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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Luciana Scharpf

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Academic year: 2019

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Luciana Scharpf

Afetividade em sala de aula:

um estudo com adolescentes da rede pública de ensino

MESTRADO EM EDUCAÇÃO:

Psicologia da Educação

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Luciana Scharpf

Afetividade em sala de aula:

um estudo com adolescentes da rede pública de ensino

MESTRADO EM EDUCAÇÃO:

Psicologia da Educação

São Paulo

2008

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agradecimentos. Hoje, ao concluir essa etapa, posso compreender perfeitamente. A verdade é que sozinhos, o conhecimento não se constrói! Precisamos uns dos, e, por isso agradeço:

À Deus, por me encorajar e fortalecer nos momentos em que desejei desistir. Ás minhas professoras-orientadoras, Dra. Vera Mª Nigro de S. Placco e Dra. Abigail Alvarenga Mahoney.

Às professoras Vera Mª Nigro de S. Placco, mais uma vez, e Luzia Orsolon, por acreditarem em mim e a quem devo minha entrada na pós-graduação stricto

senso.

Às Maria Lucia Gulassa e Ione Dourado, por todo o incentivo e conversas que iluminaram meus pensamentos.

À PUC-SP.

À CAPES, pelo apoio financeiro, sem o qual eu jamais teria seguido adiante.

À minha tia Patrícia Scharpf, que também me ofereceu um apoio financeiro primordial para o término deste trabalho.

Ao meu noivo Rogério Tupiná, que foi um anjo que Deus colocou em minha vida, e me ajudou a seguir adiante.

À querida família Müller, que cuidam de mim de todo o coração, e aos quais sou imensamente grata!

À Compassion do Brasil pela paciência e por todo o apoio para que eu pudesse terminar essa pesquisa.

À toda minha família, pelo incentivo e pela paciência durante as ausências. À Raquel Ghencev, pela correção ortográfica deste trabalho.

Ao amigo Fabrício Nespoli e Sueli Leiva, por garantir um inglês de qualidade no

Abstract.

À Tabita Rothmann Gonzáles, por ser minha pesquisadora auxiliar na coleta de dados.

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vulneráveis socialmente, na Rede Pública de Ensino.

Participaram oito adolescentes, sendo quatro meninos e quatro meninas, alunos e alunas de uma escola pública em Campinas. Os participantes estudavam na mesma escola, em horários e séries diferentes. Foi utilizada a metodologia de Grupos Focais. Buscou-se compreender os sentimentos decorrentes da relação professor-aluno em sala de aula, as situações indutoras destes sentimentos e como os adolescentes lidam com isso. Assim, espera-se, com essa compreensão, contribuir com os cursos de formação de professores.

O estudo apontou para a importância do papel do educador como responsável em compreender e atender às necessidades específicas da faixa etária e em buscar diferentes estratégias e metodologias de ensino para atrair a curiosidade dos alunos. Pela fala destes, quando há compromisso por parte do docente, sentem-se “vistos” e respeitados, o que gera sentimentos de bem-estar e maior interesse pela matéria a ser ensinada. Porém, o contrário também é verdadeiro: há professores que não se preocupam com as necessidades específicas desses jovens, não se comprometem em elaborar uma “boa” aula, com diferentes dinâmicas e estratégias, e, além disso, comunicam aos adolescentes uma indiferença quanto ao seu desempenho e desenvolvimento, o que gera sentimentos de mal-estar e reações como: fazer bagunça, sair da sala, ficar com raiva, brigar com o professor, pixar a escola, ficar com dor de cabeça, ter vontade de desistir dos estudos e de sumir da escola, entre outros.

Nesta análise, os sentimentos de mal-estar foram fortemente enfatizados pelos adolescentes, embora também mencionassem as situações geradoras de sentimentos de bem-estar. Esse fato aponta para a precariedade das relações entre professores e alunos da rede pública de ensino; entretanto, esses jovens ainda permanecem na escola por acreditarem que os estudos podem lhes oferecer condições de obterem um “emprego melhor”.

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adolescents, the feelings in the teacher-student relationship, socially vulnerable, in the public education system.

Eight adolescents, four boys and four girls, all students from a public school in Campinas participated in the research. The participants studied in the same school, but in different times and grades. The focal group methodology was used. The aim was to comprehend the feelings resulting from the teacher-student relationship in the classroom, the situations that induce these feelings and how the adolescents deal with it. Thus, it is hoped, with this understanding, to contribute with the teacher’s formation courses.

The study pointed out the importance of the role of the educator as the person responsible for the comprehension and address of the specific needs of each age group, and sought for different strategies and methodologies of teaching to attract the curiosity of the students. By their talk, when there is commitment by the teacher, they feel “seen” and respected, what generates feelings of well being and a greater interest in the subject to be taught. However, the opposite is also true: there are teachers who don’t worry about the specific needs of these young people, that don’t engage in preparing a “good” class, with different dynamics and strategies, and, beyond that, they pass indifference concerning the adolescents performance and development, which causes bad feelings and reactions such as: causing troubles, leaving class, becoming angry, fighting with teachers, painting the school walls, having headaches, willing to give up studies and to fleeing from school, among others.

In this analysis, the bad feelings were greatly emphasized by the students, although they also mentioned the situations which generated good feelings. This fact points the precarious relationships between teachers and students in the public education system; however, these young people still remain at school believing that the studies can offer them the means to obtain a “better job”.

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INTRODUÇÃO...01

CAPÍTULO I Levantamento Bibliográfico...07

CAPÍTULO II Adolescência na Teoria Psicogenética de Henri Wallon...15

CAPÍTULO III Procedimentos Metodológicos ...35

CAPÍTULO IV Análise e Interpretação dos dados...40

CONSIDERAÇÕES FINAIS...82

REFERÊNCIAS...87

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I n t r o d u ç ã o

“Sonhar, é acordar para dentro” (Mário Quintana)

Minha vida acadêmica se iniciou em 2001. Sempre me chamou atenção a presença da afetividade em todas as relações, influenciando positiva ou negativamente a vida das pessoas, e a minha própria vida, no contexto escolar e fora dele. Durante o Ensino Fundamental e Médio, tive muitas experiências que colaboravam ou prejudicavam o processo de ensino-aprendizagem: algumas situações que “amava” o professor e tirava dez na matéria, e outras que eram sempre um motivo de sofrimento.

Na Universidade, no curso de pedagogia, encontrei excelentes professores que, cientes de que a relação pedagógica não se limita à atividade cognitiva, davam ênfase às relações afetivas, não só considerando as necessidades afetivas dos alunos, mas também ensinando-nos a considerar o educando como um sujeito integral, provido não somente de cognição, mas também de dimensões motoras e afetivas (sentimentos e emoções).

No último ano da graduação, no excepcional curso de Orientação e Supervisão Educacional, tive uma grande oportunidade de aprofundar a discussão sobre a questão dos sentimentos e emoções na relação pedagógica. Esse aprofundamento aconteceu de duas formas:

1º - Convivendo com uma equipe de professores que, conscientes de sua prática, desenvolviam um trabalho intencional, praticando e não somente falando sobre as teorias;

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Ao entrar em contato com a prática e a teoria relacionadas a essas questões, convivendo com professores absolutamente comprometidos e realizando o trabalho com prazer, fui “contagiada” por emoções cujas tonalidades eram muito agradáveis. Percebi que, mesmo cansada após um dia de trabalho, ir para a aula me proporcionava prazer, o que me possibilitava absorver melhor os assuntos estudados.

Além da minha realidade como aluna, os aspectos afetivos tornavam-se cada vez mais evidentes também em minha prática profissional. Após o período de graduação, deparei-me novamente com tais questões, a partir de uma outra perspectiva, não mais como aluna, mas agora a partir do ponto de vista do professor.

Realizando trabalhos de formação de educadores na Rede Pública, participei de conversas informais com alguns educadores e diretores que desabafavam suas dificuldades em lidar com os alunos. Uma diretora confidenciou-me que a falta de habilidade dos educadores em lidar com os alunos adolescentes estava trazendo sérias dificuldades para a rotina da escola. Na situação em questão, a diretora procurava-me para desenvolver um trabalho de formação e conscientização com os educadores, com o objetivo de equipá-los para lidar com as questões afetivas em sala de aula.

Com parte da minha experiência também vinculada a adolescentes em situações de vulnerabilidade social, levantei a hipótese de que o encontro entre os professores da rede pública, vivendo mazelas e dificuldades inerentes à profissão e a conjuntura social do país, com os adolescentes que vivem em condições também desfavorecidas e violentas, ambos experimentando emoções negativas, complexas e contraditórias, pode se tornar “explosivo”.

Assim, tendo como base as reflexões e vivências acima descritas, tomei a decisão de dar continuidade à pesquisa iniciada na graduação sobre o tema “Afetividade na relação pedagógica”.

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Na perspectiva de Wallon, o indivíduo é considerado com uma totalidade, na qual estão presentes as dimensões afetiva, cognitiva e motora1. O

desenvolvimento da inteligência e o da afetividade ocorrem de maneira simultânea / alternada, com predomínio e alternância do par razão e afeto, que têm como suporte a atividade motora.

Para Wallon, a afetividade é “a disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo interno ou externo por sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis” (Mahoney & Almeida, 2005). É um conceito amplo que engloba as emoções, sentimentos e paixão.

Placco (2002) analisou muito bem a relação pedagógica ao afirmar que a formação do sujeito acontece em parceria e na presença do outro, ou seja, no encontro dos atores há uma articulação de saberes, uma troca que mobiliza e permeia os processos cognitivos, ao mesmo tempo em que há nessa interação a exposição de pensamentos, dos modos de interpretar a realidade, as perspectivas de ação e reação, os motivos e intenções, desejos e expectativas, que dizem respeito à dimensão afetiva.

Analisando os enfoques teóricos sobre relações pedagógicas na sala de aula, a autora demonstra que há uma tendência em se considerar separadamente dois aspectos: um referente às questões pedagógicas, cujos temas discutidos são organização, planejamento, controle de classe, conteúdos curriculares, áreas de conhecimento, etc; e o outro referente às relações interpessoais em sala de aula, incluindo os temas afeto, aceitação, cumplicidade, solidariedade, necessidades, satisfações pessoais, em estudos relacionados a relações interpessoais, que aparecem mais vinculados a motivos, com ênfase na pessoa. No entanto, a autora as propõe “como sendo relações unas e complexas, engendradas em

movimentos humano-interacionais, técnicos e políticos” (pág. 9 ).

Mahoney e Almeida (2005), estudiosas da obra de Wallon, no artigo em que apontam para a relevância da afetividade para o processo de ensino-aprendizagem, o definem, também, como uma unidade, como “faces da mesma

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moeda”, no qual a dimensão afetiva está sempre presente. Para as autoras, a relação interpessoal é fator determinante e defendem que sua compreensão é essencial para:

ƒ que o professor possa se apropriar desse recurso, aumentando sua eficácia.

ƒ que haja a elaboração de programas de formação de professores, buscando compreender a relevância da dimensão afetiva para o processo de ensino-aprendizagem.

Scavazza (2003), citando Leite e Tassoni (1999), afirma que a afetividade é fator determinante da natureza das relações, não só interpessoais, mas também com relação a objetos de estudos e conteúdos escolares, interferindo conseqüentemente na disposição dos alunos diante das atividades propostas. Essas reações podem desencadear um movimento cíclico positivo ou negativo, em que a relação pode se tornar cada vez mais convidativa ou aversiva ao indivíduo, podendo gerar reações emocionais cada vez mais intensas tanto ao educador quanto ao aluno. Afirma ainda, citando Almeida (1997) que a falta de conhecimentos sobre o funcionamento fisiológico e social da emoção gera no profissional da educação a incapacidade de lidar com os estados emocionais, acrescentando que o desconhecimento dos mecanismos da emoção conserva o professor alheio “às suas mais evidentes manifestações” (p. 4).

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Dessa forma, com base nas reflexões e experiências acima descritas e com o objetivo de contribuir para o avanço do tema e com os cursos de formação de professores, tomei a decisão de dar continuidade às pesquisas iniciadas na graduação sobre o tema “Sentimentos e emoções na relação pedagógica”.

O problema a ser investigado é: Do ponto de vista dos alunos, quais são os sentimentos e emoções presentes na relação pedagógica entre professores e adolescentes da rede pública de ensino?

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C a p í t u l o I

L

EVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO

O tema afetividade na relação professor-aluno é um assunto ainda pouco discutido, apesar de nas décadas de 1990 e 2000, ter sido mais rico nesse sentido.

Segundo Mahoney (2004)2, o estudo da afetividade, que é uma

problemática da área da Psicologia da Emoção, teve até a década de 1970 um estudo “marginal, supérfluo e não-cientifico”. A partir daquela década, mudanças e estudos empíricos e teóricos passaram a ser produzidos. Segundo as autoras, havia uma dificuldade de consenso nas definições sobre o assunto, com enunciados que abordavam apenas um aspecto limitado da emoção.

Marin (1998) publicou um artigo em que analisa os problemas educacionais brasileiros, demonstrando que são estruturais e históricos. Segundo a autora, a indisciplina em sala de aula, as precárias condições de trabalho, o baixo status profissional, a baixa remuneração e a dificuldade para enfrentar eficazmente as características do corpo discente são entraves à realização dos ideais propostos para a escola, sobretudo para a escola pública, contribuindo para o fracasso escolar e para a baixa qualidade de ensino. Nesse artigo, a autora aponta para as principais discussões em torno do assunto, nas décadas de 1970, 1980 e 1990, afirmando que os aspectos afetivos do processo de ensino-aprendizagem raramente são mencionados. Brandão, Baeta e Rocha (1980, apud Marin, p. 3) analisaram pesquisas nacionais e internacionais realizadas entre 1971 e 1981. Com relação aos problemas de rendimento escolar de alunos e aspectos relativos aos professores, esse estudo evidenciou dois enfoques: a formação do professor e as características das práticas docentes. Dentre os fatores enumerados pelas pesquisas, o aspecto afetivo não é mencionado, aparecendo de forma indireta nas seguintes afirmações: 1. “os índices de aprovação entre professores que

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lecionavam em séries de sua preferência são maiores”; 2. “o rendimento dos alunos está relacionado à forma como o professor vivencia sua profissão”; 3. “a presença de estereótipos e preconceitos em relação aos alunos, sobretudo os de baixa renda”; 4. “a presença do fenômeno das profecias auto-realizadoras”; 5. “o pouco aproveitamento com relações educativas e o desempenho altamente formalizado, distante das crianças reais, ocasionando, portanto, o fracasso escolar” (Marin, p. 3).

O artigo acima mencionado bem como os estudos analisados pela autora não tiveram como foco analisar a recorrência do tema afetividade nas pesquisas sobre o processo de ensino-aprendizagem. Portanto, é possível constatar que a relevância do assunto é pouco considerada, uma vez que não aponta para o tema como fator de produção do fracasso escolar, e aparece de forma indireta em apenas um dos casos.

Já Scavazza (2003) teve como foco de sua pesquisa analisar o tema emoção, em periódicos da área de Psicologia da Educação. Para realização dessa pesquisa, a autora recorreu a CAPES, à bibliotecas da PUC-SP, USP (SP e Ribeirão), UNICAMP e à bibliotecas das cidades de Bragança Paulista e São João da Boa Vista e analisou 4 periódicos, entre 1991 a 2000, encontrando apenas 12 artigos sobre o tema.

No entanto, ao realizar o levantamento bibliográfico para essa investigação, foi possível perceber que as décadas de 1990 e 2000 foram ricas na produção do tema, especialmente no Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; o que nos leva a concluir que, apesar de existir a riqueza em pesquisas, o assunto ainda foi pouco divulgado.

Para o levantamento bibliográfico desta dissertação, foram utilizadas como

palavras-chave “afetividade”, “processo de ensino-aprendizagem” e

“adolescência”, com estudos realizados entre os anos de 2000 e 2007 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Foi consultada também a Plataforma da Capes, na qual encontrei, com esse foco, um artigo no Caderno

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artigos na revista Psicologia da Educação, da PUC-SP. Outras consultas foram realizadas nas revistas Escritos sobre Educação, da Fundação Helena Antipoff, revista Interações, da Universidade São Marcos, revista Imaginário, do Instituto de Psicologia da USP e Cadernos de Pesquisa, da Fundação Carlos Chagas, entretanto não encontrei nenhum artigo especifico sobre o assunto.

Apesar de ter utilizado essa delimitação de ano e palavras-chave, para essa pesquisa foram consultados também alguns autores da década anterior, porém foi apenas uma consulta e não um estudo mais detalhado.

Munhoz (2007) observou os sentimentos e as emoções em relação às atividades escolares de bons alunos de 8ª série do Ensino Médio de uma escola particular de São Paulo. A pesquisa foi realizada com 11 professores de diferentes áreas do conhecimento e 22 adolescentes, indicados pelos professores como “bons alunos” e utilizou como metodologia questionários abertos. A autora afirma que os dados mostram que o “bom aluno” adolescente estabelece uma relação satisfatória com o professor, com os colegas e com as atividades escolares. Nessa pesquisa, foi possível perceber que professores e alunos apresentam uma visão dicotômica do processo de ensino-aprendizagem, cuja responsabilidade pelo bom desempenho é individual, ou seja, depende somente do desempenho do aluno. A autora constatou que os adolescentes mesclam atitudes de interesse e desinteresse e são movidos pelas necessidades daquela fase do desenvolvimento (segundo Wallon), apesar de demonstrarem sentimentos de bem-estar ao cumprirem suas obrigações e obterem boas notas. Assim, a autora confirma sua hipótese de que os bons alunos se relacionam bem com colegas e professores; no entanto, na minha opinião, não é possível concluir se o bom rendimento é responsável pela boa relação ou o contrário: se a boa relação é responsável pelo bom desempenho. Ou os dois, já que a constituição da pessoa se caracteriza pela dialética das relações.

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dos professores, que se mostram eficazes ou ineficazes à aprendizagem, afirmando que os resultados indicam que o conhecimento tido pelo professor sobre os estágios do desenvolvimento e das necessidades específicas da adolescência pode ser uma ferramenta facilitadora do processo de ensino-aprendizagem (pág. 7). Interessante notar que a autora afirma que a pesquisa revelou que não só a relação professor-aluno pode interferir na relação aluno-conhecimento, mas também que a relação professor- conhecimento também interfere na relação do aluno com o professor (p.95). Nessa pesquisa, assim como em Lima (2005), os alunos também consideram a escola como lugar de conhecimento, demonstrando seu querer saber, conhecer e aprender. Os adolescentes entrevistados passam a elogiar, reconhecer ou repudiar a forma como esse processo se dá. A autora afirma que eles desejam aulas que despertem o interesse, que sejam dinâmicas e que se utilizem de diferentes instrumentos para mediar o conhecimento. Além disso, querem professores que gostem de ensinar, que se preocupem com a aprendizagem, que os ajudem nos momentos de dificuldade, que os ouçam, respeitem-nos como sujeitos e que os apóiem na participação no processo de ensino-aprendizagem, mesmo que composta de sucessos e fracassos. Os alunos denunciam as aulas sem criatividade e a falta de compromisso em esclarecer dúvidas, ensinar o conteúdo proposto ou não corrigir.

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uma excelente infra-estrutura e uma boa equipe de profissionais que são formados para atender constantemente às necessidades dos alunos e isso se reflete na disposição dos educandos em estar na escola, pois afirmaram que se sentem felizes e satisfeitos por estarem em uma escola em que são vistos e respeitados. Dessa forma, é possível constatar que, para que o aluno seja afetado por sentimentos de bem-estar é necessário cuidar não só da qualidade da relação professor-aluno em sala de aula, mas também de toda a infra-estrutura da escola e da formação dos professores. O autor afirma que, quando iniciou sua pesquisa, tinha como objetivo analisar as razões da falta de interesse e motivação frente ao saber. No entanto, para surpresa do pesquisador, os alunos adolescentes eram cheios de vida e tinham interesses e motivos diferentes daqueles que ele, enquanto professor, julgava importantes. Após essa constatação, mudou seu foco de investigação para compreender o que significa ser adolescente para o próprio adolescente, apontando para essa fase como de constantes transformações, conforme afirma Wallon, e que os sentimentos “a flor da pele” interferem nos sentimentos de bem-estar ou mal-estar e na disposição de querer ou não aprender (p. 84). O autor aponta para a necessidade do professor compreender o aluno como um todo, ajudando-o nessa fase de mudanças internas e externas, cujas emoções variam a cada segundo.

Lima se surpreendeu ao perceber que os adolescentes querem cumprir seu papel em sala de aula. A escola é vista como um lugar necessário à formação humana. Eles gostam da escola em que estudam, se sentem amados e respeitados. Consideram importante a relação amistosa entre professores e alunos, considerando-a importante para a aprendizagem; porém, desejam que o professor exerça sua autoridade, pois buscam limites.

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pesquisa quatro professores, um homem e uma mulher com até nove anos de experiência docente e outros dois, também um homem e uma mulher, com mais de vinte anos de experiência. Nas análises iniciais a autora constatou as diferenças de concepção de indisciplina, o que, segundo ela, oferecem elementos para compreensão do que afeta cada entrevistado em maior ou menor intensidade. Além das diferenças relativas ao tempo de experiência profissional, a autora percebeu que os sentimentos e emoções expressos variam de acordo com o gênero do participante. Consciente do par inseparável professor-aluno, considera que a indisciplina é um fenômeno com múltiplas determinações e, afirmou que ao analisar a partir da ótica do professor, não excluiu da análise “os encontros resultantes desse par no processo de ensino-aprendizagem” (p. 196).

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reflexão sobre sua prática, a busca por novos recursos e a didática ajudam em suas intervenções. Já o professor com menor tempo de experiência demonstra agir mais por impulso, indicando a necessidade de dialogar com seus pares, para poder refletir sobre as necessidades de seus alunos, para melhorar a relação professor-aluno, fazendo com que, no final do ano, não se sintam muito estressados. A autora afirma que as necessidades não realizadas dos alunos (as) são comunicadas nos comportamentos indisciplinados, fazendo com que, no final do ano, o professor se sinta “um trapo” (pág. 197-198).

Chaves ainda afirma que os quatro professores expressam sentimentos de impotência, frustração e inutilidade, por causa da indisciplina, e menciona Batista e Codo (1999) ao relatar que esse sofrimento psíquico e desalento abala a crença em si de professores e professoras.

Gonçalves (2005), procurou identificar e compreender o que provoca alegria na escola. Os dados foram coletados a partir das redações de alunos adolescentes de uma escola pública de São Paulo. A autora assevera que há uma desvalorização social da obrigação, e que, por ser a escola uma obrigação social, sentir alegria nesse contexto “poderia parecer proibido”. No entanto, a pesquisa revelou que a alegria é parte da realidade escolar do adolescente. Tal investigação corrobora a afirmação de Wallon de que o indivíduo é um ser biologicamente social, ao evidenciar que as situações indutoras de alegria estão relacionadas às relações dos educandos consigo mesmo, com os amigos, com os adultos e com o ambiente que os cerca, o que enfatiza a importância dos professores e de toda a escola compreenderem as necessidades dessa faixa etária para que possam construir, com base no respeito e acolhimento, um ambiente que contribua para o processo de ensino-aprendizagem.

Dér (2001) realizou um estudo teórico com o objetivo de analisar a adolescência em Wallon, explicitando o tipo de articulação que é estabelecida por ele entre adolescência e sua teoria psicogenética. A autora baseou-se nos documentos escritos por Wallon sobre as etapas do desenvolvimento.

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precisa resolver as ambivalências de sentimentos e atitudes que permeiam todo o estágio, ampliar a consciência que tem de si e superar a causalidade mecânica de seu pensamento, buscando sua autonomia intelectual. Segundo a autora, a teoria aponta para a grande responsabilidade do adulto na orientação das atividades que possibilitam ao adolescente construir sua personalidade moral.

Dourado (2000) realizou sua pesquisa com uma professora de oitava série da rede pública de ensino, utilizando como instrumento questionário e entrevista semi-estruturada, com o objetivo de identificar sua concepção sobre afetividade. A autora tinha a hipótese de que os professores de oitava série eram despreparados, pouco conhecendo sobre a fase de desenvolvimento de seus alunos e sobre afetividade. Essa hipótese foi refutada durante a pesquisa, ao constatar que ambos os conceitos estão presentes na prática docente. Sendo assim, essa análise reabilitou na pesquisadora a imagem que tinha do professor como responsável e culpado pelas dificuldades encontradas em sala de aula, apontando para a importância do docente refletir e ter consciência tanto de seu papel na formação de seus alunos quanto sobre a concepção de afetividade, afirmando que este conhecimento auxilia no ensino, pois lhe permite integrar várias dimensões da prática em sala de aula. Enfim, a autora conclui apontando para a responsabilidade do professor por seu trabalho, resgatando a integralidade do aluno. Emoções, sentimentos, movimento, cognição, sociabilidade, portanto, a afetividade, estão presentes no processo de ensino-aprendizagem, e, dessa maneira, constituem a competência do profissional da área da educação.

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C a p í t u l o I I

ADOLESCÊNCIA NA TEORIA PSICOGENÉTICA DE

H

ENRI

W

ALLON

“Quando a amizade e as rivalidades deixam de se basear na comunidade ou no antagonismo das tarefas empreendidas ou a empreender; quando esses sentimentos se procuram justificar por afinidades ou repulsas morais; quando eles parecem interessar mais à intimidade do ser que as contribuições ou conflitos efectivos, isso é indício de que a infância está já a ser minada pela puberdade.”

(Henri Wallon, 1968, p. 233)

Em um tempo de contradições, ontem e hoje, a necessidade de conhecimentos que possam contribuir para os processos de formação do indivíduo e da sociedade é crescente para os propósitos de delinear ações intencionais afim de intervir na realidade. No nosso caso, tal intervenção na realidade, utiliza como instrumento os grupos que se formam em sala de aula.

A teoria de Wallon nos permite uma compreensão do aluno dentro e fora da escola. Os pressupostos que a embasam são instrumentos importantes para a análise e entendimento dos fenômenos pedagógicos e psicológicos que acorrem em sala de aula.

A elaboração dessa teoria ocorreu como síntese de sua vivência em um contexto marcado por conflitos e antagonismos decorrentes das 1ª e 2ª guerras mundiais, guerra civil espanhola, guerra pela libertação das colônias africanas, lutas de classe, avanço dos ideais socialistas e avanço dos regimes autoritários.

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abarcar a complexidade do estudo da natureza humana de maneira científica e crítica.

Dourado (2005) afirma que a principal pergunta que buscava responder era “o que unia os homens entre si”. Para responder a essa questão, remeteu-se ao estudo da gênese do desenvolvimento psíquico, partindo do pressuposto que o ser humano se constitui nas relações com o meio, buscando compreender, em cada etapa do desenvolvimento, os sistemas de relações estabelecidas entre a criança e o meio.

O processo de desenvolvimento estende-se da concepção até a morte. No início da vida psíquica do indivíduo, ainda nos primeiros meses de vida, há uma indiferenciação entre o que lhe é exterior e o que é próprio do sujeito. Tudo o que acontece permanece em sua consciência de maneira confusa, sem delimitações entre o eu e o outro.

Durante todo o desenvolvimento, há uma busca pelo indivíduo para diferenciar-se do outro. Em cada estágio3, os conjuntos funcionais - afetivo, cognitivo e motor - se integram e se alternam, ora preponderando um, ora outro, em uma dinâmica que define e orienta os comportamentos em cada estágio do desenvolvimento. Duarte e Gulassa (2003), referindo-se à teoria Walloniana, explicam que há uma preponderância da atividade motora do bebê, nos três primeiros meses de vida, manifestando suas necessidades por meio de reflexos e movimentos impulsivos; a afetividade e a cognição se alternam ao longo do desenvolvimento, visando ora a formação do eu ora a elaboração do mundo exterior. Nos períodos de preponderância afetiva, o papel do outro estará sendo exigido em sua contraposição, ou seja, a relação é fundada no conflito e na oposição. Já nas fases de preponderância cognitiva, há um movimento para conhecer o mundo. Nesses estágios, as relações estão fundadas na cooperação com o outro.

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Além da preponderância funcional, há também o que Wallon chamou de alternância funcional, em que, ora o indivíduo está voltado para a construção de si – direção centrípeta - ora está voltada para a elaboração da realidade externa – direção centrífuga.

A integração funcional rege a organização das funções que preponderam sucessivamente nos estágios do desenvolvimento. Ela se expressa de duas maneiras: organicamente, com excitações que resultam em novos movimentos, novos circuitos, fortalecidos pelas sinapses neurais que estruturam a função simbólica, e sob a forma de novas operações intelectuais e comportamentais da criança, caracterizando a sucessão para um novo estágio de desenvolvimento. Isso significa que as novas possibilidades orgânicas que se configuram no início de um estágio são acrescidas e incorporadas às estruturas funcionais formadas nos estágios anteriores, configurando um novo plano funcional e uma nova estrutura intelectual e comportamental.

A puberdade / adolescência é um estágio do desenvolvimento em que ocorre uma verdadeira revolução na vida do indivíduo. Iniciando-se por volta dos 11 ou 12 anos, o organismo passa por profundas e rápidas transformações físicas, decorrente do amadurecimento das funções sexuais e, simultaneamente, operam-se também transformações de ordem psíquica.

O excesso dessas modificações físicas e psíquicas causa no adolescente não só um sentimento de estranheza frente ao próprio corpo, mas também com relação aos valores morais. Como parte da caminhada para a vida adulta, o processo de diferenciação continua intensamente e o adolescente busca sua autonomia. Segundo nos lembra Dér (2001), tornar-se autônomo é uma das principais tarefas que o jovem deve realizar nesse período, que se caracteriza pela busca de inserção na vida social.

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Os estudos realizados por Wallon permitem identificar que esse processo de diferenciação e busca por autonomia ocorre em meio a crises, conflitos e oposições, que se intensificam durante a adolescência.

Wallon afirma que o indivíduo é um ser biologicamente social, fato que se revela desde o seu nascimento, pois o outro lhe é constantemente indispensável para que a totalidade de suas reações possa ser completada, compensada e interpretada.

Segundo esse autor, as influências afetivas que rodeiam o indivíduo desde o nascimento têm uma ação determinante sobre sua evolução mental, afirmando que “o social amalgama-se com o orgânico” (Wallon, 1995, p. 136, grifo meu).

Dessa forma, o meio é parte constitutiva do indivíduo. Trata-se de um par dialético, em que ocorre um movimento de identificação/diferenciação. O outro

internalizado é chamado de sócius, concorrendo em um processo de

complementação e oposição.

“O sócius ou o outro é um parceiro permanente do eu na

vida psíquica. Ele é normalmente reduzido, invisível, recalcado e como que negado pela vontade de dominação e de completa integridade que acompanha o eu.” (Werebe e Nadel, 1986 - p.

165)

Durante todo o seu desenvolvimento, o indivíduo empreende um grande esforço para diferenciar-se do meio com o qual está fundido. Durante a adolescência, esse esforço se intensifica. O adolescente quer eliminar de si o outro, para que possa elaborar uma identidade autônoma e

afirmá-la.

Wallon aponta para um jogo de alternância de papéis que são exercícios fundamentais para a diferenciação de si. As atitudes de oposição aparecem freqüentemente ligadas à dependência do outro.

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“Verifica-se aí uma constante alternância entre a necessidade desafiadora de independência que o adolescente sente e a necessidade infantil de dependência, e provavelmente está revelando uma necessidade de orientação para as tarefas que deve realizar.” (Dér, 2001, p. 115)

Citando Wallon, Dér nos lembra que é exatamente a íntima ligação e dependência do adulto que vai exigir um esforço de discriminação, que acontece com a oposição. No entanto, apesar de buscar diferenciar-se do outro, o meio ainda lhe é indispensável, pois, conforme afirma Wallon, o amadurecimento do organismo oferece potencialidades, mas é o meio que vai oferecer as condições para que essas potencialidades se concretizem, o que nos aponta para a escola, como um dos meios funcionais para que isso aconteça.

“(...) uma efervescência afetiva e moral prepara o despertar da personalidade, mas o meio precisa intervir para concretizar e transformar em realidade as novas potencialidades do eu. Ao se confrontar com os diversos meios, particularmente a família e a escola, o adolescente adquire a consciência gradual de seu eu sobre o plano reflexivo, descobre suas qualidades e seus defeitos, suas possibilidades e seus limites.” (Dér, 2001, p. 124)

É importante salientar que, em um período em que há preponderância do conjunto funcional afetivo, a vida afetiva, conforme já explicitado, torna-se intensa. Deste modo, em diferentes circunstâncias, o adolescente pode ser tomado por fortes emoções, o que significa dizer que, na sala de aula o professor precisa estar preparado para essas manifestações da emoção, uma vez que Wallon afirma que

as manifestações afetivas podem obnubilar totalmente a percepção e a inteligência, tornando o indivíduo cego e indiferente à visão exata da realidade.

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vísceras, às câimbras ou ao relaxamento dos músculos.” (Wallon, 1995 a, p. 86)

Da mesma maneira e em oposição, a atividade perceptiva ou intelectual é o método mais adequado para reduzi-la.

“Todo aquele que observa, reflete ou mesmo imagina, abole em si mesmo a perturbação emocional. Não nos livramos da emoção apenas ao reduzi-las às suas corretas proporções, mas sim, e principalmente, pelo esforço para representá-la.” (Wallon, 1995 a, p. 86)

Wallon afirma que esse é um período de crises, resultantes de um esforço despendido pelo adolescente para manter o equilíbrio entre suas possibilidades psíquicas, ainda confusas, e as realidades do amanhã. Em meio às rápidas e profundas transformações, sente-se desorientado não somente consigo mesmo, mas ainda mais com o meio que o rodeia. Assim, possui um desejo de posse que provém da necessidade de apreender a um corpo e a um meio que está em mudança.

“Também aqui a nova idade vai reflectir em todos os domínios da vida psíquica. Surge um mesmo sentimento de desacordo nos da acção, da pessoa, do conhecimento; em cada um, existem mistérios a desvendar, e surge uma mesma necessidade de posse, de certo modo essencial, pois a posse actual não basta para satisfazer e procura para si perspectivas indefinidas.” (Wallon, 1968, p. 232)

(27)

O desejo de posse e de transformação é próprio do processo de mudança. Com um corpo diferente e um acesso a valores novos, o adolescente tem a necessidade de se apropriar novamente de si mesmo.

Todas essas mudanças transformam rapidamente a personalidade e a inteligência do adolescente, uma vez que a inteligência é o recurso cognitivo para a apreensão da realidade e solução das situações.

“O domínio de categorias cognitivas de maior nível de abstração, nas quais a dimensão temporal toma relevo, possibilita discriminação mais clara dos limites de sua autonomia e de sua dependência” (Mahoney e Almeida, 2005, p.12)

Esse movimento de afirmação de si não acontece somente de forma positiva. Dér (2001), citando Debesse (1952/1992), afirma que cinismo, insolência e grosseria, por exemplo, costumam fazer parte das “atitudes habituais nesse modo agudo de oposição, mas não deixam de ser também um modo de afirmação de si” (p. 123). A autora esclarece que isso acontece porque, além da falta de imparcialidade e experiência, “a condição de adulto que ele tanto aspira, o desejo de se querer outro, geralmente o torna impaciente e pretensioso” (p. 123).

As questões relacionadas ao seu futuro e às suas responsabilidades aparecem, convidando-os a refletir sobre a razão e o valor de tudo que os rodeia; o adolescente é tomado por muitos “por quês”. O adolescente questiona-se sobre o destino do mundo, a razão da existência das coisas; há escolhas de ordem religiosa e de ordem política, entram em contato com as leis e questionam sobre como as coisas vieram a existir. Com relação a essas leis, Wallon é enfático em afirmar, “nada tem a ver com a psicogênese, mas com o nível presente da

civilização” (Wallon, 1979, p. 68)

Alguns poetas e romancistas da época de Wallon criticaram a generalização com relação aos adolescentes, lembrando-lhe que os jovens das classes sociais mais baixas, por terem a necessidade de trabalhar para auxiliar no sustento da família, não teriam tempo de experimentar tais divagações.

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submetidos a sentimentos diversos, em sua dependência prolongada da família. Por outro lado, os jovens operários poderiam se beneficiar por já estarem em ligação com realidades que são dos adultos.

Assim, mais uma vez, o autor deixa sua posição clara ao dizer que, em ambos os casos, os adolescentes podem estar submetidos a perigos e privilégios, e que a influência do meio possui um papel muito importante sobre a formação de sua personalidade.

Deixa claro, também, que os adolescentes de classes sociais menos favorecidas sofrem tentações ao serem submetidos a filmes e jornais que oferecem coisas impossíveis ou, mais gravemente, aventuras anti-sociais. Por não terem tempo para as divagações no espaço, uma evasão em aventuras reais podem conduzir a uma satisfação doentia às necessidade de mudança, de renovação.

Apesar do perigo, Wallon enfatiza que existem elementos positivos nessa fase da vida. O gosto e uma necessidade de aventura e de se unir a outros que tenham o mesmo sentimento deve ser aproveitado, sendo utilizado para ajudar o adolescente a fazer suas escolhas entre os valores do entorno. Tais aspectos devem ser evidenciados pelo educador em sua relação com seus alunos.

Entretanto, a má orientação nessa fase pode levar à criação de grupos hostis, que se reúnem pela necessidade natural da idade, mas que, estando descontentes com a sociedade e não encontrando direções satisfatórias, encontram nos “meios alternativos” as possibilidades de realização.

Segundo Wallon, há um sentimento que é a síntese das tendências ambíguas dos desejos de possuir, dominar e se sacrificar: a responsabilidade, que confere o direito de domínio, mas comporta também um dever de sacrifício.

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Os estudos realizados pelo grupo de pesquisas da Psicologia Sócio-Histórica da PUC-SP podem nos ajudar a responder esta indagação:

E o adolescente do nosso tempo?

Atualmente, esse é um tema que continua despertando grande interesse por parte de pesquisadores de diversas áreas, trazendo importantes contribuições sobre as concepções de adolescência presentes hoje.

Deve-se ressaltar que, coerentemente com as bases epistemológicas da teoria de Wallon, para a psicologia sócio-histórica, o homem é visto como sendo constituído numa relação dialética com o social e a história. Fatos sociais surgem nas relações e os homens atribuem significados a esses fatos, criando conceitos. As marcas sociais serão significações que servirão de referência para a constituição do sujeito (Aguiar & Ozella, 2008).

Em 1999, foi realizada uma pesquisa, coordenada por Ozzela, com cinqüenta e dois (52) psicólogos, sendo quinze (15) da área da Educação (Febem, instituições particulares e Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua), oito (8) da área da educação formal, nove (9) da área da Saúde Institucional (hospitais públicos e privados, ambulatórios e postos de saúde), cinco (5) da área da Saúde Particular (consultório particular), dois (2) da área do trabalho (serviços de inserção do jovem no mercado de trabalho) e doze (12) da área Jurídica (Vara da Família, varas especiais da infância e da juventude e Centros de Orientação Psicológica – SOS Criança).

Essa pesquisa evidenciou que a naturalização, universalização e patologização permeiam os significados compartilhados sobre adolescência. Do total de entrevistados, trinta (30) definem que as características apresentadas pelos adolescentes fazem parte da natureza humana, com uma visão apriorística, como se as expressões do comportamento fossem independentes da cultura e do meio social.

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é próprio, faz parte do desenvolvimento do indivíduo.” (Profissional da área de Educação)

Contrariamente à sua própria opinião, Ozella reconhece que a universalização, naturalização e patologização são ainda as principais marcas sobre as concepções correntes dessa faixa etária, afirmando que, desde o início do século XX, a adolescência foi identificada como uma etapa marcada por tormentos e conturbações vinculadas à sexualidade. Afirma ainda que essa visão foi reforçada pela psicanálise, impregnando a definição do termo através de livros, teorias, mídia, profissionais das Ciências Humanas, sendo incorporada pela população e pelos próprios adolescentes. Segundo o autor, essa concepção naturalística supõe igualdade de oportunidades, ocultando e legitimando as desigualdades presentes nas relações sociais, atribuindo ao jovem toda a responsabilidade por suas ações e insucessos.

A universalização e generalização dos conflitos e crises dos adolescentes vêm recebendo críticas desse e outros autores do Programa de Psicologia Sócio-Histórica, que reafirmam as determinações históricas e culturais na constituição desses jovens. Essa questão vem sendo muito discutida:

Entender a adolescência como constituída socialmente a partir das necessidades sociais e econômicas dos grupos sociais é olhar e compreender suas características que vão se constituindo no processo [...] Os modelos estarão sendo transmitidos nas relações, através dos meios de comunicação, na literatura e através das lições dadas pela psicologia.” (Aguiar, Bock & Ozella, 2001, p 171)

Na sociedade atual, a adolescência é vista, ainda, como um período de preparo para o trabalho; devido às grandes exigências do mercado, é necessário que tenham dedicado uma grande parte do tempo aos estudos.

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“É dessa relação e de sua vivência enquanto contradição que se constituirá grande parte das características que compõem a adolescência: a rebeldia, moratória, a instabilidade, a busca de identidade e os conflitos.” (Aguiar, Bock e Ozella, 2001, p. 170)

Ozella afirma que é preciso abandonar aquela visão cristalizada, pois, ainda que na aparência ela corresponda ao real, isso pode caracterizar uma profecia auto-realizadora, que leva jovens a se adaptarem às expectativas.

Essa afirmação se confirmou mais a frente, na pesquisa realizada por Aguiar & Ozzela (2008), evidenciando que os adolescentes, de fato, se apropriam da visão socialmente construída do que é ser adolescente e a assumem como verdadeira.

Segundo os autores, os jovens da década de 60 eram vistos como criativos, generosos e críticos; já os da década de 1990 têm sua imagem associada à violência, às drogas e ao individualismo.

Aguiar e Ozella concordam com a afirmação feita por Abramo de que, à medida que o jovem é visto como “a encarnação de impossibilidades, eles nunca podem ser vistos, e ouvidos, e entendidos, como sujeitos que apresentam suas próprias questões, para além dos medos e das esperanças dos outros” (Abramo 1997, apud Ozella & Aguiar 2008, p.06). Além disso, afirma que:

[...] a manutenção das concepções de que a adolescência é um período naturalmente de crise, cumpre o papel ideológico de camuflar a realidade, as contradições sociais, as verdadeiras mediações que constituem tal fenômeno. (Aguiar & Ozella, 2008, p. 6)

A pesquisa foi realizada com 856 adolescentes brancos, negros e orientais, meninos e meninas, pertencentes às classes sociais de A a E, no município de São Paulo. Os dados foram organizados em sete núcleos de significação:

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Núcleo 4 - Razão x Afetividade: elementos fundamentais na constituição do gênero.

Núcleo 5 - O conflito nas relações familiares: mito ou realidade? Núcleo 6 - A violência: ameaçadora ou banalizada?

Núcleo 7 - O futuro: idealização ou concretude?

O núcleo um demonstrou quetodos os adolescentes, de todas as classes, dos dois gêneros, de todas as faixas etárias e raças reproduzem as concepções instituídas sobre o que vem a ser adolescência. Os autores afirmam que existem diferenças nas formas de significação, mas que, no entanto, essa característica está presente em todos. Os indivíduos das classes A e B, a maioria brancos e poucos orientais, são o que mais expressam essa característica.

“A significação da adolescência como uma fase de crise, é sustentada, como nos coloca Peres (1998), pela concepção da ciência positiva, que, “...permite dar a idéia de desarranjo, pois a harmonia é pressuposta como sendo de direito. Na concepção de adolescência, esta leitura faz sentido, na medida em que, dentro da evolução referida, a crise é apresentada como um desvio ou um perigo do curso natural do desenvolvimento, que deve ser cuidado para a retomada da ordem natural.”(Aguiar & Ozella, 2008, p. 10)

Os autores reafirmam que há uma eficácia ideológica, uma vez que os adolescentes incorporam esses conceitos e os assumem “como sendo expressão de sua autêntica forma de ser”.

“A forma como os adolescentes significam este momento vivido por eles, a nosso ver, revela e reforça a expectativa social, produz e reproduz a ideologia liberal, reafirmando concepções naturalizantes e a-históricas.” (p. 10)

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discurso foi o mesmo. Já os jovens das classes D e E revelaram uma grande preocupação com a vida, referindo-se não somente às drogas, mas às frustrações, aos medos e às impossibilidades. Os autores afirmam que os adolescentes dessas classes (D e E), especialmente os mais velhos, apresentam uma visão mais crítica sobre a sociedade, considerando as relações sociais injustas. Para as meninas dessa mesma classe, de todas as idades, essa etapa da vida também aparece relacionada a sofrimento, mas não com a mesma visão crítica dos meninos. Falaram sobre gravidez precoce, que impede uma adolescência “normal”.

Com relação ao núcleo dois (Sair da adolescência é tornar-se Responsável,

Autônomo e Livre), os adolescentes das classes A, B e C, masculino, vincularam a responsabilidade à liberdade e independência. No entanto, contradições apareceram ao afirmarem que tornar-se responsável é tornar-se livre, mas que o excesso de responsabilidade também pode sacrificar a liberdade. Além disso, enquanto são dependentes dos pais, sentem-se protegidos, pois, na vida adulta, experimentarão uma independência “real” e precisarão trabalhar para se sustentar, o que significa riscos de ficarem sem trabalho e de terem um salário baixo.

Para esse grupo, a responsabilidade apareceu associada à entrada na vida adulta e está ligada ao fim das coisas boas (predominantemente classe B/ orientais/masculino), ao mesmo tempo significa também a possibilidade de casar e sustentar a família, o que é motivo de orgulho.

Para as classes B e C, masculino/ brancos e orientais, a responsabilidade está associada a uma nova forma de vida, com maiores preocupações e cobranças. Para os meninos das classes B e C, a responsabilidade se vincula a mudanças complicadas, que são mais “pesadas”. Já os meninos da classe A mencionaram alguns limites e cobranças, mas essas preocupações apareceram de forma menos acentuada.

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atos. Além disso, a classe C, orientais e negros, associou a responsabilidade com a necessidade de ajudar a família.

Os meninos da classe C pensam no futuro e enfatizam o risco de não conseguirem um emprego, referindo-se, especialmente aos orientais e às dificuldades do mercado de trabalho. Os autores afirmam que para esses adolescentes “ser adulto está mais associado a sofrimento, a perda de condições favoráveis e prazerosas” (p. 15).

A classe C, orientais e negros, foi o único grupo que mencionou a necessidade de se levar os estudos a sério, apontando-o como “elemento de distinção na passagem para a vida adulta” (p. 16). Para os outros grupos (A, B, D e E / feminino, todas as raças e faixas de idade), a palavra estudo quase não apareceu.

Para as classes D e E, masculino, todas as idades, predominantemente negros, a responsabilidade apareceu associada a sofrimento, surgindo também a preocupação com o sustento da família. Apesar de apontarem as dificuldades da vida adulta, apresentaram uma visão otimista, na expectativa de alcançarem uma melhora na vida. Esse é o grupo em que mais apareceu o termo “correr atrás”

Nas concepções das meninas também houve associação da responsabilidade com a entrada na vida adulta. No entanto, “o significado dado à responsabilidade é extremamente marcado por valores e por características que, historicamente, vêm sendo associadas ao gênero feminino” (p. 17). A afetividade é um diferenciador marcante entre as concepções de meninos e meninas.

As meninas das classes A, B e C, brancas e orientais, não se diferenciam muito dos meninos de classe A e B, querem mais liberdade para poder sair, ir a festas, namorar.

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apareceu como algo natural, e a independência dos pais como algo desejado. Já para as meninas da classe B/branca, ter responsabilidade é assumir a vida sozinhas, e mencionaram o trabalho como um forma de resolver necessidades próprias, como: comprar um carro ou morar sozinha. Para as jovens das classes A e B, a adolescência não aparece como algo ruim e sofrido.

Já para as meninas da classe C, brancas e negras de todas as idades, responsabilidade significa cuidar de si mesmas sozinhas. Referem-se aos sentimentos vinculados a essa necessidade, afirmando sentirem medo e insegurança.

Nas classes D e E, predominantemente negras, o casamento apareceu como uma forma de se obter liberdade. Ter um filho é uma grande possibilidade de se verem livres da família de origem. Ser adulta significa ter maior confiança em si mesma e vencer obstáculos. Essas meninas se assemelham aos meninos das classe B, C, D e E, orientais e negros, ao se preocuparem mais concretamente com o trabalho e o futuro.

“Interessante observar que todos os adolescentes (classes, etnias, idades) tratam a idéia da entrada na vida adulta como algo natural, que inevitavelmente é assim, por conta de características dos próprios adolescentes e da sociedade, entendidos de uma forma a-histórica e natural.” (Aguiar & Ozella, 2008, pp. 19-20)

O núcleo três (Grupo: uma característica masculina) evidenciou uma grande diferença entre os meninos e as meninas. As classes A e B masculino, até os 16 anos, revelaram a grande importância dada ao grupo, considerando-o como “orientador de comportamentos, valores, atitudes e hábitos”. Interessante notar que, para essa classe social, o grupo aparece como algo que se modifica constantemente, que não é estável. Já para os meninos das classes C, D e E, predominantemente negros de todas as idades, os grupos são mais fixos, estáveis, e parecem ter maior importância como suporte e até para garantir a sobrevivência do adolescente.

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No núcleo quatro (Razão x afetividade: elementos fundamentais na

constituição do gênero), os autores afirmam que são as meninas que expressam maior importância aos aspectos afetivos, pois com maior freqüência mencionam suas características psicológicas e comportamentais.

“Tais questões só podem ser compreendidas à luz de uma análise que considere a ideologia e as condições concretas de vida em sociedade. Uma ideologia que impõe e restringe as mulheres ao mundo intimista dos afetos e emoções.” (Aguiar & Ozella, 2008, p.21)

No entanto, apareceram especificidades nos sentimentos vividos pelas meninas das diferentes classes. As das classes C, D e E, de todas as idades e raças, falaram do sofrimento como algo presente em suas vidas. Os pesquisadores afirmam que algo que marca também a diferença de gênero é que elas falam muito mais de suas famílias, de suas mães, do que os meninos. Além disso, eles se orgulham por serem observadores da realidade; já as meninas não mencionam esse aspecto, referindo-se muito mais aos sentimentos vividos nas experiências do que ao relato objetivo das mesmas. Os meninos definem-se pelo que fazem, por suas experiências, e não pelo que sentem.

“Tais características vêm reafirmar as expectativas sociais para a mulher como mais voltada para si mesma, para seus afetos, menos ligada na realidade social.” (p. 21)

Os adolescentes das classes A e B de todas as idades valorizam a individualidade e a razão.

“Chama a atenção que tal característica não apareça nas classes C, D e E. Talvez, como uma hipótese, em tais classes, a noção de indivíduo, por conta das frustrações, da baixa auto estima, dos impedimentos vividos, se constitua de modo diferente, levando a que se sintam com menos potência, com menos condições de atuar, e até de valorizarem suas ações.” (p. 22)

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A mulher aparece como reprodutora da ideologia dominante, cabendo a ela a manutenção dos valores, na transmissão da afetividade e criação dos filhos.

O núcleo cinco (O conflito nas relações familiares: mito ou realidade), revelou uma diferença interessante, especialmente entre as classes sociais e etnias. Para os meninos das classes A e B, brancos, e meninas da classe B, brancas, os autores afirmam que o discurso parece seguir “um script pré-definido”, reproduzindo o papel de filho rebelde. Eles afirmam que essa rebeldia é uma conseqüência do excesso de “repressão familiar”, apesar de reconhecerem que é para o bem deles. Já as meninas da classe A revelam uma relação tensa com os pais; sentem-se desrespeitadas e cerceadas em sua liberdade, apesar das excelentes condições econômicas em que vivem. Os autores da pesquisa destacam, ainda, que essa característica (relações conflituosas com a família) aparece somente com os adolescentes até os 16 anos.

Para os orientais de ambos os gêneros das classes B e C, de todas as idades, não aparecem tensões na ambiente familiar. A família é vista como algo importante, que deve ser tratada com respeito.

Já nas classes D e E / meninos, os autores afirmam que as relações familiares não sofrem tais conflitos.

“Estes adolescentes assumem os impedimentos colocados pela família como sendo necessários. A família aparece como apoio, conselheira. Assim, quando aparece a rebeldia, não é contra os pais, mas contra alguma situação social. Tais formas de relação familiar vão aparecer em todas as idades e em todas as raças.” (Aguiar & Ozella, 2008, pp. 23-24)

As meninas das classes C, D e E, afirmaram não ter a liberdade que gostariam , mas compreendem que essa repressão é decorrente do cuidado dos pais em protegê-las dos perigos.

“Fica evidente que não aparece rebeldia e insatisfação em relação à família, sendo que inclusive as adolescentes justificam o fato da família impor limites.” (p. 24)

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essa ameaça pode levá-los a se tornarem violentos. Apesar de falarem sobre a violência, ela aparece de forma bastante abstrata; não relataram nenhum exemplo concreto de violência em suas vidas.

Já as meninas das classes A e B não falaram sobre a violência. Os autores levantam a hipótese de que isso se deve à condição da mulher das camadas sociais mais privilegiadas, que se expõem menos aos espaços públicos e, portanto, ficam mais protegidas.

Já para as classes C, D e E, meninos e meninas de todas as idades,

“(...) a violência não aparece como uma ameaça, é banalizada, rotineira, “natural”. Quando aparece, vem associada aos “irresponsáveis”, na fala deles, os “outros”, e nestes casos, se referem sempre ao uso de drogas e ao tráfico.” (Aguiar & Ozella, 2008, p. 25)

Para finalizar, temos o núcleo sete (O futuro: idealização ou concretude), enfatizando que, para os adolescentes das classes A e B, masculino e feminino, de todas as idades, a palavra trabalho não apareceu. O futuro é apresentado como algo muito bom, mas eles não demonstram preocupações sobre como irão viabilizá-lo. Os meninos da classe B referiram-se ao vestibular, demonstrando preocupação com o futuro, que aparece de forma abstrata, “mas com certeza bom”, expressando como único perigo a possibilidade de uma escolha errada.

Para os meninos da classe C, o trabalho é uma categoria presente. Desejam estudar para que possam alcançar um posto de trabalho.

Já os meninos das classes D e E, predominantemente negros, também acreditam que os estudos abrem possibilidades para “um futuro melhor”, mas o que os autores enfatizam é que, para este grupo, o “bom comportamento” está ligado e/ou favorece as condições de estudo.

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geralmente atribuída às populações mais carentes social e economicamente.” (Aguiar & Ozella, 2008, p. 26)

As meninas das classes C, D e E, brancas e negras, também relacionaram os estudos ao futuro e ao trabalho, e, diferentemente dos meninos, elas mencionaram o vestibular como possibilidade de um futuro melhor.

“Como hipótese podemos pensar que os meninos são mais cobrados para contribuírem financeiramente em casa, sendo, portanto, mais pressionados para ingressarem mais cedo no mercado de trabalho, inviabilizando muitas vezes a possibilidade de fazerem um curso superior.” (p. 27)

Um outro aspecto que Ozella e Aguiar destacam é que a expressão “futuro melhor” só apareceu para as classes C, D e E, para ambos os gêneros.

Embora a pesquisa demonstre que os significados constituídos sobre a adolescência sofrem determinação de gênero, classe, cultura e idade, foi marcante perceber as diferenças existentes entres as classes sociais e entre os gêneros. Por exemplo, o aumento da responsabilidade apareceu em todas as classes, gêneros, e idades, o que levou os autores a considerar esse núcleo como quase central na concepção de adolescência. De um modo geral, a responsabilidade vem relacionada ao fim das coisas boas e a perda das situações prazerosas.

Os autores constatam que os significados sociais instituídos marcam as formas de significar a adolescência e penetram as subjetividades, constituindo-as.

“O estudo mostra o quanto a tendência ao individualismo proporcionada pela sociedade contemporânea, onde a prerrogativa da autonomia, da individualidade inata, da liberdade é fundamental e marca as formas de significar dos adolescentes.” (p. 27)

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Os adolescentes referem-se a essa fase como “normal” e aqueles de classes sociais mais baixas (C, D e E) se entristecem por não poder vivê-la.

Portanto, esse estudo nos permitiu verificar que, conforme explicitado pelos autores, os significados constituídos sobre adolescência sofrem determinações de gênero, classe, cultura e idade. Para esta pesquisa, foi interessante notar as diferenças marcantes entre as classes sociais, nos permitindo uma compreensão mais adequada dos participantes dessa pesquisa: adolescentes pertencentes predominantemente às classes sociais D e E.

Aguiar & Ozella (2005) concluem afirmando que:

“Ao focarmos os adolescentes das classes C, D e E,

começamos a conhecer um adolescente diferente dos manuais de psicologia. Um adolescente que fala de sofrimento, do medo de não ter trabalho, de não conseguir sustentar a família, etc... Começamos a ver um adolescente que não fala dos tradicionais conflitos familiares, pelo contrário, fala da família como um apoio, que não fala dos tradicionais conflitos profissionais, nem fala em Universidade, mas fala da necessidade do esforço pessoal para um trabalho qualquer” (Aguiar & Ozella, 2008, p. 28)

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C a p í t u l o I I I

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

1. Grupo Focal

Para a realização desta pesquisa, optei por trabalhar com a metodologia de Grupos Focais.

O Grupo Focal é uma técnica de discussão em grupo não diretiva que tem como objetivo levantar diferentes opiniões, atitudes, pensamentos e sentimentos expressos verbalmente ou pelas posturas corporais, expressões fisionômicas ou por outras reações. Segundo Placco (2005) e Gatti (2005), entrevistas com grupos são apropriadas para estudos que buscam entender os sentimentos, atitudes, preferências e necessidades, permitindo se obter dados qualitativos.

As autoras afirmam que, diferentemente de outras técnicas, o Grupo Focal permite ao pesquisador levantar uma boa quantidade de informações em um período de tempo mais curto. A definição clara de um tema e o roteiro das questões ajudam nisso. Além disso, o trabalho com grupo também possibilita uma maior probabilidade de fidedignidade, pois faz com que opiniões extremadas não prevaleçam.

Para garantir tal fidedignidade, é preciso ainda respeitar o princípio da não diretividade. Durante o levantamento dos dados, o mediador do grupo deve evitar realizar intervenções afirmativas e negativas, emitir opiniões particulares, conclusões ou outras formas de intervenção. Conforme esclarece Gatti, não se trata de uma não intervenção absoluta; encaminhamentos com relação ao tema a ser discutido poderão ser realizados, bem como intervenções que facilitem as trocas, devendo, portanto, facilitar a discussão entre os membros do grupo, zelando para que não se perca o foco em questão.

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Gatti aponta que, em casos de grupos de pesquisa, recomenda-se não mais do que 10 pessoas. A adesão ao grupo deve ser voluntária, após um convite motivador que sensibilizará os participantes quanto à importância do tema geral a ser tratado. Um outro aspecto que deve ser observado é que os participantes não sejam íntimos, isto é, não se conheçam muito, pois, conforme esclarece Gatti (2005, p. 21), quando há excesso de intimidade, os participantes podem atuar em bloco, monopolizando ou paralisando a discussão. Além disso, o conhecimento mútuo pode inibir as manifestações espontâneas, reduzindo a possibilidade do aparecimento da multiplicidade de idéias. Assim, os adolescentes participantes desta pesquisa apesar de freqüentarem a mesma escola e Projeto Social, o fazem em horários e salas diferentes, o que os qualificou para a participação na pesquisa.

As formas de registro e sua importância devem ser explicitadas. A anuência de todos quanto aos registros é imprescindível. Deve-se garantir o sigilo dos registros e dos nomes dos participantes, enfatizando que todas as opiniões e idéias interessam; não há certo e errado e não se espera que todos cheguem a um consenso. É bom lembrar também que a conversa é entre eles e não precisam atuar como se estivessem respondendo ao moderador, pois, não se trata de uma entrevista coletiva, mas sim, de uma possibilidade de troca efetiva entre os participantes.

Para garantir que o máximo de informações possam ser captadas nas seqüências interacionais estabelecidas, recomenda-se a colaboração de um observador, que deverá ser uma pessoa qualificada, que compreenda sobre o assunto e que possa observar de acordo com os objetivos da pesquisa.

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“Para análises em maior profundidade, os sentidos procurados repousam mais nessa dinâmica interacional que nos recortes que se possam obter como pontos de partida das análises” (Gatti, 2005, p. 47 e 48).

“Para estudos em ciências sociais e humanas, o foco de análise na seqüência de interações é extremamente importante, pois permite níveis interpretativos mais aprofundados e teoricamente mais significativos” (ibid, p. 48).

Cabe acrescentar que a teorização não deve se restringir aos dados obtidos. Portanto, pelo fato de a produção do conhecimento científico se constituir como um processo de construção coletiva, é importante situar o problema proposto em uma discussão acadêmica mais ampla, não somente com um levantamento bibliográfico, mas também com o confronto entre os resultados obtidos e os de outras pesquisas relacionadas ao tema.

“Esses procedimentos não são formalismos acadêmicos, mas condições necessárias à cumulatividade e transferibilidade do conhecimento, assim como à formulação das teorias” (Mazzotti, 2001, p. 42).

2. Coleta de Dados

O grupo focal foi realizado em uma instituição social filantrópica, chamada pela comunidade de Projeto. Essa instituição atua na assistência social e no combate à fome, prestando serviços educacionais e de orientação familiar a

aproximadamente 600 crianças e adolescentes vulneráveis pessoal e

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prontuários existentes na instituição em que foi realizada esta pesquisa, os adolescentes participantes se enquadram nessa realidade.

Conforme os objetivos desta pesquisa – afetividade na relação professor-aluno da rede pública de ensino - a escolha do local para o levantamento de dados privilegiou esse aspecto, pois atende crianças que estudam predominantemente na rede pública de ensino; assim a escola pública foi analisada de forma indireta. Além disso, a localização e o fato da pesquisadora conhecer pessoas na instituição influenciaram nas decisões, pois o acesso ao local e aos participantes foi facilitado, bem como aos seus pais, que precisariam assinar uma autorização para que os adolescentes participassem da pesquisa. A própria instituição contactou as famílias, indo à casa delas – a maioria na favela – para explicar os objetivos da pesquisa e obter a autorização escrita.

Para a coleta de dados, foram realizados dois encontros de 60 minutos com o mesmo grupo. As reuniões foram gravadas e transcritas (quadros anexos) e as observações foram realizadas com o auxílio de uma outra pesquisadora, profissional especialista em pesquisa na instituição. Com base nas gravações, as trocas realizadas foram estruturadas em categorias, analisadas e interpretadas pelo pesquisador, conforme os objetivos propostos.

Participaram 8 adolescentes com a idade entre 14 e 17 anos, sendo quatro meninos e quatro meninas que, apesar de freqüentarem a mesma escola e Projeto, estudam em horários e turmas diferentes, o que os qualificou a participar da pesquisa, obedecendo ao critério de “não intimidade” explicitado acima.

3. Análise e interpretação de dados

O foco da pesquisa foi investigar a afetividade na relação professor-aluno, analisando-se, a partir da perspectiva do adolescente, os seguintes aspectos:

• O que os adolescentes sentem na relação com seus professores em sala de aula?

• Quais são as situações indutoras desses sentimentos?

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Assim, foram analisados os sentimentos, as situações indutoras e a reação dos adolescentes frente às experiências. De acordo com as interações vivenciadas nos grupos focais, foram criadas categorias relacionadas às situações indutoras expressas nos relatos dos adolescentes.

Categorias relacionadas às situações indutoras de sentimentos de bem-estar ou mal-estar:

1. Modo de relacionamento com o professor: comportamento e

aparência física.

2. Modo de relacionamento com o professor: conteúdos, metodologias e formas de avaliação.

3. Organização da sala: disciplina, número de alunos e infra-estrutura. 4. Ir para a escola.

Referências

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