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4º Seminário de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Relações Internacionais.

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Academic year: 2021

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4º Seminário de Relações Internacionais da Associação Brasileira

de Relações Internacionais.

27 e 28 de setembro de 2018 na Universidade Federal da

Integração Latino-Americana (UNILA) em Foz do Iguaçu.

Área temática: Análise de Política Externa

A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO GOVERNO TEMER:

CONTINUIDADE OU RUPTURA?

Janiffer Tammy Gusso Zarpelon -

Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA)

                         

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Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar a política externa brasileira do governo Temer verificando quais os aspectos que possivelmente denotam características de ruptura e de continuidade em relação á política externa dos governos Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2016). A política externa brasileira no governo Lula teve como diretriz a autonomia pela diversificação, que significou a diversificação da agenda internacional do Brasil bem como de parceiros não tradicionais, tendo como foco a Cooperação Sul-Sul. No governo Dilma, apesar da instabilidade política e econômica que assolou o cenário doméstico brasileiro, foi dado continuidade na cooperação entre os países em desenvolvimento, fortalecendo alianças estratégicas com os BRICS, IBAS, UNASUL Mercosul, e na doação de cooperação técnica internacional, tendo como destaque as áreas da saúde, educação e agricultura. Já no governo Temer, o discurso político inicial seria em priorizar acordos comerciais com os países desenvolvidos, principalmente os Estados Unidos e Europa. No entanto, no decorrer do seu mandato essa priorização não aconteceu. Temos, assim, a hipótese que devido as dificuldades em fortalecer as relações com as grandes potências econômicas - que serão apresentadas no artigo -, o governo Temer deu continuidade em certas agendas como priorizar as relações com os BRICS. Destacamos que essa continuidade está muito aquém do que fora realizado pelos governos anteriores. Além disso, entendemos que a incapacidade ou a própria ausência de um conjunto de diretrizes para a política externa brasileira contribuíram para a continuidade em relação a certas agendas. A metodologia utilizada nesta pesquisa teve como base a análise empírica a partir de fontes bibliográficas, documentos oficiais e a análise de discurso do presidente Temer e dos Ministros das Relações Exteriores do governo Temer.

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Introdução1

Uma das principais preocupações na análise da política externa brasileira tem sido se a mesma é marcada por certa continuidade ou por rupturas quando ocorre a troca do chefe de Estado no país. Muitos autores e diplomatas consideram que como a política externa representa a busca dos interesses nacionais no exterior, constitui-se, portanto, em uma política de Estado, caracterizando-se em certa continuidade. Ou seja, a política externa representaria valores nacionais de longo prazo, como no Brasil a busca pelo desenvolvimento e, estaria assim, livre de interesses partidários ou de influências de grupos ou indivíduos específicos da sociedade de curto prazo, base da política de governo.

Desde a redemocratização do Brasil, na metade da década de 1980, passa haver o aumento da participação do chefe de Estado na condução da política externa brasileira, sendo chamado de diplomacia presidencial. Além disso, com a abertura da economia brasileira nos anos 1990, passa haver o maior envolvimento de outros ministérios e organizações no auxilio da condução da politica externa, além apenas do Ministério das Relações Exteriores, tradicional órgão do executivo responsável pela política externa e pelas relações internacionais do Brasil.

Assim, com o aumento do envolvimento do presidente na condução da agenda internacional do país, podemos dizer que a mesma tem sido marcada por certas mudanças estratégicas quando ocorre a alteração do chefe de Estado no Brasil. Assim, o presente artigo tem como objetivo analisar a política externa brasileira do governo Temer verificando quais os aspectos que possivelmente denotam características de ruptura e de continuidade em relação á política externa dos governos Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2016).

Antecedentes da politica externa brasileira a partir da redemocratização do Brasil

Os anos de 1980 é marcado pelo término das ditaduras militares na América Latina. No Brasil, esse término ocorreu em 1985, fazendo o país a ingressar novamente no contexto democrático. O primeiro presidente civil brasileiro após o                                                                                                                          

1 Parte deste artigo foi fruto de pesquisa realizada na minha tese de doutoramento em  

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golpe militar de 1964 deveria ter sido Tancredo Neves, mas o mesmo acaba falecendo antes de tomar posse, assumindo seu vice, José Sarney (1985-1990). A política externa brasileira no inicio do governo Sarney buscou seguir o paradigma desenvolvimentista, termo cunhado por Amado Cervo (2003), em que o foco da política externa brasileira, desde o governo Vargas, nos anos 1930, priorizava o desenvolvimento interno, medidas protecionistas do mercado nacional e as relações bilaterais e/ou plurilaterais, principalmente com os seus vizinhos.

Segundo Tullo Vigevani e Gabriel Cepaluni, também corroboraram que desde o governo de Getúlio Vargas (década de 1930), até o governo Sarney, com algumas oscilações, a política externa brasileira estava pautada na "autonomia pela distância". Autonomia, para os autores, significa “a condição que permite que os Estados formulem e implementem sua política externa independentemente do constrangimento imposto por Estados mais poderosos.” (VIGEVANI; CEPALUNI, 2011, p. 34). Já a distância quer dizer uma política externa volta para o afastamento da agenda liberalizante propagada pelas grandes potências, mais especificamente pelos Estados Unidos.

Assim, o governo Sarney teve como base a expansão econômica do país pautada pelo desenvolvimento autárquico, pelo avanço do mercado interno e pela resistência ao ingresso do país aos regimes internacionais, como por exemplo, o regime internacional do comércio – o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, sigla em inglês) – no qual prevalecia os interesses das potências econômicas2 (VIGEVANI; CEPALUNI, 2011).

Este período foi caracterizado pela intensa aproximação do Brasil com os países da América Latina. Uma das primeiras medidas do governo Sarney foi o reatamento das relações diplomáticas com Cuba. Com a Argentina, as relações começam a melhorar desde 1979, quando fora estabelecido o Tratado Tripartite, incluindo o Paraguai, que estabeleceu as regras da utilização hidroelétrica das águas do Rio Paraná. Em 1985, foi assinado a Declaração de Iguaçu entre José Sarney e Raúl Alfonsín, presidente na época da Argentina, a intenção de iniciar uma aproximação econômica entre os mesmos resultando, em 1986, no estabelecimento do Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE). Em 1988, é dado um novo passo na integração econômica entre Brasil e Argentina, com a assinatura do Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, que previa a criação, no

                                                                                                                         

2 O GATT nesse período irá buscar a implementação de uma agenda mais ampla, buscando inserir discussões sobre o comercio de serviços, de investimentos e o direito de propriedade intelectual, no qual representavam os interesses das grandes potências econômicas.

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prazo de dez anos, de uma área de livre comercio entre os dois países3. Esse acordo estimula Uruguai e Paraguai a participarem também da integração do processo de integração regional, culminando na assinatura do Tratado de Assunção, em 1991, criando o Mercosul.

No entanto, devido as fortes pressões internacionais, principalmente por parte dos Estados Unidos em que realizou duras sanções econômicas sobre o Brasil nas áreas da informática e das patentes farmacêuticas, no final da década de 1980, o país passa a ingressar paulatinamente na agenda multilateral. Segundo Vigevani e Cepaluni (2007; 2011), essa estratégia é denominada de autonomia pela participação, em que o país busca se inserir nas principais discussões da agenda internacional como direitos de propriedade intelectual, meio ambiente, direitos humanos, entre outras, a fim de atender seus interesses nacionais.

Essa lógica é mantida nos Governos de Fernando Collor (1990-1992) e de Itamar Franco (1992-1994), consolidando-se no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). No governo Collor, a política externa brasileira teve como prioridades: i) atualizar a inserção internacional do país em face da emergência de novos temas e agendas, tais como: meio ambiente, direitos humanos, tecnologias sensíveis; ii) fortalecer uma aliança positiva com os Estados Unidos; e iii) descaracterizar o perfil terceiro-mundista do Brasil no cenário internacional. (HIRST e PINHEIRO, 1995).

O aprofundamento da integração econômica com os países da América do Sul foram mantidas no governo Collor, criando o Mercosul, em 1991, e reduzindo o tempo para a chegada da Área de Livre Comércio de 10 anos para 4 anos. Apesar da abertura do mercado, das privatizações e da busca inicial em estreitar as relações com os Estados Unidos, as cooperações com os países em desenvolvimento, permanecendo como membro do Grupo dos 77 e não abandonando sua condição de observador do Movimento dos não Alinhados.

Outro destaque que representou grande continuidade na condução da política externa do governo Collor foi ratificar os acordos relacionados aos direitos humanos, processo iniciado pelo governo Sarney, e sediar a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, nos dias 3 a 14 de junho de 1992. A busca em ser anfitrião da conferência foi projeto do governo Sarney, que tinha como objetivo alterar sua imagem no ambiente internacional, ao adotar uma postura em prol ao desenvolvimento sustentável.

                                                                                                                         

3 Área de livre comércio representa na eliminação gradual das barreiras alfandegárias (tarifas relacionadas a importação e exportação) com relação ao comércio de mercadorias entre os países envolvidos.

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Com o impeachment de Collor de Mello, em dezembro de 1992, Itamar Franco (1992-1995), seu vice, assume a presidência tendo a difícil tarefa de resolver o problema da estabilização econômica e monetária do país. Itamar deixou totalmente a tarefa ao Ministério das Relações Exteriores da formulação e da execução da política externa brasileira. O primeiro Ministro das Relações Exteriores do governo Itamar foi Fernando Henrique Cardoso (05.10.92 até 20.05.93). A principal estratégia com FHC como ministro foi manter a participação do Brasil na agenda multilateral como apoiar os novos temas na Rodada do Uruguai, negociações do GATT, iniciada em 1986 e finalizada em 1994, que culminou na criação da Organização Multilateral de Comércio (OMC). No âmbito regional, em 1993, o Brasil reativa a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), que tinha como objetivo fomentar a cooperação regional para a manutenção da paz e segurança do Atlântico Sul.

Com a saída do FHC no Ministério das Relações Exteriores e a entrada de Celso Amorim (20.07.93 até 01.01.95), a política externa brasileira se configurou na busca de não haver rótulos, mas voltada ao desenvolvimento e a democracia. Em 1994, ocorre a assinatura do Protocolo de Ouro Preto que estabeleceu as bases institucionais para o Mercosul, aprofundando assim o processo de integração econômica regional. No mesmo ano, o Itamaraty realiza, em Brasília, o 1º Encontro dos Chanceleres dos Países de Língua Portuguesa, evento precursor da CPLP (CAMPOS, 2008).

Celso Amorim como Ministro das Relações Exteriores no governo Itamar também defendeu a democratização das relações internacionais, destacando a necessidade da reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, órgão configurado por 15 países membros, sendo 5 permanentes e com direito de veto. Além disso, tendo como iniciativa brasileira, que a “Agenda para a Paz” da ONU contemplasse uma “Agenda para o Desenvolvimento”.

No governo FHC, a ênfase da política externa brasileira foi de inserir o Brasil na construção das regras internacionais, de modo a melhorar a imagem e a legitimidade do país no cenário internacional. Como bem destaca Luiz Felipe Palmeira Lampreia, Ministro das Relações Exteriores neste governo4:

[...] os dados básicos de nossa presença internacional neste momento, dados que desejamos permanentes, definitivos, são a democracia e a estabilidade econômica [...] no plano político, a valorização internacional da democracia, dos direitos humanos, do desenvolvimento sustentável. No plano econômico, a estabilidade e                                                                                                                          

4 Os Ministros das Relações Exteriores no governo FHC foram: Luiz Felipe Palmeira Lampreia (01/01/95 a 12/01/02), Luiz Felipe de Seixas Corrêa (12/01/02 a 29/01/02) (interino) e Celso Lafer (29/01/02 a 01/01/03).

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a tendência de liberalização comercial, que o Brasil passou a seguir desde o início dos anos noventa (LAMPREIA, 1998, p. 7).

Segundo Vigevani e Cepaluni (2011), foi no governo FHC que houve a consolidação da “autonomia pela participação”, representando na busca do país em participar mais ativamente na elaboração e regulamentação das normas e regras nas relações internacionais de modo a contribuir para o estabelecimento de um ambiente favorável ao seu desenvolvimento econômico. Nesse sentido, a perspectiva institucionalista passou a ser mais favorável na consecução dos interesses brasileiros uma vez que promovia o respeito às regras na política internacional, as quais, quando estabelecidas, deveriam ser respeitadas por todos os Estados, inclusive pelas grandes potências.

O Brasil neste período teve como foco ser um global trader. A incorporação do conceito de global trader significava inserir o país como um ator com interesses globais, assumindo posições e agendas diversificadas buscando, com isso, novas parcerias comerciais sem se vincular a um único parceiro. Tal busca representou no pragmatismo comercial adotado pelo país marcado por uma política externa universalista caracterizada em fortalecer as relações econômicas já existentes e construindo outras. No plano da cooperação internacional, este governo buscou também conquistar uma posição de global partner, ou seja, em ampliar suas parceiras no ambiente internacional. (ZARPELON, 2016).

As estratégias escolhidas por FHC para aumentar a projeção internacional do Brasil consistiam, de modo geral, na eliminação da percepção negativa do país na sociedade internacional - de forma a convencer seus parceiros de que o Brasil estava apto para arcar com as obrigações na economia mundial -, e na ênfase nas rodadas de negociações na OMC por considerar que tais negociações seriam mais benéficas para a consecução dos interesses nacionais, pois, além de trazer novas alianças, a referida organização era possuidora de mecanismos de resolução de conflitos comerciais mais justos, caracterizado pelo Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) da OMC. (ZARPELON, 2016).

Neste contexto, o Brasil se envolveu em vários casos de disputas comerciais no OSC da OMC, mas os que ganharam maior repercussão foi o contencioso entre a Bombardier (empresa de aviação canadense) e a Embraer (empresa brasileira de aviação) no qual o Brasil saiu vitorioso com relação ao Canadá; e a disputa entre o governo brasileiro e as grandes empresas farmacêuticas estadunidenses, que levou o Brasil a exigir a possibilidade do uso da licença compulsória para a fabricação de

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remédios para o tratamento da HIV/Aids5, no qual o OMC permitiu o Brasil a fazer uso desta licença.

Com relação a reforma do Conselho de Segurança, FHC acreditava que o Brasil deveria possuir uma vaga de membro permanente no órgão, mas não foi incisivo na ONU quanto a essa empreitada. Em vez disso, optou por aprofundar a integração regional, considerando o Mercosul como mecanismo de melhora da inserção internacional do país no ambiente politico e econômico mundial. Priorizou também a tentar fazer parte do G7, grupo composto pelas economias mais avançadas do mundo: Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido. (CEPALUNI; VIGEVANI, 2011).

Cervo (2003, p. 19), ao analisar a PEB do governo FHC, destaca que este governo fora caracterizado pela “dança dos paradigmas: o desenvolvimentista, que agonizava mas não morria; o normal, que emergia de forma prevalecente; e o logístico, que se ensaiava ao mesmo tempo”. O paradigma desenvolvimentista, conforme mencionado anteriormente, entendia a política externa como um instrumento para promover o desenvolvimento econômico do país. O paradigma normal, ou neoliberal, representava na adoção de medidas neoliberais, preconizadas pelo Consenso de Washington, aos países da América Latina como forma dos mesmos saírem da crise econômica da “década perdida”. Tais medidas consistiram, principalmente, na abertura do mercado nacional, privatizações, proteção do capital estrangeiro e na redução do papel do Estado na economia. Desse modo, ser normal significava seguir a cartilha neoliberal. O paradigma logístico caracteriza-se no papel do Estado em dar apoio logístico aos empreendimentos públicos e/ou privados, mantendo o país na esfera do sistema neoliberal, mas recuperando a autonomia decisória perdida durante o paradigma normal67.

                                                                                                                         

5 No âmbito da OMC, o Brasil buscou, junto com demais países em desenvolvimento, em alterar as regras na organização de forma a reduzir os subsídios agrícolas praticados pelos EUA e pelos países europeus.

6 Os paradigmas correspondem por determinados períodos históricos: i) o Liberal– Conservador, entre 1810 e 1930; ii) o Estado Desenvolvimentista, entre 1930 e 1989; iii) o Estado Normal ou Neoliberal, entre 1990 e 2002; e, iv) o Estado Logístico.

7 Segundo Cervo (2003), o paradigma logistico foi apenas um ensaio no governo FHC. Esse ensaio pode ser verificado pela contenda da Bombardier (empresa canadense) contra a Embraer, levando o governo canadense a abrir um painel na OMC contra o Brasil por acusar o mesmo de praticar subsídios. Durante o governo FHC, fora implementado o ProEx (programa a exportação) no qual subsidiava as exportações brasileiras. O Brasil, não concordando com os pareceres da OMC, entra com um novo painel na OMC contra os subsídios disfarçados do Canadá à Bombardier, no qual vence. Assim, apesar dos problemas internos, como a carga tributária elevadíssima para as empresas brasileiras, o Brasil visou contrapor–se às ações unilaterais do Canadá contra a Embraer, representando no apoio do Estado logístico em defender os interesses de uma empresa nacional. Esse fato

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Como o governo FHC priorizou as relações com os países desenvolvidos, principalmente com os Estados Unidos e a União Europeia, as relações com os países em desenvolvimento se caracterizou num caráter mais material, ou seja, na busca de trazer benefícios comerciais ao Brasil. Foi na metade do seu segundo mandato, que o governo buscou aprofundar as relações com os países em desenvolvimento, priorizando as relações com os países emergentes: China, Índia, Rússia e África do Sul. (CEPALUNI; VIGEVANI, 2011).

Com o governo Lula (2003-2010), apesar do discurso de campanha eleitoral, antes de conquistar seu primeiro mandato, ter enfatizado a necessidade de mudança com relação ao governo FHC, houve neste período grande continuidade de muitas ações que haviam sido iniciadas no governo FHC. Podemos dizer o que mudou foi a estratégia da PEB, que em vez da autonomia pela participação, se caracterizou pela “autonomia pela diversificação”, conceito desenvolvido por Vigevani e Cepaluni (2011).

A “autonomia pela diversificação” se traduziu na manutenção das alianças com seus antigos parceiros, mas buscando também intensificar as relações com parceiros não tradicionais como os países do Oriente Médio, da África, da Ásia-Pacifico e da Europa Oriental. Essa diversificação representou em alianças estratégicas do Brasil com os países em desenvolvimento, chamado de Cooperação Sul-Sul (CSS). Desta forma, a CSS foi concebida no governo Lula como uma importante diretriz na consecução do interesse nacional do Brasil, bem como na correção das assimetrias sociais e econômicas, e na busca pelo aumento da capacidade de barganha internacional do país com os países ricos, principalmente Estados Unidos e Europa.

Desta forma, são muitos os autores que defendem o caráter assertivo dado à PEB em privilegiar alianças com os países do Sul (LIMA, 2003; CERVO, 2006; SOUTO MAIOR, 2004; VIGEVANI; CEPALUNI 2007; 2011). O estreitamento da relação do Brasil com os países do Sul foi justificado pelo governo Lula devido as afinidades históricas, linguísticas, sociais, econômicas, culturais e étnicas com estes países. Além disso, o governo Lula também procurou, por meio da Cooperação Sul-Sul, exercer um posicionamento de liderança do Brasil na defesa dos interesses dos países em desenvolvimento nos principais fóruns internacionais. Exemplo desse contexto foi a liderança do país na criação do G-208, em 2003, na reunião                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             pode ser entendido como um dos ensaios no governo FHC da mudança do paradigma Neoliberal para o Logístico.

8 O G-20 é um grupo de países em desenvolvimento que visa defender os interesses dos mesmos na OMC, principalmente com relação ao tema agrícola. Atualmente fazem parte 23 países: 5 da África (África do Sul, Egito, Nigéria, Tanzânia e Zimbábue), 6 da Ásia (China,

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preparatória da Conferência Ministerial da OMC, a fim de pressionar na redução dos subsídios agrícolas adotados pelas grandes potências.

Assim, apesar do discurso do presidente Lula enfatizar por mudanças na política externa brasileira, não houve ruptura substancial com a ênfase da ação diplomática brasileira (PUENTE, 2010; VIGEVANI e CEPALUNI, 2007; 2011). “Os princípios basilares da política externa brasileira foram mantidos tais como: a defesa da solução pacífica de controvérsias, a autodeterminação dos povos, não intervenção, respeito do direito internacional, igualdade entre os Estados e o pragmatismo na busca do interesse nacional de forma pragmática”9 (PUENTE, 2010, p. 220). Nesse sentido, Maria Regina Soares de Lima destaca que:

[...] a principal mudança do projeto internacional do governo Lula é de perspectiva, de visão da ordem internacional que o informa. A ideia de que existe espaço para uma presença internacional mais afirmativa do Brasil, como propõe o projeto do governo Lula, não é fruto apenas do voluntarismo a informar a política externa de um governo de centro esquerda, mas reflete uma certa avaliação da conjuntura mundial, que assume a existência de brechas para uma potência média como o Brasil, que, por via de uma diplomacia ativa e consistente, podem até ser ampliadas (LIMA, 2003, p. 98).

Para Cervo (2003, 2006, 2008), a PEB do governo Lula se aproximou do Paradigma Logístico. Nas palavras do autor (2008, p. 83) o paradigma logístico “firma-se na era Lula ao dosar o liberalismo às etapas do desenvolvimento agrícola, industrial e tecnológico e à salvaguarda de interesses nacionais”.

Destacam-se, assim, os principais eixos de atuação da PEB no governo Lula

:

revitalização e ampliação do MERCOSUL; intensificação das relações com a América do Sul; aumento da presença e da cooperação com os países africanos (não só lusófonos), com o resgate do papel tradicional da África na política externa brasileira; busca de relações maduras com os Estados Unidos; perseguição do diálogo e da aproximação com países do Sul, sobretudo com potências regionais como a China, Índia, Rússia e África do Sul, mas também em outras áreas (Oriente Médio, e países árabes, por exemplo); prosseguimento na defesa da reforma das Nações Unidas, com a proposta de ampliação do número de membros permanentes no Conselho de Segurança e postura mais assertiva                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão e Tailândia) e 12 da América Latina (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, Equador, Guatemala, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela). 9 O caráter pragmático quer dizer que toda política externa deve buscar o interesse nacional. Cardozo e Miyamoto (2006) mencionam que a política externa de Lula resgatou algumas das diretrizes do “Pragmatismo Responsável e Ecumênico” de Geisel (1974-1978), como afirmar sua autonomia perante as potências econômicas e aumentar as relações com países do Sul, tanto de forma bilateral como por meio de instituições internacionais.

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da candidatura do Brasil nesse contexto; prosseguimento e intensificação da participação nos foros multilaterais, sobretudo econômicos (OMC, negociações sobre a ALCA e bi-regionais – MERCOSUL-UE), com a articulação de coalizões com países emergentes (G-20), com vistas à defesa de interesses comuns (PUENTE, 2010, p. 221).

O governo Lula deu também continuidade nas relações do Brasil com os países do Norte, negociando acordos entre o Mercosul e a União Europeia e mantendo o estreitamento das relações com os Estados Unidos no contexto comercial. Muitos acadêmicos, como Cardozo e Miyamoto (2006) mencionam que a PEB de Lula retomou algumas diretrizes do “Pragmatismo Responsável e Ecumênico”10 de Geisel, ao angariar maior autonomia enfocando ampliar os laços com os países do Sul, tanto em acordos bilaterais como por meio das negociações multilaterais, especialmente na OMC liderando a criação do G-20, em 2003.

A CSS representou tanto na possibilidade de aumentar o poder do Brasil perante os países do Norte como também em uma cooperação mais justa e colaborativa, em que a parceria nasceria da vontade dos mesmos, tendo como base o consenso e a equidade, sendo um movimento fundamentado na horizontalidade (SANTOS, 2012). Segundo Celso Amorim, Ministro das Relações Exteriores no governo Lula, a política externa brasileira direcionou-se para a Cooperação Sul-Sul no contexto do princípio da “não indiferença”, ou seja, cooperação com os países mais pobres ou vulneráveis a fim de promover o desenvolvimento dos mesmos, conduzindo no aumento da paz e da prosperidade (AMORIM, 2011).

Com a eleição de Dilma Rousseff, em 2011, acreditava-se que pelo fato de ser do mesmo partido que Lula, o Partido dos Trabalhadores (PT), haveria grande continuidade na condução da politica externa brasileira do que foi realizado no governo Lula. No entanto, o governo Dilma foi afetado por um ambiente internacional desfavorável, devido a crise econômica iniciada em 2008, que atingiu o Brasil por volta dos anos de 2010 e 2011. Além disso, o ambiente interno fora caracterizado pela queda do crescimento do PIB, aumento da inflação, elevação da carga tributária, excesso de burocracia, redução dos investimentos em inovação tecnológica e manifestações contra o governo (CERVO e LESSA, 2014).

Cervo e Lessa (2014) destacam que a política externa do governo Dilma foi caracterizado por um declínio sistêmico devido a ausência de metas e de                                                                                                                          

10 O “Pragmatismo Responsável e Ecumênico” de Geisel significou conduzir as relações internacionais do Brasil de modo responsável, buscando sua inserção internacional mais autônoma e servindo aos interesses nacionais (VIGEVANI; CEPALUNI, 2011).

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planejamento no contexto da PEB. Ainda segundo os autores acima, esse declínio da PEB também está associado a ausência do carisma da presidente, voltando sua atuação para o ambiente doméstico, seguindo um perfil mais tecnocrata. Como consequência, ocorreu a redução da diplomacia presidencial no governo Dilma, fator verificado como relevante para alcançar a diversificação e a ampliação da inserção internacional do país no governo Lula.

Já segundo Cornetet (2014, 140), a politica externa no governo Dilma se caracterizou pela contenção na continuidade, que representou na continuidade em atingir os objetivos nacionais de autonomia e de desenvolvimento, mas foi “menos propositiva e menos ousada.” No estudo de Cornetet (2014) ao comparar o governo Lula com o de Dilma, houve uma redução em torno de 40% das viagens presidenciais, as ações em política externa foram menos numerosas e mais tímidas, e reduziu-se o estabelecimento de novos postos diplomáticos.

As ações de destaque no governo Dilma que se caracterizam por certa continuidade foi a manutenção da integração na América do Sul, em que houve a suspenção do Paraguai e a adesão da Venezuela ao Mercosul, em 2012. Além disso, manteve a busca em fortalecer a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), formada pelos doze países sul-americanos, em que teve seu tratado constitutivo assinado em 2008, mas entrando em vigor em março de 2011.

Além disso, deu forte continuidade nas relações com os BRICS (sigla que representa os seguintes países: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Desde 2009, os países passaram a realizar cúpulas anuais, formando um grupo político de cooperação. E em 2014, é criado o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) dos BRICS com o objetivo de financiar de projetos de infraestrutura e desenvolvimento em países pobres e emergentes. Já as relações com os países africanos, o governo Dilma deu continuidade na realização de Cooperação Técnica Internacional, mas com relativa redução no número de projetos. Com os países do Oriente Médio, devido ao inicio da Primavera Árabe no ano de 2011, a cooperação foi fortemente reduzida.

Na ONU, o governo Dilma manteve a lógica em defender a importância dos programas sociais e no combate a fome e a pobreza, no entanto, a busca pela reforma do Conselho de Segurança foi menos presente nos discursos de Dilma. Outro fator que teve destaque no governo Dilma foi a forte ênfase na defesa dos direitos humanos na ONU, destacando a importância da “Responsabilidade ao proteger” no seu primeiro discurso de abertura na Assembleia Geral da ONU. Este conceito foi uma crítica quanto ao uso indiscriminado das intervenções militares e o uso da força nas ajudas humanitárias. Também vinculou as migrações

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internacionais como uma questão de direitos humanos, aumentando o asilo político que segundo o ACNUR – Brasil, em 2010, tinham sido reconhecidos 3.904 refugiados, foi para 8.863 asilos no inicio de 2016.11

Com o processo de impeachment de Dilma Rousseff aprovado pelo Senado em 12 de maio de 2016, Dilma foi afastada da presidência até que o mesmo fosse concluído, fazendo com que seu vice, Michel Temer, assumisse a presidência do Brasil. O processo foi finalizado em 31 de agosto de 2016, em que o plenário do Senado condenou Dilma Rousseff à perda de seu cargo por 61 votos a 20, pela acusação de ter cometido crime de responsabilidade fiscal.

Temer ao assumir a presidência passa a declarar que seu governo seria caracterizado pela total mudança com relação ao governo de Dilma. Desta forma, será analisado no próximo subtítulo se a política externa brasileira no governo Temer foi caracterizada por mudanças ou por continuidades.

A política externa do governo Temer

Desde que Temer assumiu a presidência, seu governo tem destacado que a política externa brasileira seria caracterizada por ser livre de ideologias. Esse discurso foi utilizado constantemente pelo senador José Serra, indicado por Temer a ser o Ministro das Relações Exteriores. Serra ficou no cargo de 12 de maio de 2016 a 22 de fevereiro de 2017. Já ao assumir, Serra declarou que a sua primeira diretriz seria:

A diplomacia voltará a refletir de modo transparente e intransigente os legítimos valores da sociedade brasileira e os interesses de sua economia, a serviço do Brasil como um todo e não mais das conveniências e preferências ideológicas de um partido político e de seus aliados no exterior. A nossa política externa será regida pelos valores do Estado e da nação, não do governo e jamais de um partido. Essa nova política não romperá com as boas tradições do Itamaraty e da diplomacia brasileira, mas, ao contrário, as colocará em uso muito melhor. Medidas que, em outros momentos, possam ter servido ao interesse nacional, quero dizer, podem não

                                                                                                                         

11 ACNUR- Brasil. Brasil tem quase 9 mil refugiados de 79 nacionalidades. Disponível em:

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ser mais compatíveis com as novas realidades do país e com as profundas transformações em curso no cenário internacional.12

A outra diretriz de Serra para a politica externa do Brasil seria retomar o estreitamento das relações com os países do Norte, principalmente com os Estados Unidos, Europa e Japão, fazendo várias críticas sobre as relações de Cooperação Sul-Sul. Buscou também dar um enfoque de cunho comercial a politica externa brasileira. Fez com que a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) ficasse subordinada ao Ministério das Relações Exteriores. Tanto que o projeto de integração econômica entre os países da América do Sul passa a cair por terra, ao enfocar que a aproximação do Brasil com a Venezuela e Bolívia se deu por caráter ideológico.

A UNASUL passou a enfrentar uma crise já que os principais líderes desse projeto já não estavam mais dispostos a levar adiante a integração. Brasil e Argentina passam a apoiar as relações bilaterais do que a cooperação dentro do bloco e destacam de forma crítica o caráter ideológico dessa integração. Já a Venezuela, que tem a sede do Banco do Sul da UNASUL, baseia-se sua economia no mercado do petróleo. Com a baixa do valor do petróleo no mercado internacional, o país tem enfrentado forte crise econômica, deixando de fazer investimentos na projeto da integração.

Já com relação ao Mercosul, Serra priorizou as relações comerciais dentro do bloco. Tentou retomar as negociações para a implementação do Acordo – Quadro de Cooperação Inter-regional entre o Mercosul e a União Europeia (UE), que fora assinado em dezembro de 1995, e tinha o intuito de criar uma área de livre comércio intra-blocos. No entanto, este acordo até hoje não foi ratificado por divergências nas negociações, principalmente quanto a questão dos subsídios agrícolas praticados pela UE.

Mas o que gerou bastante polêmica na gestão de Serra como Ministro das

Relações Exteriores foi a defesa em não permitir que a Venezuela assumisse a presidência do Mercosul, que funciona de forma rotativa, a cada 6 meses, por um dos membros permanentes do Mercosul, em ordem alfabética. O governo brasileiro                                                                                                                          

12 BRASIL-MRE. Discurso do ministro José Serra por ocasião da cerimônia de transmissão do cargo de ministro de estado das Relações Exteriores – Brasília, 18 de maio de 2016. Disponível em:

http://www.itamaraty.gov.br/discursos-artigos-e-entrevistas-categoria/ministro-das-relacoes-exteriores- discursos/14038-discurso-do-ministro-jose-serra-por-ocasiao-da-cerimonia-de-transmissao-do-cargo-de-ministro-de-estado-das-relacoes-exteriores-brasilia-18-de-maio-de-2016 Acesso em: julho de 2018.  

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alegou que a Venezuela não estaria cumprindo a cláusula democrática, estabelecida pelo Protocolo de Ushuaia, em 1998. Obtendo o apoio da Argentina e do Paraguai, e posteriormente do Uruguai, a Venezuela foi impedida de assumir a presidência do Mercosul. Após esse fato, Serra passa a defender a suspensão da Venezuela no Mercosul, alegando que a entrada do país no bloco se deu por alianças ideológicas com o antigo governo do Brasil e da Argentina por serem de esquerda. No entanto, destacamos que a aproximação do Brasil com a Venezuela passa a ocorrer com o governo Sarney com o objetivo de cooperar na proteção da Amazônia e no governo FHC na área comercial, no qual até chegou mandar tropas brasileiras a fim de auxiliar no controle da ordem no território venezuelano devido a uma greve geral dos petroleiros.

Outra polêmica na gestão de Serra, foi o anúncio de revisar o voto do Brasil na UNESCO sobre a preservação do patrimônio cultural e histórico por parte da Palestina nos seus territórios ocupados. Esse fato foi bastante criticado por ser visto como um retrocesso já que o Brasil desde a redemocratização passa a se inserir nos regimes internacionais sobre direitos humanos, e, além disso, no governo Lula é reconhecido o Estado da Palestina, atitude que se insere no respeito a

autodeterminação dos povos e a busca do diálogo e a convivência pacífica com os

vizinhos.

Assim, ao mesmo tempo que Serra destacava que a política externa brasileira deveria ser livre de relações ideológicas, suas ações como Ministro das Relações Exteriores foram partidárias, ligado ao Partido em que o mesmo é filiado, Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Suas principais ações foram criticar o governo e o partido anterior. No entanto, muitas ações que foram realizadas no governo de Lula e de Dilma com relação a política externa brasileira, foram

continuidade de ações dos governos anteriores como de Sarney, Collor, Itamar e FHC.

Em 22 de fevereiro de 2017, José Serra pediu demissão do cargo alegando motivos de saúde. Indicado por Temer, assume Aloysio Nunes, em 7 de março de 2017, como o novo Ministro das Relações Exteriores. Também senador do pelo estado de São Paulo, filiado ao PSDB, era, antes de assumir o cargo, presidente da Comissão das Relações Exteriores e de Defesa Nacional do Senado.

Sua nomeação foi marcada por controvérsias. Assim que Donald Trump venceu as eleições para presidente dos Estados Unidos, Aloysio Nunes colocou no seu Twitter sobre o novo presidente norte-americano como "o partido republicano de porre [...] é o que há de pior, de mais incontrolado, de mais exacerbado entre os

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integrantes de seu partido".13 Além disso, o mesmo é investigado pela Operação Lava Jato14, por ter recebido 500 mil reais em recursos não contabilizados da Odebrecht15.

Como Ministro das Relações Exteriores, Nunes tem buscado se aproximar mais das relações com os BRICS. Destacamos que apesar de Serra ter tentado se aproximar dos países do Norte, somando a crítica do atual ministro ao presidente Trump, os países do Norte não têm dado muita atenção ao Brasil. Pode-se dizer que pelas próprias controvérsias que tem marcado o governo Temer, como: falta de legitimidade, governo impopular, visto como provisório por muitos países, corrupção, entre outros.

O ministro Nunes também buscou priorizar o Mercosul, no entanto, mantendo a Venezuela suspensa do bloco. Já na UNASUL, o Brasil, junto com Argentina, Colômbia, Chile e Peru, suspenderam suas atividades no bloco, em carta enviada à Presidência Pró-Tempore da União das Nações Sul-americanas (Unasul), Fernando Huanacumi, chancelar da Bolívia, que está no comando da organização. A razão alegada pelos países foi o impasse quanto a escolha do próximo secretario geral da UNASUL, que era ocupado por Ernesto Samper, ex-presidente da Colômbia. Com o término do seu mandato, foi indicado pela Argentina José Octavio Bordón, ex-governador da província de Mendoza e ex-embaixador do país em Washington. No entanto, como as decisões são por consenso dentro do bloco, Venezuela não aceitou a indicação pois o cargo só deveria ser ocupado por ex-presidentes ou ex-chanceleres. Isso causou a paralisia dentro do bloco e a divisão de frentes: de um lado países mais voltados para o comércio e práticas liberais e do outro voltados para uma integração mais fechada e protecionista quanto aos países do Norte.

Apesar da paralisia dentro do bloco, que resultou em mais de um ano sem realizar encontros entre os países membros, a suspensão das atividades dos 6 principais países gera efeitos simbólicos e políticos no processo da integração na América do Sul. Depois de décadas, ou até mesmos séculos se dizermos com as                                                                                                                          

13 Carta Capital. Escolhido para o Itamaraty, Aloysio Nunes atacou Trump no Twitter. 2/03/2017. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/politica/escolhido-para-o-itamaraty-aloysio-nunes-atacou-trump-no-twitter Acesso em: Julho de 2018.

14A Operação Lava Jato é um conjunto de investigações em andamento pela Polícia Federal

do Brasil, iniciada em 17 de março de 2014, em que investiga crimes de corrupção ativa e passiva, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, organização criminosa, obstrução da justiça, operação fraudulenta de câmbio e recebimento de vantagem indevida.

15 Empresa brasileira que atua nas áreas de construção e engenharia, química e

petroquímica, energia, entre outros, envolvida na Lava Jato.

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primeiras tentativas de Simón Bolívar por volta dos anos de 1820 com a busca de uma “União Bolivariana” ou uma “Confederação Andina”, por motivos partidários e ideológicos, o governo brasileiro dá passos em direção ao passado, descartando a busca por uma cooperação e um fortalecimento coletivo entre os países da América do Sul.

Não é a primeira vez que o Brasil é criticado por priorizar seus interesses e adotar práticas unilaterais em vez de pensar no coletivo e na integração. O Brasil em 1999 quebrou a paridade da sua moeda, o Real, com o dólar, levando a uma séria crise econômica na Argentina e a quebra da União Aduaneira no Mercosul. Até os dias de hoje, o Mercosul é uma união aduaneira incompleta devido a uma lista de exceções que fora estabelecida pela Argentina, devido a crise econômica no país.

Assim, podemos observar que apesar das críticas quanto a Cooperação Sul-Sul, realizada principalmente por Serra, no inicio do governo Temer, Brasília não realizou grandes mudanças na estratégia da política externa brasileira em vista que manteve-se o estreitamento das relações com os BRICS. A tentativa do governo brasileiro de se aproximar com os países do Norte não foi bem sucedida. Muitos chefes de Estado ou de governo evitaram visitar o Brasil, escolhendo outros países na região, como a chanceler alemã Angela Merkel, o premiê israelense Benjamin Netanyahu e o então presidente francês François Hollande. Talvez a maior ruptura foi com relação a Venezuela, por destacar que a aproximação do governo brasileiro com este país foi de caráter ideológico, causando certa crise no processo de integração na América do Sul.

Outro aspecto a ser destacado foi a drástica redução da diplomacia presidencial no governo Temer, viajando menos para o exterior do que qualquer um de seus antecessores desde Itamar Franco. Percebe-se que apesar da busca por um enfoque mais econômico, direcionando suas ações em priorizar as relações comerciais do que por uma cooperação política ou social, o Brasil continua apresentar um baixo crescimento econômico do seu mercado. Além disso, pela falta de uma real estratégia e de certa forma, a politica externa brasileira estar em segundo plano, o Brasil perdeu sua capacidade de pautar nas discussões da agenda internacional, não conseguindo lidar com os desafios regionais como a crise na Venezuela ou a crescente presença chinesa na América Latina.

Considerações Finais

Devido a questão de tempo, destacamos de forma breve as principais ações da política externa brasileira desde o governo Sarney até o governo Temer a fim de

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perceber se houve grandes rupturas ou certa continuidade nas ações do Brasil no ambiente internacional, principalmente no governo Temer. Esta análise partiu justamente de verificar se o discurso do governo Temer condizia com a prática, já que o mesmo passa a discursar sobre a necessidade de mudanças na condução da política exterior do Brasil com relação aos governos anteriores, mais especificamente dos governos Lula e Dilma.

Ao analisarmos sobre a política externa brasileira, percebemos que por mais que haja mudanças nas estratégias governamentais, a mesma tem apresentado certa continuidade ao longo das décadas. Como a política externa representa a busca dos interesses nacionais de determinado país no exterior, o que se altera de forma mais abrangente são as estratégias utilizadas em cada governo para atingir esses interesses nacionais. Grandes rupturas na condução da politica externa dos países são percebidas quando ocorre conflitos internos ou revoluções, alterando as percepções sobre os interesses nacionais.

Verificamos que as principais características da Política de Estado do Brasil são a busca da autonomia e do desenvolvimento brasileiro. Já sobre a Política de Governo, as estratégias foram: a autonomia pela distância, principalmente no governo Sarney; a autonomia pela participação principalmente com Collor e FHC; a e autonomia pela diversificação no governo Lula. O governo Dilma, devido aos problemas e impactos externos e internos, não houve uma estratégia muito clara na condução da politica externa brasileira, sendo chamado por muitos acadêmicos como “contenção na continuidade”.

Já o atual governo, verificamos que o mesmo não possui uma estratégia clara na condução da política externa brasileira, agindo conforme a “onda do momento”. Apesar do discurso de buscar uma cooperação mais estreita com os países do Norte e reduzir as relações com os países do Sul, na verdade a grande ruptura na condução da política externa do Brasil do governo Temer com relação aos governos Lula e Dilma foi o afastamento do Brasil com a Venezuela. Devido a falta de legitimidade e de aceitação de Temer no ambiente internacional, visto por muitos como um governo provisório, houve um certo descaso por parte de vários países do Norte com relação ao Brasil.

Assim, apesar das críticas com relação ao enfoque dado pelo governo Lula e Dilma sobre a priorização na Cooperação Sul-Sul, o governo Temer manteve o estreitamento das relações com os BRICS e com os países do Mercosul, exceto Venezuela. Percebemos também, que embora tenha destacado que a condução da política externa seria livre de ideologia, a suspenção da Venezuela no Mercosul e o afastamento do Brasil na integração com os países da América do Sul, ou seja, na

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UNASUL, se deu de forma ideológica, se voltando para países com um caráter mais liberalizante.

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