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Eventos de letramento com foco na produção de textos: uma perspectiva etnográfica

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – UFPE CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE

ÉRICA FEIJÓ DE SOUZA LIMA

EVENTOS DE LETRAMENTO COM FOCO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS: UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA

RECIFE 2017

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ÉRICA FEIJÓ DE SOUZA LIMA

EVENTOS DE LETRAMENTO COM FOCO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS: UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação.

Linha de pesquisa: Educação e Linguagem.

Orientadora: Prof. Dra. Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo

RECIFE 2017

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Andréia Alcântara, CRB-4/1460

L732e Lima, Érica Feijó de Souza.

Eventos de letramento com o foco na produção de textos: uma perspectiva etnográfica / Érica Feijó de Souza Lima. – Recife, 2017. 163 f. : il. ; 30 cm.

Orientadora: Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2017.

Inclui Referências.

1. Letramento. 2. Língua portuguesa – Estudo e Ensino. 3. Escrita. 4. Ensino fundamental. 5. UFPE - Pós-graduação. I. Macedo, Maria do Socorro Alencar Nunes. II. Título.

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ÉRICA FEIJÓ DE SOUZA LIMA

EVENTOS DE LETRAMENTO COM FOCO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS: UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação.

Linha de pesquisa: Educação e Linguagem.

Orientadora: Prof. Dra. Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo

Aprovado em 26 de maio de 2017.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________ Profa. Dra. Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo (PPGE/UFPE)

1ª Examinadora (orientadora)

_____________________________________________________________ Profa. Dra. Maria Lúcia Ferreira de Figueirêdo Barbosa (PPGE/UFPE)

2ª Examinadora (Interna)

____________________________________________________________ Profa. Dra. Vânia Costa (DPEC/CE/UFRN)

3ª Examinadora (Externa)

____________________________________________________________ Prof. Dr. Clécio dos Santos Bunzen Júnior (UFPE)

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A Ricardo, pela cumplicidade, pelo incentivo e pelo seu cuidado.

À Jael e Micael, que mesmo tão pequenos entenderam que eu precisava fazer muita tarefa de casa. A vocês minha família, todo amor do mundo.

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AGRADECIMENTOS

A Deus pela força tão presente. Sem Ele, nada feito!

Ao meu pai, Sr. Bola, pelo exemplo de ser humano que sempre foi para mim. À minha preciosa mãe, por não ser apenas meu braço direito, mas meus dois braços. Apoio e amor descrevem a senhora.

A meu companheiro de todas horas, Ricardo Lima, especialista em me acalmar e em me fazer feliz.

A meus amados, queridos e abençoados filhos, por entenderem minha presença ausente. (Olhos marejados).

A meu irmão único e preferido, Dinho Feijó, pelo incentivo e por traduzir para o inglês o resumo que compõe essa dissertação.

À querida, dedicada e poeta, Socorro Nunes, pelo incentivo, pelo encorajamento e pela forma respeitosa que conduziu o processo de orientação dessa dissertação. A você, minha admiração e carinho.

À Professora Vânia Costa, pelas contribuições para com meus escritos desde o período da qualificação e pelo aceite em participar como integrante externo na banca de meu trabalho.

À professora Maria Lúcia Figueiredo, por compor a banca dessa dissertação, participar das discussões sobre o texto aqui exposto, desde a qualificação e contribuir de maneira tão respeitosa com minha formação enquanto pesquisadora.

Ao Professor Clécio Bunzen, pela contribuição tão presente, desde a época da qualificação, “para além da escrita”. Obrigada pela solicitude ao longo de todo curso de mestrado e participação na banca.

Aos amigos do GPEALE, pessoas queridas demais, pelas discussões e aprendizagens, pelas amizades e vínculos construídos.

Ao professor Eduardo Jorge, pelos esforços empreendidos na minha preparação para seleção do mestrado.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação da UFPE, exemplos para mim.

Aos professores do Curso de Extensão Pré-Pós, etapa tão importante nessa escala graduada que tem sido minha vida acadêmica. Em especial, Priscila Angelina pela atenção a mim concedida nos momentos constitutivos as etapas da seleção para o curso de mestrado.

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Aos meus colegas de turma: Carlos Eduardo, Alberto Lopes e Thiago Rodrigo por tanto me ajudarem ao longo da caminhada no curso.

À minha amiga Maiara Cavalcanti, a maternidade, os conflitos em administrar tantas demandas nos aproximaram. Uma bela amizade se instituiu. Da academia, para a vida.

A todos os meus amigos do Educandário Municipal Cônego Costa Carvalho, pela torcida e incentivo desde o período da seleção do mestrado. Em especial meus gestores Manoel Salviano e Geazy Valentim, pela confiança gerada ao longo os dias. À gestão da Escola Estadual Professora Azinete Ramos Carneiro nas pessoas de: Elisabete Dino, Zenialdo Rodrigues, Marta dos Santos, Villma Nestor mais que pares de atuação, amigos que quero para sempre na minha vida.

À Vivian Andrade, Roseane Soares e Leta Tavares, amigas mais chegadas que irmãs.

Às integrantes do Trio Ternura, Taciana e Lane. Meninas, o que seria de mim sem vocês?

A meu amigo Ernando José (in Memoriam) que tanto se alegrou com meu retorno a academia, porém foi recolhido deste mundo antes de minha conclusão. Seu estímulo e sua ausência foram marcas expressivas nesses dois anos e três meses

À minha amiga Chisley, pelo carinho e por me fazer rir, quando o cansaço tentava me abater. Você é iluminada!

Aos meus 40 sobrinhos, frutos de uma relação íntima com Deus, construída na ICB caetés III - Abreu e Lima, pela torcida irreverente e por entenderem minha ausência nos nossos encontros sabatinos.

À Marlene, que dividiu comigo meus afazeres do lar e atenção a ser dada aos meus pequenos. Talvez, ela não tenha noção do bem que sempre nos fez!

À equipe gestora, professoras e funcionários da Escola Municipal que sediou a pesquisa, meus sinceros votos de gratidão. Em especial, Adriana Toledo, outrora vice gestora da instituição que intermediou os primeiros contatos para o aceite da escola na participação da pesquisa.

À professora participante da pesquisa, que permitiu nossa entrada e permanência em sua sala de aula, a você meu respeito e admiração pelo trabalho desenvolvido no atendimento de seus estudantes.

Às crianças da turma investigada, pela forma amorosa e “curiosa” com a qual fui recebida no espaço que a elas pertencia.

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“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu” (Eclesiastes 3:1)

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RESUMO

A presente dissertação teve como objetivo compreender os eventos de letramento ocorrentes em uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental, com foco no ensino de produção de textos. A pesquisa foi realizada em uma escola pública do Município do Recife e trata-se de uma pesquisa qualitativa norteada a partir de princípios da perspectiva etnográfica. Para a coleta de dados lançamos mão de observações de aulas, no total de 19, com gravações de áudio de alguns episódios, registro no diário de campo e realização de entrevistas semiestruturadas: duas, a primeira realizada em dias anteriores a nossa incursão no lócus de pesquisa e a segunda, após uma breve análise de mapas de eventos que nos possibilitou a construção de uma visão ampla dos eventos de letramento ocorridos relacionando-os à forma com a qual a professora organizava e priorizava o que era proposto para as crianças. É importante salientar que esta pesquisa se insere em um projeto macro, intitulado: Eventos e práticas de letramento no contexto escolar: uma perspectiva etnográfica, desenvolvida pelo GPEALE, grupo que integramos durante todo o curso de mestrado. Nossa pesquisa buscou a compreensão dos fenômenos ocorrentes na sala de aula, na análise das interações e mediações ocorrentes neste espaço, partindo do pressuposto de que a cultura escolar fabrica as suas próprias formas de uso da escrita por meio da escolarização, originando as práticas do letramento escolar. Nesse estudo o letramento é compreendido como prática social, tendo como um dos principais aportes teóricos os Novos Estudos sobre o Letramento, campo epistemológico que empreende esforços na discussão sobre a existência de vários letramentos e que o mesmo difere entre os diversos contextos sociais e culturais. Os resultados da pesquisa apontaram 5 eventos de letramento na produção de textos que foram analisados no que toca as ações pedagógicas da professora. A análise evidenciou que a professora participante criou situações para assegurar momentos de produção de textos aproveitando circunstâncias advindas do cotidiano escolar. Nesses momentos a professora nos pareceu assegurar algumas condições de produção de texto, imbricadas no processo de escolarização da escrita, afastando o texto produzido na escola daqueles que circulam em outros espaços.

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ABSTRACT

This master thesis aimed at understanding the literacy events which occurred in a group 3rd year of elementary school, focused on the teaching of producing texts. The research was carried out in a public school in Recife and it has a qualitative approach guided by the principles of ethnographic perspective. In order to collecting data 19 classes were observed, some of them having audio recording, records on the field diary, and semi structured interviews: two of them, the first one took place some days before our incursion on the research locus, and the second one after a quick analysis of event maps which enabled us to have a holistic view about the literacy events which occurred, connecting them to the way the teacher organized and prioritized what was proposed to the children. It’s important to highlight that this research is inserted in a macro project entitled: Literacy practices and events in the school context: an ethnographic perspective, which is developed by GPEALE, a group we took part during the master course. Our research searched for understanding phenomena which occur in the classroom, on the analysis of interactions and mediations which occur in this space, starting from the assumption that Scholar culture makes its own way of writing usage by means of schooling, what origins the Scholar literacy practices. In this study, literacy is seen as a social practice, having the New Studies about Literacy as one of the main theoretical contributions, epistemological field which achieve efforts on the discussion about the existence of various literacies and that they differ when it comes to diverse social and cultural contexts. The results of the research pointed to 5 literacy events on text production that were analyzed concerning to didactic actions externalized by the teacher. The analysis made it clear that the participating teacher created situations to assure moments of text producing making use of circumstances from the school’s everyday life. In these moments, the teacher seemed to assure some conditions for text producing, but we also noticed in these actions enmeshed marks to the process of writing schooling, stepping the result of the production aside, the text which is produced at school, from the ones that circulate in other spaces.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 Observações realizadas 45

Quadro 2 Mapa de Eventos da aula de 15 /02/2016 58

Figura 1 Fachada da Escola Municipal das Crianças 63

Quadro 3 Funcionários da Escola Municipal das Crianças em 2016 67 Figura 2 Sala organizada em semicírculo no 1º dia de aula. 80 Figura 3 Alfabetário colorido impresso em folhas de ofício 81 Figura 4 Alfabetário em EVA e outros cartazes produzidos pela

professora (calendário e quadro de aniversariantes do mês)

81

Figura 5 Expositor numérico em formato de centopeia 82

Figura 6 Expositor de livros da sala. Acima cartazes produzidos pela professora

82

Quadro 4 Faixa etária do 3º ano A 2016 da Escola Municipal das Crianças 86 Quadro 5 Origens dos estudantes do 3º ano A da Escola Municipal das

Crianças

87

Quadro 6 Mapeamento quantitativo de eventos observados 92 Quadro 7 Mapeamento dos eventos de escrita do cabeçalho 93 Quadro 8 Mapa de eventos da aula de 17 de fevereiro de 2016 98 Quadro 9 Síntese dos eventos de produções de textos observados 103 Figura 7 Esboço da capa construída pela professora participante 104

Figura 8 Registro do bilhete escrito coletivamente 116

Figura 9 Texto produzido coletivamente pelos estudantes 116 Figura 10 Carta pessoal exposta na página 12 do LD de Língua Portuguesa 118

Quadro 10 Mapa de eventos da aula de 24/03/2016 119

Figura 11 Quadro com os registros da canção original e versos da paródia em vermelho

122

Quadro 11 Versos originais da canção de páscoa seguidos dos versos produzidos pelas crianças.

126

Quadro 12 Mapa de eventos do dia 24 de abril de 2016 128

Figura 12 Criança copiando a parlenda escolhida 129

Figura 13 Crianças registando a parlenda escolhida 130

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Figura 15 Crianças indo ao quadro para marcar suas escolhas no gráfico (1)

133

Figura 16 Crianças indo ao quadro para marcar suas escolhas no gráfico (2)

133

Figura 17 Crianças registrando o gráfico produzido coletivamente em papel quadriculado (1)

134

Figura 18 Crianças registrando gráfico produzido coletivamente em papel quadriculado (2)

135

Quadro 13 Mapa de eventos da aula de 20 de maio de 2016 136

Figura 19 Página 34 do livro de geografia 137

Figura 20 Página 35 do livro de geografia 139

Figura 21 Imagem 2 da questão 35 – planta tomada como base para a construção da legenda

141

Figura 22 Produção da legenda para a planta da imagem 2 da questão da página 35 do livro de geografia

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LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

15

DNER Departamento Nacional de Estradas e Rodagens 68

GPEALE Grupo de pesquisa em alfabetização e letramento 15

IDEB Índice de desenvolvimento da Educação Básica 78

INAF Instituto Nacional da Alfabetização 31

LD Livro Didático 49

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) 76

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra 51

NEL Novos Estudos sobre o Letramento 15

PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais 34

PPGE/UFPE Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco

19

RPA Região Política Administrativa 64

SAERE Sistema de Avaliação Educacional do Recife 77

UFPE Universidade Federal de Pernambuco 69

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

2 LETRAMENTOS ... 25

2.1 Letramento: único problema ou única solução? ... 25

2.2 Os Novos Estudos sobre o Letramento (NEL) ... 27

2.3 Letramento no brasil, um neologismo? ... 30

2.4 Letramento escolar: caminhos e descaminhos ... 32

2.5 Ler e produzir textos: práticas de letramento interligadas ... 33

2.6 O ensino de produção de textos ... 35

3 O PERCURSO METODOLÓGICO ... 39

3.1 A perspectiva etnográfica como ferramenta de investigação ... 39

3.2 Elementos de coleta de dados ... 43

3.3 Formas de organização dos dados: os eventos de letramento ... 50

3.4 A “sala de aula” e a “aula”: espaço e prática culturais ... 52

3.5 O campo de investigação e os sujeitos participantes ... 59

3.5.1 A busca pelo campo de pesquisa ... 59

4 EVENTOS DE LETRAMENTO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS ... 92

4.1 Caracterização geral dos eventos observados ... 92

4.2 A escrita do cabeçalho escolar ... 93

4.3 Produzindo a etiqueta de identificação do caderno de classe ... 103

4.4 Produzindo um bilhete para os pais ... 107

4.5 Produzindo uma paródia coletivamente ... 118

4.6 Produzindo coletivamente um gráfico de colunas ... 127

4.7 Produzindo legenda para uma planta ... 136

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 145

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1 INTRODUÇÃO

À escola é socialmente atribuído o papel de mediar e oportunizar o acesso ao conhecimento sistematizado das diversas áreas. Assim, também não é diferente no que compete à escrita.

Norteados por essa afirmação, percebemos que a escola assume o papel de representante da “cultura letrada”, uma vez que é nesse espaço que majoritariamente atribui-se o aprendizado da escrita.

Dessa forma, nossas inquietações de pesquisa perpassam pelo intuito de compreender os eventos de letramento na produção de textos ocorrentes em uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal da Cidade do Recife. Neste estudo veiculamos nossa compreensão para com as marcas da escolarização da escrita construídas na esfera escolar, para tanto, não convém desconsiderarmos e ou negarmos o processo de escolarização. Faz-se necessário compreendê-lo como elemento constitutivo da cultura escolar. Assim, nos alinhamos com o que justifica Soares (2011, p. 11)

Não há como ter escola sem ter escolarização de conhecimentos, saberes, artes: o surgimento da escola está indissociavelmente ligado à constituição dos “saberes escolares”, que se corporificam e se formalizam em currículos, matérias e disciplinas, programas, metodologias, tudo isso exigido pela invenção, responsável pela criação da escola, de um espaço de ensino e de um tempo de aprendizagem.

O pensamento da autora nos possibilita o desvencilhamento da ideia pejorativa da escolarização e nos faz pensar que o problema não se dá pela existência do processo que é inevitável, porém nos incentiva a pensar como ele ocorre, como se materializa, e como o mesmo impacta os processos de ensino e aprendizagem.

Ao observamos o cotidiano escolar, podemos perceber como a escrita pode materializar-se de diversas formas, tanto no seu ensino, quanto em seu uso: suas funcionalidades e especificidades. Rockwell (1985), em estudo etnográfico com campo de pesquisa formado por oito escolas de tipos distintos, da terceira a sexta séries do primeiro grau, no México, apontou resultados que constataram que o ensino da escrita se configura nas seguintes categorias: 1) aprendizagem da estrutura da língua, 2) os usos especificamente escolares da língua escrita e 3) a aquisição de outros conhecimentos escolares através da língua escrita.

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Imersos nos resultados obtidos pela autora, no que tange os usos da escrita no contexto escolar, passamos a nos questionar: “Como ocorrem os de eventos de letramento no ensino de produção de textos na escola?”. No presente trabalho, nos debruçamos nesse questionamento, tendo como lócus de pesquisa uma turma final do ciclo de alfabetização, o 3º ano do Ensino Fundamental.

Os resultados destacados por Rockwell (1985) também nos fizeram considerar que os usos da escrita no contexto escolar assumem forma peculiar a essa instituição, pois atendem seus objetivos, necessidades, especificidades e funcionalidades. Essas evidências nos aproximam da definição de letramento escolar indicada por Bunzen (2010), que o define como “[...] um conjunto de práticas socioculturais, histórica e socialmente variáveis, que possui uma forte relação com os processos de aprendizagem formal da leitura e da escrita, transmissão de conhecimentos e (re)apropriação de discursos” (BUNZEN, 2010, p. 101).

É importante salientar que esta pesquisa se insere em um projeto macro intitulado: Eventos e práticas de letramento no contexto escolar: uma perspectiva etnográfica, submetido e aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), coordenado pela professora Dra. Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo. O projeto é uma ação do Grupo de Pesquisa em Alfabetização e Letramento (GPEALE), no qual nos engajamos desde o início de nossos estudos no curso de mestrado. O grupo é formado por professores e estudantes da Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Federal de São João Del Rei. Outrossim, alguns componentes o integram como convidados – são profissionais da Educação Básica que atuam como docentes e como formadores na Rede Municipal de Educação da Cidade do Recife.

O GPEALE tem como objetivo a orientação de pesquisas que abordam eventos e práticas de leitura e escrita em turmas do Ensino Fundamental. Também se compromete com a ampliação da compreensão do conceito de práticas e eventos de letramento em contextos escolares, visando uma perspectiva interdisciplinar, aglutinando conhecimentos das áreas da Educação, dos Novos Estudos sobre o Letramento (NEL)1 e a teoria bakhtiniana da enunciação.

1 A sigla NEL será utilizada em nossos registros sempre que fizermos menção aos Novos Estudos Sobre o Letramento, um dos alicerces teóricos desse estudo. NEL se refere ao campo epistemológico que compreende os usos e os significados da escrita de maneira contextual para com os diferentes grupos sociais. Tem como percussor Brian Street, que a partir de investigações antropológicas no Irã na década de 80 constatou que os significados do letramento estão imersos em práticas culturais

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As discussões oriundas do GPEALE contribuíram de maneira significativa com a nossa formação enquanto pesquisadora. E o aporte teórico que tem embasado os encontros de estudo, potencializou nossa aproximação com aspectos teóricos e metodológicos que se alinham às nossas intenções de pesquisa.

Os acordos e decisões construídos coletivamente no grupo no que tange à pesquisa macro e aos subprojetos de pesquisa impactaram positivamente a aprendizagem, a investigação, as expectativas de pesquisa anteriores e, consequentemente, o redirecionamento dos olhares dos pesquisadores – tendo ganho revelo uma relação coerente e respeitosa com os sujeitos de pesquisa a serem retratados em dissertações e teses.

Articulada aos princípios que subsidiam os estudos do GPEALE, nossa pesquisa buscou a compreensão dos fenômenos ocorrentes na sala de aula, na análise das interações e mediações ocorrentes neste espaço, partindo do pressuposto de que a cultura escolar fabrica as suas próprias formas de uso da escrita por meio da escolarização, originando as práticas do letramento escolar. Dessa forma, nossos interesses de pesquisa apresentam-se na busca da compreensão de como ocorrem as práticas de letramento quanto ao ensino de produção de textos oportunizadas organizadas e mediadas por uma professora, aos estudantes do 3ª ano do Ensino Fundamental.

Nos comprometemos com os eventos de produção de textos como o objeto de investigação que permeará as discussões a serem apresentadas nesta pesquisa. Porém, ao elegermos tal objeto, vale explicitar que não nos desvencilhamos dos demais eventos ocorrentes na dinâmica da sala de aula, pois acreditamos que os elementos do letramento escolar se apresentam de maneira constitutiva, não de maneira isolada.

Em nosso estudo o letramento é compreendido como prática social (STREET, 1984), o que nos faz reconhecer a existência de múltiplos letramentos que variam mediante o tempo e o espaço e os diversos contextos e culturas. Essa forma de conceber o letramento vai de encontro a correntes que o focalizam como elemento que valora apenas a aquisição de habilidades linguísticas e ou cognitivas.

arraigadas e ou relacionadas aos diferentes contextos que, por vezes, não são reconhecidos e ou legitimados. Para tanto, os NEL nos sensibilizam sobre a compreensão do letramento como prática social, nos fazendo reconhecer a existência de diversos letramentos.

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Os novos Estudos Sobre o Letramento (NEL) buscam uma mudança importante da visão dominante de letramento que o apregoa como habilidade “neutra”. Os estudos de Street (1984) são um dos aportes teóricos que alicerçam a forma com a qual tratamos os usos da escrita na escola no que toca à produção de textos. Sendo assim, defendemos que o contexto escolar em que estivemos inseridos no decorrer da pesquisa, influencia, afeta e condiciona a significação da escrita ali produzida.

Discutiremos os modelos de letramento autônomo e ideológico cunhados por Brian Street, percursor desse campo epistemológico. Para além, versaremos sobre as práticas e eventos de letramento, sendo esse último elemento importante para nossa pesquisa, pois configura-se como objeto de nossa investigação e serão analisados a partir das contribuições de Heath (1982, 1983, 2004) retomadas aqui no Brasil em Kleiman (1995) e Marinho (2007) pesquisadoras dos espaços de materialização da escrita como a escola e /ou salas de aula.

Assim nosso estudo alinha-se com o que afirma Marinho (2007, p. 4) ao tratar do campo epistemológico dos Novos Estudos do Letramento.

A concepção de letramento que vem ganhando hegemonia, no Brasil, é fruto de uma divergência entre os estudos interessados nas grandes consequências cognitivas, históricas e culturais atribuídas à escrita e aqueles interessados nas “práticas locais ou situadas” de letramento, uma corrente que se autodenomina Novos Estudos sobre Letramento - New Literacy Studies (NLS). Quando usamos os termos Modelo autônomo, modelo ideológico, práticas de letramento, eventos de letramento, estamos aderindo a uma concepção de escrita, de linguagem, de cultura, portanto, a uma concepção específica de letramento.

Os eventos de letramento no ensino de produção de textos observados em um lócus específico, a sala de aula, espaço aqui compreendido como produtor e reprodutor de cultura (MACEDO, 2005), onde os processos de ensino e aprendizagem são compreendidos como elementos que emergem da interação entre os participantes, professores e alunos, em nosso estudo também são compreendidos e analisados a partir das contribuições advindas de Barton (1994).

Nossa proximidade com o campo conceitual da produção de texto vem da nossa experiência enquanto professora no ciclo de alfabetização em consonância com nossa formação inicial no curso de Pedagogia, uma vez que já lecionávamos, devido à formação que possuímos advinda do antigo curso de magistério.

Passando cerca de uma década ministrando aulas como professora polivalente nos anos iniciais nas redes de ensino pública e privada, pudemos mobilizar

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conhecimentos veiculados na formação em Pedagogia, logo após em uma especialização em alfabetização vivenciada concomitantemente com a docência, como também na vivência de metodologias advindas do cotidiano escolar, formações continuadas proporcionadas pelas redes às quais atendíamos e na observação e reflexão sobre a nossa própria prática e a prática de nossos pares.

No decorrer da carreia docente, tivemos a oportunidade de sempre estarmos inseridos em grupos de profissionais da educação voltados aos anos iniciais, bastante engajados na defesa de ensino de qualidade socialmente referenciada na escola pública. Mesmo diante de diversas problemáticas, era nítido nessas equipes o desejo de assegurar, na medida do possível, o direito ao acesso e permanência dos estudantes na escola, buscando oportunizar situações que promovessem a aprendizagem nas diversas áreas de conhecimento. Comumente, fazíamos uso da metodologia de projetos, que eram pensados, planejados e propostos a partir de temáticas do interesse do público que atendíamos: os estudantes e os demais segmentos da comunidade escolar.

Existia no fazer pedagógico da equipe uma preocupação enfática com o ciclo de alfabetização. Era nosso desafio maior, alfabetizar as crianças inseridas nele. As professoras que atendiam às turmas do ciclo eram aquelas que tinham o “perfil de alfabetizadora”. Na equipe em que atuávamos, construímos e recebemos essa identidade de professora alfabetizadora e com o passar dos dias e anos letivos, partindo sempre da análise das práticas promovidas, percebemos a importância e a necessidade de um ensino de língua voltado a uma concepção de interlocução (GERALDI, 1997).

Em análise constante de nossa prática, percebemos a ausência de momentos previamente pensados e planejados para o ensino de produção de textos aos estudantes a nós confiados. Detectamos que quando esses momentos ocorriam não pareciam interessantes ou não atendiam às demandas e necessidades da turma. Os objetivos, a graduação e as formas de organização dessas atividades deixavam a desejar, o que, por conseguinte, resultava na produção apresentada pelas crianças. E, ao dialogar e refletir com nossos pares na escola, percebemos que essa problemática era marcante em nosso grupo de professoras.

Dessa forma, aspirando o retorno à vida acadêmica nos submetemos à seleção para o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGE/UFPE), trazendo as inquietações de ordem pedagógica e

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profissional para proximidade de um estudo mais aprofundado dos aportes teóricos que tratassem das ações pedagógicas para o ensino da escrita desenvolvidas na escola, partindo das seguintes problemáticas: “Como ocorrem as propostas de produção de texto no 3º ano do Ensino Fundamental?”2, “Quais eventos e práticas emergem dessa ação de produzir textos?”, “Que estratégias didáticas usam as professoras no intuito de ensinar os estudantes a produzirem textos?”.

Diferentes estudos, cujo objeto são as ações pedagógicas que tratam do ensino da produção de textos na escola (LEAL, 2004; GUERRA, 2009; CRUZ, 2012; GIRÃO, 2011; VARELLA, 2013; ANDRADE, 2015), demonstram que, na maioria das vezes, essas são perpassadas por lacunas que limitam as possibilidades de os estudantes apreenderem as especificidades e as finalidades de textos produzidos na sociedade. Tal problemática nos mostra que se faz necessário empreender esforços na publicação de estudos que abranjam este elemento do letramento escolar: a produção de texto. Estudos que apostem na tentativa de contribuir no planejamento e mediação dessas práticas para que através delas os estudantes sejam capazes de produzir textos que atendam às demandas da nossa sociedade letrada, porque:

Ensinar a produzir textos realmente não é tarefa fácil, pois exige que o próprio professor tenha consciência sobre as estratégias necessárias e sobre as dimensões de textualidade que precisam ser objeto de reflexão do aluno, ou seja, tanto o professor quanto o aluno precisam ter consciência de que no processo de produção de texto, se faz necessário planejar e executar as ações tanto no plano geral, que diz respeito à ideia central do texto e à estrutura geral, como também nos planos específicos, relativos às partes do texto. Eles devem estar atentos às particularidades dos diversos elementos que compõem o texto. (GUERRA, 2009, p. 14).

Em um ensino alicerçado na concepção de linguagem como interação, é premissa a evidência de atividades que busquem tratar a língua como elemento socialmente produzido (ALMEIDA, 2012). Dessa forma, as práticas constituintes do letramento escolar devem se aproximar das práticas e usos de outros contextos sociais da escrita. Ao analisarmos o uso da escrita em nosso cotidiano, perceberemos a existência de finalidades em nossas interações, sejam das mais simples como: anotar algo na agenda, redigir um bilhete, enviar mensagens, e-mails, até as mais complexas, como redigir um artigo científico e escrever uma carta de reclamação à

2 Na seção referente aos aspectos metodológicos nos posicionamos sobre o que justifica a escolha desta etapa do ciclo de alfabetização, o 3º ano do Ensino Fundamental, como lócus da pesquisa.

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prefeitura. Dessa forma, acreditamos que no contexto escolar os usos situados e contextualizados da escrita não deveriam passar desapercebidos.

Pautado nessa constatação, Geraldi (1997) nos ensina que para produzir um texto é necessário que se tenha não somente o que escrever, mas também para que e para quem escrever. Tais informações servirão, então, para orientar tanto a escolha do gênero de texto como a escolha dos recursos linguísticos a serem utilizados por quem produz o texto.

Dessa forma, faz-se necessário promover para os estudantes atividades que envolvam situações de escrita que também possibilitem as condições de produção de texto, partindo de situações que surjam do ambiente escolar ou mesmo criadas pelos professores. Como alertam Girão e Brandão (2011, p. 126):

Escrever um cartão de aniversário para a diretora, um bilhete para os pais, histórias para compor um livro [...] o importante é que a escrita apresente uma finalidade clara e um destinatário, sendo explicitado um gênero textual a ser produzido. É por meio desse contexto chamado de condições de produção textual, que as crianças podem pensar sobre quem, para que o que escrevemos (assim como, de fato, fazemos nos diversos momentos de nossa vida em que nos deparamos com a tarefa de escrever um texto).

Ao analisar a contribuição das autoras, no tocante às condições de produção de texto, podemos perceber a relação estabelecida entre as condições de produção e usos da escrita, que é um modo de interação entre as pessoas, onde, sobretudo, existe um objetivo que nos impulsiona a escrever (a finalidade), nos dirigimos, interagimos com alguém através da escrita (o destinatário/o interlocutor), esse registro escrito comumente possui uma forma socialmente estabilizada (o gênero).

Proporcionar atividades na escola que possibilitem um ensino de produção de texto, buscando promover as condições de produção, é ir de encontro ao que denunciam Góes e Smolka (1992). As autoras explicitam que é comum em práticas de produção de texto na escola onde a finalidade da escrita é o exercício, e o professor o único destinatário, que corrige e avalia a produção, a partir de certos critérios por ele selecionados, o que empobrece a interação e as possibilidades de destinação do que foi redigido.

Nosso objeto de pesquisa focaliza a compreensão dos eventos de letramento na sala de aula, com foco naqueles onde o ensino de produção de textos se materialize. Nosso estudo compromete-se com a análise das ações pedagógicas da

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professora, a partir das teorias que nos aproximam do campo conceitual da produção de texto.

Entendemos que é preciso, mais do que julgar e avaliar a prática pedagógica, compreender as razões que fazem determinados elementos serem validados pela tradição ou pela experiência do professor. Como nos alerta Tardif (2013), é preciso analisar o contexto em que as ações do professor são postas e refletir sobre as razões que levam os professores a organizarem dessa forma suas dinâmicas. Chartier (2000), nos faz perceber o quanto é redutor analisar o que efetivamente é realizado pelo professor em sala de aula com base no paradoxo entre o que seria tradicional e/ou inovador.

Nossa aspiração é compreender as ações pedagógicas da professora ao proporcionar a seus alunos eventos de letramento no ensino de produção de textos, portanto, optamos por “dar voz a professora” concebendo seu discurso e sua prática como fonte privilegiada de dados sobre o letramento escolar.

Quando fazemos uso do termo “dar voz à professora”, fazemos referência aos dizeres dela ao longo de toda a pesquisa: nas aulas ministradas, em conversas informais, nas duas entrevistas realizadas e nos eventos materializados em suas ações pedagógicas. Esses elementos serão discutidos em seções vindouras desse estudo.

Como objetivo geral, apontamos:

Compreender os eventos de letramento ocorrentes em uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental, com foco na produção de texto.

De maneira específica, elencamos:

A) Mapear e descrever dentre os eventos de letramento observados em sala, os episódios que especificamente apresentem o ensino de produção de texto promovidos pela professora.

B) Analisar as práticas de ensino de produção de texto mapeadas, como também as mediações desenvolvidas pela professora durante este processo.

C) Elencar as estratégias e recursos metodológicos utilizados pela professora no ensino de produção de textos.

Sobre a organização da dissertação, seu corpo constitui-se de 3 capítulos, assim distribuídos: no capítulo LETRAMENTOS, discutiremos sobre o termo letramento, partindo, a princípio, de uma visão que nega a relação de causa e efeito do letramento, desmistificando as concepções que atribuem ao mesmo a resolução

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de todos os problemas de ordem social. Trataremos também do campo epistemológico ao qual nos filiamos, os Novos Estudos sobre o Letramento.

Mobilizaremos uma discussão sobre os principais conceitos do NEL: letramento ideológico, letramento autônomo, práticas de letramento e eventos de letramento. Os últimos, apresentam-se como elementos de extrema importância para a materialização desse estudo que compromete-se com a compreensão dos eventos de letramento ocorrentes no lócus de pesquisa, focalizando os eventos de produção de textos.

Para além disso, trataremos da incorporação do termo letramento no Brasil como neologismo polissêmico. Também discutiremos sobre o letramento escolar e sobre as práticas constitutivas do ler e escrever na escola. Por fim, tematizaremos sobre o ensino de produção de textos.

No capítulo PERCURSO METODÓLOGICO apresentaremos nossa justificativa para o desenvolvimento de um estudo que faz uso da perspectiva etnográfica como ferramenta de investigação, que teve como elementos de coleta de dados: a observação em registro em diário de campo, com uso também de gravação de algumas aulas e de entrevistas semiestruturadas. Relatamos nossas tentativas para encontrarmos uma escola que desejasse sediar a pesquisa macro, que incorpora essa dissertação. Também justificamos a nossa escolha pelo 3º ano do Ensino Fundamental como campo a ser investigado.

Clarificamos nossa compreensão de sala de “aula” e de “aula” como espaço e prática cultural e apresentamos a forma a qual elegemos para organização dos eventos de letramento observados, os Mapas de eventos, apontando algumas pesquisas que também adotaram esse recurso.

Feito isso, apresentamos informações pertinentes à Escola Municipal das Crianças, fazendo uso de nossas apreciações advindas de nossas observações, aglutinando-as aos elementos presentes no Projeto Político Pedagógico da instituição.

Tematizamos também sobre os participantes da pesquisa: a professora e as crianças. Sobre a professora, abordaremos informações sobre sua formação e principais marcas em suas ações pedagógicas a partir da concomitante análise do discurso proferido nas entrevistas realizadas.

Sobre as crianças que constituíram a sala de aula investigada, o 3º ano A, apresentaremos algumas inquietações advindas de duas problemáticas: o alto índice

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de crianças que iniciaram o ano letivo de 2016 com resultado de retenção – 11 delas, em uma turma com total de 21 crianças –, o que, consequentemente, evidencia a segunda problemática, que é a distorção idade/ano apresentada por contingente representativo de crianças.

Na construção desse capítulo, a obra de Paulo Freire contribuiu para a realização de algumas análises de dados advindos do período de incursão no campo, no que se refere às marcas nas ações pedagógicas da professora, e a necessidade de veicularmos o contexto que compõe a sala de aula investigada para uma maior compreensão dos elementos constitutivos dessa realidade e consequentemente o objeto de pesquisa: os eventos de letramento que focalizam a produção de texto.

As contribuições de Freire são tomadas como referência devido às aproximações entre a concepção de alfabetização do autor e os Novos Estudos sobre o Letramento (BARTLETT; MACEDO, 2015); pela indicação de Street (2014) que analisa as contribuições do autor como uma abordagem que partiu da conscientização, e assim permitiu aos pobres e oprimidos a investigação e a análise de suas fontes de opressão; e, por intermédio da escrita e em Gadotti (2005), que defende que a concepção de alfabetização de Freire alinha-se com o que Street (1984) nomeou como modelo ideológico de letramento, ao considerar que as práticas de escrita são social e culturalmente determinadas pelo contexto.

O capítulo OS EVENTOS DE LETRAMENTO NO ENSINO DE PRODUÇÃO DE TEXTOS elucida nossas interpretações e análises de uma das marcas do uso da escrita na sala de aula observada, a escrita do cabeçalho escolar, ocorrente quase que diariamente, em um total de 11 eventos durante o período em que estivemos imersos no campo.

Apresentaremos as análises dos 5 eventos de produção de texto observados ao longo da pesquisa: 1) Produção da etiqueta de identificação para o caderno de classe, 2) Produção coletiva de um bilhete para os pais dos alunos da turma, 3) Produção coletiva de uma paródia, 4) Produção coletiva de um gráfico de colunas e 5) Produção de uma legenda para figura no livro didático de geografia.

Seguiremos a ordem cronológica dos eventos com a qual foram se materializando no cotidiano da sala de aula. Os eventos foram descritos a partir de excertos de nosso diário de campo e analisados a partir da triangulação que relaciona o marco teórico que alicerça nossa pesquisa, dados advindos do contexto

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observado nas ações pedagógicas da professora, na interação entre ela e as crianças e na fala da professora nas entrevistas realizadas.

Findada a exposição dos capítulos, apresentaremos nossas considerações finais que, além de tratar sobre aspectos conclusivos desse estudo, aborda nosso encontro de devolutiva dos dados da pesquisa para com a escola investigada.

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2 LETRAMENTOS

O alicerce teórico que subsidiará nossa pesquisa perpassará pelas inquietações e defesas de Graff (1994), quando problematiza sobre a importância de questionarmos a relação de causa e efeito atribuída ao letramento no desenvolvimento de uma sociedade. Versaremos também sobre o NEL (STREET, 2010), pois acreditamos que as concepções ligadas a esse campo potencializarão nossa compreensão sobre a diversidade de letramentos existentes e que as práticas de leitura e escrita estão concernentes aos usos sociais dos diversos grupos. Ainda nessa perspectiva abordaremos as contribuições dos conceitos de práticas e eventos de letramento nos subsidiando em Heath (1982, 1983) e Barton (1994).

Trataremos sobre o neologismo do letramento no Brasil, também nos debruçaremos sobre o letramento escolar, já que nossa pesquisa perpassa pelas práticas ocorrentes nela.

2.1 Letramento: único problema ou única solução?

Para refletirmos sobre letramento, precisamos retomar alguns contextos sociais, históricos e políticos e, sobretudo, a contínua legitimação da desmistificação do mesmo ao ser compreendido como fórmula única e reparadora de todos males sociais. Graff (1994), contradiz perspectivas parcialmente abandonadas que atribuem a aquisição do letramento como fator determinante para o desenvolvimento da condição humana. A discussão deste autor nos possibilita entender “o mito do letramento”, posicionando-se contra a relação de causa e efeito na visão hegemônica de letramento: o desenvolvimento econômico, cultural e social dos indivíduos teriam supostos efeitos e consequências diretas do letramento por eles obtido, e que, se as sociedades assegurassem a todos os seus cidadãos “acesso” ao letramento, todos os problemas de diversas ordens seriam resolvidos.

Diante disso, o autor pontua três tarefas necessárias para que se possa estudar o letramento: 1) a definição constante do termo letramento; 2) A definição do termo levando-se em conta que se trata de uma tecnologia ou um conjunto de técnicas para comunicação e a decodificação e reprodução de materiais escritos ou impressos, nesse aspecto o letramento deve ser visto como uma base, um fundamento não como

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conclusão; e, 3) A reconstrução dos contextos da leitura e da escrita, buscando compreender: como, quando e para quem ela se destina.

Para a compreensão do mito do letramento, Graff (1994) ainda nos alerta para a necessidade do desvencilhamento da dicotomia oralidade-escrita. Em sua contribuição teórica, o autor faz um resgate histórico e nos convence que com o surgimento da “tecnologia da escrita”, um dos seus principais objetivos era registrar a fala, nos mostrando que ambas (oralidade e escrita) interagem e condicionam-se uma a outra, não havendo supremacia entre essas ferramentas.

O que precisa ser apreendido é que o oral e o escrito, como o manuscrito e o impresso, não precisam ser colocados em oposição como simples opções. A história humana e os desenvolvimentos humanos não se realizam dessa forma. Em vez disso, eles permitiram que ocorresse um processo rico e profundo de interação e condicionamento recíprocos à medida que o letramento ganhava aceitação e influência [...] por muitos séculos, a própria leitura era uma atividade oral, frequentemente coletiva e não a atividade privada, silenciosa, que nós conhecemos hoje. (GRAFF, 1994, p. 37).

As indagações de Graff (1994) também ganham relevo quando o autor defende a existência de vários tipos de letramento, inclusive aqueles não submetidos à escolarização e ou escrita hegemônica, por isso, invisibilizados. O autor também tece críticas as avaliações de níveis de letramento (alicerçados na escolarização) onde os resultados são associados ao desenvolvimento econômico dos indivíduos, como aquelas realizadas por organismos internacionais tais como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). A tese do autor está imbricada na negação de causa e efeito atribuída ao letramento. Essa constatação é nítida quando afirma “O letramento não é o único problema. Ele também não é a única solução” (GRAFF, 1994, p. 52)

Alguns elementos destacados pelo o autor, contribuem para a análise e desmistificação do mito do letramento, tais como: o reconhecimento de vários letramentos, a tentativa de fuga à dicotomia do escrito e o oral, a denúncia da invisibilização de espaços voltados à apropriação e vivência do letramento nos remete ao campo conceitual denominado NEL que também é aporte teórico norteador dessa pesquisa.

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2.2 Os Novos Estudos sobre o Letramento (NEL)

O campo denominado NEL, respalda-se na perspectiva etnográfica, tendo como grande precursor Brian Street que, ao pretender realizar pesquisa sobre migração, teve seu foco de estudo modificado quando passou a se interessar pelas práticas de letramento ocorrentes numa vila do Irã, na década de 70, considerada uma vila de analfabetos. O autor nos revela que ao fazer uso de recursos etnográficos procurou entender como os moradores da vila estavam envolvidos com materiais escritos (contas relativas à venda, textos do Alcorão, nas leituras voltadas à escola religiosa). Ele aponta que os significados do letramento estavam intrinsecamente relacionados às práticas culturais da comunidade, sobretudo ele buscava captar a relação existente entre esses eventos e pôde verificar como eram reconhecidos e legitimados (ou não) por diferentes grupos sociais. Tal experiência vivida no Irã problematizou o olhar do autor em outros países (África do Sul, Nepal e na índia).

As apreciações de Street (2010) indicam que existe uma variedade de letramentos decorrentes das necessidades de usos da leitura e da escrita de determinado grupo social. Dessa forma, o autor tece críticas à perspectiva evolucionista, que baliza a sociedade em escalas (inferiores e superiores), que trazem implicações valorativas ao letramento hegemônico, e cunha as definições de letramento autônomo e letramento ideológico. No primeiro, prejulga-se uma única forma de ser letrado, o letramento é visto de maneira descontextualizada, ancora-se na estrutura hegemônica das práticas de leitura e escrita. Já o segundo, ratifica as diversidades de modelos culturais, portanto reconhece a pluralidade de letramentos, e valoriza as diversas maneiras de concepção desse conhecimento.

Marinho (2010) nos situa bem no campo dos NEL, ao fazer uma apresentação cronológica em que explicita a ocorrência da grande divisão criada entre as culturas ágrafas e culturas grafocêntricas alicerçada nas publicações Literacy in traditional society (GOODY, 1968) e “As conseqüências do letramento” (WATT; GOODY, 1963), The Domestication of the Savage (MIND, 1977), que apontam em seus resultados a dicotomia entre oralidade e a escrita. Ainda neste contexto cronológico, a autora retrata a contraposição das ideias pertinentes da grande divisão partindo dos dados das pesquisas: Ways with Words, Shirley Heath (1983); Literacy in Theory and Orality, Ruth Fineegan (1988); e, Psychology of literacy, Scriber e Cole (1981), que

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evidenciam uma ruptura com as ideias anteriormente defendidas pelos adeptos da grande divisão.

Comungam com as ideias difundidas por Street, autores estrangeiros como: Heath (1983, 2004), Barton (1994, 2000,), Gee (2004) e Kalman (2004). Dentre os brasileiros, destacam-se: Kleimam (1995), Macedo (2005, 2010), Castanheira et al. (2007, 2013), Rojo (2009), Costa (2010), Marinho (2010) e Bunzen (2014), que também assumem um posicionamento concernente ao letramento ideológico, uma vez que indicam a necessidade de reconhecimento dos diversos tipos de letramento, suas relações com os contextos usuais, do contexto cultural e social e transitam pelo espectro teórico que rompe com a dicotomia valorativa do escrito sobre o oral.

O conceito de eventos de letramento cunhado por Heath (1982, p. 93, grifo nosso) potencializa também a compreensão dos NEL: “um evento de letramento é qualquer situação em que um portador qualquer de escrita é parte integrante da natureza das interações entre os participantes e de seus processos de interpretação”. A autora menciona que podemos entender por eventos de letramento as cenas em que as relações sociais com a escrita ocorrem. É a cena, o dado observável, na qual a escrita estabelece determinadas práticas, ou seja, o evento retrata a relação entre as pessoas e a linguagem escrita. A construção deste conceito está apresentada na pesquisa onde que ela dedicou-se a um estudo etnográfico em pequenas comunidades do Sul dos Estados Unidos, onde foi constatado que o mesmo evento de letramento (leituras e contação de histórias para crianças pequenas) configurava-se de maneiras distintas e relacionava-configurava-se com os contextos das práticas de letramento oriundas destas comunidades, relacionava-se intrinsecamente com as questões sociais e culturais de uso e valoração dessas práticas. Como bem analisa Chagas (2011, p. 50):

O trabalho de Heath contribuiu para a visão de que as comunidades constituídas por diferentes relações com a linguagem oral e a escrita estão sempre se transformando e sendo transformadas por essas relações, nem sempre tranquilas, muitas vezes conflituosas, mas sempre complexas. Mostrou também que uma orientação única de letramento tomada como universal e válida (modelo autônomo para Street) pode criar equívocos na nossa sociedade.

Por intermédio dos conceitos de eventos de letramento e práticas de letramento, presentes no campo epistemológico dos NEL, realizamos a investigação dos eventos de letramento com foco na produção de texto no lócus de nossa pesquisa, uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental. Lançamos mão das contribuições de

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Vóvio (2007, p. 82), que com base em Street (1984) também trata sobre os aspectos envolvidos na utilização desse conceito enquanto unidade de observação, uma vez que “a partir de uma metodologia etnográfica, de cunho qualitativo, a unidade de observação é o evento de letramento”.

Para a nossa pesquisa, a relação dos eventos de letramento com a perspectiva etnográfica é de extrema importância. Nossa opção pela abordagem etnográfica enseja apreender os fenômenos ocorrentes no contexto da sala. A opção pelo conceito de eventos de letramento em nossa pesquisa justifica-se pelo enquadramento dos elementos da etnografia, que aliada aos pressupostos teóricos dos NEL, nos auxiliou na exposição das nossas interpretações e análises acerca dos eventos de letramento na produção de texto observados no nosso período de incursão no campo.

Adotando o conceito de evento de letramento defendido na obra de Heat, Street (2014) difundiu um novo conceito: práticas de letramento,que possibilita ampliar e detalhar as análises e interpretações das práticas sociais que envolvem a escrita, tornando-se possível um aprofundamento no exame dos significados associados aos eventos de letramento.Para o autor, o conceito de eventos de letramento: “[...] enfatiza a importância de uma mescla de traços orais e letrados na comunicação cotidiana” (STREET, 2014, p. 146). Já o conceito de práticas de letramento orienta-se pelos usos e significados culturais relativos à leitura e escrita. O pensamento do autor alinha-se aos escritos de Barton (1994, p. 7), quando apresenta sua conceituação sobre práticas de letramento ao denominá-las como “[...] os modos culturais gerais de usar a leitura e a escrita que as pessoas produzem num evento de letramento”.

As considerações advindas dos NEL nos mostram o comprometimento dessa corrente conceitual que se consolidou no Brasil a partir da década de 1990, com o posicionamento crítico que reage à dicotomia “oralidade X escrita” e afasta-se da visão da valorização de aspectos cognitivos e psicolinguísticos da linguagem em detrimento de outras dimensões, focando-se na busca de práticas de leitura e escrita tidas como hegemônicas e que invisibilizam e marginalizam as demais maneiras de uso da leitura e escrita na sociedade.

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2.3 Letramento no Brasil, um neologismo3?

Ao rememorarmos as marcas cronológicas do Brasil sobre a classificação dos indivíduos, tendo como critério o domínio sobre as habilidades da leitura e da escrita, percebemos o surgimento de caracterizações como: alfabetizado, analfabeto, letrado e iletrado. O que nos chama atenção, como nos relembra Chagas (2011), é que esse tipo de classificação, a exemplo do instituído pela UNESCO, tem como ponto de referência demonstrações bem superficiais das habilidades da leitura ou da escrita, tais como, em tempos anteriores: a escrita do nome, a escrita de uma frase, a escrita de um bilhete.

Nessa época, o conceito de pessoas letradas e iletradas foi utilizado com a intenção de padronizar internacionalmente as estatísticas em educação. Entretanto, esse tipo de definição desconsidera a dimensão social do que é ser letrado ou iletrado, centrando-se apenas nas capacidades individuais de alfabetismo. (CHAGAS, 2011, p. 42). No Brasil, apenas na década de 90 o neologismo letramento foi utilizado para nomear os usos sociais da leitura e da escrita. Advindo do termo inglês literacy, que se refere às duas dimensões: a alfabetização e letramento. As diferenças entre essas dimensões já foram amplamente discutidas por autoras clássicas do campo, como Soares (1998) e Kleiman (1995). Para Soares (1998), a alfabetização foca no domínio do sistema de escrita alfabética e de suas particularidades. Já o letramento, é compreendido por um conjunto de práticas de escrita que se modifica a partir dos contextos sociais e culturais.

Pode-se dizer, portanto que a formulação e aplicação desse novo conceito resultaram de necessidades teóricas e práticas várias, em função dos avanços no modo de compreender as relações inter-humana, dos processos de participação social e do acesso e construção do conhecimento. (BRITTO, 2003, p. 51).

Em nossa literatura, o “neologismo” do letramento tem sido tratado, estudado e investigado de maneira ampla. Essa evidência é notada em Mortatti (2014) quando menciona as diversas formas como o campo do letramento tem sido compreendido, desde uma abordagem de caráter psicolinguística, Kato (1986), até à divulgação dos modelos autônomo e ideológico de Street, amplamente divulgados no Brasil por Kleiman (1995). Também cabe mencionar a difusão do próprio conceito no campo da

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educação, na prática docente (SOARES, 2001, 2004), na análise de diferentes aspectos das políticas do Instituto Nacional da Alfabetização (INAF) (RIBEIRO, 2003). O termo letramento é complexo e plural, pois abarca as dimensões da leitura e da escrita de forma ampla e as contrapondo para além da codificação e decodificação nos convencendo de que o letramento se materializa no uso social da diversidade de materiais escritos: “literatura, livros didáticos, obras técnicas, dicionários, listas, enciclopédias, quadros de horário, catálogos, jornais, revistas, anúncios, cartas formais e informais, rótulos, cardápios, sinais de trânsito, sinalização urbana, receitas […]” (SOARES, 2001, p. 69).

Os indivíduos imersos na sociedade letrada possuem uma relação já estabelecida com os materiais e são “invadidos pela cultura escrita”, o que nos faz pensar, nas diversas práticas de letramento uma vez que algumas pessoas podem conseguir atribuir sentido em sua leitura e ou em sua produção escrita em proporções mais elementares ou em mais elaboradas, a exemplo, ser capaz de redigir ou ler um bilhete, mas não demonstrar a competência específica de ler ou elaborar um artigo de opinião. Porém, independente da aquisição da leitura e da escrita, é fato que imersos em uma sociedade letrada, os indivíduos participam de eventos e práticas de letramento. Assim, concordamos com Chagas (2011, p. 43) ao afirmar que:

Mesmo que alguém não domine o código escrito, é praticamente impossível já não ter se envolvido, pelo menos conhecer um evento de letramento e participar de algum tipo de prática de letramento de acordo com o contexto social em que se está inserido.

Partindo do entendimento da diversidade do letramento e ancorados nas definições de modelo ideológico e autônomo difundidas por Brian Street, tomamos como empréstimo a orientação de Marinho (2010, p. 78), quando afirma que “o letramento é uma prática social, não simplesmente uma habilidade técnica e neutra. Trata-se de uma prática sustentada por princípios epistemológicos socialmente construídos”.

Na discussão aqui mobilizada percebe-se uma diversidade de conceituações e interpretações do termo letramento. Temos um neologismo integrante da língua portuguesa que pode ser considerado recente quando tratamos do campo da educação. Dentro do próprio campo encontramos tensões, discordâncias e reafirmações. O termo surge no intuito de conceituar as práticas de leitura e escrita e, não como sinônimo da alfabetização, mas também a inclui (KLEIMAN, 2005).

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Partindo de alguns elementos aqui mobilizados, trataremos na próxima seção como se configura o letramento de maneira coligada a uma das esferas sociais que o materializa em suas práticas: a escola.

2.4 Letramento escolar: caminhos e descaminhos

Ao nos aproximarmos de algumas discussões sobre o letramento e entendendo o contexto escolar como um dos espaços responsáveis pelo ensino da escrita, parece-nos interessante pensar quais práticas de letramento são usuais da escola ou para a escola e, antes disso, ratificar o que não pode ser considerado como letramento - a) letramento não é método, b) não é habilidade e c) não é alfabetização. Esses três elementos são pontuados por Kleiman (2005), quando se refere à necessidade de dialogar com professoras da Educação Básica – principais mediadores de práticas e eventos de letramento na escola.

A autora justifica que o termo letramento, muito antes de chegar à esfera escolar4, perpassa pela compreensão de outros campos de conhecimento (antropologia, sociologia, história) e é equivocadamente percebido e ou constituído como método. Dessa forma, Kleiman (2005) afirma que o ideal é que o letramento seja compreendido como a imersão dos indivíduos no mundo da escrita e que a escola pode corroborar com tal evidência a partir da promoção de atividades de leitura e escrita significativas, onde as construções e atribuições de sentido sejam ocorrentes. Ao tratar da compreensão equivocada que percebe o letramento como habilidade, a autora nos faz perceber que o letramento perpassa desde o contato formal com elementos da cultura escrita por intermédio do texto como de todas as ações voltadas para esse contato, que envolve muitas capacidades e conhecimentos que extrapolam a leitura e a escrita e perpassam pelo plano das ações, nessa sistemática a autora defende que na escola é possível:

1.Ensinar habilidades e competências para participar de eventos de letramento relevantes para a inserção e participação social;2. Ensinar como se age nos eventos de instituições cujas práticas de letramento vale a pena conhecer;3. Criar e recriar situações que permitam aos alunos efetivamente práticas letradas. (KLEIMAN, 2005, p. 9).

4 Tomamos de “empréstimo” a colocação de Bunzen (2010), que faz uso do conceito de Esfera ao tratar do letramento escolar, respaldado no aporte teórico dos estudos de Bakhtin.

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Ao negar que alfabetização e letramento são sinônimos, a autora esclarece que são processos diferentes, porém a alfabetização também constitui o letramento.

De acordo com Macedo (2005), muitos autores têm se debruçado sobre os estudos da escolarização do Letramento (SCRIBNER; COLE, 1981; BLOOME, 1987; COOK-GUMPERZ, 1991). Estes autores compreendem o letramento escolar como mais uma prática social que muda de acordo com o contexto, passando a ser considerada como uma das possíveis manifestações do letramento na sociedade. Para Kleiman (1995), as práticas escolares de uso da leitura e da escrita baseiam-se no modelo autônomo de letramento que considera e propõe a escrita como um produto descontextualizado e a sua aprendizagem como um processo individual.

Contrapondo-se a essa concepção, Bunzen (2010) nos alerta sobre a concepção do termo letramento escolar como algo negativo ou perverso, autônomo e estático por natureza. Para ele, o letramento escolar deve ser compreendido como um conjunto de práticas socioculturais, que possui uma forte relação com os processos de aprendizagem formal da leitura e da escrita e que as práticas de letramento ocorrentes nessa esfera refletem sobre as culturas escolares e apresentam cenas de letramento específicas que se submetem aos aspectos que caracterizam a escola como instituição.

2.5 Ler e produzir textos: práticas de letramento interligadas

Neste tópico tematizaremos sobre os campos teóricos que nos fazem compreender aspectos relevantes da leitura e da produção de textos, como também partiremos do entendimento de que ambas são práticas amplamente imbricadas no letramento escolar.

A relação existente entre as práticas de leitura e produção de textos é mencionada nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCNs) (1997), que atribui como objetivo do ensino de língua a formação de leitores e escritores competentes. Ao analisarmos o que fomenta o documento, podemos perceber a relação que é atribuída a esses dois elementos do letramento escolar: a leitura e a produção de texto. Percebemos no documento a defesa das práticas de leitura e de produção de texto de maneira constitutiva, onde a primeira forneceria “pistas” para a produção de um texto, que auxiliaria no que escrever e também

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contribuiria para a constituição de modelos de como escrever. Dessa forma, a segunda seria beneficiada por elementos da primeira.

Ao analisarmos os seguintes objetivos elencados nos PCNs para o primeiro ciclo, atualmente ciclo de alfabetização, podemos perceber que as habilidades da leitura e produção de texto apresentam-se de maneira complementar. Vejamos:

Ler textos dos gêneros previstos para o ciclo, combinando estratégias de decifração com estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação. Produzir textos escritos coesos e coerentes, considerando o leitor e o objeto da mensagem, começando a identificar o gênero e o suporte que melhor atendem à intenção comunicativa. (BRASIL, 1997, p. 68).

Em uma abordagem alicerçada na compreensão da língua como interação, a ideia de leitura como decodificação perde espaço e é ampliada e ou substituída pela concepção de que ler é atribuir, construir sentido. Orlandi (1996), ao assumir uma perspectiva discursiva da leitura em que a compreensão e a interpretação tornam-se foco, nos faz perceber que tanto a leitura como a escrita fazem parte do processo de instauração de sentidos.

A autora também aponta que o sujeito que realiza a leitura tem suas especificidades e história e que os sentidos atribuídos são determinados de maneira histórica e ideológica. A autora defende a relação existente entre atribuição de sentido e a legibilidade de um texto e seu posicionamento, também se contrapõe a uma visão de leitura unicamente ligada à relação sujeito leitor e material escrito. Para ela, a historicidade do sujeito e outros elementos são elencados como pontos importantes para a leitura e seu processo: “A leitura, portanto, não é uma questão de tudo ou nada, é uma questão de natureza, de condições, de modos de relação, de trabalho, de produção de sentidos, em uma palavra: de historicidade” (ORLANDI,1996, p. 9).

As implicações defendidas pela autora dialogam com os escritos de Goulemot (2009), que também discute sobre elementos externos ao texto, porém intimamente ligados à produção de sentidos. Ao tratar da especificidade do sujeito leitor, ele analisa seu processo de interação, o contato com o material escrito, percebendo e valorando desde a fisiologia, a história e elementos fora-do-texto, até a relação do acervo lido pelo leitor (denominado por ele de “biblioteca”) com a atribuição de sentidos aos textos lidos, que para o autor, sempre são polissêmicos.

Ao analisarmos as contribuições dos autores não poderíamos deixar de pensar quão importante é o papel da escola no que diz respeito à mobilização de um ensino

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