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A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS

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DAIRSON MENDES DE SOUZA

A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA

NAS AÇÕES COLETIVAS

Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora do Curso de Pós-Graduação em Direito das Relações Sociais – Subárea de Direitos Difusos e Coletivos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Patricia Miranda Pizzol

PUC/SP SÃO PAULO

(2)

Banca Examinadora

___________________________________

(3)

Agradecimentos

(4)
(5)

RESUMO

O trabalho versa sobre o polêmico tema da relativização da coisa julgada com foco nas ações coletivas.

Antes de tudo, convém desde já delimitar o estudo em questão. Existem as ações coletivas para a tutela dos casos concretos e as ações coletivas que cuidam do controle abstrato de constitucionalidade.

Foram tratadas na dissertação as ações coletivas adequadas à tutela dos casos concretos. Todavia, nem todas as ações desta categoria foram abordadas, pelo fato de que algumas delas são muito específicas e cuidar de todas exigiria um aprofundamento e extensão incompatíveis com o presente trabalho. As ações coletivas cabíveis ao controle abstrato de constitucionalidade não foram abordadas porque a relativização da coisa julgada não se aplica à elas, em hipótese alguma.

Antes de enfrentar o tema central, fizemos algumas considerações sobre a jurisdição, sentença, coisa julgada, ações coletivas, nulidades que contaminam as sentenças, coisa julgada e litispendência nas ações coletivas.

(6)

ABSTRACT

This paper deals with the polemic subject of the relativization of the thing adjudged focusing on the collective actions.

By the beginning it seems to be necessary to delimitate the issue of this study. There are collective actions applied to concrete cases and collective actions that deal with the abstract control of constitutionality.

In the present work we have studied the collective actions applied to concrete cases. But not all kinds of collective actions in this category have been analysed though, because some of them are too specific and writing about them would take a deepness and extension not intended for this study. We didn’t consider the collective actions that deal with the abstract control of constitutionality either because the relativization of the thing adjudged does not apply to them.

Before facing the main subject we decided to make some considerations about jurisdiction, sentences, thing adjudged, collective actions, nullities that affect the sentences, thing adjudged and litispendency in the collective actions.

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

1. A JURISDIÇÃO E A COISA JULGADA...14

1.1. Jurisdição: conceito e finalidade ...14

1.2. Interesse na jurisdição e justiça das Decisões...20

1.3. Jurisdição e coisa julgada...22

1.4. O processo como instrumento para a realização da jurisdição ...24

1.4.1. Pressupostos processuais e condições da ação ...25

2. SENTENÇA...30

2.1. Processo e segurança jurídica ...30

2.2. Sentença: escorço histórico ...31

2.3. Conceito, natureza jurídica e imutabilidade...33

2.4. A sentença como pronunciamento obrigatório do juiz ...37

2.4.1. Estrutura ...37

2.4.2. Condições ...39

2.4.3. Classificação...41

2.4.3.1. De acordo com o conteúdo ...41

2.4.3.2. De acordo com a eficácia...42

2.4.3.2.1. Sentenças declaratórias...43

2.4.3.2.2. Sentença constitutiva ...45

2.4.3.2.3. Sentença condenatória ...46

2.4.3.2.4. Sentença Mandamental...48

2.4.3.2.5 Sentença executiva lato sensu...49

3. A COISA JULGADA...52

3.1. Brevíssimas notícias sobre o processo e a coisa julgada no direito romano ...52

3.2. O tratamento constitucional da coisa julgada no Brasil ...58

3.3. Definição de coisa julgada ...61

3.3.1. Coisa julgada formal e material...65

3.4. Limites objetivo e subjetivo da coisa julgada ...68

3.5. A importância da coisa julgada...75

(8)

3.7. O duplo grau de jurisdição e a coisa julgada...81

3.7. A coisa julgada como meio de prova ...83

4. AS AÇÕES COLETIVAS...84

4.1. A necessidade do regramento das ações coletivas como conseqüência previsível da evolução da sociedade e seus conflitos ...84

4.2. Brevíssimas notas sobre a evolução das ações coletivas no Brasil ...86

4.3. Conceito de ações coletivas ...88

4.4. As ações coletivas previstas na Constituição Federal de 1988 ...89

4.5. A contribuição da Constituição Federal de 1988 ao arcabouço processual coletivo brasileiro ...91

4.6. Tutela jurisdicional coletiva...92

4.6.1. Ações coletivas mais comuns...94

4.6.1.1. Ação civil pública...94

4.6.1.2. Ação popular...103

4.6.1.3 Mandado de segurança coletivo...108

5. NULIDADES QUE CONTAMINAM AS SENTENÇAS...116

5.1. Nulidades dos atos processuais ...116

5.2. Classificação ...120

5.3. Nulidades das sentenças...125

5.4. Querela nullitatis...130

6. A COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS...138

6.1. A disciplina da coisa julgada no CDC e a interação legislativa entre o CDC e a Lei de Ação Civil Pública ...138

6.2. A coisa julgada e os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos: conceituação necessária...139

6.2.1. Os direitos e interesses essencialmente coletivos...140

6.1.2. Os direitos e interesses formalmente coletivos...142

6.3. A coisa julgada nas ações coletivas...145

6.3.1. A coisa julgada para os direitos e interesses difusos ...145

6.3.1.2. A coisa julgada para os direitos e interesses coletivos...152

6.2.1.3. A coisa julgada para os interesses individuais homogêneos...154

6.3.1.3.1. Os direitos individuais homogêneos e a condenação genérica do artigo 95 do CDC...157

(9)

6.3.1.4. A indevida limitação dos efeitos da coisa julgada aos associados que demonstrarem

seu domicílio na data da propositura da ação ...160

6.4. A tentativa de restrição territorial da coisa julgada em ações coletivas: a alteração legislativa do artigo 16 da Lei de Ação Civil Pública ...162

6.5. A formação da coisa julgada em processos extintos sem julgamento de mérito ...169

6.6. A coisa julgada no mandado de segurança coletivo...172

6.7. A coisa julgada na ação popular ...174

7. A LITISPENDÊNCIA E AS AÇÕES COLETIVAS...177

7.1. A ocorrência da litispendência e o instituto da coisa julgada ...177

7.2. A litispendência entre ações individuais e coletivas ...178

7.3. A litispendência entre processos coletivos...180

7.4. A suspensão dos processos individuais como requisito para participação dos efeitos erga omnes do processo coletivo...181

8. A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS...184

8.1. A garantia constitucional do acesso à justiça e a coisa julgada ...184

8.2. A doutrina e a relativização da coisa julgada...188

8.3. O pensamento do Ministro José Augusto Delgado do Supremo Tribunal Federal ...196

8.4. A impossibilidade da relativização da coisa julgada de sentenças que julgaram pedidos juridicamente impossíveis...200

8.5. A coisa julgada inconstitucional ...203

8.6. Coisa julgada e Estado Democrático de Direito: o pensamento de Nelson Nery Junior ...213

8.7. Necessidade de relativização ...214

8.7.1. Definição de prova e prova técnica ...219

8.7.2. Objeto da prova ...221

8.7.3. A finalidade e o destinatário da prova e a coisa julgada...223

8.7.4. Ônus da prova...227

8.7.4.1. Inversão do ônus da prova ...231

8.7.4.2. Os requisitos da verossimilhança e hipossuficiência...236

8.7.4.3. Momento da inversão ...238

8.8. O Direito, a coisa julgada, justiça das decisões e a sociedade de riscos ...241

8.8.1. A sociedade de riscos, os riscos do desenvolvimento e a ciência ...243

8.8.2. A controvérsia sobre a aplicação da teoria do risco do desenvolvimento como excludente de responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto...245

(10)

8.10. A necessária previsão da relativização da coisa julgada em lei ...259

CONCLUSÃO...262

(11)

INTRODUÇÃO

A dissertação com o tema relativização da coisa julgada nas ações coletivas foi desenvolvida em nove capítulos. Antes de ingressar nas considerações acerca da relativização do clássico instituto de direito processual, foram feitas algumas considerações sobre outros assuntos pertinentes à espécie e necessários ao entendimento da matéria em comento.

O primeiro capítulo trata da jurisdição com ênfase na coisa julgada. Foram abordados o conceito, a finalidade e o interesse na jurisdição, relacionando-os com a justiça das decisões. Foram feitas, também, considerações acerca do processo como instrumento para a realização da jurisdição, sendo tratado os pressupostos processuais e as condições da ação.

O segundo capítulo cuida da sentença, cuja importância resulta de ser ela o ato do juiz que permite a ocorrência da coisa julgada. Foi feito um escorço histórico sobre o tema, definido seu conceito, natureza jurídica e imutabilidade. Além disso, a sentença foi tratada como um pronunciamento obrigatório do juiz, aonde foi abordada sua estrutura, condições e classificação de acordo com seu conteúdo (sentenças definitivas ou terminativas), eficácia (sentenças declaratórias, constitutiva, condenatória, mandamental, e as executivas lato sensu).

(12)

O quarto capítulo cuidou das ações coletivas, que surgiram como conseqüência da evolução da sociedade e seus conflitos. Foram feitos pequenos comentários acerca da evolução das ações coletivas no Brasil, definindo-as.

Das ações que integram a jurisdição coletiva comum foram feitos comentários apenas à Lei de Ação Civil Pública, Lei de Ação Popular e Mandado de Segurança Coletivo. Essa limitação foi entendida como necessária em razão da abrangência da tutela das ações estudadas e especificidade de algumas ações não condizentes com o trabalho dessa dissertação. As ações de controle abstrato de constitucionalidade não foram estudadas porque a hipótese de relativização da coisa julgada a elas não se aplicam.

O quinto capítulo versa sobre as nulidades que contaminam as sentenças. Foram tratadas as nulidades que contaminam os atos processuais, a classificação dos defeitos que podem macular os atos jurídicos (inexistência, nulidade, anulabilidade e irregularidade), as nulidades da sentença e abordado o tema da querella nullitatis.

O sexto capítulo foi dedicado à coisa julgada nas ações coletivas. Inicialmente foram feitas considerações acerca da interação legislativa entre o CDC e a Lei de Ação Civil Pública. Posteriormente, foram conceituados os direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Então foi demonstrado como se dá a coisa julgada na ação civil pública quando se tratam de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Além disso, foi demonstrado como se dá a coisa julgada na ação popular e no mandado de segurança coletivo.

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individuais como requisito para participação dos efeitos erga omnes do processo coletivo.

O oitavo capítulo cuida da relativização da coisa julgada nas ações coletivas que tutelam direitos subjetivos. Foram tratados, conjuntamente, a garantia constitucional do acesso à justiça e a coisa julgada. Em seguida foi trazido à colação o entendimento da doutrina acerca da relativização; o pensamento do Ministro José Augusto Delgado, do STF; tratada a questão da impossibilidade da relativização da coisa julgada das sentenças que julgaram pedidos juridicamente impossíveis; feito um breve estudo sobre a coisa julgada inconstitucional; o pensamento de Nelson Nery Junior sobre a coisa julgada; discutida a necessidade de relativização, bem como feita uma proposta de relativização para as ações coletivas.

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1. A JURISDIÇÃO E A COISA JULGADA

1.1. Jurisdição: conceito e finalidade

O Homem, nas fases primitivas da civilização1, não dispunha de um Estado organizado suficientemente forte para resolver os conflitos que surgissem, de modo que prevalecesse uma decisão imparcial. Eram os tempos da justiça privada.

Todavia, com o fortalecimento do Estado de Direito, os litígios, que surgem quando há “um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida”, na lição clássica de Carnelutti2, passaram a ser pacificados exclusivamente pelo Estado. 3

Com efeito, a distribuição da justiça4, é uma das missões do Estado e exercida por ele por meio de seus poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,

1“Nas fases primitivas da civilização dos povos, inexistia um Estado suficientemente forte para superar os

ímpetos individualistas dos homens e impor o direito acima da vontade dos particulares”. CINTRA, Antonio Carlos Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 10. ed. São Paulo: Malheiros Ed., 1994. p. 21.

2CARNELUTTI, Francesco. Instituciones de proceso civil. Buenos Aires, 1973. v. 1, n. 1, p. 21-22.

3Pontes de Miranda ensina que “A pretensão é o poder exigir alguma prestação. Do outro lado da relação jurídica

está o obrigado, que talvez tenha, também ele, a sua pretensão, ou as suas pretensões. Tanto àquele quanto a esse o Estado reconhece a pretensão à tutela jurídica, com que, passando a si o fazer justiça, substituiu o antigo direito de se fazer justiça com as próprias mãos (declarativa, constitutiva, condenatória, mandamental, executiva). Por isso, a pretensão à tutela jurídica dirige-se ao Estado; não a outras pessoas obrigadas. A designação Rechtsschutzanspruch foi-lhe dada em 1885, por Adolf Wach (Handbuch des deutschen, Zivilprozessrechts, I, 19, s.). Tanto os que têm a pretensão de direito material quanto o obrigado dispõem da pretensão à tutela jurídica. Também dela dispõe o que apenas quer que se declare, se constitua, se execute, ou se mande. MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado da ação rescisória. Campinas: Bookseller, p. 42.

4“Para manter o império da ordem jurídica e assegurar a paz social, o Estado não tolera a justiça feita pelas

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que são independentes e harmônicos entre si, consoante o disposto no artigo 2º da Constituição Federal5.

O Poder Legislativo faz as leis que devem ser aplicadas; o Poder Executivo, por meio da gerência da coisa pública, garante o investimento em infra-estrutura, captação de recursos (recolhimento de tributos) e promove a assistência social; o Poder Judiciário aplica as leis aos casos concretos, julgando as ações submetidas à sua apreciação. Esta atividade recebe o nome de jurisdição.6.

A jurisdição pode ser definida como a interpretação e aplicação do direito objetivo, pelas autoridades constituídas pelo Estado, aos conflitos sociais submetidas à apreciação.7 Busca-se, por meio da jurisdição, a pacificação dos

conflitos de interesses existentes na sociedade.

5“Nenhum princípio de nosso constitucionalismo excede em ancianidade e solidez o princípio da separação de

poderes. Inarredável de todas as Constituições e projetos de Constituição já formulados neste País, desde 1823, data de elaboração do célebre Projeto de Antônio Carlos oferecido à Constituição Imperial, ele atravessou o Império e a República, rodeado sempre de respeito e do prestígio que gozam as garantias constitucionais de liberdade. A única exceção veio a ser a Carta de 1937, mas esta em rigor não foi uma Constituição e sim um ato de força de natureza institucional, tanto que afastou, por inteiro, o País de toda a sua tradição de liberalismo e representatividade do poder. Veja-se que depois do desastre de 1937, nem as Constituições outorgadas pela ditadura de 1964, sem embargo de violência de seu autoritarismo, ousaram tocar naquele princípio”. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros Ed., 2002. p. 508.

6“Humberto Theodoro Jr. define jurisdição como “o poder que toca ao Estado, entre as suas atividades

soberanas, de formular e fazer atuar praticamente a regra jurídica concreta que, por força do direito vigente, disciplina determinada situação jurídica”. THEODORO JÚNIOR, Humberto. op. cit., p. 34.

7Patricia Miranda Pizzol, em sua obra Competência no Processo Civil, reuniu a definição de jurisdição de vários

juristas consagrados, nacionais e estrangeiros, a saber:

“a) Liebman: “a atividade dos órgãos do Estado, destinada a formular e atuar praticamente a regra jurídica concreta que, segundo o direito vigente, disciplina determinada situação jurídica.’

b) Chiovenda: ‘a função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos, já no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la praticamente efetiva.’

c) Carnelutti, para quem jurisdição é a função de composição das lides, como se extrai do conceito de processo contencioso, ‘O processo contencioso é, portanto, um processo caracterizado pelo fim, que não é outro que a composição da lide.’

(16)

A jurisdição não está ligada tão somente ao Poder Judiciário. Existem países em que o Poder Executivo, por meio de processos administrativos, julga e dá a última palavra sobre matérias administrativas. São as chamadas jurisdições administrativas. O Brasil não adota esse sistema.8 Nosso regramento constitucional, artigo 5º, inciso XXXV, garante a inafastabilidade do Poder Judiciário, ao dispor que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

A jurisdição é norteada por vários princípios, entre os quais se destacam: juiz natural, inafastabilidade do controle jurisdicional e dispositivo, duplo grau de jurisdição, investidura, aderência ao território, indelegabilidade, inevitabilidade, indeclinabilidade e definitividade.9

O princípio do juiz natural está ligado à competência e à imparcialidade do juiz. Assegura às partes que o processo não seja julgado por um tribunal ou juiz criado ou designado especialmente para julgar aquele fato. Esse princípio decorre do artigo 5º, XXXVII e LIII, da CF/88.

A inafastabilidade do controle jurisdicional decorre do artigo 5º, XXXV, da CF/88, que dispõe, in verbis: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Nem a lei, nem ninguém pode

o poder e cumprindo a função que lhe comete. O poder, a função e a atividade somente transparecem legitimamente por meio do processo devidamente estruturado (devido processo legal).

e) Moacyr Amaral Santos: “Jurisdição é a função do Estado destinada a compor conflitos de interesses ocorrentes. Tem por finalidade resguardar a ordem jurídica, o império da lei, amparando o direito objetivo, e, como conseqüência, proteger aquele dos interesses em conflito que é tutelado pela lei. Sendo função Estatal, e mesmo uma das características da soberania do Estado, é exercida sobre todo o território nacional. PIZZOL, Patricia Miranda. A competência no processo civil. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003. p. 33.

8Carmem Lúcia Antunes Rocha, em nota de rodapé, bem esclarece a questão: “Conquanto a palavra jurisdição

vincule-se a idéia de judicial (aqui ligada à noção de Poder Judiciário), é certo que a jurisdição pode ser exercida por outros órgãos estatais que não aqueles componentes do Poder Judiciário. Isto ocorre nos Estados que adotam a chamada jurisdição administrativa. Neles, órgãos do Poder Executivo afirmam e aplicam o direito a caso concreto sobre o qual se litigue, em caráter definitivo e vinculante. Nos países que não adotam esse sistema tem-se o fortalecimento do conceito de jurisdição vinculado ao da atividade do Poder Judiciário, pois então o Estado monopoliza aquela atividade e responde pela prestação exclusivamente pelo conjunto de órgãos que compõem aquele Poder. Esta constatação não deve restringir ou apequenar o sentido da palavra jurisdição, pois a atividade é mais importante para o titular do direito que o órgão que realiza a prestação”. ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. O direito constitucional à jurisdição. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). As garantias do cidadão na justiça. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 33.

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impedir que uma lide seja apreciada pelo Poder Judiciário. O Tribunal Marítimo, por exemplo, criado pela Lei 2.180/54, é um órgão auxiliar do Poder Judiciário. Está ligado ao Poder Executivo e tem por competência o julgamento dos fatos e acidentes de navegação e a manutenção do registro naval. Trata-se de um órgão que, apesar do nome, profere decisões administrativas. Portanto, não integra a jurisdição e suas decisões sempre podem ser revistas pelo Poder Judiciário.

Releva notar que a Lei 9.307/96, que dispõe sobre a arbitragem, prevê a possibilidade de pessoas capazes de contratar valerem-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis. Isto significa que as partes podem renunciar à jurisdição estatal, mediante prévia convenção, quando a questão envolver direitos patrimoniais disponíveis. Nesta hipótese, um árbitro privado resolverá eventual lide surgida entre elas.

A convenção de arbitragem é uma relação jurídica formada entre as partes por meio da cláusula compromissória e o compromisso arbitral.

A lei que disciplina a matéria, em seu artigo 4º, define cláusula compromissória como “a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.”

O compromisso arbitral é definido pela Lei de Arbitragem, em seu artigo 9º, como “a convenção através do qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.”

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Nelson e Rosa Nery esclarecem que a arbitragem não ofende aos princípios constitucionais da inafastabilidade do controle jurisdicional, nem do juiz natural. É que a Lei da Arbitragem deixa a cargo das partes a escolha do julgamento da lide, que pode tanto ser um juiz estatal ou um juiz privado. O doutrinador ainda esclarece que a lei seria inconstitucional se houvesse compulsoriedade de sua aplicação, afastando da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça a direito. No que tange ao juiz natural, explica que as partes estabelecem de antemão como será julgada uma eventual lide surgida entre elas e que o requisito da pré-constituição, na forma da lei, que caracteriza o princípio do juiz natural, também está presente no juízo arbitral.10

O princípio do duplo grau de jurisdição não está expresso na Constituição, mas decorre do princípio do devido processo legal, previsto no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal. Trata-se da possibilidade de uma decisão ser examinada, no mínimo, por mais de uma vez, quando há interposição de recurso, pelo Tribunal superior ou pelo mesmo Tribunal.

O princípio da investidura garante aos jurisdicionados serem julgados somente por juízes regularmente investidos de autoridade, ou seja, aqueles que ingressaram nos quadros da Magistratura por concurso público, pelo quinto constitucional ou quando designados por autoridade competente. Por exemplo, Ministros do Supremo Tribunal Federal indicados pelo Presidente da República (artigo 101 da CF/88). Devem ainda estar em atividade. Decisões proferidas por juízes aposentados são inexistentes.

O princípio da aderência ao território é uma espécie de delimitação territorial do poder do Magistrado. Em razão da soberania nacional, a jurisdição brasileira só alcança nosso território. A jurisdição também é limitada à Comarca ou à Seção Judiciária, dependendo da Justiça (estadual ou federal). Um juiz só

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tem sua jurisdição reconhecida dentro dos limites legais previamente estabelecidos.

Quanto à indelegabilidade, significa que o juiz deve exercer pessoalmente suas funções. Não pode delegar a terceiros o exercício de seu ofício. A jurisdição é indelegável.

A inevitabilidade decorre do fato de que as partes do litígio, independentemente do resultado do julgamento, sujeitam-se a ele. Isto porque apenas o Estado detém o poder.

A indeclinabilidade é garantia de que o Estado vai pronunciar-se em quaisquer demandas, ainda que para extinguir o processo sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 267 do CPC, conforme será abordado mais adiante.

Temos, também, o princípio da definitividade. Uma vez ocorrido o trânsito em julgado, situação processual decorrente da impossibilidade de interposição de recursos, opera-se a coisa julgada. A coisa julgada é um dos institutos mais antigos do direito e graças a ela é alcançada a segurança jurídica das decisões, uma vez que se tornam impassíveis de serem reformadas.

A jurisdição se caracteriza por ser “secundária”, “instrumental”, “declarativa ou executiva”, “desinteressada” e “provocada”.11

É secundária porque a pacificação promovida pelo Estado deveria, a princípio, ser alcançada pelas partes envolvidas no litígio.

Instrumental porque é o instrumento disponível à coletividade para que resolvam seus conflitos. A Jurisdição não tem outra finalidade, senão a pacificação dos conflitos sociais, por meio da aplicação do direito e distribuição da justiça.

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A característica declarativa ou executiva decorre do fato de que o Estado, por meio da atividade jurisdicional, muitas vezes afasta as incertezas ou repara as transgressões sofridas pelas partes, por meio de declarações judiciais ou de medidas de execução previstas em lei.

Outra característica da jurisdição é sua imparcialidade. O Juiz aplica aos casos concretos a vontade da lei, e não das partes. Também é inerte: o Poder Judiciário só se manifesta quando provocado.

1.2. Interesse na jurisdição e justiça das Decisões

Cabe ao Estado, portanto, o monopólio da prestação jurisdicional, por meio do Juiz, que é imparcial, pacificar o conflito de interesses12 posto a julgamento, aplicando ao caso concreto a regra legal adequada.

O interesse pode ser definido como um sentimento que nos leva a buscar aquilo que é necessário, útil ou que tenha importância. Existem vários tipos de interesses. A Constituição Federal menciona o interesse particular, coletivo, específico, local, nacional, da União, dos Estados e público. 13

12Tradicionalmente, o processo civil cuidou dos interesses individuais. Essa visão, todavia, começou a mudar a

partir dos estudos levados a cabo por Capelletti. É o que explica Lourival Gonçalves de Oliveira: “Este foi enfocado dentro da tônica do nosso direito de que o ingresso em juízo é vinculado à sua natureza pessoal, o chamado direito subjetivo do autor. Esta influência das leis jusnaturalistas, como concebidas no século XVIII. De um lado, é posto o interesse pessoal, particular, e, de outro, o interesse público, numa dicotomia estável, excludente de outros interesses, insuficientes à satisfação da realidade. Esta situação sempre foi pretendida pelo Estado como garantia de supremacia e facilitação do exercício político, procurando retardar ou atenuar o reconhecimento de grupos intermediários ou categorias. Trata-se de fruto do jusnaturalismo de Rousseau, hoje amplamente revisto a partir da profunda crítica oriunda dos trabalhos de Capelletti. Atualmente, parece indiscutível a existência de interesses não opostos a um ou outro lado deste dualismo político tradicional, que atendem à generalidade de anseios. São verdadeiros tertium genus. Daí o jurista ressaltar o significado classista de interesse, sempre acrescido de adjetivo: público, individual, secundário, primário, de agir, social, etc”. OLIVEIRA, Lourival Gonçalves de. Interesse processual e mandado de segurança coletivo. Revista de Processo, São Paulo, v. 14, n. 56, p. 78, out./dez. 1989.

13“O interesse pode apresentar diversas titularidades ou sujeitos, levando a uma classificação subjetiva. A

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Independentemente de o interesse ser particular, coletivo, público, social, específico, local, nacional, da União, dos Estados, dos Municípios, uma vez provocado, o Poder Judiciário deverá pronunciar-se, dizendo a quem cabe o direito. Para tanto, o Juiz deve pautar-se em todo o ordenamento jurídico. Na necessária interpretação do direito objetivo, o magistrado não deve se esquecer da vontade da lei, deve ser guiado pelas diretrizes traçadas pelo legislador constituinte.

A Constituição Federal, em seu artigo 3º, consagra como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Isso significa que a busca por uma sociedade justa deve nortear todas as atividades do Estado, compreendendo inclusive os atos jurisdicionais. A justiça social vem novamente contemplada no artigo 193 da Carta Maior, quando o legislador garante que “a ordem social tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.14

Em outras palavras: a jurisdição deve solucionar os conflitos, pondo termo às controvérsias por meio de sentenças. Todavia, não basta ao Estado simplesmente proferir quaisquer decisões, mas decisões justas, pois este é o

interesse coletivo: arts. 5º, XXXIV; 13, 192; interesse social: arts. 5º, XXI; 5º XXIV; 12, 184;

interesse específico: arts. 29, XI; 129, V; 200, I; 232, 237; interesse local: art. 30, I e V;

interesse nacional: art. 12, § 4º, I; 148, II; 172; 176, § 1º; 129, III; ADCT, 44, § 1º; interesse da União, Estados etc.: arts. 109, IV; 155, § 2º, V, b; 144, § 1º;

interesse público: ARTS. 19, I; 37, IX; 57, § 6º, II; 66, § 1º; 93, VIII e IX; 95, II; 128. § 5º, I, b; 231, §§ 5º e 6º; ADCT, 51 §§ 2º e 3º; 52, parágrafo único”. SLAIBI FILHO, Nagib. Sentença cível: fundamentos e técnica.

5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 2.

14Oportuno, neste momento, lembrar a lição de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araújo Cintra e

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objetivo do Direito.15 Não basta apenas proferir uma decisão que contemple o

particular, o individual em detrimento do bem comum 16 pondo em xeque

valores de toda a sociedade. A indeclinabilidade do Poder Judiciário não está dissociada da justiça de suas decisões17

Para que uma decisão faça coisa julgada, é garantido um longo caminho processual às partes, para que interponham os recursos que acharem cabíveis. Assim, quando uma decisão faz coisa julgada, desde que tenham sido interpostos recursos durante a marcha processual, foi dado ao Estado a oportunidade para corrigir eventual erro judicial. Vale dizer, a logística processual minimiza, de per si, a possibilidade de o Estado cometer injustiças. Mas ainda assim, a prática tem demonstrado que em alguns casos elas ocorrem.

1.3. Jurisdição e coisa julgada

O instituto da coisa julgada permite que o Estado ponha fim à sua missão jurisdicional. É por meio do referido instituto que o processo chega ao seu fim. Com a sentença revestida pela autoridade da coisa julgada, torna-se

15Nesse sentido é a aula do Prof Rodolfo de Camargo Mancuso: “(...) o que hoje se espera da função

jurisdicional, sob a direção da intrumentalidade-efetividade, é que a resposta judiciária, no limite do possível, de um lado se mostre plena e exauriente, resolvendo-se a um tempo o processo e a lide; e, de outro lado, que promova a maior coincidência possível entre o direito material (lesado ou ameaçado) e a reparação/prevenção resultante do cumprimento do julgado”. MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação civil pública em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores. 8. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002. p. 291.

16Ver SLAIBI FILHO, Nagib. op. cit., p. 5.

17Falando sobre as transformações sofridas pelo Poder Público, Nagib Slaibi Filho fez importantes considerações

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impossível rediscutir as decisões judiciais ali lançadas, independentemente de seu conteúdo. Daí o relevo que assume para o Direito em geral.18.

O aspecto da justiça das decisões tem sido argumento bastante utilizado por parte da doutrina para sustentar que o Estado, para cumprir seu papel jurisdicional, não pode proferir quaisquer decisões, mas somente aquelas que consagrem a justiça. É a idéia da tutela jurisdicional efetiva e do processo civil de resultados 19

Teresa Arruda Alvim Wambier, em artigo que tratava de recursos judiciais, expressou sua visão sobre a finalidade da jurisdição, que tem o processo como instrumento para que as partes possam alcançar o direito material, ressaltando que não deve existir um abismo entre as decisões judiciais e a realidade. A autora sustenta que o processo foi criado para distribuir direitos a seus reais titulares, não para atribuir a quem não os tem”.20

Existem decisões judiciais acobertadas pelo manto da coisa julgada que são absolutamente desconexas com a realidade, com o mundo dos fatos e causas de enormes injustiças, ora contra o homem comum, ora contra o meio-ambiente, ora contra a coletividade.

18“Diante da suprema importância dada à segurança jurídica pela doutrina em geral, a coisa julgada é e sempre

foi sacralizada. Conforme entendimento até pouco tempo atrás pacífico na doutrina e na jurisprudência, entende-se que após a imunização da situação de direito substancial pela coisa julgada material, passado o prazo para a propositura de ação rescisória, a imutabilidade persiste independentemente da gravidade do vício acobertado pela coisa julgada (Res judicata facit de nigro album et de albo nigrum). Nessa linha EDUARDO JUAN COUTURE faz menção ao famoso dístico de SCASSIA: "la cosa juzgada hace de lo branco, negro; origina y crea las cosas; transforma lo cuadrado en redondo; altera los lazos de la sangre y cambia lo falso en verdadero" LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Coisa julgada e justiça das decisões. Forense. Disponível em: <www.forense.com.br/atualida/artigos_DC/coisa.htm>. Acesso em: 29 dez. 2003.

19O Prof. Cândido Rangel Dinamarco sustenta que “O que importa não é oferecer ingresso em juízo, ou mesmo

julgamento de mérito. Indispensável é que, além de reduzir os resíduos de conflitos não –jurisdicionalizáveis, possa o sistema processual oferecer aos litigantes resultados justos e efetivos, capazes de reverter situações injustas desfavoráveis. Tal é a idéia da efetividade da tutela jurisdicional, coincidente com a da plenitude do acesso à justiça e a do processo civil de resultados. DINAMARCO, Cândido Rangel. Tutela jurisdicional.

Revista de Processo, São Paulo, v. 21, n. 81, p. 55, jan./mar. 1996.

20WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Fungibilidade de “meios”: uma outra dimensão do princípio da

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Rediscutir essas decisões fora dos limites previstos em lei (ação rescisória e artigo 741, I, e parágrafo único do CPC) é impossível. Por isso, a doutrina tem defendido a possibilidade de flexibilização da coisa julgada em alguns casos, considerando que não é justo perpetuar injustiças com fundamento na coisa julgada.

1.4. O processo como instrumento para a realização da jurisdição

A Constituição Federal (artigo 5º, X), bem como a legislação infraconstitucional, garante a reparação dos danos materiais e morais de todas as pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas. Assim, o sujeito de direito que tiver um direito subjetivo alvejado, pode recorrer ao Judiciário, por meio do ajuizamento de ação, solicitando ao Estado prestação jurisdicional.

O instrumento utilizado pelo Estado para que a parte possa alcançar o direito material por meio do exercício de uma ação judicial chama-se processo.21

O processo viabiliza o direito de ação, que é uma garantia constitucional atribuída a todos os jurisdicionados. O direito de ação é, na verdade, o alicerce de um Estado Democrático de Direito. Sem ele, não é possível que o Estado preste a jurisdição, já que, pelo princípio da inércia22

21Para Arruda Alvim, “o processo é um instrumento de técnica jurídica, cujo escopo principal é a aplicação da lei

a um caso controvertido, não solucionado extraprocessualmente, e cuja solução é pedida pelo autor”. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 7. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2001. v. 1, p. 103.

22“Outra característica da jurisdição decorre do fato de que os órgão jurisdicionais são, por sua própria índole,

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consagrado no artigo 2º do Código de Processo Civil, o Poder Judiciário só pode manifestar-se quando provocado.23

Todavia, o direito de ação não deve ser confundido com a garantia de se obter um provimento judicial favorável à pretensão24. Trata-se tão somente do direito de pedir tutela judicial do Estado, ou seja, que este diga a quem cabe o direito em relação ao caso concreto analisado.

Muitas ações judiciais, todavia, não chegam sequer a ter o pedido enfrentado pelo Poder Judiciário, por não preencherem os requisitos de natureza processual previstos em nosso ordenamento jurídico. Vejamos:

1.4.1. Pressupostos processuais e condições da ação

Para que a parte interessada consiga a efetividade do processo, alcançando-se o bem tutelado pelo direito e pleiteado na ação, é necessário o preenchimento de alguns requisitos legais25, conhecidos como pressupostos processuais e condições da ação.

23Ressalte-se que ao lado do direito de ação é necessário garantir aos jurisdicionados o acesso à justiça, garantia

constitucional estampada no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal. Por acesso à justiça não devemos entender apenas o acesso formal, mas sim o acesso efetivo para que os conflitos sociais sejam pacificados.

24“O direito à tutela jurisdicional não se confunde com o direito de petição, este último garantido pelo artigo 5º,

XXXVI, a, da CF, conforme experiência haurida do Estado Liberal. O direito de petição é conferido para que se possa reclamar, junto aos poderes públicos, em defesa dos direitos contra ilegalidade ou abuso de poder”. NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 6. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2000. p. 96.

25Id. Princípios fundamentais: teoria geral dos recursos. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1993. p. 59.

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Os pressupostos processuais, conforme ensina Moacyr Amaral dos Santos, são os requisitos processuais indispensáveis à validade e regularidade de um processo.26

Na visão de Humberto Theodoro Júnior, os pressupostos processuais são as exigências impostas pelo legislador sem as quais fica inviabilizada a marcha processual válida ou até mesmo a sua formação.27

Nelson Nery adverte que a falta de um pressuposto processual não acarreta, necessariamente, a extinção do processo. Cita como exemplo os casos de incompetência absoluta do juízo, que se reconhecida “tem como conseqüência a anulação dos atos decisórios e o envio do processo ao juízo competente (art. 113 § 2º).”28

Para ele “são pressupostos processuais de existência da relação processual: a) jurisdição; b) citação; c) capacidade postulatória (CPC 37 par. ún); d) petição inicial. São pressupostos processuais de validade da relação processual: a) petição inicial apta (v. CPC 295); b) citação válida; c) capacidade processual (CPC 7º e 8º); d) competência do juiz (inexistência de incompetência absoluta); e) imparcialidade do juiz (inexistência de impedimento do juiz). São pressupostos processuais negativos, isto é, circunstâncias que, se verificadas no processo, ensejam sua extinção sem julgamento de mérito: litispendência, perempção, coisa julgada (CPC 267 V).”29

Os pressupostos processuais funcionam como um filtro para deter que demandas temerárias, do ponto de vista formal, tenham que ter o mérito enfrentado pelo Judiciário.

26SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1993.

p. 165.

27THEODORO JÚNIOR, Humberto. op. cit., p. 58.

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Trata-se, pois, de requisitos formais necessários à validade e eficácia do processo, vale dizer, para que o processo não contenha nulidades capazes de frustrar o direito expresso na sentença de conhecimento.

Assim considerando, é necessário esclarecer que não basta que a parte tenha o direito material tão somente. É necessário que os requisitos formais do processo sejam observados, sem os quais não será possível a satisfação do direito material.

Caso esteja ausente um dos pressupostos processuais, é necessário sanar a irregularidade para que o processo possa ter sua marcha desenvolvida, até que o Magistrado possa sentenciar, enfrentando o mérito do que está sendo pedido.

As condições da ação estão previstas no artigo 267, VI, do Código de Processo Civil e são: interesse processual; a legitimação “ad causam” e a possibilidade jurídica do pedido.

O interesse processual está ligado à necessidade e à utilidade do processo. Vale dizer, é necessário demonstrar a necessidade da interferência estatal, por meio de prestação jurisdicional, e a utilidade daí advinda para o jurisdicionado.30

A possibilidade jurídica do pedido31 refere-se à admissão, em tese, de se admitir o que se está sendo pleiteado em juízo. Somente poderá ser

30Em relação ao interesse processual, Ada Pellegrini Grinover, e outros, asseveram: “É preciso, pois, sob esse

prisma, que, em cada caso concreto, a prestação jurisdicional seja necessária e adequada. Repousa a necessidade da tutela jurisdicional na impossibilidade de obter a satisfação do alegado direito sem a intercessão do Estado – ou porque a parte contrária se nega a satisfazê-lo, sendo vedado ao autor o uso da autotutela, ou porque a própria lei exige que determinados direitos só possam ser exercidos mediante prévia declaração judicial (são as chamadas ações constitutivas necessárias, no processo civil e ação penal condenatória, no processo penal. CINTRA, Antonio Carlos Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. op. cit., p. 256.

31“Assim, ilustrativamente, é exemplo da falta de possibilidade jurídica do pedido a ação declaratória para

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pleiteado em juízo o que esteja em compasso com o ordenamento jurídico ou o que este não vede expressamente.

A legitimidade para a causa está ligada a quem pode ser autor ou réu em uma demanda, vale dizer, quem é o titular do pólo ativo ou passivo da relação processual. A legitimidade também é bilateral: um autor é legitimado para propor uma demanda em face de um réu (aqui não considerando evidentemente os casos de cabimento de litisconsórcio) e não em face de outro.32

Donaldo Armelin endossa esse entendimento, qual seja, a de que ambas as legitimidades são importantes, tanto a do autor, quando a do réu, pois um autor está legitimado a propor a ação contra determinado réu e não contra outro.33

A doutrina nunca conferiu muita importância à legitimidade passiva, mas esta também é condição da ação importantíssima a ser considerada para o efetivo desfecho do processo.

sequer, ser admitido pelo juiz (art. 295, parágrafo único, III). Igualmente não cabe ação declaratória para declarar nulidade de sentença, em lugar de ação rescisória (Id. Ibid., anotações ao art. 4º, 8). O exame e a decisão precipuamente com base na ausência de possibilidade jurídica do pedido dependerá da certeza de que o magistrado se encontre investido, ao examinar a petição inicial. Como já se assentou, não cabe ação declaratória para declarar nulidade de sentença, posto que, para tal fim, reserva o ordenamento jurídico meio próprio, a ação rescisória (CPC, art. 485).”.. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, cit., v. 1, p. 409.

32Preciosas são as palavras de Arruda Alvim para compreensão do tema: “a legitimidade é idéia transitiva, isto é,

alguém é legítimo em função de outrem; vale dizer, o perfil final da legitimidade exige a consideração do outro, ambos esses pólos ligados a uma situação legitimante”. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, cit., p. 417.

33ARMELIN, Donaldo. Legitimidade para agir no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos

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A falta de uma das condições da ação34 implica na extinção do processo sem julgamento de mérito, por força do artigo 267, VI, do CPC.

Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, o processo desenvolve sua marcha, até o momento em que ocorre seu fim.

O fim de um processo pode ocorrer por vários motivos: 1) da decisão judicial (sentença ou acórdão) a parte não interpôs recurso; 2) o recurso interposto não preencheu os pressupostos de admissibilidade; 3) ocorreu o esgotamento das vias recursais. Forma-se, então, a coisa julgada, com a conseqüente impossibilidade, em regra, de rediscutir a decisão que se tornou imutável.

34“O meio adequado para impugnar uma sentença, onde faltou uma das condições da ação, não é a ação

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2. SENTENÇA

2.1. Processo e segurança jurídica

Com o exercício da jurisdição, o Estado busca a pacificação dos conflitos existentes entre os jurisdicionados. No exercício desta atividade deverão ser perseguidos o ideal da justiça, que somente é alcançado por meio de decisões justas, quando o Estado dá a cada um aquilo que é seu.

É por meio do processo que as partes provocam o Poder Judiciário na busca da jurisdição. Ajuizada a ação, tem-se início uma série de atos processuais para que o Estado, por meio da sentença35 proferida por um Magistrado, no final do processo, normalmente, atribua um bem jurídico a alguém. Portanto, a sentença está intimamente relacionada à jurisdição e ao próprio Estado Democrático de Direito.

A coisa julgada, por sua vez, está diretamente atrelada à sentença. Ela se operará naquelas decisões que já não comportam mais recursos. Nestas hipóteses diz-se que a decisão judicial foi alcançada pela autoridade da coisa julgada e isto a torna imutável proporcionando aos jurisdicionados a segurança jurídica que se espera das decisões judiciais.36 Daí porquê iremos analisar, ainda que brevemente, a sentença.

35“A palavra ‘sentença’ decorre do latim sententia, sententiae, substantivo feminino, com diversas acepções,

como se pode ver em Cícero, noticiado no Novo dicionário latino-português: 1) o sentimento, sentença, opinião, parecer, intenção, vontade; 2) a prudência, ciência, sabedoria; 3) a sentença, determinação pela qual o juiz condena, ou absolve, o réu; a coisa sentenciada ou determinada em juízo; 4) frase que faz um sentido completo e perfeito; 5) sentimento, resolução; 6) a sentença, máxima dito sentencioso. Cícero usou a expressão ex animi sententia significando sinceramente, verdadeira, com sinceridade. “SLAIBI FILHO, Nagib. op. cit., p. 203.

36“Justamente para retirar a incerteza do conflito, foi gestado o instituto da coisa julgada, o qual durante muito

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2.2. Sentença: escorço histórico

Contam os historiadores que os sumérios, civilização que teria vivido entre 4.500 a 4.800 anos antes de Cristo, desenvolveram os primeiros traços do Estado de nossos dias. Este povo criou um conjunto de regras sobre leis, ouro, moedas, jóias, crédito, astronomia, literatura. Vencidos pelos babilônicos, estes aproveitaram a experiência dos sumérios e promulgaram o famoso Código de Hamurabi, em 2.400 ou 1.790 a.c.37

O artigo 5º do Código de Hamurabi tratava da sentença, que podia ser oral ou escrita. Havia recomendação para que a sentença fosse justa, bem como a previsão de pesadas multas ao seu prolator em caso de erro judiciário, além de declará-lo impedido de julgar outro processo38 A pena capital era

prevista para aqueles que furtassem bens de Deus, da Corte ou escravos.39

No Código de Manu40, a sentença não advinha do raciocínio lógico do juiz, pois na verdade o magistrado somente proclamava o resultado do juízo de Deus ao qual era submetido o réu. O resultado da sentença dependia exclusivamente das ordálias.41

O processo romano dividia os atos do juiz em sententias e

interlocutiones.42 Por meio da sentença, o juiz julgava efetivamente o direito da

37NORONHA, Carlos Silveira. Evolução histórica da sentença no processo lusitano. Revista de Processo, São

Paulo, v. 23, n. 92, p. 220, out./dez. 1998.

38Id. Ibid.

39Continua o autor: “As sentenças impunham severas penas pecuniárias, privativas da liberdade e até a pena

capital para quem furtasse bens de Deus e da corte (arts. 7º e 8º). Do mesmo modo, a sentença que condenasse alguém por furto de um escravo ou escrava pela porta da cidade, imporia ao culpado a pena capital”. Id. Ibid. 40“Esse nome é dado pelos hindus a quatorze pessoas diversas, cada uma delas presidindo a um período. Manu é, pois, o

primeiro homem nascido de Brahman, pertence à casta hindiana, cujos membros são iguais à divindade e superiores aos reis, tocando-lhes tudo o que diz respeito com a religião e a justiça. As outras castas são os Xatryas, donde saem os reis e governantes; os Vaisyaas, lavradores e mercadores; e os Sudras que servem os demais”. Id. Ibid., p. 221.

41Id. Ibid.

42“A primeira era ato do juiz que julgava o direito da parte, e como se desconheciam outros tipos de tutela, a

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parte. As interlocutiones eram utilizadas para resolver questões no curso do processo.

No direito germânico, o processo era dividido em duas fases: probatória e de julgamento e o juiz proferia duas sentenças. A primeira sentença era lançada para regular o ônus da prova. A segunda efetivamente julgava o direito material das partes. Ambas as sentenças alcançavam a coisa julgada.43

O direito canônico é dividido tradicionalmente em dois grandes períodos pelos estudiosos e tem como marco o Decreto de Graciano (1139-1145). Assim, costuma-se falar em período pré-Graciano44 e pós-Graciano.45

No período pré-graciano a sentença era proferida pelo guia dos cristãos e era irrecorrível.46 Após o Decreto, em relação a sentença, houve uma preocupação de ordem moral. Isto porque o julgador só deveria pronunciar o julgamento quando estivesse imbuído de certeza moral (Cânon 1608 do Código Canônico). 47 Com as Decretais de Gregório IX, foi instituído o processo escrito,

43“No direito germânico, a sentença passou a ter outro valor e conceito. No processo germânico existiam duas

fases bem distintas: a fase probatória e a fase de julgamento. A primeira terminava por sentença, e seu escopo era regular o ônus da prova. Após essa fase, proferia-se outra sentença proclamando o resultado. Assim, como lembra Buzaid, o processo germânico se desenvolvia intercalado de sentenças que decidiam ora matérias processuais, ora matérias substanciais, ambas prolatadas no decorrer do processo e sujeitas à impugnação mediante recurso de apelação. Na tradição germânica, não só a sentença definitiva alcançava a coisa julgada, mas também a sentença proferida na primeira fase (interlocutória)”. Id. Ibid.

44“Anteriormente ao decreto, a canonística era regida pelas Sagradas Escrituras, pelos escritos

pseudo-apostólicos (Didachê, Didascalia, Cânones eclesiásticos, constituições apostólicas, bem como pelas normas emanadas dos concílios (de Nicéia, de Toledo, nos anos 325 e 587, respectivamente, pelas Decretais ou Epistoles, Decisões dos bispos e por regras monásticas e penitenciais de São Parcônio e São Basílio, em 320 e 370, respectivamente sem se distanciarem todas elas da tutela do direito romano, principalmente a partir de Constantino. Foram relevantes também para a regência da canonística pré-graciana algumas coleções pertinentes ao direito bizantino do oriente tais como a Écloga (726), Procheiron (875), Epanagogue (886) e Basílicas (890). A partir de Constantinopla, há que se referir ainda, como fontes do direito canônico daquele momento, outras coletâneas, tais como Collectiones Dionisiana, Hispana et Adriana, respectivamente em 500, 636 e 802. Foram estas, juntamente com outras de menor importância, promulgadas, atendendo exigências de normas processuais novas, em momento de grande afluência de feitos perante as episcopalis audientiae”. NORONHA, Carlos Silveira. op. cit., p. 224, citando aula de pós-graduação proferida pelo Prof. Moacir Lobo da Costa em 14.09.99 na Faculdade de Direito da USP.

45NORONHA, Carlos Silveira. op. cit., p. 223. 46Id. Ibid., p. 224.

47Continua o autor: ‘além da certitudo moralis, que é o elemento fundamental da sentença canônica, outros

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ganhando incremento as sentenças interlocutórias, já que o processo era dividido em várias fases e comportava várias sentenças, todas recorríveis.48

No período visigótico, a sentença de primeiro grau era proferida por um juiz inferior (normalmente um conde). Raramente pelo rei, titular da Suprema Magistratura. Para se chegar ao julgamento, utilizavam a tortura e o juramento.49

Também no direito português as sentenças se dividiam em definitivas e interlocutórias, por influência do direito germânico.50 Foi o Código de Processo Civil de 1939 que adotou o novo conceito de sentença como o pronunciamento judicial com vistas à extinção do processo, cindindo-o, portanto, das decisões interlocutórias.51

2.3. Conceito, natureza jurídica e imutabilidade

Alguns autores conceituam a sentença sob vários ângulos: como ato estatal, como ato processual e como ato do juiz.

Como ato estatal a sentença é a “manifestação da vontade estatal emitida no exercício da função jurisdicional”.52 Como ato processual, a

48NORONHA, Carlos Silveira. op. cit.. 49Id. Ibid.

50“Dispunham as ordenações filipinas que a sentença interlocutória seria qualquer sentença ou mandado que o

juiz dava ou mandava em algum feito, antes da sentença definitiva. A sentença interlocutória podia ser revogada a qualquer tempo, a não ser quando a mesma impusesse a extinção do processo. Já a sentença definitiva era a que efetivamente apreciava o direito levado ao julgador, que deveria ficar circunscrito às provas e alegações deduzidas em juízo, a não ser quando a sentença definitiva era proferida pelo príncipe, que poderia julgar de acordo com a sua consciência”. JORGE, Flávio Cheim. op. cit., p. 113.

51Id. Ibid.

52Continua o autor: “Como ato estatal, deve nela ser enfatizado o caráter de ato de poder, de decisão, de

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sentença é o ápice do processo, o momento em que aquela instância judicial encerra a prestação jurisdicional com a decisão sobre o caso concreto. Como ato do juiz é a definição dada pelo Código de Processo Civil.

A sentença, segundo o art. 162, § 1º, do Código de Processo Civil é

“o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa”. Trata-se, assim, do ato estatal que põe fim à pretensão resistida das partes. A doutrina, todavia, assegura que a palavra “ato” do dispositivo legal trata na verdade dos pronunciamentos judiciais.53

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 3.253/04, que altera inúmeros artigos do Código de Processo Civil, entre eles, o parágrafo único do artigo 162, que passaria a ter a seguinte redação: “Sentença é o ato do juiz proferido conforme os arts. 267 e 269.”

A sentença judicial é aquele pronunciamento do juiz que tem força o suficiente para pôr fim ao processo. Muitos doutrinadores, todavia, criticaram essa definição. Nelson Luiz Pinto, por exemplo, sustenta que o que qualifica o pronunciamento judicial como sentença é o seu conteúdo e não o fato de pôr fim ao processo.54 Teresa Arruda Alvim Wambier também entende ser o conteúdo o traço marcante das sentenças. A autora sustenta que é ele que distingue as sentenças dos demais pronunciamentos do juiz.55.

53Nesse sentido, Arruda Alvim: “Na verdade, embora o art. 162 aluda à categoria genérica de atos do juiz,

refere-se em verdade a refere-seus pronunciamentos, que refere-se constituem em refere-sentenças, decisões interlocutórias e despachos, desprovidos estes últimos normalmente de caráter decisório. (...). Os atos do juiz são categoria mais ampla que pronunciamentos, que abrangem, v.g, a inquirição de testemunhas, a inspeção judicial, etc”. ALVIM, Arruda.

Manual de direito processual civil, cit., p. 628.

54“São os artigos 267 e 269 do Código de Processo Civil que estabelecem quais os conteúdos que podem ter as

sentenças. O artigo 267 estabelece as hipóteses de sentenças de extinção do processo sem julgamento do mérito, enquanto que o artigo 269, as hipóteses de extinção do processo com julgamento de mérito.(...) Portanto, o que qualifica o pronunciamento judicial como sentença é o seu conteúdo e não a circunstância de por fim ao processo, que nada mais é do que a conseqüência desse pronunciamento, e os fenômenos jurídicos não devem ser definidos pelas suas conseqüências ou pelos seus efeitos, como pretende o § 1º do artigo 162 do CPC”. PINTO, Nelson Luiz. Recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Malheiros Ed., 1992.

55WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos

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Nelson Nery, todavia, entende que o legislador levou em conta, para conceituar processo, a finalidade do ato e não seu conteúdo.56

Flávio Cheim Jorge sustenta que o conceito de sentença do código, a rigor, está incorreto porque a sentença não extingue nem o processo e nem o procedimento.57 Para ele, a sentença apenas extingue o processo quando, em face dela, não exista recurso e opera-se o trânsito em julgado. Havendo recurso, o processo continua a existir, porém em outro grau de jurisdição. Também discorda do entendimento de que o conteúdo do ato do juiz seja importante para conceituar o que seja sentença. Isto porque “a extinção com fundamento no artigo 267 ou no artigo 269, já se trata de conseqüência da própria sentença, no que tange ao término do processo com ou sem julgamento de mérito. Ademais disso, é possível a existência de pronunciamentos judiciais com o conteúdo do art. 267 ou do artigo 269, que não podem ser classificados como sentença”.58

Ficamos com a definição de sentença dada pelo legislador, que levou em consideração, como afirma Nelson Nery, a finalidade do ato jurisdicional. Se o juiz quis pôr fim ao processo, estaremos diante de uma sentença. Esse é, no nosso entender, o espírito do que seja a sentença. De qualquer forma, pode-se dizer que se trata de ato essencial ao exercício da

56“Sentença é ato do juiz que, no primeiro grau de jurisdição, extingue o processo com ou sem julgamento de

mérito (CPC 267 e 269). No primeiro grau, pois, se houver apelação, o processo continua no segundo grau de jurisdição. O CPC levou em conta a finalidade do ato para classificá-lo e não seu conteúdo: se o objetivo for extinguir o processo, trata-se de sentença. O termo processo deve ser entendido como significando o conjunto de todas as relações processuais deduzidas cumulativamente e/ou processadas em simultaneus processus. O parâmetro para a classificação do ato judicial é o processo e não a ação. É irrelevante para classificar-se o ato judicial como sentença, indagar se extinguiu ou não a ação. O ato que extingue a ação pode ser sentença ou decisão interlocutória, caso, respectivamente, extinga ou não o processo”. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. op. cit., p. 515.

57“De fato, num rigor extremo, não se pode dizer efetivamente que é a sentença que extingue o processo. Nem a

relação processual nem o procedimento se encerram com a sentença. É que, como ressalta Frederico Marques, a relação processual, na realidade, somente se encerra e se finda quando ocorrer a coisa julgada formal, isto é, quando o pronunciamento torna-se irrecorrível. Num sentido ainda mais técnico do que este, poderíamos dizer que o processo somente é extinto com o trânsito em julgado, que se dá, como leciona Machado Guimarães, com a passagem da sentença da condição de mutável para imutável”. JORGE, Flávio Cheim. Sentença cível.

Revista de Processo, São Paulo, v. 26, n. 104, p. 114, out./dez. 2001.

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jurisdição. Pode-se afirmar, com segurança, que de todos os atos do juiz, a sentença é o mais importante.

Sobre a natureza jurídica da sentença, Arruda Alvim assim manifestou seu entendimento: “A sentença é ato intelectual de índole, ou com estrutura, predominantemente lógica (formal e material), que pressupõe apuração dos fatos e identificação da norma, através da qual o Estado-juiz se manifesta, concretizando imperativamente a vontade do legislador, traduzida ou expressada pela lei”. 59

O artigo 463 do CPC dispõe, in verbis: “Ao publicar a sentença de mérito, o juiz cumpre e acaba o ofício jurisdicional, só podendo alterá-la: I) para lhe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou lhe retirar erros de cálculo; por meio de embargos de declaração”.

Muito embora o dispositivo legal se refira à sentença de mérito, igualmente a sentença terminativa é imutável pelo juiz que a proferiu após a publicação, somente podendo ser alteradas na hipótese do artigo supra.

Não se há de confundir publicação com intimação. A sentença civil é publicada quando o juiz a entrega por escrito ao escrivão para que proceda a juntada aos autos ou então quando é ditada para o escrevente em audiência.60 A intimação é feita ou em audiência, quando os advogados tomam ciência de seu teor ou pelo Diário Oficial. É a partir da intimação, e não da publicação, que começa fluir o prazo para a interposição ou de embargos de declaração (nas hipóteses do artigo 535, isto é, quando a sentença contiver obscuridade, contradição ou omissão) ou do recurso de apelação.

59ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, cit., v. 2, p. 636.

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2.4. A sentença como pronunciamento obrigatório do juiz

O artigo 126 do Código de Processo Civil veda ao juiz a possibilidade de deixar de julgar ou sentenciar alegando lacuna ou obscuridade na lei. Para julgar deverá aplicar a lei, mas se esta não existir para o caso concreto posto em julgamento, deverá o magistrado pautar-se na analogia, nos costumes e nos princípios gerais de direito.

No mesmo sentido dispõe o artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil ao dispor que o “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Assim, em hipótese alguma um juiz pode deixar de proferir sentença.

2.4.1. Estrutura

Os requisitos essenciais da sentença estão previstos no artigo 458 do CPC e são o relatório, os fundamentos de fato e de direito e o dispositivo. Compõem-se, portanto, a sentença de três partes fundamentais.

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A fundamentação é a segunda parte da sentença. O juiz deverá fundamentar os motivos que o levaram a decidir em um ou outro sentido.61

O dever de fundamentação, além de estar assegurado na legislação ordinária, artigo 165 do Código de Processo Civil, também vem determinado na Constituição Federal, no artigo 93, IX.62 O inciso X do mesmo dispositivo constitucional também prevê a necessidade de fundamentação das decisões administrativas dos tribunais. A não observância da fundamentação de todos os julgamentos do Poder Judiciário implica a nulidade absoluta da decisão.63

Vale lembrar que os processos extintos sem julgamento de mérito poderão ter uma fundamentação concisa64, por força do artigo 459 do CPC.

Na opinião de José Rogério Cruz e Tucci, caso a decisão judicial imotivada tenha transitado em julgado, só restará ao interessado ajuizar uma

61“É da tradição do direito luso-brasileiro ser necessária a fundamentação das decisões judiciais. As Ordenações

Filipinas, no Livro III, Título LXVI, nº 7º, diziam expressamente ser dever do juiz motivar suas decisões, preceito que foi seguido, posteriormente pelo art. 232 do regulamento 737 de 1850. “ Bento de Faria apud

NERY JÚNIOR, Nelson Princípios do processo civil na Constituição Federal, cit., p. 174.

62Nesse sentido: NULIDADE – DECISÃO DESTITUÍDA DE FUNDAMENTAÇÃO – VIOLAÇÃO AOS

ARTS. 93, IX DA CARTA MAIOR E 832 DA CLT – RECONHECIMENTO – A partir da CF/88, o legislador entendeu por bem elevar o dever de fundamentar as decisões ao patamar constitucional, a luz dos princípios basilares da Magna Carta. Tal garantia permite que as partes conheçam as razões de convencimento do magistrado ao proferir suas decisões, participando e controlando efetivamente os atos decisórios do Poder Judiciário, em respeito ao próprio Estado Democrático de Direito. Em sendo assim, as decisões prolatadas pelo Judiciário, deverão vir impreterivelmente acompanhadas de fundamentação, sob pena de incorrer em negativa de prestação jurisdicional. A decisão destituída de fundamentação, sem qualquer menção à realidade fática narrada nos autos, importa em violação aos arts. 93, IX da CF e 832 da CLT, sendo a declaração de nulidade medida que se impõe. (TRT 15ª R. – Proc. 9172/01 – (36686/01) – 2ª T. – Rel. p/o Ac. Juiz Luís Carlos Cândido Martins Sotero da Silva – DOESP 20.08.2001 – p. 47).

63‘Interessante observar que normalmente a Constituição Federal não contém norma sancionadora, sendo

simplesmente descritiva e principiológica, afirmando direitos e impondo deveres. Mas a falta de motivação é vício de tamanha gravidade que o legislador constituinte, abandonando a técnica de elaboração da Constituição, cominou no próprio texto a pena de nulidade. (...) O mau vezo em que ocorrem alguns juízes e tribunais de não fundamentarem suas decisões acarreta hoje nulidade por infringência à CF. Não é incomum os juízes indeferirem pretensões das partes argumentando com o jargão de que o fazem ‘por falta de amparo legal’. Esse tipo de decisão é exemplo clássico de fundamentação da decisão judicial (jurisdicional ou administrativa), que a torna írrita e ineficaz. O juiz deverá indicar o porquê do indeferimento, já que se não houver vedação expressa na lei, o juiz não poderá deixar de apreciar o pedido, preenchendo eventual lacuna pelos mecanismos indicados no artigo 5º, da LICC, no artigo 126 do CPC e no artigo 7º do CDC. Sua conclusão poderá ser pelo indeferimento, mas deverá dizer quais as razões pelas quais assim decidiu”. NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, cit., p. 177.

64“Decisão concisa é a que tem fundamentação breve, da qual constem os elementos necessários para sua

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ação rescisória, com fundamento no inciso V, do artigo 485 alegando descumprimento do artigo 458, II65.

O dispositivo é a terceira parte da sentença. É dele que efetivamente constará a decisão. Caso o processo não seja extinto sem julgamento de mérito, este deverá ser enfrentado e o pedido formulado na inicial julgado como procedente, procedente em parte ou improcedente.

2.4.2. Condições

Para uma sentença judicial ser considerada válida, não se pode dar observância exclusivamente aos requisitos estruturais do artigo 458 do CPC. Existem outras condições conhecidas como qualidades que também devem ser cumpridas. Estas outras condições também estão ligadas com a validade da sentença e seu descumprimento também acarretam a nulidade do decisum. 66

A sentença deve ser clara. Muito embora tal determinação não conste do atual CPC (constava no artigo 280 do código anterior), é possível entender que tal exigência está em vigor porque a lei prevê os embargos de declaração para aclarar decisões obscuras ou contraditórias; o dever constitucional de dar fundamentação às decisões judiciais traz como conseqüência que os fundamentos possam ser compreendidos, pois são eles que legitimam a decisão tomada pelo Estado67

65TUCCI, José Rogério Cruz e. Ainda sobre a nulidade da sentença imotivada. Revista de Processo, São Paulo,

v. 14, n. 56, p. 223-233, out./dez. 1989.

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