para a resolução de conflitos ambientais. Deste modo, examina-se sinteticamente o fenômeno da fragmentação do direito internacional para então investigar de que modo se deu a regulamentação do comércio internacional e do meio ambiente. Em seguida, busca evidenciar a proteção do meio ambiente dentro do ordenamento interno da OMC, centrando-se no art. XX do GATT e suas exceções das alíneas b) e g). Por fim, faz-se um estudo do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC e de dois importantes casos à ele submetidos, envolvendo a temática do comércio e do meio ambiente, ressaltando, principalmente, a sua adequação para os conflitos ambientais no que tange ao tratamento equilibrado entre a perspectiva do livre comércio e da proteção ambiental.

(10)

ABSTRACT

The present study intends to analyze issues related to international trade and the environment, specially how the World Trade Organization (WTO), through its the Dispute Settlement Body (DSB), can be considered an appropriate locus to deal with environmental conflicts. Thus, it examines, briefly, the international law fragmentation and how the regulation of international trade and environment occurred. Then seeks to demonstrate the environment protection within the WTO’s rules, focusing on article XX of the GATT and its exceptions in subparagraphs b) and g). Finally, it studies WTO’s Dispute Settlement Body and two important cases submitted to it, involving the issue of trade and environment, emphasizing mainly its suitability for the environmental conflicts, whether it is an appropriate mean for the real protection of nature regarding the balanced treatment of free trade.

(11)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AMA

BIRD

CCMA

CDI

CIJ

ESC

FMI

GATS

TBT

TRIPS

Acordo sobre Meio Ambiente

Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

Comitê sobre Comércio e Meio Ambiente

Comissão de Direito Internacional

Corte Internacional de Justiça

Entendimento sobre Solução de Controvérsias

Fundo Monetário Internacional

Acordo Geral de Tarifas e Serviços

Acordo de Barreiras Técnicas

Acordo de Propriedade Intelectual

GATT

OAp

OCDE

Acordo Geral sobre Tarifa e Comércio

Órgão de Apelação

Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

OIC

OMC

ONU

Organização Internacional do Comércio

Organização Mundial do Comércio

(12)

OSC

PNUD

PNUMA

SPS

UNCTAD

UNCLOS

Órgão de Solução de Controvérsias

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias

Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento

Convenção das Nações Unidas Sobre o Direito do Mar

(13)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13 2 COMÉRCIO E O DIREITO INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE:

FRAGMENTAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL?...

17 2.1

2.2

A fragmentação do Direito Internacional... O fenômeno do multilateralismo comercial e a Organização Mundial do Comércio ...

17

20 2.3 O direito internacional do meio ambiente e o direito do

desenvolvimento... 24 3 3.1 3.2 3.3 4 4.1 4.2 4.3 4.4 5

(14)

1 INTRODUÇÃO

O fenômeno da globalização e as recentes inovações tecnológicas têm transformado o mundo em que vivemos e gerado efeitos que podem ser sentidos em todas as partes do mundo ao possibilitar o surgimento de várias e divergentes formas de reações sobre os fenômenos globais, desde o plano político, até o econômico, o social e o cultural.1

No início da expansão e do desenvolvimento das práticas comerciais na Europa, entre o século XV e o XVIII, período da história denominado de mercantilismo comercial, o comércio internacional tinha pouca ou quase nenhuma normatização comum. Com foco nas negociações bilaterais, prevalecia o que era pactuado entre as partes negociadoras, conforme suas necessidades e oportunidades.2

Com o passar dos anos e fruto do fenômeno da globalização, o comércio abandonou a antiga visão de que seria apenas um instrumento para proporcionar a opulência e o crescimento econômico do Estado, mediante a concentração de riquezas, e concentrou-se nas negociações plurais e na defesa do liberalismo econômico.3

Dessa nova forma de comércio, surge no mundo um novo conceito de desenvolvimento, conceito este que engloba não só o crescimento econômico, mas uma maior distribuição de riquezas e a promoção do denominado desenvolvimento sustentável, síntese das exigências de crescimento econômico, justiça social e preservação do meio ambiente4.

Assim como acontece no âmbito comercial, o processo de globalização também reduziu os limites fronteiriços das questões ambientais e tornou evidente a necessidade de uma maior cooperação internacional para a preservação do meio ambiente e dos danos a ele ocasionados.

1 GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. 3 ed. Rio

de Janeiro, Record, 2003

2 Keohane & Nye [1977], p. 7 em CASTRO, M. F. de, 2001.De westphalia a seattle: a teoria das

relações internacionais em transição. Caderno do REL nº20. Brasília, 2011. p 24

3 PECEQUILO, Cristina Soreanu. A Política externa do Brasil no século XXI: Os Eixos Combinados

de Cooperação Horizontal e Vertical, Ver. Bras. Polít. Int. 51 (2): 136-153, 2008, págs. 137-139.

4 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Comércio Internacional e a Proteção do Meio Ambiente. Revista

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Atualmente, os danos ambientais provocados em um Estado acabam refletindo de forma direta, ou indiretamente, nos seus Estados vizinhos próximos (vazamentos em usinas, poluição nos rios, acidentes nucleares, etc), ou mais distantes, como nos casos de danos causados por empresas multinacionais em território estrangeiro e das mudanças climáticas ocasionadas pela concentração excessiva de gases que geram o efeito estufa e ocasionam o fenômeno denominado aquecimento global.

O direito é um importante instrumento para garantir uma adequada proteção da natureza e diminuir o risco inerente a diversas atividades degradantes do meio ambiente. Em casos como os mencionados acima, muitas vezes, os ordenamentos jurídicos internos acabam não tendo mecanismos para investigar, identificar e punir todos os responsáveis pelo dano ambiental ocasionado e, consequentemente, não reparam moral e materialmente as partes lesadas. Sendo assim, na medida em que cresce a ideia do caráter internacional dos danos ambientais e de um meio ambiente comum à humanidade, aumenta a necessidade de ações integradas e multilaterais de proteção.

O tratamento multilateral do meio ambiente teve seu apogeu no século 70, com a celebração de tratados responsáveis por regularem os efeitos transnacionais da degradação ambiental.5 No âmbito do comércio, o tema adquiriu relevante importância nas diversas negociações multilaterais devido principalmente ao disfarce protecionista que muitas medidas ambientais passaram a adquirir, sendo necessário, portanto, uma reanálise da temática através de uma ponderação mais eficiente entre proteção ambiental e o livre comércio, bem como a criação de Acordos sobre Meio Ambiente (AMAs) e mecanismos de solução de controvérsias para lidar com os entraves econômicos resultados, dentre outros fatores, das medidas ambientais.

Existem hoje, em âmbito multilateral, diversos órgãos de solução de conflitos, tanto no âmbito dos instrumentos privados, a exemplo da arbitragem, como no dos instrumentos públicos, em que a Corte Internacional de Justiça (CIJ) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) adquirem protagonismo.

5 OLIVEIRA, Carina Costa de. Solução de Conflitos Ambientais no Direito Internacional. Editora

(16)

O Acordo Geral sobre tarifas aduaneiras e comércio (General Agreement on Tariffs and Trade - GATT) de 19476, antecessor da OMC, já previa em

seu artigo XX a possibilidade de adoção, pelos Estados, de medidas necessárias à proteção da saúde, da vida das pessoas, dos animais e dos vegetais.

Em novembro de 1991, o GATT estabeleceu também um Grupo de Trabalho sobre o meio ambiente e o comércio internacional, substituído em 1994 por um Comitê de comércio e meio ambiente por influência da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, realizada no Rio de Janeiro em 1992: a Rio-92 ou Eco-92.7

Em 15 de novembro de 1995, no âmbito da Rodada Uruguai, com a assinatura da Ata de Marraquech, criou-se a OMC e adveio, para o âmbito comercial, a ideia de uma utilização sustentável dos recursos mundiais para a proteção do meio ambiente. A partir de então, os Membros da OMC reconhecem o princípio do desenvolvimento sustentável e tentam seguir os ditames da agenda das Nações Unidas

Havendo órgãos, no plano internacional, responsáveis diretamente pela função de proteção ambiental, as regras da OMC devem ater-se aos aspectos comerciais e aos problemas que surjam quando as políticas de meio ambiente gerem consequências diretas ou indiretas para o livre comércio.

Não existe, no âmbito da OMC, nenhum acordo específico que trate do tema meio ambiente, mas podemos observar disposições relativas a preocupações ambientais em alguns de seus vários acordos, tais como o preâmbulo do próprio Ato Constitutivo, o artigo XX do Acordo Geral sobre as Tarifas e Comércio (GATT), bem como outros dispositivos especiais, a exemplo do Acordo Geral de Serviços (GATS), do Acordo de Propriedade Intelectual (TRIPS), Acordo de Barreiras Técnicas (TBT) e de Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias ( SPS).

Responsável pela articulação de tais dispositivos com o direito internacional vigente e apresentando um mecanismo compulsório de cumprimento de suas decisões, o Órgão de Solução de Controvérsias da OMC tem sido bastante

6 World Trade Organization. The General Agreement on Tariffs and trade. Disponível

em<http://www.wto.org/english/docs_e/legal_e/gatt47_e.pdf>. Acesso em 21.11.2014.

7 PIFFER, Carla. Comércio Internacional e Meio Ambiente: A organização mundial do comércio

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utilizado por toda a comunidade internacional para a resolução de conflitos envolvendo questões comerciais e ambientais.

Dessa forma, no primeiro capítulo, analisaremos o fenômeno da fragmentação do direito internacional, que se resume no aparecimento de normas e instituições jurídicas especializadas e relativamente autônomas que acabam gerando conflitos entre normas ou subsistemas de normas, dentre eles o comércio internacional e o meio ambiente, ambos abordados no capítulo.

Em um segundo momento, abordaremos a ligação existente entre comércio e meio ambiente no âmbito da Organização Mundial do Comércio, fazendo uma análise do artigo XX do GATT e suas duas exceções, bem como explicando a criação e a sistemática do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC.

Por fim, no terceiro e último capítulo, abordaremos alguns casos levados ao Órgão de Solução de Controvérsias, dentre eles o caso Estados Unidos - Gasolina, opondo de um lado os Estados Unidos e de outro, o Brasil e a Venezuela, e o caso Estados Unidos – Camarões, onde os Estados Unidos enfrentavam a Índia, o Paquistão, a Tailândia e a Malásia. Concluiremos o capítulo fazendo uma análise do modo pelo qual o OSC tem implementado suas decisões e de que forma tem tratado os conflitos ambientais a fim de se chegar a uma conclusão da sua importância como meio adequado para a verdadeira proteção da natureza e manutenção do livre comércio global.

(18)

2 COMÉRCIO E O DIREITO INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE: FRAGMENTAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL?

A Teoria do Direito Internacional vem sofrendo uma grande transformação em consequência da intensificação do fenômeno da globalização e da forma como os novos atores criam, implementam e controlam as normas internacionais.8 No âmbito processual, dissemina-se a noção de caráter transnacional do processo e sua consequente redução na distinção até então existente entre norma nacional e internacional, tanto na esfera pública quanto na privada.

No entanto, apesar dessa rápida evolução do direito internacional, seus subsistemas, dentre eles o direito internacional econômico, direito internacional dos direitos humanos, direito internacional humanitário e o direito internacional do meio ambiente, não evoluíram com a mesma velocidade e intensidade. Na medida em que cresce o número de normas e tratados regulamentando diferentes temáticas, que muitas vezes são conflitantes entre si, o Direito Internacional vai se tornando um sistema jurídico complexo, fragmentado e carecedor de adequações.

2.1 A Fragmentação do Direito Internacional

O fim da Segunda Guerra Mundial marcou o início de uma nova etapa na evolução do Direito Internacional. Em 24 de outubro de 1945, pela primeira vez, surge uma organização internacional com amplo respaldo estatal para a manutenção da paz e da segurança mundial9. Neste contexto, tem gênese a Organização das Nações Unidas (ONU), instituição que apresenta uma ampla agenda política de cooperação, e não mais apenas de coordenação, entre Estados e outros sujeitos de Direito Internacional.10

O período iniciado com a criação da ONU trouxe importantes implicações quanto ao entendimento da natureza jurídica do Direito Internacional, que deixou de

8 VARELLA, Marcelo Dias. Central aspects of the debate on the complexity of international law.

Emory International Law Review, v. 27, 2013, p.2.

9 Art. 1:1. Carta das Nações Unidas. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/19

30-1949/d19841.htm>. Acesso em 29 de abril de 2015.

10 XAVIER, Ana Isabel. ONU: A Organização das Nações Unidas. Humana Global, abril de 2007.

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ser um mero instrumento para a defesa de interesse dos Estados para incorporar projetos de transformação da comunidade internacional e contemplar objetivos tão complexos quanto a manutenção da ordem no cenário internacional.11

O fim da Guerra Fria e o processo de globalização também acrescentaram importantes ingredientes para o presente debate acerca da caracterização jurídica do Direito Internacional, eis que o mundo passou a experimentar um intrigante processo de crescimento econômico alavancado pela interdependência econômica entre Estados e instituições internacionais.

A concepção clássica de Direito Internacional, que até então era tradicionalmente concebido como um todo homogêneo, coerente e unificado, passou a ser desafiada e relativizada pelo crescimento e aumento dos fenômenos transfronteiriços e das negociações multilaterais. A tarefa de adjudicar, interpretar e de produzir normas aptas a tutelar relações internacionais não mais repousa, de forma exclusiva, nas mãos dos Estados nacionais.12

Com tudo isso, surge no direito internacional o fenômeno da diferenciação funcional ou fragmentação, que se resume no aparecimento de normas e instituições jurídicas especializadas e relativamente autônomas. No entanto, crê-se que a produção dessas normativas e instituições tende a ocorrer de forma não paralela aos conhecimentos e práticas gerais do direito internacional, gerando conflitos entre normas ou sistemas de normas, bem como a perda de uma perspectiva geral do direito, resultando também, indubitavelmente, em uma diminuição da almejada segurança jurídica.13

Fatores que, de alguma forma, contribuíram para essa fragmentação e consequente expansão do direito internacional foram a criação de verdadeiros subsistemas de direitos, a multiplicação dos órgãos de solução de conflitos internacionais e a crescente utilização das normas denominadas de soft law, vejamos:

11 AFONSO, Henrique Weil. Unidade e fragmentação do Direito Internacional: O papel dos direitos

humanos como elemento unificador, p. 07. Disponível em: <http://www.cedin.com.br/static/revistaeletr onica/volume4/arquivos_pdf/sumario/art_v4_III.pdf>. Acesso em 13 de março de 2015.

12 Idem, p. 07.

13 LAMBA, Aline. Fragmentação do Direito Internacional? Uma leitura sobre o Relatório da

Comissão de Direito Internacional da ONU. Disponível em:

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Toma-se como pressuposto que a fragmentação do campo jurídico internacional é determinada, portanto, por três principais fontes: a constituição e fortalecimento de vários regimes jurídicos internacionais autônomos (self-contained regimes), a multiplicação de órgãos de solução de conflitos internacionais (tribunais e órgãos quase judiciais) e a emergência e difusão de uma nova configuração normativa denominada soft law – caracterizada por ser um direito flexível e programático, ou seja, fundamentado apenas em diretivas, e não em normas imperativas como no caso do jus cogen.14

Pensando em tudo isso, a Comissão de Direito Internacional (CDI) das Nações Unidas, em 2000, estabeleceu um grupo de trabalho para analisar o fenômeno da fragmentação do direito internacional, eis que sua principal preocupação era a de que a incorporação de uma multiplicidade de subsistemas tornaria o direito internacional contraditório e incoerente, com a possibilidade de um mesmo fato jurídico internacional vir a ser submetido a dois ou mais regimes regulatórios diversos, representando risco ou ameaça à unidade do direito internacional.

Acontece que, dois anos depois, ao verificar a dimensão e a complexidade do tema, o grupo de estudos decidiu ampliar a pesquisa e constituiu uma subcomissão para relatar as dificuldades decorrentes da diversificação e expansão do direito internacional.

Em abril de 2006, o relatório de conclusão da subcomissão fora publicado e apresentou posições menos pessimistas do que o esperado no início, tendo como principal conclusão a de que o Direito Internacional constitui um sistema legal, com regras e princípios em constante relação e não sendo, portanto, um conjunto aleatório de normas.15

O Relatório apresenta também a existência de uma harmonização e colaboração jurídica em um cenário internacional mais amplo, qual seja, o de negociações multilaterais, eis que neste cenário pressupõe-se sempre uma interdependência complexa entre seus atores, de caráter e natureza diferenciados, e com relações econômicas e sociais diferenciadas.

Verifica-se, entre os Estados, a vontade de levar a cabo processos de integração, seja por meio de fóruns multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio, seja por meio de negociações bilaterais ou regionais. Esses processos,

14 CASTANHEIRA, Fernando Henrique. Fragmentação do Direito Internacional e law making no

campo jurídico internacional contemporâneo. Revista da SJRJ, Rio de Janeiro, n. 25, 2009, p. 64.

15 CELLI JUNIOR, Humberto. A OMC e os acordos preferenciais de comércio: da coexistência à

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por sua própria natureza integracionista, ocasionam, no âmbito jurídico, discussões sobre harmonização, uniformização e até unificação de normas, sistemas de normas e princípios.

O discurso da fragmentação reflete, portanto, a aceleração crescente das atividades sociais, econômicas e políticas no cenário internacional, as quais demandam nova regulamentação jurídica e forçam o direito internacional a teorizar o que já se faz na realidade prática e criar diferentes ramos que, por sua vez, se dedicam a regular certos ambientes da seara global nunca antes regulados, dentre eles o comércio internacional e o meio ambiente.

2.2 O Fenômeno do multilateralismo comercial e a Organização Mundial do Comércio

O multilateralismo comercial é um fenômeno recente na história das relações internacionais que surgiu como forma de substituição ao antigo sistema de resolução de conflitos comerciais firmado apenas em acordos bilaterais ou em decisões unilaterais, eis que agora a maioria das negociações são plurais e envolvem diferentes países com interesses e objetivos muitas vezes divergentes.16

Tendo como marco histórico o fim da Segunda Guerra Mundial, quando se evidenciou a premência de se adotar mecanismos de atuação conjunta em prol da defesa de valores comuns aos Estados Nacionais, dentre os quais encontravam-se a manutenção da paz e o desenvolvimento social e econômico, o sistema multilateral de comércio tenta “substituir” a lógica de confronto pela lógica de cooperação.17

O multilateralismo surge, portanto, como uma espécie de projeto político internacional que privilegia um padrão de ações coletivas em detrimento de soluções individuais para os problemas, apoiando-se em uma percepção de indivisibilidade do espaço e norteado por princípios que visam a uma cooperação entre os diversos atores internacionais, como o da reciprocidade e da não discriminação, vejamos:

(...) O conceito expressa, portanto, um projeto político a ser promovido por uma institucionalidade internacional ou, ao menos, a preferência por um

16 PORTELA, Paulo Henrique. Direito Internacional Público e Privado. 5a ed.: Editora

JusPodivm,

2013, p. 417.

17 NASSER, Rabih Ali. A Liberalização do comércio internacional das normas do GATT

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padrão de ação coletiva em detrimento de soluções individuais. A essa definição cabe também acrescentar as dimensões normativas do objetivo da universalidade, de uma percepção de indivisibilidade do espaço e dos problemas comuns, e de perspectivas futuras, na busca de princípios ordenadores que garantam um mínimo de previsibilidade à interação entre os atores. O conceito de multilateralismo abarca assim uma extensa variedade de situações internacionais, como método de negociação, método de ação, método de institucionalização de normas e de regulação do sistema internacional, ao mesmo tempo em que remete a um certo conjunto de valores universais fundados nos princípios da Carta da ONU. 18

Juridicamente, foi por meio da celebração de acordos internacionais e da criação de organizações internacionais com personalidade jurídica e competências próprias, dentre elas a Organização das Nações Unidas (ONU), que se deu a implementação dessa convergência de interesses dos Estados.

As principais iniciativas internacionais, no entanto, foram tomadas após a Conferência de Bretton Woods, conferência que objetivou restaurar a economia mundial abalada durante a Segunda Guerra, e a Conferência de Havana, que teve como consequência a criação do GATT (General Agreement on Trade and Tariffs – Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio).

Durante a Conferência de Bretton Woods, reuniram-se 730 delegados de 44 países que deliberaram e finalmente assinaram o Acordo de Bretton Woods. No presente acordo, criaram-se basicamente novos procedimentos e novas instituições para regular a nova política econômica internacional do pós-guerra.

Entre as instituições criadas, tivemos o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (International Bank for Reconstruction and Development, ou BIRD) e o FMI (Fundo Monetário Internacional), encarregados de fornecer auxílio a países em dificuldades conjunturais e estruturais, respectivamente. Além dessas duas organizações, a Conferência planejava a criação de uma outra, denominada Organização Internacional do Comércio (OIC), que ficaria encarregada de ordenar as negociações comerciais entre os Estados Nacionais.

A criação da OIC ficou de ser finalizada, portanto, durante a Conferência das Nações Unidas Sobre Comércio e Emprego, realizada em Havana-Cuba19, com

a assinatura da “Carta de Havana para uma Organização Internacional do Comércio”. Analisando-se a Carta de Havana, percebe-se a amplitude dos objetivos e

18 MELLO, Flávia de Campos. O Brasil e o Multilateralismo Contemporâneo. Texto para discussão

n°1628, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Rio de Janeiro, jun. 2011, p. 13.

19 Havana Charter for an International Trade Organization. Disponível em: <

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da competência que se pretendeu conferir à OIC, revestida de uma pretensão maior do que o simples incremento do comércio internacional e com ênfase no desenvolvimento econômico e à consecução de melhores padrões de vida no plano internacional.

No entanto, eis que o congresso norte-americano não chegou a aprovar a Carta, a OIC acabou não sendo criada, apesar de sua criação ter sido uma proposta do governo dos Estados Unidos da América. O principal motivo que teria levado a essa rejeição seria as limitações comerciais que uma organização como a OIC imporia aos seus Estados-membros, em função principalmente de seus dispositivos considerados de caráter intervencionista.20

Mesmo com a não criação da OIC, a liberalização do comércio e a diminuição das tarifas e barreiras ao fluxo comercial passaram a integrar a agenda das discussões internacionais de forma permanente e sistemática. Fruto dessas negociações e diante de uma necessidade de regulação comercial foi que entrou em vigor o GATT.

De início, o GATT nunca chegou a ser tratado como um organismo internacional, pois consistia em um mero acordo multilateral de redução tarifária para o qual foram transportadas as disposições da Carta de Havana sobre política comercial. Planejado para ser utilizado provisoriamente enquanto a OIC não era criada, o acordo continha uma série de compromissos assumidos pelos 23 signatários iniciais acerca do comportamento a adotarem em suas relações comerciais, dando-lhes origem, portanto, a direitos e obrigações no âmbito do direito internacional.

Possuindo dispositivos que chegavam a caracterizá-lo como uma instituição, o GATT funcionava, muitas vezes, como um foro de discussões sobre o comércio internacional, tendo como principal objetivo estimular o comércio internacional, defende como princípio básico a consagração da liberdade de circulação de mercadorias e o caráter excepcional das tarifas e das diversas barreiras existentes, alfandegárias ou não.

No entanto, os dispositivos do GATT não o concediam plenos poderes para tomar deliberações independentemente da vontade dos Estados que o

20 NASSER, Rabih Ali. A Liberalização do comércio internacional das normas do GATT

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assinaram. Apesar de as normas desse acordo estarem relacionadas à troca de mercadorias, as mesmas acabavam por não possuir um grande poder para evitar políticas protecionistas. Dessa forma, com o decorrer dos anos, os seus fundamentos e sua própria atuação foram ficando obsoletas, visto que enfatizavam apenas o comércio de bens.

Ao todo, foram 8 rodadas no âmbito do GATT, a primeira sendo a Rodada de Genebra, que ocorreu em 1947; seguida pela Rodada de Annecy, em 1949; Torquay, em 1951; Genebra, em 1956; Dillon, entre 1960-1961; Kennedy, entre 1964-1967; Tóquio, entre 1973-1979; e, por fim, a Rodada do Uruguai, entre 1986-1994.

Somente durante a Rodada Uruguai, em 1994, o GATT sofreu alterações com a elaboração da Ata de Marrakesh, transformando-se no chamado GATT 1994, que abordou, entre outras questões, o comércio de serviços, de produtos agrícolas e têxteis.

O acordo comercial, obtido após a Rodada Uruguai é considerado como um dos mais importantes dentro do sistema de comércio internacional, não só pelo fato de a matéria elencada em seu conteúdo abordar novos temas importantes, mas também por ficar decidido que seriam incluídos, no documento final, todos os acordos e arranjos concluídos desde 1947 (ano da criação do GATT), além de anexos ao acordo que cria a Organização Mundial do Comércio – OMC.

A OMC nasce, portanto, com estrutura e personalidade jurídica próprias, sendo-lhe assim permitido exercer suas funções de forma autônoma, sem vinculação aos Estados Nacionais que lhe deram origem, mas sempre com base nas normas e nos princípios que regem sua atuação e de todos os seus órgãos.

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2.3 O direito internacional do meio ambiente e o direito do desenvolvimento

Ao longo da história, o homem dominou a natureza sem se preocupar com a escassez de seus recursos naturais. As antigas normas relacionadas ao meio ambiente, vez que ligadas intrinsecamente ao objetivo de crescimento econômico e à mera proteção do indivíduo, portanto sem qualquer relação com outros componentes do meio ambiente, tinham uma finalidade demasiadamente utilitária e imediatista, concentrando-se basicamente em uma uniformização das legislações nacionais quanto à temática ambiental.21

O meio ambiente, tal como o entendemos hoje, ou seja, relacionando a biosfera com o seu meio circundante, somente passou a integrar o mundo jurídico como um valor autônomo nos meados do século XX. A partir de então, o fenômeno da necessidade de proteção ao meio ambiente passou a ser observado juntamente com outros fenômenos evolutivos, dentre eles o da proteção dos direitos humanos e do direito ao desenvolvimento.22

Desenvolvendo-se basicamente a partir das negociações multilaterais no âmbito da Organização das Nações Unidas e das organizações internacionais, logo após a Segunda Guerra Mundial, o direito do desenvolvimento nasceu do direito internacional econômico, ramo do Direito Internacional Público que visa regulamentar juridicamente os problemas relativos à produção, ao consumo e à circulação de riquezas.23

Potencializado pela Revolução Industrial, o Século XIX foi marcado pela ideia de que o desenvolvimento material das sociedades era o valor supremo a ser almejado, sem contudo atentar para o fato de que as atividades industriais produziam subprodutos prejudiciais tanto ao homem quanto ao meio ambiente. Nesse panorama econômico, o conceito de desenvolvimento relacionava-se basicamente à ideia de crescimento econômico intrinsecamente ligada à expansão comercial entre as nações e à expansão de liberdades.

21 SOARES, Guido Fernanda Silva. Direito Internacional do meio ambiente: emergência,

obrigações e responsabilidades. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 39.

22 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey,

2003, p. 26.

23 Apud Celso D. Albuquerque Melo, Direito Internacional Econômico. Rio de Janeiro: Renovar,

(26)

À época da criação dos princípios e objetivos do Acordo Geral sobre as Tarifas e Comércio (GATT) e após a sua primeira rodada de negociações, por exemplo, os membros do GATT visavam apenas ao desenvolvimento econômico de seus países, interligado somente à ampliação comercial e ao aumento de parceiros transacionais, não compreendendo aspectos da saúde, dos direitos humanos e do meio ambiente.

À medida que esse crescimento econômico tomou proporções demasiadas, acabou por repercurtir, cada vez mais forte, em catástrofes ambientais e consequências degradantes ao meio ambiente. As primeiras preocupações com uma regulamentação de caráter preservacionista emergiram justamente após essas diversas situações emergenciais e/ou catastróficas, efetivamente acontecidas e não previstas, responsáveis por graves danos e ameaças à sanidade pública.24

Com o passar dos anos e com a própria mudança de pensamento acerca do fenômeno desenvolvimentista e do próprio sistema capitalista, o homem fora compelido a buscar, em normas internacionais, a disciplina de fenômenos que ultrapassavam fronteiras e exigiam uma nova formulação internacional.

As mudanças começaram a ocorrer, de fato, na década de 60, quando se inicia uma tomada de consciência no sentido de reconhecer as desigualdades econômicas entre os Estados e de instituir-se uma “Nova Ordem Econômica Mundial”. Resultado de tal conscientização, os países menos desenvolvidos conquistaram uma maioria na Assembleia Geral da ONU e influenciaram a criação, em 1964, da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD - United Nations Conference on Trade and Development).

A UNCTAD em muito contribuiu para mudar a relação de forças existente entre os países do Norte e do Sul, eis que seu objetivo principal era o desenvolvimento de seus membros e não somente do comércio mundial.

Um ano após a criação da UNCTAD, em 1965, cria-se o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), responsável por elaborar, nos anos 80, o Relatório sobre o Desenvolvimento Humano, que analisa de forma mais minuciosa o desenvolvimento global.

24 SOARES, Guido Fernanda Silva. Direito Internacional do meio ambiente: emergência,

(27)

No entanto, foi a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano de 1972, em Estocolmo, que o direito internacional ambiental atinge seu auge e passa a incorporar os princípios do direito ao desenvolvimento.

Na Conferência de Estocolmo foram votados: a Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, estabelecendo uma série de princípios para questões ambientais internacionais, incluindo direitos humanos, gestão de recursos naturais, prevenção da poluição, dentre outros; um Plano de Ação para o Meio Ambiente, conjunto de 109 recomendações voltadas para a avaliação do meio ambiente mundial, gestão do meio ambiente e medidas de apoio (informação, educação e formação de especialistas); uma Resolução sobre aspectos financeiros e organizacionais no âmbito da ONU; e por fim a instituição de um organismo especialmente dedicado ao meio ambiente, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).25

Ainda no âmbito da ONU, cria-se, em 1983, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Comissão Brundtland, que tinha como principais objetivos o reexame das questões críticas relativas ao meio ambiente, a reformulação das propostas já elaboradas, bem como mecanismos de cooperação internacional em prol de políticas voltadas para as mudanças ambientais. Concluídos os trabalhos em 1987, estes apresentaram os principais problemas ambientais globais e propuseram uma união do desenvolvimento econômico com o ambiental, dando origem ao conceito de desenvolvimento sustentável.26

A partir de Estocolmo e sobretudo a partir das convenções-quadro27 dos anos 1990, a atividade diplomática se intensifica e se torna mais consciente dos desequilíbrios ambientais na esfera internacional, gerando-se, portanto, uma série de tratados e convenções multilaterais sobre o meio ambiente, até culminar, em

25 SOARES, Guido Fernanda Silva. Direito Internacional do meio ambiente: emergência,

obrigações e responsabilidades, 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 54.

26FERREIRA, Gustavo Assed; BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otavio (coord.). Comércio

Internacional e desenvolvimento. Fundação Boiteux: 2006, p. 45.

27 A partir dos anos 70, com o início da identificação do direito internacional ambiental, assistimos à

expansão da formação de convenções-quadro, cujos exemplos mais correntes são a Convenção de Estocolmo, a Convenção da diversidade biológica e a Convenção das mudanças climáticas. As convenções-quadro tratavam de vários assuntos distintos que têm relação com um núcleo central – o

desenvolvimento sustentável. VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico

(28)

junho de 1992, no Rio de Janeiro, na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano e Desenvolvimento, denominada ECO/92.

Se Estocolmo fora importante para o despertar dos Estados à proteção do meio ambiente, a ECO/92 trouxe o componente da dimensão humana às questões ambientais, em particular com uma preocupação voltada ao desenvolvimento, em todos os seus aspectos, inclusive introduzindo-lhe o conceito de “sustentabilidade” formulado na Comissão de Brundtland, conceito este que adjetivaria todos os atos internacionais após a conferência, inclusive no âmbito do comércio internacional. 28

[...] discute-se hoje a (in)compatibilidade do comércio com o meio ambiente, temática de muita controvérsia entre os defensores de livre-comércio e os ambientalistas. Por isso, a assertiva de que um dos grandes desafios do planeta para este século consiste em conciliar os fins de desenvolvimento econômico com a defesa do meio ambiente; em outras palavras, consiste no desenvolvimento sustentável, tese projetada no Relatório Brudtland e consagrada na Conferência do Rio.29

O Relatório de Brundtland, portanto, conceituou Desenvolvimento Sustentável como: “a satisfação das necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades”30. Síntese das exigências de crescimento econômico, justiça social e

preservação do meio ambiente e fusão dos princípios jurídicos do direito ao desenvolvimento e o da preservação do meio ambiente, o Desenvolvimento Sustentável requer que as sociedades atendam às necessidades humanas tanto pelo aumento do potencial produtivo como pela garantia de oportunidades iguais para todos.31

Visando a colocar em prática o mais novo conceito de Desenvolvimento Sustentável, a ECO 92 adotou a “Agenda 21”, na qual os governos delinearam um programa detalhado de ações para afastar do mundo o atual modelo insustentável

28 SOARES, Guido Fernanda Silva. Direito Internacional do meio ambiente: emergência,

obrigações e responsabilidades, 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 37.

29 FREITAS, 2003, p. 223. Apud PIFFER, Carla. Comércio Internacional e Meio Ambiente: A

organização mundial do comércio como locus de governança ambiental. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.8,nº15, p. 124, Janeiro/Junho de 2011.

30 Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Relatório

Brundtland, Nosso Futuro Comum. Disponível em:

<http://www.un.org/documents/ga/res/42/ares42-187.htm>. Acesso em: 01 maio de 2014.

31 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Comércio Internacional e a Proteção do Meio Ambiente. Revista

(29)

de crescimento econômico, direcionando-a para atividades que protejam e renovem os recursos ambientais.32

As ações propostas incluiam: proteger a atmosfera; combater o desmatamento, a perda de solo e a desertificação; prevenir a poluição da água e do ar; deter a destruição das populações de peixes e promover uma gestão segura dos resíduos tóxicos. No entanto, a Agenda 21 foi além das questões ambientais para abordar os padrões de desenvolvimento que causam danos ao meio ambiente, incluindo a pobreza e a dívida externa dos países em desenvolvimento; padrões insustentáveis de produção e consumo; pressões demográficas e a estrutura da economia internacional.33

Visando a assegurar os objetivos da Agenda 21, a Assembleia Geral da ONU estabeleceu, em 1992, a Comissão para o Desenvolvimento Sustentável como uma comissão funcional do seu Conselho Econômico e Social. 34

Após Brudtland e a ECO/92, os princípios do Desenvolvimento Sustentável ganharam força e ficaram implíctos em muitas das conferências das Nações Unidas, incluindo: a Segunda Conferência da ONU sobre Assentamentos Humanos (Istambul, 1999); a Sessão Especial da Assembleia Geral sobre Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (Nova York, 1999); a Cúpula do Milênio (Nova York, 2000), dentre outras.35

Em 2002, em Johanesburgo (África do Sul), fora realizada a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, para fazer um balanço das conquistas, desafios e das novas questões surgidas desde a ECO/92 e transformar as metas, promessas e compromissos da Agenda 21 em ações concretas e tangíveis.36

Em maio de 2012, para continuar discutindo estas importantes questões relativas à desenvolvimento sustentável e proteção do meio ambiente, a comunidade internacional voltou a se encontrar no Rio de Janeiro, na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20.

A Rio+20 teve a missão de renovar compromissos com o Desenvolvimento Sustentável em meio a urgências ambientais, sociais, econômicas

32 ONUBR. A ONU e o meio ambiente. Disponível em:

<http://nacoesunidas.org/acao/meio-ambiente/>. Acesso em: 01 de maio de 2015.

(30)

e políticas, abordando temas como a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável; a erradicação da pobreza; e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável, entrando na definição de metas para evitar a degradação do meio ambiente.37

A partir de então, o conceito de Sustentabilidade e de Desenvolvimento Sustentável têm crescido fortemente no cenário jurídico internacional, enfraquecendo assim os princípios de base do direito do desenvolvimento anteriores ao século XX. Se hoje o direito do desenvolvimento é quase inexistente no direito internacional econômico, ele continua a se consolidar e a crescer no âmbito do direito internacional ambiental como desenvolvimento sustentável.38

37Governo Federal. Relatório Rio+20. Disponível em: <

http://www.rio20.gov.br/documentos/relatorio-rio-20/1.-relatorio-rio-20/at_download/relatorio_rio20.pdf>. Acesso em: 01 de maio de 2015.

38 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey,

(31)

3 A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO E A PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

Em razão dessa inserção do conceito de desenvolvimento sustentável no cenário internacional e dessa mudança de entendimento quanto à proteção ambiental, a formação do direito internacional do meio ambiente tornou-se hoje heterogênea e desorganizada, contemplando uma sequência de acordos internacionais com temáticas diversas, dentre elas, algumas relacionando-se, direta ou indiretamente, com as práticas comerciais.

Atualmente, há mais de duzentos e quarenta tratados envolvendo temas do meio ambiente, dentre os quais trinta relacionam-se com questões comerciais.39 Para reforçar a efetividade do direito internacional do meio ambiente, esses acordos têm recorrido a medidas comerciais e acabam por adotar a OMC como principal organismo internacional para a resolução de conflitos, preferindo-a a outras jurisdições específicas para causas ambientais.

3.1 O comércio internacional e a proteção do meio ambiente

Foi a partir da Segunda Guerra Mundial, e principalmente com o fim da Guerra Fria, que assuntos como o livre-comércio, direitos humanos e meio ambiente, antes secundários, adquiriram, no cenário internacional, importância tão grande quanto as tradicionais questões de segurança e paz mundial, modificando-se assim a agenda de discussões internacionais.40

Nesse panorama, o meio ambiente destaca-se, portanto, como um dos principais focos de atenção nas relações internacionais contemporâneas, uma vez que sua relação com outras áreas das atividades humanas podem resultar em consequências globais que necessitem de ações e acordos multilaterais para a sua solução, ou mitigação.41

39 OLIVEIRA, Carina Costa de. Solução de Conflitos Ambientais no Direito Internacional. Editora

Nuria Fabris: Porto Alegre, 2010, p. 124.

40 QUEIROZ, F.A. Meio Ambiente e Comércio Internacional: Relação Sustentável ou Opostos

Inconciliáveis? Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável). Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS), Universidade de Brasília, Brasília, 2003, p. 252.

(32)

Ainda no pós-guerra, a intensificação do intercâmbio comercial continuou sendo uma das grandes forças que moviam a economia globalizada. No entanto, a estrutura do comércio internacional sofreu uma tremenda mudança com os países buscando, por intermédio de negociações mais amplas, a gradativa liberalização comercial e a consequente eliminação de todo tipo de barreiras comerciais e protecionistas existentes, até culminar, em 1995, com a criação da Organização Mundial do Comércio.42

A intensificação do fluxo e das negociações comerciais trouxe, contudo, uma superexploração dos recursos naturais, assim como gerou uma grande perda de biodiversidade e elevou o nível de emissão de resíduos poluentes. É nesse contexto, a partir dos anos 70 e 80 e após intensas e numerosas discussões em foros internacionais sobre o assunto, sobretudo pelas agências das Nações Unidas, que a proteção da natureza, conforme visto anteriormente, adquire importância e gera um aumento do número de acordos ambientais internacionais.

Ao longo das negociações comerciais iniciais e das primeiras Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, a exemplo da ECO/92, a temática do meio ambiente foi considerada uma moeda de troca para o acesso dos produtos do Sul aos mercados do Norte, uma vez que os países do Sul, geralmente o Brasil, a Índia e China, aceitavam os avanços das normas ambientais em troca de regras comerciais favoráveis aos seus produtos.43

Ainda que atualmente os países do sul aceitem bem o direito ambiental, no início das discussões sobre a proteção da natureza a realidade era outra. apressão em favor dos limites ambientais pedidos aos países do sul era vista como um instrumento utilizado pelo norte para bloquear o desenvolvimento econômico dos países emergentes; atitude esta refletida nos discursos dos diplomatas do sul, que se opunham à questão ambiental e defendiam o mesmo direito de destruir a natureza que tinham usufruído os países do norte durante as épocas de maior desenvolvimento econômico. embora não se possa dizer que esta era a posição geral de todos os países do sul, pode-se afirmar que era, nos países mais representativos, como o Brasil, a índia e a china.44

42 QUEIROZ, F. A. Meio Ambiente e Comércio Internacional: Relação Sustentável ou Opostos

Inconciliáveis? Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável). Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS), Universidade de Brasília, Brasília, 2003, p. 253.

43 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey,

2003, p. 31.

(33)

Durante as negociações, os adeptos do livre-comércio, por exemplo, argumentavam que as políticas ambientais utilizadas por alguns países não passavam, muitas vezes, de instrumentos comerciais protecionistas com vistas a resguardar os seus mercados internos da concorrência internacional, vez que os países-membros muitas vezes tinham que se adequar às normas ambientais impostas pelas negociações comerciais.

Os ambientalistas, por sua vez, visando ao leal cumprimento dessas normas, utilizavam-se do argumento do deslocamento das empresas altamente poluidoras para países com padrões ambientais menos rigorosos, na medida em que tais práticas acabavam por gerar maior poluição, desequilibravam o país hospedeiro e ainda por cima desestimulavam esses países à criação de normas de proteção ambiental. Outro argumento era o da enorme perda de biodiversidade resultante da liberalização comercial, vez que esta conduz a uma superexploração dos recursos naturais e, consequentemente, à deterioração do meio ambiente.45

Muito embora os textos iniciais do GATT não previssem regras específicas para a proteção do meio ambiente, elas foram gradualmente inseridas em razão das consequências comerciais advindas de uma crescente migração das empresas para Estados que dispusessem de menor controle ambiental. Ademais, impunham-se ao livre-comércio novas barreiras de caráter técnico, como, por exemplo, as regulamentações sanitárias e fitossanitárias e as normas de qualidade aplicadas a produtos e serviços ambientais, gerando assim empasses econômicos e desentendimentos políticos e comerciais entre os membros.46

Com base nisso e buscando uma solução para o problema, o Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT), desde novembro de 1991, estabeleceu um Grupo de trabalho sobre o meio ambiente e o comércio internacional. No entanto, após uma decisão de 15 de abril de 1994, esse grupo de trabalho fora substituído por um Comitê do comércio e do meio ambiente, responsável por apontar

45 QUEIROZ, F.A. Meio Ambiente e Comércio Internacional: Relação Sustentável ou Opostos

Inconciliáveis? Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável). Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS), Universidade de Brasília, Brasília, 2003, pág. 258/259.

46 OLIVEIRA, Bárbara da Costa Pinto. Meio ambiente e desenvolvimento na Organização Mundial

(34)

soluções importantes no que diz respeito à aplicação das normas que tratam da proteção ambiental no GATT e do próprio conceito de sustentabilidade.47

Ainda no âmbito da Rodada Uruguai (1986 – 1993), fora assinada a Ata de Marraqueche, responsável por criar a OMC e dispor em seus artigos, ou mesmo no próprio preâmbulo do Acordo Constitutivo, que os Estados deveriam assegurar uma utilização sustentável dos recursos mundiais para a proteção do meio ambiente, vejamos:

[...] suas relações na esfera da atividade comercial e econômica devem ter como foco a elevação dos níveis de vida, permitindo ao mesmo tempo a utilização adequada dos recursos mundiais, em conformidade com o objetivo de um desenvolvimento sustentável e procurando proteger e preservar o meio ambiente e incrementar os meios para fazê-lo, de maneira compatível com suas respectivas necessidades e interesses segundo os diferentes níveis de desenvolvimento econômico.48

Foi justamente para evitar conflitos e analisar possíveis problemas que surjam quando as políticas de meio ambiente tiverem consequências para o comércio internacional, que o tema relativo ao comércio e meio ambiente foram inseridos na OMC, por influência da Conferência das Nações Unidas do Meio Ambiente (ECO/92) e da instituição do Comitê sobre Comércio e Meio Ambiente (CCMA).49

Ainda que a política de atuação deste Comitê não possa ultrapassar a competência da OMC para lidar com controvérsias comerciais, o CCMA adquire importância fundamental quando a questão é identificar qual o limite entre uma medida legítima de proteção ambiental e uma que represente medidas protecionistas.

Percebe-se, portanto, a partir dessas mudanças, que a OMC, enquanto principal organismo internacional relacionado ao comércio internacional, passa a observar as questões do livre comércio com um olhar mais atento para o meio

47 OLIVEIRA, Carina Costa de. Solução de Conflitos Ambientais no Direito Internacional. Editora

Nuria Fabris. Porto Alegre: 2010, p. 125.

48 Organização Mundial do Comércio

OMC. Disponível em:

<http://www.wto.org/english/thewto_e/whatis_e/tif_e/org6_e.htm>. Acesso em: 24 de novembro de 2014.

49

“O Comitê de Comércio e Meio Ambiente é um foro permanente dedicado ao diálogo entre os governos sobre o efeito das políticas comerciais no meio ambiente e das políticas ambientais no comércio. Criado em 1994, o Comitê vem realizando um amplo programa de trabalho, identificando e compreendendo a relação existente entre comércio e meio ambiente na busca pelo desenvolvimento

sustentável”. Disponível em <https://www.wto.org/english/tratop_e/envir_e/wrk_committee_e.htm>.

(35)

ambiente e outras questões que a ele se relacionam. Tamanha mudança reflete a imperatividade, no contexto da globalização, de se compreender melhor a complexa e dinâmica relação entre as políticas comerciais e o meio ambiente, possibilitando-se assim beneficiar todos os Membros e melhorar a relação entre o livre comércio e o desenvolvimento sustentável.

Com as questões ambientais agora fazendo parte da agenda internacional, a Conferência Ministerial de Doha50 também enalteceu a importância da proteção do meio ambiente e deu continuidade à promoção do desenvolvimento sustentável nas novas negociações e ao estabelecer novas tarefas ao CCMA .

A partir de Doha, muitos Acordos Multilaterais sobre o Meio Ambiente (AMA's) foram firmados. Atualmente, encontram-se em vigor mais de 240 acordos referentes às mais diversas questões ambientais. Desses 240 acordos, aproximadamente 30 incluem disposições que podem afetar o comércio internacional.51 No entanto, mesmo com essa convergência, as regras da OMC

representam uma lógica própria que está, muitas vezes, em contradição com a lógica de algumas convenções sobre o meio ambiente

A inserção das questões ambientais nos acordos da OMC resultaram de um aumento da relação entre as medidas de manutenção do livre comércio e da proteção da natureza, que culminaram com a formação de dois sistemas, um comercial e um ambiental. Logo, a existência de dois sistemas, muitas vezes antagônicos, gera um conflito de normas e faz com que, quase sempre, a liberdade de comércio prepondere e anule o valor das normas ambientais, carecendo, portanto, de soluções.52

50 Primeira rodada de negociações comerciais sob a égide da OMC, cujo principal objetivo era

aperfeiçoar as regras e disciplinas do sistema multilateral de comércio e promover nova rodada de compromissos de liberalização de políticas comerciais com ênfase nas necessidades e interesses dos países em desenvolvimento.

51 RUIZ FABRI, Hélène. Apud CARINA OLIVEIRA, Carina Costa de. Solução de Conflitos

Ambientais no Direito Internacional. Editora Nuria Fabris, Porto Alegre, 2010, pág. 124.

52 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey,

(36)

3.2 O arcabouço institucional do meio ambiente na OMC: Art. XX do GATT e suas alíneas b) e g)

Muito embora não exista, no âmbito da OMC, um acordo específico que trate do tema meio ambiente, bem como os textos do GATT não prevejam regras específicas para a sua proteção, podemos encontrar, nos vários acordos firmados até o presente momento, diferentes disposições relativas a preocupações ambientais:

Não existe, no âmbito da OMC, nenhum acordo específico que trate do tema meio ambiente, mas em vários acordos firmados podemos observar disposições relativas a preocupações ambientais: preâmbulo da OMC, artigos X e XX do Acordo Geral sobre as Tarifas e Comércio (GATT), o Acordo sobre as Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS), o Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual que dizem respeito ao comércio (ADPIC/TRIPS) e o Acordo sobre a Agricultura.53

Dentre as disposições citadas acima, o Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual que dizem respeito ao comércio (ADPIC/TRIPS) e o Acordo sobre as Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS) são acordos específicos que buscam basicamente garantir que os produtos comercializados preencham certos requisitos ambientais e não criem obstáculos desnecessários ao comércio internacional, reconhecendo explicitamente os direitos dos membros à proteção da saúde animal, vegetal e do ambiente ao nível que escolher.54

O ponto central da regulação jurídica ambiental no âmbito comercial encontra-se no próprio texto do GATT, mais especificamente em seu artigo XX, que reconhece a importância da proteção ao meio ambiente, mas o associa a duas exceções previstas em suas alíneas, sendo elas: medidas de restrição ao livre comércio em casos de proteção à vida das pessoas e dos outros seres vivos (b) e para a conservação dos recursos esgotáveis (g):

53 PIFFER, Carla. Comércio Internacional e Meio Ambiente: A organização mundial do comércio

como locus de governança ambiental. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.8,nº15, p. 125, Janeiro/Junho de 2011.

54 WTO. An introduction to trade and environment in the WTO. Disponível em:

(37)

Artigo XX – Exceções gerais. Sob reserva que estas medidas não sejam aplicadas de modo a constituírem um meio de discriminação arbitrário ou injustificável entre os países onde as mesmas condições existem, ou ainda uma restrição disfarçada ao comércio internacional, nenhum ponto do presente Acordo será interpretado para impedir a adoção ou aplicação por

qualquer parte contratante das medidas (…)

b) necessárias à proteção da saúde e da vida das pessoas e dos animais ou à

preservação dos vegetais (…)

g) relacionando-se a conservação dos recursos naturais esgotáveis, se tais medidas são aplicadas conjuntamente com as restrições à produção ou ao consumo nacional55

Tais exceções previstas nas alíneas do artigo XX não podem ser analisadas sem uma análise sistêmica de todo o corpo normativo do GATT e não podem ser medidas de discriminação injustificada ao livre comércio:

Este artigo do GATT esboça a rejeição ao unilateralismo dos Estados que se utilizam da proteção ambiental como uma falsa barreira ao comércio internacional. O dispositivo estabelece que as medidas expostas nas alíneas não podem constituir uma discriminação arbitrária e injustificável entre Estados com as mesmas condições [...]56

Dessa forma, é inegável a importância do artigo como argumento a ser utilizado pelos Estados ao implementar novas políticas e regulações ambientais que tenham impacto direto no comércio internacional e gerem consequências a outros Estados, fazendo-se necessário identificar se a razão da medida restritiva é um disfarce para uma medida comercial que não precisaria ser adotada.

Em busca do equilíbrio entre os objetivos de liberalização comercial e a proteção da saúde dos seres humanos, dos vegetais e dos animais, o artigo XX b) exige o cumprimento de três condições.

Primeiramente, o Estado que deseja praticar a política de proteção deve necessariamente provar que a medida adotada deve visar essencialmente à proteção da saúde e da vida das pessoas e dos animais, bem como da preservação dos vegetais. A escolha das medidas faz parte do poder discricionário do Estado, que são livres para instituir o nível de proteção interna desejado. Em seguida, faz-se mister identificar se a medida é realmente necessária, devendo-se demonstrar o elo de causalidade entre a medida e o efeito desejável, devendo aquela ser possível e disponível.

55GATT. Disponível em: <https://www.wto.org/english/res_e/booksp_e/analytic_index_e/gatt1994_07_

e.htm>. Acesso em 22 de março de 2015.

56 OLIVEIRA, Carina Costa de. Solução de Conflitos Ambientais no Direito Internacional. Editora

(38)

Por fim, deve-se procurar evitar de uma forma sistemática toda a discriminação arbitrária ou injustificada ao comércio internacional. Ainda que uma medida seja teoricamente possível, os Estados podem impugná-la sob alegação de que a mesma seria nefasta em função das condições concretas, por sua implementação gerar uma discriminação arbitrária ou injustificada a alguns membros.

A alínea g), que trata da conservação dos recursos naturais esgotáveis, adquire uma interpretação que, no entanto, não deve ser tão ampla, mas limitada em função do objeto e dos objetivos do acordo geral. A medida deve ter uma relação com a conservação dos recursos naturais esgotáveis, mas isso não significa que a mesma terá menos impactos sobre o meio ambiente. Deve também estar inserida na margem discricionária do poder público nacional. É preciso demonstrar o nexo de causalidade entre a medida em questão e o objetivo "conservação". A demonstração do nexo de causalidade dá legitimidade à medida.

Analisando-se então o caput do artigo XX, percebe-se o quanto o texto é ambíguo, vez que se faz necessário a presença rigorosa de três condições para que se autorize as exceções ambientais previstas nas alíneas b) e g) e comprove-se, portanto, que o Estado utiliza dessas exceções para chegar aos objetivos previstos pelas mesmas e não para maquiar uma barreira ao comércio internacional, são elas: uma "discriminação arbitrária" (entre os países onde as mesmas condições existem); uma "discriminação injustificável" (entre dois países onde as mesmas condições existem) ou uma "restrição disfarçada ao comércio internacional".57

A interpretação do artigo XX e suas alíneas, portanto, suscita algumas questões interessantes diante da incerteza quanto aos seus limites por conta das ambiguidades ainda existentes na própria redação do artigo e suas exceções. Por outro lado, a existência de ambiguidade permite maior maleabilidade em novas soluções para questões futuras:

A imprecisão das expressões utilizadas deixa uma margem de manobra considerável aos intérpretes do Acordo Geral, a exemplo do Órgão de Solução de Controvérsias. Embora a análise das expressões tenha sido aplicada somente a dois casos concretos, o Órgão de Solução de Controvérsias da OMC muito contribuiu a consolidação para uma interpretação coerente sobre o tema [...]58

57 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Econômico Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey,

2003, p. 271/272.

58 VARELLA, Marcelo Dias. O acúmulo de lógicas distintas ao Direito Internacional: Conflitos

Referências

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