JPediatr(RioJ).2015;91(6):509---511
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EDITORIAL
The
road
to
eliminate
mother-to-child
HIV
transmission
夽
,
夽夽
O
caminho
para
eliminac
¸ão
da
transmissão
vertical
do
HIV
Andrew
M.
Redmond
a,b,∗e
John
F.
McNamara
a,baUnidadedeDoenc¸asInfecciosas,RoyalBrisbane&Women’sHospital,MetroNorthHospitalandHealthService,Queensland,
Austrália
bEscoladeMedicina,UniversityofQueensland,Queensland,Austrália
O Observatório Mundialda Saúdeda Organizac¸ão Mundial daSaúdeestimaque78milhõesdepessoasforam infecta-daspelovírusdaimunodeficiênciahumana(HIV)durantea epidemiaeque39milhõesdehomens,mulheresecrianc¸as morreram.1Aproximadamenteumem20adultosnaÁfrica
doSulatualmentevivecomainfec¸ão.OHIVrepresentaum dosproblemasdesaúdemaissériosdomundo.
A estratégiado setor mundial de saúde da OMS sobre oHIV/Aidsidentificouquatroorientac¸õesestratégicaspara orientararespostadospaísesaoHIVparaatingiros Obje-tivosdeDesenvolvimentodoMilêniodasNac¸õesUnidasde conter a propagac¸ão doHIV/Aids. Umelemento essencial de uma orientac¸ão estratégica foi a eliminac¸ão de novas infecc¸õesporHIVemcrianc¸as.2
É encorajador que o número de novas infecc¸ões por HIV em crianc¸as esteja caindona maiorparte domundo. Em2011, aproximadamente330.000crianc¸as foram infec-tadas e, apesar de ser uma reduc¸ão de 43% desde 2003, essenúmeroaindacontinuainaceitavelmentealto.3
Infeliz-mente,ummaiornúmerodeinfecc¸õesnainfânciafoivisto emAngola,Congo,GuinéEquatorialeGuiné-Bissau.
DOIserefereaoartigo:
http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2015.08.004
夽 Comocitaresteartigo:RedmondAM,McNamaraJF. Theroad
to eliminatemother-to-childHIVtransmission. JPediatr (RioJ). 2015;91:509---11.
夽夽VerartigodedaRosaetal.naspáginas523---8.
∗Autorparacorrespondência.
E-mail:meinmuk@gmail.com(A.M.Redmond).
Embora uma pequena parte das infecc¸ões na infância resultedetransfusõessanguíneas,abusosexualoupráticas deinjec¸ão nãoseguras, a maioria ocorrecomo resultado datransmissãodemãeparafilho(TMF).3,4Atransmissãodo
HIV demãe para filho podeocorrer no útero, noperíodo peripartooupormeiodaamamentac¸ão.
Nofimde2013516milhõesdemulheresviviamcomHIV
emuitasdelasestãoemidadereprodutiva.Sãocomplicadas pelainfecc¸ãoporHIVemtodoomundo1.600.000gestac¸ões eestima-sequeastaxasdetransmissãodemãeparafilho sejam,naausênciadeintervenc¸ãoterapêutica,tãoelevadas quanto31%.6As condic¸õesqueresultameminflamac¸ãoda
placenta,aidadenaprimeirarelac¸ãosexualeúlceragenital estãoassociadas ataxas maiselevadas detransmissãode mãeparafilho.
Melhoriassubstanciaisnastaxasdetransmissãodemãe parafilhoforamatingidasdesdeoprimeirocasode transmis-sãodoHIVdemãeparafilhotersidoidentificadoem1983. TestesdeHIVderotinanagravideztêmsidorecomendados desdeofimdosanos90;ensaiosclínicosdeantirretrovirais demonstraramdietasseguraseeficazesduranteagravidez ehouvedestinac¸ãodiretadefinanciamentoparapesquisar TMF.
O tratamento de mulheres grávidas com terapêutica antirretroviraldecombinac¸ão(TARc)mostrouterum drás-ticoimpactosobreatransmissãodemãeparafilho.7ATARc
mostroureduziratransmissãodemãeparafilhosemquase 20vezes.Estima-sequeentre2009e2011aTARcdurantea gravidezpreveniu 409.000infecc¸ões porHIV na infância.3
Em resposta ao peso da evidência na prevenc¸ão da TMF, as Diretrizes Consolidadas sobre o Uso de Medicamentos
510 RedmondAM,McNamaraJF
Antirretrovirais paraTratamento e Prevenc¸ão daInfecc¸ão peloHIV daOMSrecomendamque todasasmulheres grá-vidas e amamentando portadores de HIV devem iniciar a terapiaantirretroviraleaquelasqueatendemaoscritérios deelegibilidadedevemcontinuaraolongodavida.8
Acredita-sequearemoc¸ãodaTMFpodeserfeitapormeio decoberturaantirretroviral efetiva, orientac¸ãoe cuidado médicoadequado. Contudo,acoberturaantirretroviralde mulheresgrávidas portadorasde HIV continuabaixa, com apenas30% demulheresgrávidas elegíveisque recebema terapiaantirretroviral,emoposic¸ãoa54%detodosos adul-toselegíveis.3 A maioria dos neonatos infectados por HIV
nascede mãesque nãotêm conhecimentode sua sorolo-giaparaHIV,4oquedestacaaimportânciadeprogramasde
triagemnagravidez.
Comoumpaísemdesenvolvimento,oBrasilcarregaum fardopesadodaepidemiadoHIVefezumprogresso signifi-cativonacontenc¸ãodapropagac¸ãodainfec¸ão.OBrasiltem umaprevalênciaestáveldoHIVestimadaem1%,com apro-ximadamente718.000pessoasportadorasdeHIV.Estima-se que a prevalência da infecc¸ão por HIV em determinadas populac¸õesnoBrasilsejade5,9%entreusuáriosdedrogas, 10,5% entrehomens homossexuais e 4,9% entre mulheres profissionaisdosexo.9
Em2012,8.622casosdeAidsforamrelatadosem mulhe-res por meio do sistema de informac¸ões de agravos de notificac¸ão(Sinan).Aexposic¸ãonessasmulheresfoi deter-minadacomo 96,6%paraheterossexuais, 2,5%parausode drogasinjetáveis,0,8%paratransmissãodemãeparafilho e0,1%paratransfusão.Nosdezanosentre2003e2012,a idade dos pacientes portadores de Aidsmudou para indi-víduos maisnovos com observac¸ão de elevadas taxas em pacientesentre30e49anos.Houveumaumentoda tendên-cianadetecc¸ãodetaxasentrepessoasentre15-24anos,9o
queampliouaproporc¸ãodemulheresportadorasdeHIVem idadereprodutiva.
Apopulac¸ãobrasileira é beminformada comrelac¸ãoà transmissãodo HIV e amplas pesquisas mostram que 97% concordamcomaindicac¸ãodequeousodepreservativoéa melhorformadeevitarainfecc¸ãoporHIV.Infelizmente,isso nãoécompatívelcomaac¸ãoesperada;apenas55%fizeram usodepreservativocomumparceiroocasionalnos12meses anteriores,empessoasentre15e65anos.9
Houve uma queda geral na taxa de detecc¸ão de Aids entrecrianc¸as abaixo de cincoanos (35,8%) nosdez anos anterioresa2012.Essareduc¸ãonãofoiuniformeemtodoo Brasil,comaumentosnasnotificac¸õesdeAidsemcrianc¸as nasregiõesNorteeNordeste.9
No Brasil, a transmissãode mãe para filho continua a principalvia deaquisic¸ão doHIV paracrianc¸as abaixo de cincoanos. A identificac¸ão do HIV na gravidez apresenta melhoriasnoBrasilcomcoberturadetriagemestimadade 80%em umestudo recenteem mulheresque fizeram tes-tesdepré-natal,10 porém estima-seque atriagemdoHIV
atingeapenas58,3% doscasosesperados degrávidas com HIVpositivo.9AprevalênciadoHIVnagravidezfoide0,38%
no Brasil, com 50,7% dessas mulheres portadoras de HIV entre20e29anos.
O estudo de da Rosa et al.,11 nesta edic¸ão do Jornal
dePediatria, relata umaavaliac¸ão retrospectiva de taxas efatoresassociados àTMF doHIV-1 em umgrande hospi-talnosuldoBrasil emumperíodode14 anosentre1998
e2011.Osautoresextraíramosdadosdabasededadosdo laboratórioedoprontuáriomédicoparaessefimedividiram otempoemduas sec¸õesparacomparac¸ão.Elesrelataram quehouveumamudanc¸anaprevalênciadosubtipoviralCe notratamentoclínicodoHIVcomopassardotempo,apesar deos parâmetrosexatosdessas mudanc¸as nãoterem sido relatados.
Duranteesseperíodo,houve353nascidosvivosde mulhe-resinfectadasporHIV.Houveumareduc¸ãonataxadeTMF doHIV de 11,8%para 3,2%nos doisperíodos. A diferenc¸a foi altamente significativa tanto estatística quanto cli-nicamente, mudou drasticamente as vidas das crianc¸as protegidasdainfecc¸ãoporHIV.Osautoresconstataramque astaxasdebaixacargaviralmaternal(<1.000cópias/mL), daelevadacontagemdecélulasCD4+Tmaternas(>500x
109 células/mL) e de uso da terapia antirretroviral (TAR)
considerada concluída(TAR maternadurante agravideze nonascimentoeprofilaxiapós-exposic¸ãoazidovudinapara oneonato)aumentaramdoprimeiroparaosegundoperíodo. Houvetambémumaobservac¸ãodequeomanejodoparto mudou durante os dois períodos e o normal de tempos deruptura demembranas foi demaisdequatrohoras no períodoanterior(79,4%),porémnãoduranteoperíodo pos-terior(27%).Contudo,nãohouvemudanc¸asignificativana proporc¸ão devia departo vaginal paracesariana durante esseperíodo.Éprovávelqueamudanc¸anomanejodoparto reflitaapolíticadodepartamentonacionaldesaúde.
A natureza retrospectiva do estudo impede que con-clusões sólidas sejamfeitas arespeito dacausadaqueda drástica na TMF. É provável que a queda na TMF obser-vada durante o período avaliado neste estudo deva-se a umacombinac¸ãodefatores,porémquesejadominadapelo aumentona proporc¸ão demulheres combaixa cargaviral deHIVequesedeveamaiorestaxasdemulheresgrávidas querecebemTARc.Aprevenc¸ãodaTMFéumdosbenefícios dotratamentocomoprevenc¸ãoe,conformeaimplantac¸ão dessapolíticasetornemaisdifundidaemtodooBrasileno restantedomundo,podemosesperarprevenc¸ãodadoenc¸a eprevenc¸ãodatransmissãoparacrianc¸asdemães infecta-dasporHIVeparaparceirossexuaisdepessoasquevivem comHIV(PVHIV).
Váriasintervenc¸ões são recomendadas paraprevenir a TMF,conformedescritonasorientac¸õesinternacionais.12,13
A maioria dessas intervenc¸ões é aplicada no Brasil, com admirável pontualidade, inclusive a identificac¸ão da infecc¸ãoporHIVemgrávidaspormeiodetriagemdurante ocuidadopré-natal;acompanhamentodemulheres infecta-dasporHIV;recomendac¸ãoeoferecimentodaterapêutica antirretroviraldecombinac¸ãoaessasmulheres;triageme tratamento de outras doenc¸as sexualmente transmissíveis em mulheres em risco; e oferecimento de profilaxia pós--exposic¸ãoparacrianc¸asdemãesinfectadasporHIV.9
A comprovac¸ão com relac¸ão ao impacto sobre a TMF de rupturaprolongada(> 4 horas)de membranas foi ava-liadaemumametanáliseem2001peloGrupoInternacional paraPessoasInfectadasporHIVporTransmissãoPerinatal.14
Theroadtoeliminatemother-to-childHIVtransmission 511
< 1.000 cópias/mL com ruptura de membrana de até 25 horas.15Nessacoorte,apenascargaviral>10.000cópias/mL
foi um fator de risco independente para TMF. Então por que existeuma diferenc¸a aqui?Aparentementeé a TARc. Os estudos incluídos na metanálise foram predominante-mente conduzidos antesdo oferecimentodaTARc,apesar deospacientesnoestudoemMiamiterem recebidoTARc. ApesardedaRosaetal.11teremconstatadoquearuptura
prolongadademembranasfoiumfatorderiscopara trans-missão,umfatorprovavelmenteserámuitomenospotente doqueaviremiadeHIVnãocontrolada.Paramulheresque nãoatingiramasupressãovirológicanomomentodoparto, é provávelque aindasejaindicadacesárea eletivaou,na impossibilidadedessa,evitararupturaprolongadade mem-branas.
Apesar daqueda na TMF observadaneste estudoe em qualqueroutro,ataxaaindaémuitoalta.Precisamos traba-lharparareduzirataxadetransmissãoazero.Algumasdas estratégiasnecessáriasparatantosãoconhecidas,conforme descritasacima,eexigemimplantac¸ãoeapoiosólidos. Algu-mas,comoacompanhamentodepessoasquefazemusode drogasinjetáveis,sãomaisdesafiadores.Éincentivadorver osesforc¸os e osrecursos para essegrupo serem prioriza-dosnoBrasil.9 MulheresinfectadasporHIV diagnosticadas
durante a gravidez são um importante grupo para focar-mos,poishá menostempoentreoiníciodotratamentoe opartoparaatingirsupressãovirológicaafimdeprevenira TMF.Alémdisso,aadesãoaotratamentoéumaimportante questãonotratamentodoHIVparatodos,porém,conforme identificadoemumaanáliserecente,menosdetrêsquartos dasgrávidasapresentaadesãoidealaotratamento.16
Inde-pendentementedeissorefletirincertezasobreaseguranc¸a dosmedicamentosparaofetoouafaltadetratamento,essa tambémrepresenta umaimportante áreaaser priorizada paraconteratransmissãodoHIV.
Os achados deste estudo, juntamentecom a liberac¸ão precoce dos resultados do estudo Start que mostrando o claro benefício à saúde das pessoas proveniente do tra-tamento precoce,17 nos mostram que, em vez de mais
pesquisas,éomomentodeimplantaroquejásabemospara atingirametadeumagerac¸ãolivredoHIV.
Conflitos
de
interesse
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse.
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