• Nenhum resultado encontrado

Qualidade de vida e autonomia das pessoas com paramiloidose.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Qualidade de vida e autonomia das pessoas com paramiloidose."

Copied!
123
0
0

Texto

(1)

Mónica Raquel de Oliveira Quintas

QUALIDADE DE VIDA E AUTONOMIA DOS DOENTES

COM PARAMILOIDOSE

Dissertação apresentada para a

obtenção do grau de Mestre em

Bioética, sob a orientação da Mestre

Ivone Duarte, e a coorientação da

Doutora Teresa Coelho.

VII Curso de Mestrado em Bioética

(2)

II

Mónica Raquel de Oliveira Quintas

1

QUALIDADE DE VIDA E AUTONOMIA DOS DOENTES COM

PARAMILOIDOSE

Dissertação apresentada para a

obtenção do grau de Mestre em

Bioética, sob a orientação da Mestre

Ivone Duarte, e a coorientação da

Doutora Teresa Coelho.

VII Mestrado em Bioética

Porto, 2011

1

(3)

III “Tem o tempo o ser em mim mas se eu morro ele não fica outro o tem se sobrevive e se nele se implica

gosto desta dança etérea do descontínuo ao seguido do contínuo ao diferente do não vivente ao vivido

mais do que eu porém se deve o de eterno divertir vendo como nada vai num suposto jogo de ir.”

(4)

IV Para que este trabalho fosse possível foi necessário a intervenção de várias pessoas. Uma palavra de agradecimento à Mestre Ivone Duarte pela sua orientação ao longo do trabalho que parecia não ter fim.

À Dra Teresa Coelho pela coorientação e pelo fornecimento de material de apoio. À Dra Patrícia Valente pelo ânimo, incentivo e apoio prestado.

Ao Professor José Luís Pais Ribeiro que me recebeu prontamente e me ofertou o seu livro sobre o questionário SF-36, essencial para este estudo.

Ao meu marido, Hugo, pela paciência e compreensão.

À minha mãe por ter cuidado do meu filho nas minhas ausências para a realização deste trabalho.

À Dra Ana Rita Teixeira pela insistência.

Aos meus colegas de trabalho, Cristina Moreira e Hélder Ferreira, por me terem auxiliado na distribuição dos questionários aos doentes.

A todas as pessoas que colaboraram no preenchimento dos questionários no grupo controlo e a todos os doentes com Paramiloidose que também contribuiram para a realização deste trabalho.

(5)

V

Introdução: A paramiloidose foi descoberta em 1932 por Corino de Andrade. Trata-se de uma

doença hereditária degenerativa, autossómica dominante, cuja incidência é maior na zona da Póvoa de Varzim. Grande parte das pessoas afetadas por esta doença apresentam vários problemas físicos, psicológicos e sócio-económicos. Existem equipas multidisciplinares que tentam diariamente contribuir para o bem-estar destas pessoas.

Objetivos: Tratando-se de uma doença portuguesa, este trabalho teve como objetivos identificar

a autonomia e a qualidade de vida destas pessoas, e verificar alguns dos problemas que as afetam diariamente.

Metodologia: Os instrumentos de estudo utilizados foram o questionário SF-36 e o questionário

sócio-demográfico em que o primeiro foi aplicado a dois grupos, doentes e não doentes, e o segundo apenas aos doentes. A amostra da população em estudo foi de 130 doentes e 130 não doentes. Os questionários dos doentes com paramiloidose foram preenchidos no Serviço de Neurofisiologia do Hospital Geral de Santo António no Porto, quando se encontravam inscritos para realizarem exames, enquanto que o questionário do grupo de participantes foi passado do tipo bola de neve. O programa estatístico para tratamento de dados que foi utilizado foi o Minitab16 e o Microsoft Excell.

Resultados e Conclusões: A paramiloidose tem uma influência negativa significativa na

qualidade de vida dos doentes, nomeadamente nas dimensões do funcionamento e desempenho físico, perceção geral de saúde, desempenho emocional e saúde mental. Os principais problemas que afetam estes doentes são a falta de conhecimento das características da paramiloidose, a falta de recursos económicos e sociais que lhes permitam fazer face a uma fase avançada da doença, e os problemas familiares decorrentes da sua perda de autonomia ao longo do tempo. Infere-se do estudo que mais de metade da população doente não está inscrita para transplante hepático e também que, não obstante o conhecimento de serem portadores da doença, os casais têm desejo de ter filhos. Consideramos que para estes doentes usufruirem de uma melhor qualidade de vida é necessário prestar-lhes apoio físico, psicológico, sócio-económico e espiritual.

(6)

VI

Introduction: Paramyloidosis was discovered by Corino de Andrade in 1932. It is a hereditary

degenerative disease, autosomal dominant, whose incidence is higher in the area of Póvoa de Varzim, Portugal. Most people who are affected by this disease have physical, psychological and socioeconomic problems. There are multidisciplinary teams trying, every day, to improve the well-being of these people.

Objectives: To characterize the autonomy and quality of life of the Portuguese patients affected

by paramyloidosis, and analyze their daily disease related problems.

Methodology: Two group of people, 130 with the disease and 130 healthy, were surveyed using

the SF-36 health survey and a social-demographic questionnaire, the latter only to the sick group. This group was assembled in the neurophisiology service of Hospital Geral de Santo António in Porto, when they were registered for disease related exams. The healthy group was selected using th method known as snowball sampling. Minitab 16 and Microsoft Excel were used to calculate statistics and produce reports.

Results and Conclusions: Paramyloidosis has a significant impact in the quality of life of the

patients, namely in the physical functioning and physical role functioning, in the general health perception, in the emotional role functioning and in mental health. The main issues these patients have to deal with are the lack of knowledge about the disease’s characteristics, the lack of economic and social resources that enable them to cope with an advanced stage of disease, and the family problems arising from their loss of autonomy over time. It appears from the study that more than half of the patient population is not registered for liver transplantation and also that, despite the knowledge of being carriers of the disease, couples have the desire for children. We believe that for these patients to enjoy a better quality of life is necessary to support them in a physically, psychologically, socio-economically and spiritually way.

(7)

VII

INTRODUÇÃO ... 14

PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO ... 17

1. POLINEUROPATIA AMILOIDÓTICA FAMILIAR ... 18

1.1 A Descoberta da Paramiloidose ... 18

1.2 Propagação do gene da paramiloidose ... 19

1.3 Como se transmite a PAF ... 20

1.4 Diferentes tipos de amiloidose ... 24

1.5 Diagnóstico, Tratamento e Prognóstico ... 26

1.5.1 Transplante Hepático ... 27

1.5.2 Transplante Hepático Sequencial ou em Dominó ... 28

1.6Associação Portuguesa de Paramiloidose ... 31

2. ÉTICA BIOMÉDICA ... 34

2.1. Relatório de Belmonte ... 37

2.2 Principiologia de Beauchamp e Childress ... 41

2.3 Consentimento informado ... 43

2.4 Autonomia dos doentes com Paramiloidose ... 44

3. QUALIDADE DE VIDA NOS DOENTES COM PARAMILOIDOSE ... 47

3.1 Qualidade de vida ... 47

3.2 Qualidade de vida nos doentes com paramiloidose ... 51

PARTE II ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO ... 54

4. METODOLOGIA ... 55

(8)

VIII

4.3 Seleção da amostra ... 58

4.4 Recolha de dados ... 59

PARTE III ENQUADRAMENTO EMPÍRICO ... 63

5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ... 64

5.1 Resultados ... 64

5.2 Discussão dos resultados ... 85

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 89

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 91

ANEXOS ... 101

Anexo 1 – Autorização da entidade hospitalar para a realização da investigação ... 102

Anexo 2 – Documento informativo do estudo ... 104

Anexo 3 – Questionário sócio-demográfico ... 106

Anexo 4 – Questionário sobre o estado de saúde ... 114

Anexo 5 – Consentimento informado dos doentes ... 120

(9)

IX

Figura 1 – Exemplo de família com penetrância do gene da PAF baixa ... 21 Figura 2 - Exemplo de família com penetrância do gene da PAF alta ... 22 Figura 3 – Mapa das sensibilidades (Sinapse 2006; 1(6), 1: 58) ... 23

(10)

X

Gráfico 1 - Considera existir informação suficiente sobre a doença? ... 66

Gráfico 2 - De que forma obteve informação sobre a doença? ... 67

Gráfico 3 - O que sentiu quando soube que tinha a doença? ... 68

Gráfico 4 - Que sintomas físicos da doença mais o incomodoram? ... 69

Gráfico 5 - O que mais o preocupa em relação à família? ... 70

Gráfico 6 - Está inscrito para transplante hepático? Há quanto tempo? ... 71

Gráfico 7 - Expectativas em relação ao transplante hepático ... 72

Gráfico 8 - A doença e a descendência ... 73

Gráfico 9 - Recorreria a técnicas médicas que lhe permitissem ter filhos saudáveis se o processo não fosse tão dispendioso? ... 74

Gráfico 10 - Alguma vez sentiu discriminação por ser portador da doença? ... 74

Gráfico 11 - Considera ter disponíveis todos os recursos para ter uma boa qualidade de vida? (caso esteja numa fase avançada da doença) ... 75

Gráfico 12 - Tem capacidade financeira para pagar a instituições/outras pessoas para cuidarem de si? ... 76

Gráfico 13 – Estatísticas resumidas, histogramas e box-plots das duas dimensões sumárias do SF-36 para cada grupo. ... 77

Gráfico 14 – Box-plots das dimensões sumárias do SF-36 do grupo de doentes, em função do género ... 79

Gráfico 15 – Box-plots das dimensões sumárias do SF-36 do grupo de doentes, em função da escolaridade ... 80

Gráfico 16 – Box-plots das dimensões sumárias do SF-36 do grupo de doentes, em função da situação profissional ... 81

Gráfico 17 – Box-plots das dimensões sumárias do SF-36 do grupo de doentes, em função do rendimento profissional ... 82

Gráfico 18 – Box-plots das dimensões sumárias do SF-36 do grupo de doentes, em função do estado civil ... 83

(11)

XI

(12)

XII

Tabela 1 – Dados sócio-demográficos da amostra de doentes com paramiloidose ... 65 Tabela 2 – Comparação de resultados de QdV dos dois grupos nos diferentes domínios .... 77 Tabela 3 - Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função do género .... 78 Tabela 4 – Correlação da variável idade com a QdV no grupo de doentes ... 79 Tabela 5 - Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função da

escolaridade ... 80 Tabela 6- Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função da situação profissional ... 81 Tabela 7- Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função do rendimento profissional ... 82 Tabela 8- Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função do estado civil ... 83 Tabela 9- Variabilidade da QdV nos doentes com paramiloidose em função do tempo dos primeiros sintomas ... 84

(13)

XIII APP - Associação Portuguesa de Paramiloidose

CEP – Centro de Estudos da Paramiloidose CES – Comissão de Ética em Saúde

CP – Cuidados Paliativos

H.G.S.A – Hospital Geral de Santo António H.U.C – Hospitais da Universidade de Coimbra OMS – Organização Mundial de Saúde

QdV – Qualidade de Vida

PAF – Polineuropatia Amiloidótica Familiar PMA – Procriação Médica Assistida

RNCCI – Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados TH – Transplante Hepático

(14)

14

INTRODUÇÃO

Segundo a Organização Mundial de Saúde, as doenças crónicas são “doenças de longa duração e geralmente de progressão lenta” 2

. Incluem-se dentro do grupo das doenças crónicas, o cancro, a diabetes, a hipertensão arterial, a paramiloidose, entre muitas outras. Os doentes crónicos requerem cuidados especiais e com a evolução da tecnologia é possível, de alguma maneira, contribuir para o bem-estar destes doentes de modo a proporcionar-lhes uma melhoria na sua qualidade de vida.

O tema desta dissertação versa a qualidade de vida e a autonomia dos doentes com paramiloidose. A escolha do tema deveu-se ao facto de trabalharmos diariamente com estes doentes na nossa instituição, e de ouvirmos os seus desabafos de uma forma fugaz, enquanto realizam os testes de sensibilidade.

A paramiloidose, também conhecida como polineuropatia amiloidótica familiar ou ―doença dos pezinhos‖ é uma doença portuguesa, descoberta em 1939 por Corino de Andrade, médico Neurologista no Hospital Geral de Santo António. As características peculiares da doença levaram-no a uma investigação incansável, até que em 1952 a doença foi divulgada mundialmente através da revista Brain.

A paramiloidose é uma doença hereditária, autossómica dominante, crónica, progressiva e incapacitante, que num curto espaço de tempo conduz à morte3. O aparecimento da doença deve-se a uma mutação genética de uma proteína sintetizada na sua maioria no fígado, a transtirretina, onde um aminoácido de valina é substituído por um de metionina na posição 30, dando origem a uma proteína mutada, a TTRmet30. A doença surge no adulto jovem entre os 25 e os 35 anos. Os doentes com paramiloidose são acometidos por manifestações clínicas específicas iniciais, nomeadamente com uma polineuropatia sensitivo-motora, com a perda de sensibilidade térmica e álgica ao nível das extremidades, e alterações motoras. Posteriormente apresentam manifestações cardíacas, gastrointestinais, oculares entre muitas outras. O grau de incapacidade física progride com o avanço da doença levando a atrofias marcadas. O tratamento

2

Definição da World Health Organization para doenças crónicas. [Em linha] [Consult. 24 Agosto 2011] Disponível em WWW: URL http://www.who.int/topics/chronic_diseases/en/

3

SOARES, Miguel L., COELHO, Teresa, SOUSA, Alda, HOLMGREN, Gösta, SARAIVA, Maria J., KASTNER, Daniel L., BUXBAUM, Joel N., (2004)―Haplotypes and DNA sequence variation within and surrounding the transthyretin gene: genotype–phenotype correlations in familial amyloid polyneuropathy (V30M) in Portugal and Sweden‖ European Journal of Human Genetics vol.12, nº 3, pp.225–237.

(15)

15 para a doença consiste num transplante hepático, uma vez que a maioria da proteína mutada é sintetizada no fígado.

Os doentes que padecem de paramiloidose sofrem desde o dia que ficam a conhecer o seu diagnóstico, porque provavelmente já tiveram familiares com a doença e que vieram a falecer. Neste ponto a questão que se nos coloca é: que pensamentos terão estes doentes face a um futuro incerto, sabendo que irão passar pelas mesmas coisas que os seus familiares passaram? O grau de incapacidade é tão grande que estes doentes passam a depender de terceiros numa dada altura da doença. Que qualidade de vida terão estes doentes? Quando é que a autonomia na liberdade de escolhas deixa de existir?

Esta doença pode levantar certas questões éticas como por exemplo: relacionadas com a realização do transplante hepático (e no transplante hepático sequencial), na decisão de terem ou não filhos (sabendo que existe 50% de probabilidade de transmitir a doença à descendência), fazerem ou não o diagnóstico pré-natal ou mesmo participarem num ensaio clínico. A decisão final cabe sempre ao doente, uma vez que é autónomo nas suas escolhas. Neste ponto relacionamos o princípio da autonomia com o conceito de consentimento informado, uma vez que toda a prática clínica a que o doente se sujeita, deve ser consentida de uma forma livre, informada e esclarecida.

O termo ―Bioética‖ surgiu pela primeira vez em 1970 pelo oncologista Van Rensselaer Potter, como a “ciência da sobrevivência”4 que procurou integrar a biologia, a ecologia, a medicina e os valores humanos. Em 1971 Potter publicou o seu primeiro livro ―Bioethics: Bridge to the Future‖. A Bioética é, por assim dizer, o estudo transdisciplinar entre a medicina, a biologia, a filosofia e o direito com o intuito de criar diretrizes que estabeleçam regras e limites na investigação humana, tendo como objetivo final o bem estar do ser humano. A Bioética centra-se na dignidade da pessoa humana e no seu direito à autodeterminação.

Em 1979, Beauchamp e Childress publicaram os ―Princípios da Ética Biomédica‖. Estes princípios, o respeito pela autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça tiveram um papel importante ao nível da ética médica contemporânea, pois permitiram estabelecer diretrizes universais em qualquer tipo de experimentação científica em que estejam envolvidos seres humanos. Sendo princípios de caráter moral são partilhados e aceites por todos, independentemente da posição ética, religiosa ou cultural que ocupam.

Propusemo-nos a analisar neste trabalho o princípio da autonomia e a qualidade de vida dos doentes com paramiloidose.

4

(16)

16 Segundo a Principiologia de Beauchamp e Childress, o princípio da autonomia diz-nos que o indivíduo é livre nas suas tomadas de decisões e é responsável pelas suas ações perante terceiros numa sociedade pluralista e secular5. O princípio da autonomia aparece intimamente ligado ao conceito do consentimento informado. O doente sendo uma pessoa autónoma, é livre para prestar o seu consentimento informado e esclarecido.

Por último, descrevemos o conceito de qualidade de vida de uma forma geral, caminhando para o particular, no que concerne à qualidade de vida destes doentes. Das pesquisas bibliográficas efetuadas foram encontradas inúmeras definições sobre qualidade de vida.

Para Fayers e Machin6 o conceito de qualidade de vida apresenta significados diferentes para diferentes pessoas dependendo da área de aplicação. Consideram existir vários instrumentos para medir as várias dimensões da qualidade de vida, dependendo do objetivo que se pretende atingir7.

Porquê medir a qualidade de vida? Uma das razões é para melhorar a comunicação entre profissionais de saúde e os doentes. Outra das razões é conseguir estabelecer informação àcerca da amplitude dos problemas que afetam os doentes, tendo como objetivo armazenar informação numa forma que possa a vir a ser comunicada a futuros doentes, permitindo-lhes antecipar e compreeender as consequências da sua doença e do seu tratamento. Se a avaliação sobre a qualidade de vida descobrir informações relevantes sobre os doentes, poder-se-á mudar práticas na gestão clínica.

A perceção que os doentes têm da sua qualidade de vida relacionada com a saúde pode ajudar os profissionais de saúde a avaliar a eficácia dos cuidados clínicos e a desenvolver inovações nesses cuidados.

Em suma, tentamos compreender que fatores, para além da doença, interferem na vida destas pessoas e de que modo é possível implementar medidas para solucionar as dificuldades que surgem no seu dia a dia. Gostaríamos que este trabalho de investigação desse o seu pequeno contributo para a ciência e que pelos menos contribuísse de alguma maneira para aperfeiçoar e melhorar a qualidade de vida e a autonomia destes doentes, até ao fim dos seus dias.

Na segunda parte do trabalho analisamos os dados recolhidos através de questionários e procedemos à sua interpretação e discussão.

5

ARAMINI, Michele (2007) Introducción à la Bioética, San Pablo, p.36

6

FAYERS, Peter M., MACHIN, David (2007) Quality of life : the assessment, analysis, and interpretation of patient-reported outcomes,Wiley , 2nd edition, p.4.

7

(17)

17

Parte I

(18)

18

1. POLINEUROPATIA AMILOIDÓTICA FAMILIAR

1.1

A Descoberta da Paramiloidose

A Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF), também conhecida por Paramiloidose ou Doença dos pézinhos, foi descrita pela primeira vez em 1939 por Corino de Andrade8. Neste ano Corino de Andrade observou uma mulher de 37 anos da Póvoa de Varzim que sofria do ―mal dos pezinhos‖ e que apresentava várias queixas: adormecimento das extremidades, formigueiros, falta de sensibilidade térmica e dolorosa nos membros inferiores, dificuldade na marcha, diarreias e perturbações nos membros superiores semelhantes às dos membros inferiores. A doença atingia muitos membros da mesma família com uma evolução inexorável para a morte, ao longo das gerações. A síndrome neurológica da doente, história e quadro clínico, colocou a equipa de neurologia perante uma entidade clínica até então desconhecida.

Esta patologia teve particular incidência no norte do país, nomeadamente na Póvoa de Varzim na região piscatória. A primeira impressão foi reforçada pelo conhecimento da existência, na referida área geográfica, de uma doença denominada por ―mal dos pézinhos‖9

. Desde o ano de 1939, Corino de Andrade dedicou-se à investigação desta doença, primeiro pela sua natureza progressiva e segundo pela taxa de mortalidade extremamente elevada que a mesma apresentava10.

Em 1952 esta doença é divulgada mundialmente com a publicação de um artigo ―A Peculiar Form of Peripheral Neuropathy‖ na Revista Brain11. Mais tarde em 1960 Corino de Andrade fundou o Centro de Estudos da Paramiloidose (CEP) no Hospital Geral de Santo António (H.G.S.A.).

Em 1976, a PAF foi considerada pela sua frequência e pelas suas características, um grave problema de saúde pública12.

8

Neurologista do Hospital Geral de Santo António – pioneiro na descoberta da Paramiloidose.

9

Jornal da Associação Portuguesa de Paramiloidose (1998) nº22, p.2

10

Entre os colaboradores de Corino de Andrade destacou-se o Dr João Resende que na altura estagiava no Hospital Geral de Santo António e que se tornou parte integrante de uma equipa constituída por Pereira Guedes, Jorge Campos, António Coimbra e Castro Alves (médicos neurologistas).

11

ANDRADE, Corino (1952) ―A Peculiar Form of Peripheral Neuropathy‖, Brain, vol.75, nº3, p.408.

12

FREITAS, António Falcão de (1976), ―Aspectos clínicos da polineuropatia amiloidótica familiar Tipo Andrade‖ in Boletim do Hospital vol.1, nº 2, pp.17-25.

(19)

19 Actualmente a prevalência da doença é de 1/1000 habitantes13. Os os estudos de investigação desta doença prosseguem com a Dra Teresa Coelho que é a responsável pela Unidade Clínica de Paramiloidose (UCP) no Centro Hospitalar do Porto14.

1.2 Propagação do gene da paramiloidose

Devido à alta prevalência da doença na Póvoa de Varzim, pensa-se que a mutação original possa ter ocorrido aqui há vários séculos atrás e que se tenha propagado para fora do país através do porto de Vila do Conde, cuja actividade principal era a pesca.

Sabe-se que entre o povo português e o povo sueco existe uma mutação comum no que diz respeito ao gene da paramiloidose. Há uma hipótese de o gene mutante ter emigrado de Portugal para a Suécia, devido às rotas comerciais do sal que se realizavam entre o continente e o mar Báltico. Da história sabe-se que os Vikings atacaram a costa portuguesa a partir de 961. Pensa-se que a propagação da doença se deveu ao facto dos Vikings se terem relacionado com a população local e assim, o gene ter sido transmitido aos países nórdicos15.

Também há uma referência histórica no século XV relativamente à amizade travada entre Damião de Góis e dois suecos, Olaus Magnus, padre católico sueco e Johannes Magnus, o último Bispo católico sueco.

Sabe-se que é no norte da Suécia, na cidade de Skelleftea, junto ao Báltico, que a doença está mais concentrada. Existem, também, outras cidades em que doença se espalhou mas em menor escala, tais como Pitea, Alvsbyn; Kalix e Liycksele.

Devido à arte de navegar e ao comércio, os portugueses foram levando a paramiloidose até países longínquos. A partir de 1510 alguns poveiros terão participado como mareantes e pilotos nas naus portuguesas começando a emigrar para outros países. Devido a este factor tramsmitiu-se a doença. Desde o século XV que paítramsmitiu-ses como Espanha (ilha de Maiorca), Itália, Grécia, Chipre, Irlanda têm o gene da paramiloidose devido às rotas comerciais. Destes países

13

SARAIVA, Maria João (2001). Data base on transthyretin mutations. Universidade do Porto: Instituto de Biologia Molecular e Celular, Amyloid Unit.

14

Teresa Coelho, médica Neurologista com especialização em Neurofisiologia, deu continuidade à investigação iniciada pelo Dr Corino de Andrade no H.G.S.A., tendo sido incansável até à data, na procura da cura para esta doença, juntamente com vários colaboradores.

15

―As viagens de um gene‖ (1989) – esta edição foi publicada para acompanhar a exposição ―As viagens de um gene‖ aquando do 1st International symposiun on Familial Amyloidotic Polyneuropathy and Other Transthyretin Related Disorders, não tendo paginação. O texto que diz respeito à história da propagação da doença foi retirado desta edição.

(20)

20 emigraram pessoas que levaram o gene mutante para o outro lado do mundo, como os Estados Unidos e Brasil.

A chegada dos portugueses ao Japão data do séc. XVI. Além de terem levado conhecimentos de cartografia, geografia, arte de navegar entre outras coisas, também levaram a paramiloidose. No fim do século XIX dá-se a migração para as grandes cidades, Porto e Lisboa, com o início da era industrial.

Em 1900 Fonseca Cardoso no seu livro ― O Poveiro, estudo antropológico‖ descreve a influência dos povos normandos no litoral português como comerciantes na actividade piscatória.

O gene da paramiloidose irá propagar-se ao longo da costa, primeiro para o norte, Viana do Castelo e depois para a zona centro, Figueira da Foz. A seguir começam a ir para o interior, através das ligações comerciais e agrícolas, para Barcelos e Braga.

Pensa-se que a propagação da doença na Serra da Estrela se deveu essencialmente ao uso das termas em Unhais da Serra, famosas para o ―reumatismo‖, contribuindo assim para a instalação da doença.

Apesar dos portugueses terem vivido em África e terem criado famílias com a raça negra durante mais de quatro séculos, o que se sabe é que a doença nunca foi observada em negros ou mestiços.

1.3 Como se transmite a PAF

A paramiloidose é uma doença hereditária, autossómica dominante, altamente incapacitante levando à morte num período de 10 anos. Em suma a PAF é uma amiloidose hereditária fatal16.

Em Junho de 2009 estavam registadas na UCP cerca de 550 famílias que correspondiam a 2331 doentes. Todos estes doentes apresentavam mutação da proteína TTRval30met.

Segundo Costa & Saraiva tudo começou há várias centenas de anos, por uma mutação pontual ocorrida num segmento do cromossoma 18 que consistiu na substituição de um

16

ANDO, Yukio, ARAKI, Shukuro e ANDO, Masayuki. (1993), ―Transthyretin and familial amyloidotic polyneuropathy‖ Intern Med, vol.32, pp.920-922.

(21)

21 aminoácido valina por meteonina na posição 30 dando origem à Transtirretina - TTR Val30Met (forma mutada da proteína)17.

A TTR pode ser encontrada no plasma e no líquido céfalo-raquidiano, sendo estável nos tecidos. É sintetizada, na quase totalidade, pelo fígado (90%), nos plexos coroideus do cérebro e uma menor fracção na retina. Embora existam vários tipos de mutações da substância amilóide, este trabalho irá debruçar-se essencialmente na mutação da TTR Val30Met, pois trata-se da mutação de amilóide mais frequente em Portugal.

A probabilidade de um filho adquirir o gene alterado é de 50%. Esta doença atinge o adulto jovem e a maioria da população afectada tem uma idade média compreendida entre os 25 e os 35 anos. No entanto fica salvaguardado a existência de casos tardios da doença mesmo depois dos 40 ou 50 anos de idade18.

É de salientar que existem famílias de doentes assintomáticos que nunca vieram a desenvolver a doença (figura 1). E existem outras famílias em que a doença se desenvolve e manifesta (figura 2)19.

Figura 1 – Exemplo de família com penetrância do gene da PAF baixa

17

COSTA, Paulo Pinho e, SARAIVA, Maria João (1988), ―PAF: Amilóide, Transtirretina e Nervo periférico – Estudos etiopatogénicos (Revisão)‖ in Boletim do Hospital, vol.3, nº 9, pp. 109-126.

18

SOUSA, Alda (2006), ―Genetic Epidemiology of Familial Amyloid Polyneuropathy‖ Sinapse, vol.6, nº1, supl. nº 1, pp.74-79.

19

FONTE: Figuras cedidas pela Dra Teresa Coelho da Unidade Clínica de Paramiloidose do Centro Hospitalar do Porto.

(22)

22

Figura 2 - Exemplo de família com penetrância do gene da PAF alta

A maioria dos doentes apresenta sintomas de polineuropatia sensitivo-motora e autonómica. A polineuropatia é uma afecção sistémica, bilateral e simétrica dos nervos periféricos, motores e sensitivos, que se traduz por fraqueza e atrofias musculares progressivas, com arreflexia e perda da sensibilidade ao nível das extremidades (figura 3)202122.

Na figura 3 podemos ver representado as alterações que vão surgindo com o evoluir da doença. Vêmos nas extremidades a anestesia ao calor e a sensação de dor. À medida que se sobe até ao joelho os doentes apresentam queixas de hipostesia térmica e dor, havendo preservação das sensibilidades tácteis e de pressão.

Normalmente a neuropatia começa com alterações das pequenas fibras nos pés, onde os doentes apresentam queixas de parestesias/disestesias, ―sensação de formigueiro‖, ―dores‖, ―picadas‖ ―queimaduras‖ ou ―choques eléctricos‖23

.

A maioria dos doentes apresenta alterações da sensibilidade à temperatura. Primeiro deixam de sentir o frio e mais tarde o quente. Muitos deles dizem que “quando entram na água do mar só sentem do joelho para cima”24

. A parte motora será afectada mais tarde quando a neuropatia sensitiva estiver numa fase mais avançada.

20

COUTINHO Paula, BARBOSA, Adelino Resende.(1976), ―Aspectos Neurológicos da P.A.F‖ in Boletim do Hospital, vol.1, nº 1, pp.27-34.

21

IN DICIONÁRIO MÉDICO (2004), 3ª Edição. Climepsi Editores.

22

Mapa das sensibilidades – Sinapse 2006; vol.6, nº 1, supl. nº1, p.58.

23

LOBATO, Luísa (2003) ―Portuguese-type amyloidosis (transthyretin amyloidosis, ATTR V30M)‖ J Nephrol, vol.16, nº3, pp.438-442.

24

(23)

23

Figura 3 – Mapa das sensibilidades (Sinapse 2006; 1(6), 1: 58)

A perda sensitiva nos membros inferiores inicia-se progressivamente dos pés para os tornozelos, destes para as pernas e depois para os joelhos, enquanto que a parte sensitiva nos membros superiores ainda se encontra preservada. A neuropatia autonómica aparece relativamente cedo e pode ter um conjunto de manifestações clínicas tais como alterações do trânsito gastrointestinal (diarreia, obstipação, náuseas e vómitos), perturbações genito-urinárias (bexiga neurogénica e disfunção sexual), alterações cardíacas (hipotensão ortostática).

Estes doentes também apresentam como sintoma inicial um emagrecimento marcado e desnutrição. Quando a parte motora é afectada estes doentes apresentam atrofias musculares, abolição dos reflexos tendinosos, pés pendentes, marcha em ―steppage‖ que se caracteriza por um exagerado levantamento do joelho e excessiva flexão da coxa sobre a bacia25.

25

FONSECA, Isabel (2006) ―Emagrecimento e desnutrição na polineuropatia amiloidótica familiar de tipo português‖ Sinapse; Vol.6, nº1,supl. nº1, pp.121-124.

(24)

24

1.4 Diferentes tipos de amiloidose

As amiloidoses são um grupo de doenças caracterizado pela deposição de uma proteína insolúvel nos tecidos, a amilóide, que se deposita no espaço extracelular de vários tecidos. As amiloidoses são também conhecidas por doenças conformacionais, uma vez que, uma proteína normalmente solúvel dá origem a agregados insolúveis com uma estrutura ordenada, as fibrilhas de amilóide, através de um mecanismo que envolve alterações da conformação26.

A apresentação e a evolução das amiloidoses dependem dos órgãos atingidos, podendo ser estabelecidos alguns padrões clínicos conforme a proteína precursora. A classificação actual de uma amiloidose assenta na composição química das fibrilhas e não no quadro clínico.

Podem ser divididas em amiloidoses não hereditárias e amiloidoses hereditárias.

As amiloidoses não hereditárias podem ser primárias ou secundárias. Na amiloidose primária a proteína amilóide é um fragmento da cadeia leve de imunoglobulinas (proteínas que fazem parte do sistema imunológico), que é produzida em excesso por células imunológicas. Geralmente está associada a doenças da medula óssea, como por exemplo o mieloma múltiplo. Afecta normalmente homens de meia idade27.

Na amiloidose secundária (disproteinémica) a proteína depositada é a amilóide sérica A e é produzida pelo fígado quando ocorrem processos inflamatórios. Este tipo de amiloidose pode ser observada em pessoas portadoras de doenças inflamatórias intestinais (Crohn e colite ulcerosa ), com artrite reumatóide, osteomielite, tuberculose, entre outras. A evolução da doença traduz-se por um grau crescente de incapacidade sensitiva, motora e autonómica28.

A amiloidose primária é fatal, normalmente secundária a falência cardíaca ou renal. Tem uma esperança de vida de 2 a 10 anos, após ter iniciado os sintomas sensitivos.

As pessoas que apresentam amiloidose secundária com neuropatia amilóide normalmente morrem devido a alterações subjacentes à amiloidose sistémica. Não há tratamento específico para este tipo de amiloidose.

As amiloidoses hereditárias podem ser classificadas segundo os sinais clínicos e o tipo bioquímico da proteína amilóide envolvida. O principal órgão afectado é o fígado mas órgãos

26

MERLINI, Giampaolo e BELLOTTI, Vittorio., (2003) ―Molecular mechanisms of amyloidosis.‖ N. Engl. J. Med., vol.349, pp.583-596.

27

KELLEY, John J., KYLE, Robert A., O'BRIEN Patricia C. e DYCK, Peter J. (1979): ―The natural history of peripheral neuropathy in primary systemic amyloidosis‖ Ann Neurol vol.6, nº1, pp.1-7.

28

THOMAS, Peter K. and KING, Rosalind H.M. (1974), ―Peripheral nerve changes in amyloid neuropathy‖ Brain vol.97, p.395.

(25)

25 como o coração, rins, pele, cérebro também são atingidos. Este tipo de amiloidoses destaca-se pelo envolvimento do Sistema Nervoso Periférico e são herdadas de uma maneira autossómica dominante.

No caso da PAF, que se inclui no grupo das amiloidoses hereditárias, as fibrilhas de amilóide são, essencialmente, constituídas por uma variante da transtirretina (TTR), em que a alteração de um único aminoácido torna a proteína mais susceptível à formação de amilóide29.

Segundo Reilly e King, as amiloidoses hereditárias podem ser divididas em quatro grupos30:

PAF tipo I, de Andrade ou tipo Português com (início nos membros inferiores) – este tipo de polineuropatia foi descrito em portugueses, japoneses e suecos, entre outros. Normalmente aparece entre os 25 e os 35 anos, os sintomas iniciam-se por parestesias nos pés, seguindo-se alterações gastrointestinais ou alterações de disfunção autonómica. Esta doença é lentamente progressiva, levando ao desenvolvimento de uma neuropatia sensitivo-motora severa313233.

PAF tipo II, de Rukavina ou tipo Indiana (com início nos membros superiores) - este tipo de PAF foi descrita em famílias suíças com origem em Indiana e em famílias alemãs com origem em Maryland, nos E.U.A.; apresenta como principais sintomas o síndrome do túnel do carpo e opacidade vítrea34.

Normalmente aparece na meia idade, com compressão do nervo mediano bilateralmente e por vezes acompanhado de opacidade vítrea. Há uma perda sensitiva generalizada mas a neuropatia periférica não é incapacitante e o envolvimento autonómico não é característico deste tipo de PAF.

29

SARAIVA, Maria João, BIRKEN, Steven, COSTA Paulo Pinho e, GOODMAN, DeWitt S., (1984), ―Amyloid fibril protein in Familial Amyloidotic Polyneuropathy, Portuguese type.‖ J. Clin. Invest, vol.73, pp.104-119.

30

REILLY, Mary M., KING, Rosalind H., (1993), ―Familial amyloid polyneuropathy.‖ Brain Pathol, vol.3, pp.165–176.

31

ANDERSSON, Rune (1970), ―Hereditary amyloidosis with polyneuropathy.‖ Acta Med. Scand., vol.188, pp.85-94.

32

ANDRADE, Corino. (1952), pp.408-426.

33

ARAKI, Shinobu, MAWATARI, Shiro. OHTA, Michio, NAKAJIMA, Atsushi e KUROIWA, Yoshimi (1968), ―Polyneuritic amyloidosis in a Japanese family.‖ Arch. Neurol., vol.18, pp.593-602.

34

RUKAVINA, John G., BLOCK, Walter D., JACKSON, Charles E., FALLS Harold F., CAREY Joshua H., CURTIS, Arthur C.(1956), ―Primary systemic amyloidosis: a review and an experimental, genetic and clinical study of 29 cases with particular emphasis on the familial form‖ Medicine, vol.35, nº 3, pp.239-334.

(26)

26 PAF tipo III, de Van Allen ou tipo Iowa (generalizada) – este tipo de PAF é descrito no Iowa, EUA, em familias cujos antepassados tiveram origem na Grã-Bretanha.Tanto os membros superiores como os inferiores são afectados, mas o síndrome do túnel do carpo não está presente. Inicia-se na quarta década e a morte por envolvimento renal ocorre em menos de 20 anos35.

Os sintomas iniciam-se nos membros inferiores na parte distal por dor, disestesias e fraqueza seguidos de um envolvimento proximal progressivo que se estende até aos membros superiores. A disfunção autonómica não é proeminente. A maioria destes doentes fica incapacitado pela neuropatia periférica ao fim de dez anos.

PAF tipo IV, de Meretoja ou tipo Filandês (nervos cranianos) – este tipo de PAF é descrita na Finlândia e caracteriza-se pelo aparecimento de uma tríade de manifestações: oculares, neurológicas e cutâneas36 37. Segundo Makishita foram descritos casos de PAF tipo IV no Japão semelhantes aos da Finlândia. Todos os doentes apresentavam manifestações típicas de PAF, sem neuropatia periférica marcada. Pensa-se que os nervos autonómicos possam ser atingidos num estadio avançado da doença38.

1.5 Diagnóstico, Tratamento e Prognóstico

Para se efectuar o diagnóstico da PAF o clínico deve recolher a anamnese do doente, verificar se há história familiar da doença, verificar a idade do aparecimento da doença e se há ou não sintomas. Actualmente, o diagnóstico pré-natal realiza-se através da amniocentese. Os testes mais utilizados para fazerem o diagnóstico são os exames laboratoriais utilizando a técnica da análise do ácido desoxirribonucleico (ADN) ou realizando biópsia de tecido, para detectar a

35

VAN ALLEN, Maurice W., FROHLICH, Janet A. e DAVIS, Julian R. (1969) ―Inherited predisposition to generalized amyloidosis. Clinical and pathological study of a family with neuropathy, nephropathy and peptic ulcer‖ Neurology (Minneap),vol.19, p.10.

36

MERETOJA, Jouko, (1969) ―Familial systemic paramyloidosis with lattice dystrophy of the cornea, progressive cranial neuropathy, skin changes and various internal symptoms. A previously unrecognized heritable syndrome.‖ Ann Clin Res, vol.1, nº 4, pp.314-324.

37

PEREIRA, Sara V., ALMEIDA, Leonor D., LÉ, Jorge S., MONTEIRO-GRILLO, Manuel (2010), ―Manifestações Oculares da Polineuropatia Amiloidótica Familiar do Tipo Finlandês – Caso sem história ancestral associada‖ Oftalmologia, vol.34, pp.371-378.

38

MAKISHITA, Hideo, YAZAKI, Masahide., MATSUDA, Masayuki, IKEDA, Shu-ichi., YANAGISAWA, Nobuo (1994), ―Familial amyloid polyneuropathy type IV (Finnish type) a clinicopathological study‖, Clinical Neurology, vol.34, nº5, pp.431-437.

(27)

27 presença da substância amilóide. A biópsia de tecido pode ser realizada em qualquer órgão que esteja afectado pela amilóide tal como coração, rim, fígado. Também pode ser retirado da mucosa rectal ou das glândulas salivares minor39.

Há 30 anos atrás o tratamento limitava-se ao aconselhamento genético e à correcção de desvios hidroelectrolíticos e nutritivos decorrentes das alterações digestivas40. Actualmente, a única opção terapêutica eficaz é o transplante hepático (TH). Como a maioria da TTR é produzida no fígado, substituindo este órgão a fonte da proteína mutante é eliminada. Mas para que ocorra a substituição do órgão afectado é preciso um novo órgão. O problema que aqui se coloca é que a PAF não é a única doença que necessita de um órgão, neste caso o fígado, para ser transplantado. O que se tem verificado é que a espera é demasiado longa. Alguns dos doentes estão inscritos há mais de quatro anos para a realização do TH. E neste tempo a doença não pára a sua evolução. Então o que poderá ser feito por estes doentes enquanto esperam?

Com o evoluir da ciência e das novas tecnologias mais cuidados são prestados aos doentes de forma a garantir uma pequena melhoria na sua qualidade de vida enquanto esperam pelo órgão que precisam. O tratamento dos outros sintomas que apresentam como as nevralgias, problemas gastrointestinais, oculares, entre outros é feito à base de medicamentos. Outra terapêutica passa pela prevenção, isto é, prevenir o aparecimento de queimaduras e feridas face à falta de sensibilidade dolorosa e térmica que é muito comum nestes doentes.

Mas estes doentes devem esperar pelo TH até quando? O órgão para o TH chegará a tempo de salvar estes doentes? E quando surgir a oportunidade de fazer o TH, será que o doente irá ser compatível? Será que a espera valeu a pena? Ou não?

Parece-nos que a ciência irá encontrar alguns dilemas éticos relativamente ao TH.

1.5.1 Transplante Hepático

Em 1990 na Suécia, Holmgren realizou o primeiro TH num doente com PAF. Contudo esta técnica apresentou algumas limitações e o seu sucesso dependeu das alterações que os doentes apresentaram antes da cirurgia nomeadamente a nível cardíaco e da disfunção autonómica4142.

39

CARVALHO, Filipa, SOUSA, Mário, FERNANDES, Susana, SILVA, Joaquina, SARAIVA, Maria J., BARROS, Alberto (2001) ―Preimplantation genetic diagnosis for familial amyloidotic polyneuropathy‖ Prenat Diagn, vol.21, pp.1093-1099.

40

FREITAS, António Falcão de, (1976), pp.17-25.

41

HOLMGREN, Gösta, STEEN, Lars, EKSTEDT, Jan, GROTH, Carl-Gustav, ERICZON, Bo-Goran, ERIKSSON, Siv, ANDERSON, Oluf, KARLBERG Ingvar, NORDEN Gunnela, NAKAZATO, Masamitsu, HAWKINS, Philip, RICHARDSON, Suzanne, PEPYS, Mark

(28)

28 Em Portugal, o primeiro transplante hepático realizou-se em 1992 nos Hospitais da Universidade de Coimbra (H.U.C.) e no Hospital Curry Cabral em Lisboa, juntando-se mais tarde o H.G.S.A.43.

O TH deve ser realizado quando surgem os primeiros sintomas da doença visto que este irá travar a evolução da mesma. Nesta fase existe um grande problema que são as listas de espera. Embora o TH trave a evolução da doença, os sintomas que os doentes apresentavam antes da cirurgia permanecerão com eles à posteriori44.

Contudo é de salientar que existem outras medidas terapêuticas preventivas visto que estes doentes apresentam vários problemas no decurso da doença. Assim sendo, é preciso tratar os problemas gastrointestinais, cardíacos, genito-urinários, entre outros. Para isso é necessária a intervenção de uma equipa multidisciplinar que seja capaz de ajudar estes doentes numa fase tão difícil da vida.

1.5.2 Transplante Hepático Sequencial ou em Dominó

Portugal para além de ter uma maior incidência de doentes com PAF também tem legislação respeitante à dação de órgãos - Lei nº12/9345.

De acordo com o artigo 1º, alínea 1, (…) a presente lei aplica-se aos actos que tenham por objecto a dádiva ou colheita de tecidos ou órgãos de origem humana, para fins (…)de transplantação, bem como às próprias intervenções de transplantação. (…)

Segundo o artigo 4º e 5º da presente lei (…) é proibido revelar a identidade do dador ou do receptor de órgão e tecido e a dádiva de tecidos ou órgãos com fins terapêuticos de transplante não pode, em nenhuma circunstância, ser remunerada, sendo proibida a sua comercialização. (…)

Em Dezembro de 2006 o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) redigiu o Parecer nº 50 de Dezembro de 2006, sobre a proposta de Lei nº 65/X com o intuito de contemplar dados não existentes na Lei nº 12/9346.

(1991) ―Biochemical effect of liver transplantation in two Swedish patients with familial amyloidotic polyneuropathy (FAP-met30)‖ Clin Genet, vol.40, pp.242-246.

42

COUTINHO, Conceição Azevedo (2006), ―Envolvimento cardíaco na polineuropatia amiloidótica familiar‖ Sinapse; vol.6, nº1,supl.1, pp.92-98.

43

FURTADO, Emanuel (2006), ―Transplantação hepática na polineuropatia amiloidótica familiar‖ Sinapse, vol.6, nº1, supl. nº 1, pp.151-154.

44

COELHO, Teresa.(2006), ―Tratamento da polineuropatia amiloidótica familiar: princípios gerais e tratamento sintomático‖ Sinapse, vol.6, nº1, supl. nº 1, pp.147-150.

45

(29)

29 Este Parecer teve como objetivos:

―adequar a evolução dos conhecimentos às novas práticas de transplantação e (…) fazer face às as necessidades clínicas em órgãos e tecidos para transplantar”.

Esta evolução científica veio permitir que os doentes aguardassem mais tempo pelo transplante criando expectativas para uma melhoria da sua doença. Contudo, verificou-se a presença de um grande problema: não há órgãos e tecidos suficientes somente a partir de cadáveres que possam satisfazer as necessidades existentes.

Segundo este Parecer, e transpondo este problema a nível mundial, estima-se que nos EUA “…um em cada oito órgãos de cadáver com potencialidade para serem transplantáveis consegue ser efectivamente usado para transplantação”.

Nalguns países a carência de órgãos para transplantação deve-se, entre outros fatores, à falta de legislação para a colheita dos mesmos. Noutros países fazem-se campanhas públicas de sensibilização da população para o registo voluntário de dação de órgãos. Em Portugal o acto de recolha de órgãos e tecidos a partir de cadáveres é legislado na sua totalidade.

Uma solução que diminuiria efectivamente as listas de espera seria a colheita de tecidos ou órgãos em dador vivo para fazer face às necessidades existentes.

As novas alterações ao Decreto-Lei 12/93 “…visam permitir aumentar o número de colheita em vida de órgãos, de tecidos e células.‖ e “…sobre quem poderá ser dador quando se trata de órgãos não regeneráveis…”.

As questões éticas levantadas por este Parecer centram-se, entre outras:

a) Na salvaguarda de uma informação muito precisa dos dadores vivos sobre as consequências do acto da dádiva

b) No consentimento esclarecido (….).

Relativamente a este assunto o CNECV emitiu o Parecer nº 41 em Novembro de 2003, que visa proteger o ser humano em todos os seus aspectos no que diz respeito à transplantação de órgãos47.

Existe ainda na legislação Portuguesa uma Directiva que contempla normas de tratamento de órgãos e tecidos desde a sua dádiva até à sua empregabilidade48.

46

PARECER 50 /CNECV/06 sobre a proposta de LEI nº 65/X (Alteração à Lei n.º 12/93, de 22 de Abril - Colheita e Transplante de órgãos e tecidos de origem humana).

47

PARECER 41/ CNECV/03 – Parecer sobre o Protocolo adicional à Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina ralativo ao Transplante de Órgãos e Tecidos de Origem Humana.

48

(30)

30 O primeiro TH sequencial ocorreu em 1996 nos H.U.C.. Um doente paramiloidótico após ter recebido o fígado de um cadáver doou o seu a um receptor que tinha doença hepática grave49.

Existem alguns problemas com a transplantação hepática nomeadamente as listas de espera, pois não há órgãos disponíveis para tantos doentes. Muitos chegam mesmo a morrer antes da vez deles chegar para realizar o transplante50.

O TH sequencial de dadores vivos veio diminuir as listas de espera. Um outro problema que se coloca relaciona-se directamente com os doentes da PAF. Embora realizem o transplante sequencial de doentes paramiloidóticos para doentes com doença hepática terminal, se o doente paramiloidótico estiver já numa fase avançada da doença o TH não se realizará, primeiro porque não vai haver regressão dos sintomas e segundo porque há mais doentes em lista de espera numa fase menos avançada da doença e que precisam mais rapidamente do fígado. Nesta fase coloca-se uma questão ética: é lícito para estes doentes coloca-serem retirados da lista de espera em detrimento de outros?

Outra questão ética que se levanta é o facto do receptor do dador vivo revelar nos exames após o TH deposição de amilóide nalguns tecidos. Será lícito transplantar um órgão que apresenta alterações genéticas com um potencial risco de causar manifestações da doença no receptor?

Segundo Wilczek e colaboradores, esta doença requer um mínimo de 15 anos para se desenvolver e pode nunca vir a manifestar-se51.

Figueras e colaboradores realizaram um estudo onde os doentes com PAF tinham uma média de idades de 37 anos enquanto que os receptores do segundo TH teriam 64 anos. Este facto, de os segundos receptores terem uma idade mais avançada veio demonstrar que estes doentes não viriam a manifestar qualquer sintoma de PAF. Deste estudo concluiu-se que o TH sequencial é uma técnica possível de ser realizada sem comportar riscos aparentes para os dois receptores52.

Em suma, podemos inferir que o prognóstico da PAF pode variar, e geralmente de forma não favorável, se o diagnóstico não for feito atempadamente. Quando se sabe que se trata de um

49

FERRÃO, José (2006), ―Transplante hepático sequencial (dominó) – alargar a esperança?‖ Sinapse, vol.6, nº 1,supl.nº 1, pp. 155-157.

50

WILCZEK, Henryk E., LARSSON, Marie, YAMAMOTO, Shinji, ERICZON, Bo-Goran. (2008), ―Domino liver transplantation‖ J Hepatobiliary Pancret Surg, vol.15, pp.139-148.

51

ERICZON, Bo-Goran., LARSSON, Marie., WILCZEK Henryk E. (2008), ―Domino liver transplantation: risks and benefits‖ Transplantation Proceedings, vol.40, pp.1130-1131.

52

FIGUERAS, Juan, PARES, David, MUNAR-QUÉS, Miguel, RAFECAS, António, TALTAVULL, Teresa C., FABREGA, Juan, XIOL, Xavier, TORRAS, Jaume, LAMA, Carmen, LLADÓ, Laura.e JAURRIETA, Eduardo (2002) ―El transplante hepático dominó o secuencial, es una técnica factible?‖ Gastroenterol Hepatol, vol.25, nº4, pp.225-229.

(31)

31 doente paramiloidótico é necessário começar de imediato o combate aos sintomas apresentados por esses doentes, verificar que órgãos estão afectados, se é necessário o tratamento de feridas por queimaduras ou se necessitam de uma dieta especial na sua alimentação devido às alterações gastrointestinais. Há uma tentativa de tratamento para aliviar a sintomatologia e para que estes doentes consigam ter uma qualidade vida aceitável.

A sobrevida destes doentes, após o início dos sintomas, é de aproximadamente onze anos, podendo ir até aos quinze anos53 quando se verifica uma melhoria na qualidade de vida, isto é, quando se consegue tratar alguns dos sintomas.

Pelas razões acima descritas, os doentes devem também ter auxílio de carácter psicológico e emocional. Muitos destes doentes ficam deprimidos porque à medida que os sintomas vão aparecendo, eles deixam de conseguir fazer as suas actividades, ficando incapacitados para tal. A dada altura da doença começam a depender de terceiros nas actividades de vida diárias e isto torna-os mais vulneráveis. Outra das razões apontadas para a depressão que estes doentes possam vir a manifestar, deve-se ao facto de existirem elementos do agregado familiar já com a doença. Ora, os doentes ao verem os seus familiares a ficarem num estado deplorável irão projectar-se no futuro e pensarão no estado que também irão chegar.

Outra das razões apontadas para os doentes estarem sujeitos à depressão diz respeito ao TH. Existem familiares de doentes sujeitos a TH, que vieram a falecer durante a cirurgia, outros doentes não se sentem capazes de se inscreverem eles próprios na lista de transplante, porque o sentimento de medo é dominante.

Das poucas razões apontadas, porque existem certamente mais, verifica-se que a maioria dos doentes com PAF necessita de apoio especializado a nível psicológico, não descurando outro tipos de apoio.

1.6

Associação Portuguesa de Paramiloidose

Como se veio a verificar ao longo destes anos, o número de doentes aumentou e houve, assim, a necessidade de criar um grupo de pessoas, onde estas juntamente com os seus familiares, se pudessem reunir e discutir os seus problemas. Criou-se então a Associação Portuguesa de Paramiloidose (APP) que foi fundada em 1979 por um grupo de doentes e pessoas

53

FALK, Rodney H., COMENZO, Raymond L., SKINNER, Martha (1997) ―The systemic amyloidosis‖ N Engl J Med, vol.337, pp.898-909.

(32)

32 ligadas ao CEP. Desta associação fazem parte doentes, familiares, amigos e profissionais de saúde. Existem vários núcleos espalhados pelo país com o intuito de ajudar e promover o bem-estar dentro do possível destas pessoas. Os núcleos situam-se em Braga, Barcelos, Vila do Conde, Figueira da Foz, Unhais da Serra, Lisboa, Cartaxo e Esposende. Todos têm a colaboração de um médico, uma enfermeira e uma assistente social.

Esta associação tem vários objetivos, entre os quais se destacam uma melhoria da assistência médica e a promoção de cuidados continuados no que diz respeito a tratamentos de fisioterapia, de feridas abertas, de apoio psicossocial, transporte nas deslocações aos centros de saúde/ hospitais, entre outros.

Em 1982 a APP conseguiu que a medicação para estes doentes fosse gratuita nas entidades de saúde.

Em 2010, criou o Parecer sobre a Paramiloidose que está à espera de aprovação pelo Ministério da Saúde54. Neste parecer a APP tem como objetivo esclarecer algumas alterações ocorridas em relação aos benefícios dos doentes no que se refere aos beneficiários do regime da segurança social e do regime da ADSE.

Os doentes com paramiloidose têm uma comparticipação de 100% das receitas médicas desde que estas sejam prescritas nos serviços habilitados para o tratamento da doença.

Segundo a Lei nº173/2003, de 1 de Agosto, artigo nº 2, alínea m), os doentes com paramiloidose estão isentos de pagar taxas moderadoras em consultas, em análises clínicas e nos exames complementares de diagnóstico.

Estes doentes têm direito a material clínico de apoio, previsto no Decreto Regulamentar nº 29/90 de 14 de Setembro, como cadeira de rodas, canadianas calçado ortopédico, talas, fraldas, almofadas.

Muitos destes doentes ficam dependentes de terceiros e, por este motivo, precisam de apoio especializado. As suas habitações devem ser modificadas para facilitar a locomoção e para isso é necessário rampas para as cadeiras de rodas, casas de banho equipadas para a higienização. Devem ter assistência domiciliária no que diz respeito à alimentação, cuidados de higiene diários e limpeza da casa, bem como o fornecimento de alimentos e refeições.

Outro dos objetivos da APP é criar um levantamento e registo das famílias afectadas, isto é criar um Registo Nacional de doentes com Paramiloidose. Uma vez que é no nosso país que esta doença tem maior prevalência, é necessário saber quantos pessoas estão afectadas por esta

54

A APP criou este parecer com o intuito de esclarecer o enquadramento destes doentes no Sistema da Segurança Social, dos benefícios na área da saúde e dos benefícios dos doentes que que pertencem ao regime contributivo. Contudo, este parecer ainda não foi regulamentado.

(33)

33 doença, isto é, torna-se imprescindível obter uma base de dados epidemiológicos afim de implementar medidas para ajudarem estes doentes.

Este registo tem como objetivos: identificar e caracterizar todos os doentes, prevenir e melhorar os cuidados de saúde a prestar a estes doentes55.

Portanto, é necessário criar meios para divulgar esta doença nos sítios onde a informação não chega ou não é suficiente. Também seria importante arrecadar verbas para apoiar financeiramente os projectos de investigação científica no que diz respeito a esta doença56.

A Paramiloidose continua ainda a ser uma doença incurável e que afecta todas as dimensões do Ser Humano: biológica, psicológica, sociológica, cultural e espiritual.

55

A proposta para o Registo Português de Paramiloidose foi anunciado em Diário da República, 2ª série, nº 126 de 4 de Julho de 2011, com o Despacho nº 8812/2011, pp.27872-3. Neste Despacho consta em anexo o Regulamento do Registo Nacional de Paramiloidose.

56

Grande parte dos doentes queixa-se da falta de informação sobre a doença. É preciso implementar medidas para combater esta lacuna.

(34)

34

2. ÉTICA BIOMÉDICA

O termo ―Bioética‖ surgiu pela primeira vez em 1970 pelo oncologista Van Rensselaer Potter, no artigo ―Bioethics. The Science of Survival‖. Em 1971 Potter publicou o seu primeiro livro ―Bioethics: Bridge to the Future‖57,58

.

Nunes & Brandão afirmam que “A Bioética tem sido caracterizada como uma ponte para o futuro. Um futuro em constante mutação, mas onde determinados valores são considerados imutáveis e intemporais. (…) o respeito pela dignidade humana (…) tem-se tornado o paradigma das relações inter-pessoais nas sociedades plurais e democráticas59.”. O aparecimento desta palavra veio revolucionar o mundo em que vivemos. Desde o seu aparecimento até à data, inúmeras questões éticas foram debatidas e continuarão a ser, desde o conceito de embrião, às técnicas de procriação medicamente assistida (PMA), às directivas antecipadas da vontade. Nesse sentido, dependendo do seu enquadramento, a palavra ―Bioética‖ pode ter várias definições, pois abrange diferentes domínios, como a filosofia, sociologia, medicina, direito, entre outros. Existem Comissões de Ética (CE) em várias instituições com elementos capazes de resolverem problemas éticos baseando-se num conjunto de princípios. A Declaração de Helsínquia quando foi elaborada em 1964, previa a criação de comissões e grupos com funções específicas60 que tinham como objetivo garantir a integridade do ser humano na sua plenitude, baseados num conjunto de normas éticas.

A Lei nº 46/200461, de 19 de agosto define Comissão de Ética para a Saúde (CES), entre outras, “as entidades criadas pelo Decreto-Lei nº 97/9562, de 10 demMaio, às quais compete, sempre que solicitadas pela Comissão de Ética para Investigação Clínica, emitir o parecer previsto na presente lei.‖ As CES têm como objetivos a intervenção na investigação médica63,

57

POTTER,Van Resseler (1970) ―Bioethics: The Science of Survival‖. Persp. Biol. Med. vol.14, nº 1, pp. 127-153. cit in SGRECCIA, Elio. (2009) Manual de Bioética- Fundamentos e ética biomédica, Principia Cascais: Principia Editora, p.13.

58

NUNES, Rui (2002) “Bioética e Deontologia Profissional”, Colectânea Bioética Hoje-IV, Gráfica de Coimbra 2ª edição, p.7.

59

NUNES Rui, BRANDÃO Cristina (2007): ―Nota introdutória‖ in “Humanização da Saúde”, Colectânea Bioética Hoje-XIII, Gráfica de Coimbra, p.11.

60

WALTER, Osswald (2004), Um fio de ética, 2ª edição, Gráfica de Coimbra, p.228.

61

LEI nº 46/2004 [Em linha]. [Consult. 9 Agosto 2011] Disponível na WWW:<URL: http://www.centrodedireitobiomedico.org/files/Lei_dos_Ensaios_Clinicos.pdf.

62

DECRETO-LEI nº 97/95, de 10 de Maio tem como objetivo delinear as regras subjacentes às CES nos estabelecimentos de saúde públicos e privados, no que diz respeito à sua constituição, competências e modo de funcionamento. [Em linha]. [Consult. 9 Agosto 2011] Disponível na WWW:<URL: http://www.cnpma.org.pt/Docs/Legislacao_DL_97_95.pdf.

63

(35)

35 solucionar problemas éticos que surjam na prática clínica, tendo sempre em atenção a dignidade e a integridade do ser humano. As CES existem em todos as instituições que intervenham diretamente com a saúde (públicas e privadas) como hospitais, centros de saúde, entre outros.

Segundo a opinião de Pinto “A Bioética projeta-se sobretudo em complexas questões emergentes, que põem novos problemas à humanidade e que exigem decisões graves sobre nova legislação e regulamentação de questões (…). A reprodução medicamente assistida, as células estaminais, o uso de embriões humanos em experimentação (...)64. De facto, todos estes conceitos ligados à genética devem ser devidamente regulamentados caso contrário, qualquer investigador poderia manipular a informação genética. Em Portugal ainda não existe legislação referente, por exemplo, às bases de dados genéticos. O uso de embriões humanos em investigação implica várias questões éticas nomeadamente de ordem jurídica65. A título de exemplo é o destino que se dá aos embriões excedentários devido ao uso das técnicas de procriação medicamente assistida66.

Hellegers67 considerava a bioética uma ciência capaz de recolher os valores através do diálogo e do confronto entre a medicina, a filosofia e a ética. Para Segreccia68 foi Hellegers quem introduziu pela primeira vez o termo ―bioética‖, introduzindo-o no contexto universitário como disciplina e fazendo a junção entre a área biomédica.

Reich69 define bioética como “o estudo sistemático das dimensões morais (…) das ciências da vida e da saúde, com o emprego de uma variedade de metodologias éticas numa abordagem interdisciplinar. Para este autor a bioética passou a ser examinada através de uma variedade de metodologias éticas70.

Nesse sentido, existem várias definições de bioética e todas elas com um objetivo comum, que é o primado do ser humano. Devido às várias situações emergentes a que o ser humano foi exposto durante décadas (experimentação em seres humanos, clonagem humana, entre outros)

64

PINTO, Alexandre S. (2007) ―Problemas Bioéticos em Medicina Geral e Familiar‖, in “Humanização da Saúde”, Colectânea Bioética Hoje-XIII, Gráfica de Coimbra p.94.

65

TELES, Natália O. (2004) ― O estatuto do embrião humano: algumas considerações bioéticas‖, Nascer e crescer, vol.XIII, nº 1, p.53.

66

TELES, Natália O. (2000) ―Bioética em genética – historial, problemas e principios éticos‖ in Genética e Reprodução Humana, Coord. Rui Nunes e Helena Melo, Colectânea Bioética Hoje – I, Gráfica de Coimbra, p.121.

67

HELLEGERS, André – médico obstetra, de origem holandesa, que em 1971, fundou o Instituto Kennedy da Ética.

68

SGRECCIA, Elio (2009), p. 15.

69

REICH, (ed.), Encyclopedia of Bioethics, (1995), vol.I, pág.XXI cit in SGRECCIA, Elio (2009), p 31. O professor Warren Reich é membro do Instituto de Kennedy da Ética e autor da primeira Enciclopédia de Bioética (1978).

70

(36)

36 tornou-se de uma enorme necessidade a criação de um conjunto de normas e condutas, para que a sociedade se regesse de igual modo com todos os indivíduos. Neste contexto surgiu a bioética.

Então podemos afirmar que a bioética é o estudo transdisciplinar entre várias áreas do saber com o intuito de construir diretrizes, para que o ser humano possa viver em plenitude enquanto ser social. A bioética estuda e trata questões complexas onde não existe consenso moral relativamente a problemas como: clonagem, aborto, eutanásia, células estaminais, entre outros. O papel fundamental da bioética é o respeito pela vida, autonomia e dignidade humana71.

Com todas estas questões de valor moral que foram surgindo ao longo da vida houve necessidade de se criarem diretrizes. Apresentamos, assim, alguns exemplos destas diretrizes72:

1. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, publicada pelas Nações Unidas a 10 de dezembro de 1948, que contém elementos importantes à dignidade, liberdade e direitos do ser humano, bem como, a aplicação de um conjunto de medidas universais que sejam reconhecidas pelas populações dos Estados membros e pelas populações que se encontram em territórios sobre a sua jurisdição.

2. A Convenção sobre os Direitos do Homem e da Biomedicina, aprovada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa a 16 de novembro de 1996, cujo objetivo e finalidade disposto no Artigo 1º do Capítulo 1: ―As Partes na presente Convenção protegem o ser humano na sua dignidade e na sua identidade e garantem a toda a pessoa, sem discriminação, o respeito pela sua integridade e pelos seus outros direitos e liberdades fundamentais face às aplicações da biologia e da medicina.‖ Ratificada por Portugal em 2001, Ratificada pelo Decreto do Presidente da República, nº 1/2001, de 20 de fevereiro, de 3 de janeiro, publicado no Diário da República, I Série-A, n.º 2/200173.

3. O Código de Nuremberga de 1947, surgiu após a Segunda Guerra Mundial que estabelece um conjunto de princípios éticos relativamente à pesquisa em seres humanos e à

71 WALTER, Osswald (2004), p.189. 72 SGRECCIA, Elio (2009), p. 29. 73

CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DO HOMEM E DA BIOMEDICINA, [Em linha]. [Consult. 1 Agosto 2011] Disponível na WWW:<URL http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhregionais/convbiologiaNOVO.html.

Referências

Documentos relacionados

In this study clay mineral assemblages, combined with other palaeoenvironmental data, were studied in a core recovered from the outer sector of the Ria de Vigo, a temperate

Dessa forma, a partir da perspectiva teórica do sociólogo francês Pierre Bourdieu, o presente trabalho busca compreender como a lógica produtivista introduzida no campo

DATA: 17/out PERÍODO: MATUTINO ( ) VESPERTINO ( X ) NOTURNO ( ) LOCAL: Bloco XXIB - sala 11. Horário Nº Trabalho Título do trabalho

Além disso, a falta de esclarecimento de toda a comunidade escolar sobre sua importância para a melhoria do desempenho dos educandos também contribuiu para que os pais não o

O trabalho intitulado PROJETO DE INTERVENÇÃO SOBRE A IMPLANTAÇÃO DA SISTEMATIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM (SAE) PARA PACIENTES COM DIABETES MELLITUS NO

As key results, we found that: the triceps brachii muscle acts in the elbow extension and in moving the humerus head forward; the biceps brachii, pectoralis major and deltoid

Atualmente os currículos em ensino de ciências sinalizam que os conteúdos difundidos em sala de aula devem proporcionar ao educando o desenvolvimento de competências e habilidades

Contudo, não é possível imaginar que essas formas de pensar e agir, tanto a orientada à Sustentabilidade quanto a tradicional cartesiana, se fomentariam nos indivíduos