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A função social da Heráldica Eclesiástica na arte do século XVI e XVII. Estudo da armaria dos bispos de Lamego

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Academic year: 2021

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Agradecimentos

Ao meu orientador, Professor Doutor Nuno Miguel de Resende Jorge Mendes pelo apoio durante toda o processo de investigação, pela disponibilidade e pelos conhecimentos transmitidos durante o meu percurso académico.

A todos os docentes de História da Arte que lecionam e lecionaram na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e que, contribuíram para o meu desenvolvimento académico.

Ao Professor Doutor Eduardo Pires de Oliveira, do Arquivo Distrital de Braga, pela sua paciência, pelo interesse que demonstrou pelo meu trabalho e pela partilha de material para este estudo.

Ao Luís Soveral Varella pelas informações dadas sobre a bibliografia do bispo D. Martim Afonso Mexia Tovar e de sua família, de Campo Maior.

Á Dr.ª Fernanda Barbosa, do Tesouro-Museu da Sé de Braga pelas fotos e informações fornecidas acerca do arcebispo D. Luís de Sousa.

À Dr.ª Maria do Céu Dez-Réis Grilo, do Museu de Évora, pela paciência e pelas informações bibliográficas sobre o arcebispo D. Frei Luís da Silva Teles.

Ao Dr. José Godinho, da Diocese de Évora, pela disponibilidade de material sobre D. Frei Luís da Silva Teles.

Aos meus pais, que desde sempre me apoiaram incondicionalmente, na minha vida pessoal e académica, nos bons e nos maus momentos; por todas as aventuras que passamos, pela companhia na recolha de fotografias para este trabalho e, principalmente, pela amizade. Ao meu irmão Tiago, por se ter mostrado presente com a sua boa disposição nos momentos mais difíceis e pela companhia.

Por fim, a todos os heraldistas portugueses e estrangeiros que proporcionaram o meu interesse por esta área e pelos seus contributos deixados sobre a heráldica, que engrandeceram este trabalho.

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Lista de Abreviaturas

ADB – Arquivo Distrital de Braga

AMDL – Arquivo-Museu Diocesano de Lamego BNP – Biblioteca Nacional de Portugal

BNPD – Biblioteca Nacional de Portugal Digital BPMP – Biblioteca Pública Municipal do Porto

BPMVNG – Biblioteca Pública Municipal de Vila Nova de Gaia ME – Museu de Évora

MFTPJ – Museu Francisco Tavares Proença Júnior ML – Museu de Lamego

TMSB – Tesouro-Museu da Sé de Braga U.C. – Universidade de Coimbra

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Resumo

O presente trabalho tem como objetivo principal o estudo da função social das armas eclesiásticas dos bispos de Lamego na arte, nos séculos XVI a XVII, dentro e fora dos limites desta diocese.

No contexto da criação da heráldica em Portugal, que por diversas razões tem vindo a ser descartada pelos historiadores, a heráldica eclesiástica surge como uma importante vertente daquele campo. No contexto da heráldica, originária nos escudos dos cavaleiros, desenvolveu o ramo da heráldica eclesiástica com regras e elementos externos em certos aspetos diversos dos usados pela nobreza.

A nossa reflexão centra-se nas armas de doze bispos de Lamego – dentro da cronologia anteriormente referida – e na sua importância e colocação em objetos artísticos ou edifícios, relacionando-os com o meio artístico em que se enquadram, fora e dentro da área desta diocese. Essencialmente tentámos perceber quais os motivos que levaram estes prelados à disposição dos seus escudos de armas em obras que, aparentemente, seriam para engrandecer a igreja.

Área Disciplinar:

História / História da Arte / Heráldica.

Palavras-chave:

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Abstract

This work has as main objective the study of the social function of ecclesiastical arms of bishops of Lamego in art in the sixteenth and seventeenth centuries, inside and outside the limits of this diocese.

In the context of the creation of heraldry in Portugal, which for various reasons has been dismissed by historians, ecclesiastical heraldry appears as an important aspect of this discipline. In the context of heraldry, originating from the shells of knights, ecclesiastical heraldry evolved with different rules and external elements used by the nobility.

Our reflection focuses on the arms of twelve bishops of Lamego - within the timeline mentioned above - and its importance in pieces of art or buildings , linking them with the artistic environment in which they fall , outside and within the area this diocese . Essentially we tried to understand the motives that led these prelates provide their shields of arms in works that apparently would be to enlarge the church.

Research areas:

History / Art History / Heraldry.

Keywords:

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Nota Prévia

Para uma melhor compreensão e leitura mais coerente do nosso trabalho, todas as referências bibliográficas, citações e comentários ao longo do texto, foram remetidas para nota de rodapé.

Todas as referências e citações respeitam a norma portuguesa NP405. As referências bibliográficas em nota de rodapé, quando repetidas, foram abreviadas a partir da segunda referência, tendo em conta a mesma norma científica.

O trabalho foi impresso em papel, correspondendo ao texto da dissertação resultante da nossa investigação, composto por uma ficha prosopográfica, uma ficha de inventário e imagens que a completam. Uma parte das fotografias colocadas é da nossa autoria, estando identificadas como tal. Cada imagem se encontra devidamente identificadas, contendo a sua fonte documental, quando necessária. A dissertação contém um índice inicial para melhor compreensão do leitor.

Seguindo as normas atribuídas pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, o nosso trabalho foi redigido de acordo com o novo Acordo Ortográfico, excepto as citações colocadas no texto, onde mantivemos a grafia original.

(6)

6 Índice Agradecimentos………...1 Resumo………...3 Abstract………...4 Nota Prévia………...5 Introdução………...8

Heráldica Eclesiástica e estudos artísticos: um Estado da Arte……….12

Parte I – Heráldica Eclesiástica…………..……….22

1.1. Panorama Geral da Heráldica Eclesiástica em Portugal………...23

1.2. A Heráldica ao Serviço da Dignidade Episcopal………...26

Parte II – Estudo da armaria dos bispos de Lamego.………...33

2. A Diocese de Lamego nos séculos XVI a XVII………..………..……….34

- Contextualização histórica da Diocese………..34

2.1. D. Agostinho Ribeiro………...36

2.1.1. As armas do bispo no seu retrato como reitor da Universidade de Coimbra………...36

2.2. D. Manuel de Noronha………...37

2.2.1. As armas do bispo nas grades da capela de São João Batista, da Sé de Lamego……….37

2.2.2. O escudo de armas do bispo na fachada da capela de Nossa Senhora dos Meninos………...40

2.3. D. Manuel de Meneses………...44

2.3.1. As armas do bispo no seu retrato como reitor da Universidade de Coimbra……….44

2.4. D. Simão de Sá Pereira……….46

2.5. D. António Teles de Meneses………..48

2.5.1 As armas do bispo na Igreja do convento das Chagas…………...48

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2.7. D. Martim Afonso Mexia de Tovar………52

2.7.1 As armas do bispo na capela da Nossa Senhora da Piedade, em Campo Maior...52

2.8. D. João de Lencastre………..………...55

2.9. D. João Coutinho………56

2.9.1 As insígnias do arcebispo na paramentaria……….……….56

2.10. D. Miguel de Portugal………...58

2.10.1. As armas do bispo na cruz de assento da Sé de Lamego………58

2.11. D. Luís de Sousa………...61

2.11.1. As armas do arcebispo na fachada da igreja de S. Vítor………...61

2.11.2. As armas do arcebispo no órgão positivo do coro da Nossa Senhora da Conceição da capela de S. Geraldo………...65

2.12. D. Frei Luís da Silva Teles………..66

2.12.1. As armas do bispo na escrivaninha do Paço Episcopal de Évora……….………..66

2.12.2. As armas do bispo numa tábua de Francisco Henriques……….………68

Conclusão………...72

Bibliografia……….74

Apêndice………..83

- Ficha prosopográfica……….84

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Introdução

Verificamos que o tema agora em estudo tem vindo a ser ignorado pelos Historiadores da Arte, em Portugal, sendo os estudos existentes discordantes sobre a avaliação da importância da heráldica eclesiástica e dos elementos que a verdadeiramente compõem. Motivo causado, talvez, pela falta de instrução sobre a heráldica portuguesa e pelo desinteresse nesta área. Por outro lado é de mencionar que a heráldica continua ainda a ser tabuna historiografia. No que se refere a estudos realizados sobre esta matéria nos referidos contextos disciplinares regista-se a existência de uma minoria ligada sobretudo à Heráldica em geral e menos aos aspetos artísticos que a compõem, consoante a época em que são produzidas.

O trabalho que aqui apresentamos enquadra o tema da heráldica eclesiástica no âmbito da produção artística dos séculos XVI a XVII. Entre as várias hipóteses de estudo, optámos pela análise de alguns exemplares heráldicos de doze prelados de Lamego, inscritos na referida cronologia, tendo em conta o local da sua colocação. As razões primordiais desta nossa escolha justificam-se, por um lado, pelo gosto pessoal já há muito manifestado, desenvolvido na unidade curricular de História da Arte e da Cultura Moderna I, que integrou o plano de estudos do 2º Ano da Licenciatura de História da Arte, como uma breve experiência de investigação do tema. Por outro lado, para pugnarmos pelo reconhecimento e destaque que a heráldica eclesiástica pode alcançar no seio da História da Arte.

O objeto do nosso estudo pretende ser, assim, um aprofundar da função social da heráldica eclesiástica na arte. Para tal damos especial atenção ao estudo funcional de alguns exemplares heráldicos, tendo em conta o seu enquadramento histórico e artístico, assim como a importância do local para onde foram produzidos.

Na realização da nossa dissertação, partimos, primeiramente, da recolha de bibliografia que consideramos importante para o nosso estudo. Numa primeira fase, a do Estado da Arte, procurámos aceder a uma referências gerais sobre heráldica portuguesa e

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além-fronteiras e estudos sobre História da Arte dos séculos XVI e XVII, nomeadamente nos períodos do Renascimento, Maneirismo e Barroco.

Para uma primeira aproximação ao tema, esta bibliografia inicial serviu para ponderarmos sobre o nosso objeto de estudo e para nos familiarizarmos com alguns aspetos relacionados com a cronologia. No respeitante à bibliografia escolhida existente sobre a heráldica optámos, primeiro, por uma abordagem geral do tema focando, com mais interesse, no ramo eclesiástico, delimitando assim o nosso campo de estudo.

Numa segunda abordagem, procurámos direcionar a nossa pesquisa para uma bibliografia específica sobre o tema da heráldica eclesiástica. Essencialmente preferimos reunir bibliografias portuguesas, algo que se tornou por vezes difícil, visto existirem escassas obras sobre este tema, em Portugal. Após a nossa pesquisa, sobre o que já tinha sido tratado na heráldica eclesiástica e os seus desenvolvimentos e, com um pensamento mais autónomo sobre o assunto a tratar, escolhemos o estudo das armas dos bispos de Lamego referentes ao período mencionado no título da nossa dissertação.

Inicialmente começámos por procurar bibliografias sobre o Bispado de Lamego, a fim de aprofundarmos a questão a tratar e o território a tratar. Depois de decidirmos quais os prelados – já nomeados na primeira parte da introdução – a incluir no nosso estudo, começamos por analisar a biografia de cada um, a fim de podermos realizar um inventário sobre as obras mandadas executar durante os seus episcopados. Este ponto da nossa pesquisa foi fulcral, pois podemos assim reconhecer as armas respeitantes a cada um dos prelados e a dispersão geográfica da sua heráldica. No que respeita às obras e objetos mandados executar por estes prelados, foi necessária uma pesquisa mais profunda. Reunimos, assim, essencialmente bibliografias específicas para cada exemplar mandado fundar ou realizar por estes bispos. O que muitas vezes se revelou complexo devido à escassez de informação bibliográfica e documental.

A bibliografia encontrada foi, sem dúvida, esclarecedora em algumas questões levantadas durante a nossa investigação. Porém, fomos confrontados com a míngua de bibliografia respeitante às armas dos prelados e da sua função social nas obras por nós nomeadas para este estudo. Para a nossa pesquisa optámos por contactar os museus das

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dioceses por onde passaram estes prelados, nomeadamente os de Évora, Braga, Algarve, Leiria e Castelo Branco, a fim de podermos registar informações sobre arte patrocinada pelos antístites. Esta parte da nossa investigação revelou-se essencial para o conhecimento de obras de arte cruciais para o desenvolvimento desta dissertação.

Quanto aos recursos e canais usados no levantamento de bibliografia e documentação respeitante ao nosso estudo utilizámos os catálogos de duas bibliotecas locais, a saber: a Biblioteca Municipal do Porto1 e da Faculdade de Letras da Universidade do Porto2; porém, em dado momento fomos forçados a alargar o nosso campo de pesquisa a nível regional e incluímos a biblioteca e o arquivo de Braga.

Uma das ferramentas por nós mais usada foi sem dúvida a Internet. Algumas das bibliografias essenciais para o nosso trabalho podem encontrar-se em formato digital, quer em bases electrónicas como a da Biblioteca Nacional de Portugal e em sítios, como o

Archive3 ou o Dialnet4. As dissertações de mestrado e teses de doutoramento por nós utilizadas nesta pesquisa obtivemo-las também em formato digital, por pesquisas efetuadas na página e base do Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal5.

Algumas das imagens do nosso trabalho foram obtidas nos sítios MatrizPix6 e MatrizNet7, quando respeitantes a peças de ourivesaria e pintura; as imagens referentes a arquiteturas foram obtidas no sítio da SIPA – Sistema de Informação para o Património

Arquitetónico8. Para outros casos podemos adquirir, com o nosso trabalho de campo,

1 Biblioteca Nacional de Portugal. Lisboa: [s.e.]. [ Consult. 20 Jan. 2014]. Disponível em WWW: <URL:

http://www.bnportugal.pt/>.

2

Biblioteca da Faculdade de Letras. Porto: Universidade do Porto. [ Consult. 20 Jan. 2014]. Dsiponível em WWW: <URL: http://sdi.letras.up.pt/>.

3

Internet Archive: Digital Library. [Em linha]. San Francisco: [s.e.]. [Consult. 20 Jan. 2014]. Dsiponível em WWW: <URL: https://archive.org/>.

4 Dialnet. [ Em linha]. La Rioja: Universidade de la Rioja. [Consult. 20 Jan. 2014]. Disponível em WWW: <URL:

http://dialnet.unirioja.es/>.

5

Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal. [Em linha]. Portugal: [s.e.]. [Consult. 20 Jan. 2014]. Disponivel em WWW: <URL: http://www.rcaap.pt/>.

6

MatrizPix. [Em linha ]. Portugal: Instituto dos Museus e da Conservação. [Consult. 20 Jan. 2014]. Disponível em WWW: <URL: http://www.matrizpix.dgpc.pt/matrizpix/home.aspx>.

7 MatrizNet. [Em linha]. Portugal: Instituto dos Museus e da Conservação. [Consult. 20 Jan. 2014].

Disponível em WWW:<URL: http://www.matriznet.dgpc.pt/matriznet/home.aspx>.

8

Sistema de Informação para o Património Arquitetónico. [ Em linha]. Sacavém: [s.e.]. [Consult. 20 Jan. 2014]. Disponível em WWW:<URL: http://www.monumentos.pt/>.

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algumas fotografias, sendo as restantes de autores devidamente referenciados nas legendas e que gentilmente no-las cederam para este trabalho.

Tendo em conta o objeto de estudo, dividimos a nossa dissertação em duas partes. A primeira parte, referente à heráldica eclesiástica, compõem-se de dois capítulos: o primeiro que diz respeito ao panorama geral da heráldica eclesiástica em Portugal, onde abordamos um pouco da sua história, desde a Idade Média até ao século XVII, explicando as mudanças sucessivas do escudo e as diferentes perspetivas teóricas de alguns heraldistas portugueses. No segundo começamos por mencionar as regras estabelecidas e reformadas para o uso de armas por parte do clero, indicando as cronologias das mudanças e os Pontífices que as introduziram. Propomo-nos a explicar alguns dos distintivos que eram usados pelo bispo nas armas eclesiásticas, nomeadamente: a cruz, o

galero e a coroa, tendo em conta a sua origem e utilidade.

Com esta primeira parte podemos partir para a análise propriamente dita da função social das armas de cada bispo – tendo em conta o local ou objeto para onde foram executadas ou onde foram implantadas.

De acordo o levantamento por nós previamente efetuado cabem em média duas peças heráldicas a cada um dos bispos. Porém, é de referir que em alguns casos isso não só se conhece um exemplar ou até mesmo nenhum como nos casos dos bispos D. João de Lencastre e D. Martim Afonso de Melo, cuja parte da sua vida eclesiástica se desconhece, assim como as suas armas.

Para cada um dos prelados atribuímos sempre uma nota introdutória referindo alguns trajetos importantes da sua vida eclesiástica, assim como sobre as dioceses onde ocuparam a cátedra. Não esquecendo a história da arte, tentamos referir sempre o local ou objeto onde as armas eram esculpidas, mencionado o seu construtor ou artífice – sempre que possível –, a sua importância artística, tendo em conta a época da sua execução e a sua utilidade. Seguidamente expusemos a análise propriamente dita do escudo, aludindo a sua constituição familiar e eclesiástica e a forma do seu escudo.

Por fim, justificamos, assim, a implantação das armas de cada um destes prelados em retábulos, peças de ourivesaria, mobiliário ou património integrado, em fachadas de

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igrejas ou pinturas, procurando transmitir a funcionalidade destas armas nos locais para onde foram executadas.

A nossa dissertação é ainda constituída por um apêndice e um anexo. No primeiro apresentamos as fichas prosopográficas, onde sistematizamos aspetos importantes sobre a biografia de cada um dos prelados, nomeadamente, a sua família, referência cronológica e cargos ocupados. No segundo aduzimos material iconográfico relevante para a contextualização das armas e elementos heráldicos elencados e devidamente analisados nas fichas prosopográficas.

Heráldica Eclesiástica e estudos artísticos: um Estado da Arte

Pretendemos evidenciar e discutir, com este Estado da Arte, as principais tendências de investigação e problemáticas que se verificaram em diferentes áreas do nosso estudo. Focar-se-á, com especial interesse, todas as publicações que direcionam o seu estudo e investigação aos bispos que aqui iremos patentear. Duma introspeção precedente compreendeu-se que não deveríamos incluir algumas obras já anteriormente comentadas em outras dissertações de mestrado, numa tentativa de evitar repetições sobre o que já foi tratado. Assim sendo, demos ênfase a publicações mais recentes.

A Heráldica tem vindo a ser tratada não só em Portugal mas, especialmente, em países como a França e Inglaterra como a arte da nobreza. Uma das primeiras e mais antigas publicações inglesas, The symbolisms of Heraldry or A Treatise on the meaning

sand derivations of Armorial bearings9, analisa o simbolismo das figuras e elementos que fazem parte de um escudo de armas. Porém, dado que a nossa dissertação remete para o estudo da heráldica eclesiástica, entendemos atenção especial a um dos capítulos desta obra que incide sobre os aspetos iconográficos dos elementos prelatícios, como a mitra, o báculo e os chapéus episcopais. Esta obra assume-se como um tratado de armaria,

9

WADE, W. Cecil – The symbolisms of Heraldry or A Treatise on the meanings and derivations of Armorial bearings. London: George Redway, 1898.

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indicando as suas origens e as diferentes formas do seu escudo, passando pelos esmaltes e o significado das cores.

No caso francês, Michel Pastoureau deixa-nos um conjunto expressivo de obras sobre heráldica, onde se destacam as intituladas Figures de l’héraldique10 e Traité

D’Héraldique11. A primeira obra que aqui distinguimos, remete-nos para a discussão da importância das figuras heráldicas e dos significados das peças num escudo de armas.

Já com várias edições publicadas, chega-nos uma das obras mais importantes da heráldica francesa, o Traité D’Héraldique várias vezes reeditado. Trata diferentes matérias: após uma breve introdução sobre o tratado, temos o primeiro livro que trata da evolução das armas desde as suas origens até aos tempos modernos (séculos XVI – XX). O segundo livro refere os elementos que compõem um brasão, ou seja, as cores, os bordos, as figuras e os seus ornamentos exteriores. O terceiro livro remete-nos para um lado crítico dos estudos heráldicos e da sua articulação com a Arqueologia e com a História Medieval e época Moderna. Finalmente, o quarto livro, possui uma vasta bibliografia de documentos e obras já publicadas sobre a heráldica assim como imagens, traduzindo uma investigação de quinze anos deste objeto.

No caso português – aquele que nos conduziu a realizar este projeto –, a maior parte das obras que abordam a heráldica foram apenas editadas já em pleno século XX, à exceção de uma pequena minoria. Uma das obras mais utilizada para estudos sobre a heráldica portuguesa, será certamente o Armorial Lusitano12 de Afonso Zúquete que nos auxiliou no estudo da heráldica das famílias dos prelados de Lamego. Podemos dizer que este livro terá seguido claramente a estruturação do Livro do Armeiro-mor13. Alfabeticamente ordenado, cada apelido destaca-se através de um texto sobre a origem do seu nome, apresentado lateralmente o brasão, com os seus elementos constituintes.

10

PASTOUREAU, Michel – Figures de l’héraldique. Paris: Découvertes Gallimard, 1996.

11

PASTOUREAU, Michel – Traité D’Héraldique. 4ª Edição. Paris: Picard éditeur, 2003.

12 ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins – Armorial Lusitano: genealogia e heráldica. Lisboa: Editorial

Enciclopédia, 1961.

13

CRÓ, João do – Livro do armeiro-mor [Manuscrito]. [1509]. Acessível no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lisboa, Portugal.

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Num estudo recente sobre a heráldica autárquica em Portugal, ressalta a parte introdutória ao tema onde se refere a armaria enquanto realização plástica. A arte e a

heráldica autárquica em Portugal14, trouxe uma nova forma de olhar para a heráldica enquanto arte, tomando-a como um design visual e conceptual. Não muito diferente desta ideia de heráldica enquanto manifestação artística, surge-nos a obra de Eduardo Duarte, da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, que tem como título A

heráldica portuguesa na Arte e na Sociedade15. A sua linha de pensamento não difere muito daquilo que é citado por Paulo Morais Alexandre, ao indicar que a heráldica

“conheceu um alto grau de abstração conceptual e formal”16, assinalando-a ainda como a taquigrafia da História e nobre Ciência17.

Tal como verificamos na heráldica da nobreza, também na eclesiástica tivemos de recorrer a obras estrangeiras, de modo a completar os nossos estudos. Assim sendo, ao longo da nossa investigação surgiu-nos, A Treatiseon Ecclesiastical Heraldry18, datado de 1894.

Numa primeira parte, no capítulo inicial, o autor revela-nos um pouco das origens da heráldica nomeadamente, nos escudos militares passando, mais tarde, a ornamento pessoal ou de família nobre. Segue-se a explicação sobre o significado de alguns símbolos exteriores, usados no escudo de armas de cada representante da igreja – elmos, mitra, espadas, galero. Por ordem hierárquica da igreja, o autor apresenta-nos nos restantes capítulos, a simbologia e os elementos que fazem parte do escudo pertencente a cada membro da igreja nomeadamente, abades e abadessas, bispos, arcebispos, cardeais e papas. De modo a completar o seu trabalho, o autor presenteia-nos, ainda, com alguns exemplos de escudos ligados à nobreza e à igreja. É de referir ainda que, ao longo da obra podemos analisar alguns exemplos de imagens pedras-de-armas de nobres ingleses, país onde se centrou a análise do autor.

14 ALEXANDRE, Paulo Morais – A arte e a heráldica autárquica em Portugal. Lisboa: Centro Lusíada de

Estudos Genealógicos e Heráldicos, Universidade Lusíada, 2006, pp. 109-128.

15

DUARTE, Eduardo – A heráldica portuguesa na Arte e na Sociedade. Lisboa: Revista da Faculdade de Belas Artes, Arte e Sociedade, 2011.

16

DUARTE, Eduardo – A heráldica portuguesa na Arte e na Sociedade, p. 37.

17

ALEXANDRE, Paulo Morais – A arte e a heráldica autárquica em Portugal, p. 109.

18

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Paralelamente, algumas dissertações de mestrado recentes vêm abrir portas para novos estudos sobre a heráldica eclesiástica. Foi o caso da publicação de Marta Santos,

Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos-Condes19. A investigadora dividiu o seu

estudo em dois capítulos: o primeiro refere os vários períodos da heráldica eclesiástica, tendo em conta a semiologia, as formas e as peças que compõem o escudo. Num segundo capítulo, já referido anteriormente, sobre os bispos-condes, a autora explora as diferentes representações heráldicas dos bispos escolhidos, não desprezando aquilo que os torna únicos no seu procedimento plástico. Devemos destacar ainda o conjunto de referências bibliográficas constantes desta dissertação conferiu uma inestimável ajuda ao nosso estudo.

Regressando ao panorama bibliográfico estrangeiro, em 2012 foi reeditado o livro de Bruno Heim, Cotumes et droit Héraldiques de l’église20, obra que logo considerámos pertinente para nosso estudo. A partir desta edição entendemos, com mais precisão, o emprego das armas eclesiásticas, assim como a sua divisão e a sua importância. O autor faz, ainda, uma avaliação às peças mais importantes usadas na heráldica eclesiástica, assim como a aquisição das marcas de dignidade – casos que podemos comparar com as armas dos bispos analisados nesta dissertação.

Não menos importante surge-nos a simbologia que, dentro do estudo da história da arte se revela uma mais-valia metodológica para avaliar do significado da iconografia heráldica. Quem estuda pinturas ou escultura tem obrigatoriamente de manusear e aplicar leituras iconográficas de modo a atribuir e esclarecer sentido ou sentidos dos elementos que se articulam na composição. Não quer dizer que tudo tenha uma definição possível, pois existe mais do que um significado para cada elemento – em História da Arte atribui-se um significado a um certo elemento de acordo com a sua matéria, cor, forma e posição, tendo em conta a época de execução e o conhecimento do seu autor ou autores.

19

SANTOS, Marta Manuel Gomes dos – Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos-Condes. Dissertação de Mestrado em História da Arte, Património e Turismo Cultural, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra sob a orientação de Lurdes Craveiro, em 2010. Texto policopiado.

20

HEIM, Bruno Bernard – Costumes et droit Héraldiques de l’église. Paris: Bibliothéque Beanchesne, 2012. ISBN: 978-2-7010-1995-6.

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Em Heráldica esta abordagem difere uma vez que a maior parte dos símbolos atribuídos nos escudos não possuem mesmo sentido que os elementos noutros contextos artísticos. É neste sentido que a simbologia deve ser aplicada, tendo sempre em conta a matéria que se estuda.

No campo da análise da simbologia e, concretamente em contexto nacional, surgem algumas edições, que convém salientar, sendo a mais antiga que conhecemos a de Manuel Artur Norton, intitulada de Acerca da simbologia e datada de 197821. Aqui o autor apresenta-nos não apenas uma pequena introdução sobre o que é a simbologia quer na heráldica e até na própria arte; como também, organiza-se por conceitos, temas e categorias – ex.º: anfíbios, aves, crustáceos, insetos, mamíferos, moluscos, peixes, répteis, bestiário fantástico, plantas, flora, imaginária, corpo humano, agricultura, cores, escudo, figuras geométricas, guerra, material, música, peles e terra. Todos estes conceitos/imagens se encontram ordenados e acrescidos do seu significado simbólico.

Um pouco mais tarde, e em contexto internacional, Jean Chevalier trouxe uma obra também dedicada à interpretação da simbologia. Encontra-se organizada alfabeticamente, de modo a facilitar a consulta, intitulando-se Dicionário dos Símbolos

(…)22. Entre o ano de 1995 e 2001, uma outra obra foi editada sobre o mesmo assunto: da autoria de Georges Romey, psicoterapeuta que redigiu o Dictionnaire de la symbolique: le

vocabulaire fondamental des rêves23. Dividido em quatro volumes e por ordem alfabética, este livro tem em conta vários elementos simbólicos como a cor, os minerais, os metais, os vegetais, os animais (no primeiro volume); personagens, partes do corpo, formas e volumes, astros (no segundo volume); números e tempos, objetos, lugares notáveis (para o terceiro volume); elementos da natureza, estados emocionais, movimentos, perceções e sons (no quarto e último volume).

21

NORTON, Manuel Artur – Acerca da simbologia. Braga: [s.n.], 1978.

22 CHEVALIER, Jean – Dicionário dos símbolos: mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores,

números. Lisboa: Teorema, 1994.

23

ROMEY, Georges – Dictionnaire de la symbolique: le vocabulaire fondamental des rêves. 4 vols. Paris: Albin Michel, 1995-2001.

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Na entrada para o século XXI, Frédéric Portal apresenta-nos A Simbologia das

cores24que, revela o significado de cada cor mediante o seu tempo e o seu uso; dando o parecer da sua linguagem quer seja ela divina, sagrada ou profana.

De forma a realizar uma melhor investigação sobre dispersão geográfica das representações heráldicas dos bispos, tivemos em conta determinadas obras de inventário de diferentes cidades e distritos de Portugal. Assim, é de referir o Inventário

Artístico de Portugal, editado pela Academia Nacional de Belas-Artes, tendo em conta os

volumes que nos interessaram dizem respeito aos distritos de Coimbra25 e de Leiria26 e às cidades de Évora27 e Porto28. Importantes para a nossa dissertação, pela sistematização da informação constante dos levantamentos artísticos, estas obras trouxeram um conhecimento mais abrangente de peças de ourivesaria com as armas dos bispos e arcebispos em questão, ou mesmo escudos de armas implantados em fachadas de igrejas onde foram benfeitores.

Numa tentativa de compreender melhor as modas e tendências artísticas das épocas do Renascimento, Maneirismo e Barroco –épocas a que se reporta o nosso estudo – sugerimos a inserção nesta investigação de obras gerais de alguns historiadores de arte nacional, como Vítor Serrão29 que especificamente têm estudado o referidos períodos da arte nacional.

No que respeita à história eclesiástica são ainda escassas as obras que tratem sobre a diocese de Lamego. Destacamos duas edições importantes para o estudo histórico desta unidade administrativa e da ação dos seus prelados na cronologia

24 PORTAL, Frédéric – A simbologia das cores: as cores simbólicas na antiguidade, na Idade Média e

nos tempos modernos. [trad.] Daniel Gouveia. Lisboa: Huguin, 2001.

25

CORREIA, Virgílio – Inventário Artístico de Portugal. Distrito de Coimbra. Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1952.

26

SEQUEIRA, Gustavo de Matos – Inventário Artístico de Portugal. Distrito de Leiria. Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1955.

27 ESPANCA, Túlio – Inventário Artístico de Portugal. Cidade de Évora. Évora. Lisboa: Academia

Nacional de Belas-Artes, 1966.

28

QUARESMA, Maria Clementina de Carvalho – Inventário Artístico de Portugal. Cidade do Porto. Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1995.

29

SERRÃO, Vítor – História da Arte em Portugal. O Renascimento e o Maneirismo. Lisboa: Presença, 2002. ISBN: 972-23-2924-3; SERRÃO, Vítor – História da Arte em Portugal. O Barroco. Lisboa: Presença, 2003. ISBN: 972-23-2017-9.

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18

abordada: a História eclesiástica da cidade e bispado de Lamego30e História do bispado e

cidade de Lamego31.

A primeira obra apresenta biografias dos bispos lamecenses até ao século XIX, indicando informações sobre o seu local de nascimento e morte assim como outros elementos biográficos.

A segunda obra, da autoria do padre M. Gonçalves da Costa, divide-se por épocas históricas como o Renascimento e o Barroco, cujos volumes nos foram essenciais à pesquisa. Os do nosso interesse serão assim os do período pré-tridentino, onde encontramos os episcopados de D. Frei Agostinho Ribeiro e D. Manuel de Meneses; e no período do domínio filipino, referindo-se a episcopados de D. António Teles de Meneses e D. Manuel de Noronha.

O autor, porém, decidiu atribuir a D. Miguel de Portugal, bispo de Lamego no século XVI, um capítulo específico, provavelmente devido à sua importância enquanto embaixador de Portugal em Roma, durante a Restauração da independência de Portugal. No volume V, do período Barroco, analisa os episcopados de D. Luís de Sousa e D. Frei Luís da Silva.

Mais recentemente, em 2006, surgiu uma nova obra, não exclusivamente sobre os prelados lamecenses, mas sobre os episcopados da época Moderna, intitulado Bispos e

Portugal e do Império desde 1495 até 177732. Apesar de tratar-se de obra com carácter mais abrangente, assinalam-se os nomes de alguns dos bispos de Lamego já referidos, indicando sistematicamente o ato da posse dos bispados e as cronologias dos episcopados, como o caso de D. António Teles de Meneses.

Para o estudo das representações heráldicas dos bispos da cátedra lamecense, que aqui irão ser analisadas, podemos começar por salientar a obra de F. J. Laranjo,

30

AZEVEDO, Joaquim D. – História eclesiástica da cidade e bispado de Lamego. Porto: Typographia do Jornal do Porto, 1877.

31 COSTA, M. Gonçalves da – História do bispado e cidade de Lamego. Vols. IV e V. Lamego: [s.n.],

1984-1986.

32

PAIVA, José Pedro – Os bispos de Portugal e do Império: 1495-1777. Coimbra: Imprensa da Universidade, 2006.

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19

Escudos de Armas dos bispos de Lamego33, que nos serviu de base ao levantamento de emblemas heráldicos dos prelados daquela diocese. Seguindo uma cronologia exata, o autor optou por clarificar certos aspetos da vida de cada bispo que tomaram posse da cátedra de Lamego. Por outro lado, o autor faz uma breve leitura heráldica dos escudos que reconheceu. No final do livro, em anexo, encontramos os escudos de armas de cada bispo de Lamego e, na mesma obra, por ordem cronológica, o nome dos prelados e suas representações heráldicas.

Mais recentemente um artigo publicado na revista do Centro de História da Sociedade e da Cultura analisada a vida e obra de D. Frei Luís da Silva34. O autor do artigo, e já atrás citado, José Pedro Paiva, refere o papel de D. Luís da Silva enquanto bispo de Lamego e arcebispo de Évora, aludindo a outras das suas nomeações e cargos do mesmo, como Deão da Capela-real e bispo da Guarda. Este tipo de estudo individual, pela sua raridade no contexto da historiografia portuguesa foi-nos particularmente útil, como elemento de apoio à elaboração das prosopografias em anexo.

No mesmo ano foi divulgada a obra de Eduardo Pires de Oliveira, sobre a Igreja de São Vítor35, em Braga, investigação importante para o nosso estudo, pois assinala que esta igreja fora refundada pelo bispo D. Luís de Sousa, durante o seu arcebispado. Numa das ilustrações publicadas pelo autor, podemos observar a fachada desta igreja em cujo frontão contêm as armas do arcebispo fundador.

Escrito por Teresa Vale, surge-nos o diário de D. Luís de Sousa36, editado enquanto embaixador português, em Roma. Para além de sumariar o relato do quotidiano do bispo, redigido pelo próprio prelado durante a viagem de Lisboa para Roma e a sua permanência nesse país, a autora relata-nos de igual modo um pouco da sua vida como prelado e a sua missão diplomática.

33

LARANJO, F. J. Cordeiro – Escudos de Armas dos Bispos de Lamego: (1492-1976). Viseu: Junta Distrital, 1977.

34

PAIVA, José Pedro – D. Fr. Luís da Silva e a gestão dos bens de uma mitra. O caso da diocese de Lamego (1677-85). Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2001, Vol. II, pp. 243-255.

35 OLIVEIRA, Eduardo Pires de – A Freguesia de São Vítor (Braga). Braga: Junta de Freguesia de São

Vítor, 2001, pp. 129-142.

36

VALE, Teresa Leonor Magalhães do – Diário de um Embaixador português em Roma (1676-1678). Lisboa: Livros Horizonte, 2006.

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20

Em 2007, Celso Mangucci elaborou um artigo para a revista Cenáculo Boletim em

linha do Museu de Évora37sobre os retábulos produzidos pelo artista Francisco Machado, a mando do arcebispo de Évora, D. Frei Luís da Silva. Apesar do arcebispo não ter sido o primeiro a patrocinar as obras de Francisco Machado, o autor apresenta-nos este prelado como sendo o homem de grandes fortunas e o remédio de todas as suas necessidades38. O autor prende-nos neste artigo ao afirmar com clareza, no título, tratar-se da oficina de retábulos do arcebispo de Évora. Ao longo deste trabalho de investigação compreendemos como D. Luís da Silva entendia como tais retábulos enquanto locais de afirmação que demonstravam a magnificência do arcebispo, da sua força moral e do seu

zelo católico39. Outro dos artistas mencionado é o virtuoso pintor barroco Bento Coelho da Silveira que, terá elaborado algumas obras, em Évora a mando do prelado.

Realizado para a Revista científica da Escola Superior de Educação da Guarda40, outro artigo biográfico, desta vez sobre o bispo de Lamego D. Miguel de Portugal. O autor Eurico Gomes Dias dá-nos a conhecer com este artigo, um pouco daquilo que foram as negociações diplomáticas com a Igreja, em Roma, de modo a restaurar a independência de Portugal.

A figura que aqui se destaca é sem dúvida a do diplomata D. Miguel, escolhido por D. João IV para representar o seu país em Roma e nessa condição, convencer o Papa e a Cúria Pontifícia da reconquista autonómica de Portugal. Algo que não terá acontecido, visto que o Papa de então, Urbano VIII, nunca o chegou a receber, cedendo às pressões pró-castelhanas.

Em relação à biografia de D. Agostinho Ribeiro foi publicado em 2009 pelo Museu de Angra do Heroísmo (na sequência da celebração dos 475 anos da Diocese de Angra)41, uma pequena obra sobre os prelados que serviram aquela diocese. Tendo sido o primeiro

37

MANGUCCI, Celso – Francisco Machado e a oficina dos retábulos do arcebispo de Évora. Évora: Cenáculo. Boletim online do Museu de Évora, nº2, 2007 pp. 2-17.

38Ibidem, p. 3. 39

Ibidem, p. 10.

40

DIAS, Eurico Gomes – A intervenção de D. Miguel de Portugal, bispo de Lamego, no arranque da diplomacia portuguesa na Restauração. Guarda: Revista Científica da Escola Superior de Educação da Guarda, nº7, 2008, pp. 9-48.

41

BRUNO, Jorge A. Paulus – Retratos dos Bispos de Angra. 475 Anos da Diocese de Angra. Angra do Heroísmo: Museu de Angra do Heroísmo, 2009, pp. 5-12.

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21

bispo de Angra D. Agostinho Ribeiro é evidenciado nesta obra através de uma biografia sucinta e de um retrato, presentemente depositado no Museu de Angra.

No ano transato, em 2013, foi divulgado um trabalho de vários autores sobre a catedral de Lamego e a sua história entre os séculos XII e XX42 focando aspetos como os da sua construção, intervenções na longa duração e respetivos mecenas que intervieram no espaço eclesial, nos quais estão referidos alguns dos bispos de Lamego, aqui em estudo. Nesta publicação, podemos verificar que são vários os parágrafos que dizem respeito às fundações de capelas identificadas com as respetivas armas dos bispos, como é o caso de D. Manuel de Noronha e as suas armas no portão da Capela de São João Batista que mandou edificar.

42

SARAIVA, Anísio Miguel de Sousa (coord.) – Espaço, Poder e Memória: A Catedral de Lamego, sécs. XII a XX. Lisboa: Centro de Estudos de História Religiosa, 2013.

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1.1. Panorama Geral da Heráldica Eclesiástica em Portugal

Até há pouco tempo a Heráldica era considerada como uma disciplina pouco séria no complemento do estudo da História, ao contrário do que se vinha a passar no além-fronteiras – em países como, a Espanha e a Inglaterra – onde era encarada como parte do conhecimento sobre o estatuto e função da nobreza. Em Portugal, só no início do século XX cresceu o interesse pelo estudo e conhecimento da heráldica, ao mesmo tempo que erem criados os emblemas autárquicos, com as suas próprias caraterísticas. Em finais da década de 1920 e início de 193030, os historiadores entenderam a utilidade da armaria, nos variadíssimos campos de investigação, do sociológico ao jurídico e do artístico ao

político43.

Nos anos de 1940 deram-se início às investigações das origens da heráldica portuguesa, nomeadamente em tempos medievais, por parte do Marquês de São Payo e de António Machado de Faria de Pina Cabral44.

Constatou-se que à semelhança do estrangeiro, inicialmente a heráldica começou por ser usada por monarcas, nobres e cavaleiros mas a prática de usar escudos de armas foi rapidamente difundida por outras camadas sociais, nomeadamente o clero. Começou por ser usado no século XIII mas ainda com o propósito de identificação pessoal. Em Portugal, verifica-se que os primeiros eclesiásticos usavam armas de fé45. Contudo mais tarde, ainda na Idade Média, começaram a ser usadas as armas de família como ostentação heráldica46.

De acordo com alguns autores para que o estudo da heráldica eclesiástica seja possível, é fundamental que se conheça as suas leis aos quais o clero se tem de submeter. Objetos como as coroas e os chapéus dos prelados foram colocados nos escudos dos eclesiásticos de forma a realçar a sua dignidade. Bruno Heim menciona em Cotumes et

43

ABRANTES, Marquês de – Introdução ao estudo da heráldica. Lisboa: Instituto de Cultura e Línguas Portuguesas, 1992, p. 13.

44

A identificação do autor do Livro do Armeiro-Mor foi levada a cabo por este investigador. Ibidem, p. 15.

45 NORTON, Manuel Artur – A heráldica em Portugal: raízes, simbologia e expressões histórico-culturais.

Dissertação de Doutoramento em História orientada pelo Professor Doutor António Dias Farinha, apresentada à Universidade do Minho, 2002, p. 697.

46

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droit Héraldiques de l’église47que a igreja ignorava o escudo de armas e tomava apenas as peças de dignidade eclesiástica como elementos das normas heráldicas. Contudo, o mesmo declara que, em alguns casos, membros de ordens ou congregações religiosas usavam peças heráldicas das suas respetivas organizações, assim como os bispos e arcebispos que combinavam as suas armas familiares com a ordem religiosa a que pertenciam.

Assim, para o estudo da heráldica eclesiástica é do entender de alguns autores que se deve ter em conta mais os elementos que determinam a dignidade e função do indivíduo ou ordem na igreja, do que propriamente o seu escudo pessoal. Algo, porém, que não é partilhado por os investigadores. Miguel Metelo Seixas48 concluiu que não se deve rejeitar as armas pessoais para o estudo da heráldica eclesiástica, visto que estas têm um propósito não só o da sua identificação pessoal enquanto membro da aristocracia mas, também, por outro lado conduz à explicação da sua dignidade e funções eclesiásticas49.

Por outro lado, Manuel Norton refere que na heráldica eclesiástica existem três perspetivas diferentes para que esta possa ser estudada. Para isso é preciso ter em conta a dimensão espiritual, a sua conotação simbólica e o condicionalismo heráldico50. No que respeita à dimensão espiritual há a entender que as armas de fé51 são o símbolo do seu utilizador e os atributos simbólico-divinos são ligados à sua entrega a Deus52. A conotação simbólica está ligada à sua dignidade: se for um bispo, as suas armas apresentam-se com o chapéu prelatício e com as borlas de cor verde, pro exemplo53. Por outro lado, estes

47

HEIM, Bruno Bernard – Cotumes et droit Héraldiques de l’église, p. 23.

48 SEIXAS, Miguel Metelo – “A Heráldica Eclesiástica na Porcelana Chinesa de Importação Portuguesa”

in SANTOS, A. Varela – Portugal na Porcelana da China: 500 anos de comércio. Lisboa: Arte mágica, 2007, vol. II.

49Ibidem, pp. 415-417. 50

NORTON, Manuel Artur – A heráldica em Portugal: raízes, simbologia e expressões histórico-culturais, pp. 700-714.

51 O uso da palavra “escudo de armas” ia contra as regras da igreja por ter sido, nas suas origens, um

artefacto de guerra.

52

Ibidem, p. 700.

53

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bispos estavam condicionados no uso de alguns elementos heráldicos que não estivessem diretamente ligados com Igreja, como as coroas nobiliárquicas e os elmos54.

A heráldica foi dividida cronologicamente segundo vários autores que sistematizaram a sua análise através dos períodos da História da Portugal: começando na medieval época que o Marquês de Abrantes55 subdivide em três fases. O primeiro período vai do século XII aquando a formação da heráldica com o reconhecimento de Portugal como reino independente. Para um melhor conhecimento desta periodização, saliente-se a sigilografia como veículo de análise para uma melhor perceção do caso heráldico56.

Em meados do século XII, o clero constituía um total de 54 exemplares de selos; não podemos ainda dizer que se trata de fragmentos da heráldica eclesiástica, visto que na sua maioria, estes selos apresentavam elementos figurativos com a imagem de um santo. Verifica-se que apesar de ainda não nos encontrarmos no período pleno da heráldica eclesiástica, existe uma tentativa de a fazer surgir aos poucos.

Na segunda fase dentro do período medieval, por volta de 1248 e durante o reinado de D. Afonso III, aponta-se a existência de 195 selos eclesiásticos, dos quais 49 apresentam elementos heráldicos. É ainda interessante verificar que 15 destes selos pertenceram a bispos ostentando escudos simples sem elementos externos mas, com figuras iconográficas no interior do escudo57.

A última fase do período medieval é compreendida entre o ano de 1385 e o reinado de D. Manuel I, quando surgem os primeiros ornatos exteriores e timbres, conferindo, assim a dignidade e título nobiliárquico nas armas. De um conjunto de 122 selos, 17 são já considerados selos heráldicos, entres os quais se destacam 19 selos de bispos e 18 de arcebispos, com ornatos exteriores58. É ainda no século XV que começam a surgir os primeiros chapéus eclesiásticos em Portugal, um século depois de ter sido

54Ibidem, p. 705. 55

ABRANTES, Marquês de – Introdução ao estudo da heráldica, p. 21-29.

56

SANTOS, Marta Manuel Gomes dos – Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos-Condes Apud SAMEIRO, Pedro Sá Alves – L’héraldique éclésiastique au Portugal. Helsinquia: The Finish National Committee for Genealogy and Heraldry, 1986, p. 469.

57

Ibidem, p. 469.

58

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26

estabelecido em Itália. A presença de ornamentos exteriores afirma-se assim com o uso de elementos que atribuem o título prelatício de um indivíduo na igreja.

Com o avançar dos séculos verificamos que a heráldica eclesiástica se vem a desenvolver sucessivamente através da adoção de novos ornamentos exteriores, tal como aconteceu com a adoção de elmos e coroas por parte da heráldica nobiliárquica e de família. A heráldica dos eclesiásticos adotou novas formas ou, pelo menos, assumiu-as

com a maior flexibilidade e preponderância, originando novos caminhos e etapas para a história da arte de armorejar no contexto clerical59.

Durante o reinado de D. Manuel I a heráldica tende a perder a sua liberdade de escolha pelos elementos que ostentava, a partir do golpe que foi a total centralização

orgânica e jurídica da Corporação dos Reis d’Armas60.

Na época do Barroco em Portugal verifica-se a influência das cortes estrangeiras nas alterações realizadas ao nível da exibição de armas, tal como se tinha passado anteriormente no reinado de D. Afonso III. No reinado de D. João V nota-se a influência italiana com a introdução da forma do escudo conhecida como testa di cavallo, adotada no reino. O bordo do escudo deixa de ter a forma oval para se cobrir de decoração exaustiva com floreados e volutas, tão próprias da época. Por outro lado, a presença de artistas estrangeiros terá sido também importante para a mudança e desenvolvimento da armaria portuguesa mais complexa. Como podemos verificar, a heráldica acompanhou

toda a miríade de influências políticas, económicas, culturais, sociológicas e artísticas que se verificaram ao longo dos tempos61.

1.2. A Heráldica ao Serviço da Dignidade Episcopal

Como podemos verificar pela análise da bibliografia atrás referida não existe, nem existiu, no tempo português, nenhuma autoridade reguladora da heráldica na igreja, que

59

SANTOS, Marta Manuel Gomes dos – Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos-Condes, p. 23.

60

ABRANTES, Marquês de – Introdução ao estudo da heráldica, p. 57.

61

SANTOS, Marta Manuel Gomes dos – Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos-Condes, p. 25.

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27

pudesse atribuir escudos de armas às organizações religiosas e aos membros eclesiásticos. Bispos, arcebispos, abades e ordens religiosas utilizavam as armas de família62 juntamente com os elementos eclesiásticos atribuídos que distinguiam a sua dignidade. O principal veículo para a heráldica eclesiástica começou com os selos, no início da Idade Média com a envolvência do clero na administração secular. Cedo a igreja utilizou o selo para validar a sua documentação. Os selos começaram por ter a forma oval com figuras de santos ou o seu próprio retrato, de forma a poderem ser diferenciados do resto dos membros do clero63.

Fora da esfera militar os clérigos substituíram grande parte dos elementos heráldicos constituintes das armas de sua família, por objetos usados durante o seu exercício canónico. A composição do escudo manteve-se, no entanto, através de peças como elmo e o manto foram banidos – pela sua ligação à nobreza – e substituídos pelo chapéu eclesiástico, – com as respetivas cores e número de borlas, consoante a dignidade – pela mitra e pela cruz.

Para o uso da heráldica por parte do clero foram estabelecidas e reformadas algumas regras pelos Pontífices: o Papa Símaco (498-514) introduziu a primeira coroa como símbolo papal; para além dos cardeais e dos próprios papas, Leão IX (1049-1054) aprovou o uso da Mitra pelos bispos que, mais tarde, com Alexandre II (1061-1073) foi estendida esta regulamentação aos abades.Com Inocêncio III (1198-1216) os eclesiásticos que fossem destinados cargo de arcebispos teriam de receber o palium primeiro64. No primeiro Concílio de Lyon, em 1245, Inocêncio IV (1243-1254) consentiu que os cardeais usassem o chapéu prelatício ou galero com cordões65 de cor roxa66.

62

O uso das armas de família apenas nos indica a ascendência dos eclesiásticos e o facto de estes pertencerem à aristocracia. Pois, na teoria, nenhum destes membros da igreja foi combatente, logo não seria necessário reconhecê-los no campo de batalha.

63

SARAIVA, Anísio Miguel de Sousa; MORUJÃO, Maria do Rosário Barbosa – “Sigilografia heráldica eclesiástica medieval portuguesa no Archivo Histórico Nacional de Espanha” in SEIXAS, Miguel Metelo de; ROSA, Maria de Lurdes (coord.) – Estudos de Heráldica Medieval. Lisboa: Instituto de Estudos Medievais (FCSH-UNL) / Centro Lusíada de Estudos Genealógicos e Heráldicos (ULL) / Caminhos Romanos, Lisboa, 2012, pp. 96-97.

64 GARCIA, Fernando del Arco y– Heráldica Eclesiástica. Espanha: Revista Emblemata, 2012, vol. 18, p.

143.

65

Ainda não tinha sido regularizado o número de borlas que distinguia as diferentes dignidades do clero.

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Bonifácio VIII (1249-1303) introduziu a segunda coroa nos distintivos papais enquanto Benedito XI introduziu a terceira, finalizando assim a imagem da mitra papal que usada quase até aos dias de hoje67. No que respeita o uso da mitra Clemente IV (1265-1268) restringiu o seu uso e colocação nos escudos de armas dos abades e dos bispos. Com a mitra papal completa João XXII (1316-1334) usou-a pela primeira vez juntamente com as chaves papais em aspas. No século XVI, durante o pontificado de Leão X (1513-1521) as dignidades eclesiásticas foram consideradas como uma classe distinta da aristocracia e, como tal, foram proibidas o uso de coroas e armas que estivessem diretamente ligadas com a nobreza familiar68.

Inocêncio X (1644-1655) proibiu o uso de coroas nos timbres dos escudos de armas dos eclesiásticos, podendo levar à excomunhão aquele que desrespeitasse essa regra. Durante o reinado de Pio VI (1775-1779) foram atribuídos o número de borlas respeitantes a cada dignidade eclesiástica; sendo, mais tarde, legalizado o uso das borlas e dos cordões69 com Gregório XVI (1831-1846), apesar de já há muito tempo serem usadas pelos membros da igreja70. Benedito XV (1914-1922) consentiu no uso das insígnias eclesiásticas com o escudo de armas de família, sendo mais tarde abolido pelo papa Pio XII (1939-1958).

Para que um bispo pudesse assumir o uso de armas eclesiásticas teria de primeiro, claro está, ser nomeado para esse cargo. Não que fosse necessário o uso de armas, porém era usual, em Portugal, a combinação das armas de família com as armas eclesiásticas. Todas as peças heráldicas, à exceção das que respeitam as armas de família, são emblemas que indicam a dignidade de um oficial da igreja. Deste modo, iremos referir alguns destes distintivos referentes à dignidade de bispo, externos ao escudo – a cruz, o chapéu eclesiástico e a coroa.

Comecemos por referir a cruz prelatícia ou latina, símbolo da competência pastoral de um bispo, abadessa ou cardeal, adotada primeiramente por arcebispos e

66

Ibidem, p. 143.

67Ibidem, p. 144. 68

ARCO Y GARCIA, Fernando del – Heráldica Eclesiástica, p. 144.

69

Legalizado através do Decreto da Sagrada Congregação de Cerimónias. Ibidem, p. 144.

70

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patriarcas no século XIV. A cruz que normalmente é apresentada pelos bispos é a cruz que antecede o Papa na procissão, sendo bastante semelhante à cruz usada nas cerimónias litúrgicas. A cruz que surge representada nas armas clericais simboliza a hierarquia papal. A mesma cruz era anteriormente usada no século V com um só braço transversal e reportada como cruz latina. É curioso como os bispos desde sempre tiveram esta cruz como elemento heráldico, mesmo não sendo antevisto o seu uso pelos prelados.

Contudo, esta é reconhecida no seio da Igreja Romana Católica como um símbolo heráldico de direito dos bispos; um arcebispo não faria uso desta cruz, a menos que, previamente, tivesse ocupado o lugar prelatício71.A cruz processional usada pelos prelados apresentava-se desprovida de decorações, com um só braço transversal; este facto levou os arcebispos e patriarcas a adotarem a cruz de dois braços para se diferenciarem da cruz processional.

No paquife da armaria, o elmo e a coroa usados pelos cavaleiros e nobres foram substituídos, na Idade Média, pela mitra. O uso da mitra pelos bispos, de acordo com Bruno Heim, deriva do camelaucum também chamado de “gorro” frígio72 originado por volta do século X e utilizado exclusivamente pelos papas. Desde Leão IX que a mitra é usada como distintivo episcopal73, enquanto com Alexandro II ela é estendida ao uso dos abades74. Durante o seu pontificado Clemente IV impôs que, durante os Concílios, os abades fossem obrigados a usar a mitra de cor branca ou guarnecida de ouro75. O uso da mitra pelos prelados na heráldica, com o tempo, caiu em desuso dando lugar, no século XIV, ao chapéu eclesiástico ou galero.

Tal como as coroas na nobreza, os chapéus eclesiásticos, ou galeros, serviam de proteção ou enfeite para a cabeça, a parte mais nobre da anatomia humana. Os primeiros chapéus eclesiásticos surgem de cor vermelha ou escarlate, conferidos pelo Papa Inocêncio IV (1243-1254) aos cardeais, com o intuito de os distinguir de outros membros

71

SANTOS, Marta Manuel Gomes dos – Heráldica eclesiástica-Brasões de Armas de Bispos, p. 39.

72 HEIM, Bruno Bernard – Cotumes et droit Héraldiques de l’église, p. 69. 73 Ibidem, p. 70. 74 Ibidem, p. 70. 75 Ibidem, p. 71.

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da igreja76. O chapéu vermelho lembra aos cardeais o dever de defender a Igreja, mesmo com o seu próprio sangue, sendo para eles uma espécie de advertência77. Quanto à sua forma, o chapéu era igual ao usado pelos peregrinos de aba larga e plana, com cada lado da borda perfurado por dois cordões e unidos nas suas extremidades por um anel de deslizamento78.

O chapéu foi colocado nas armas dos prelados sobre o escudo, acima da cruz. Inicialmente o número de cordas ou borlas não foi definido ou era inexistente, sendo colocadas três ou seis borlas de cada lado. Apenas em 1832 com a Sagrada Congregação Cerimonial se padronizou o número de borlas, tendo sido fixado para o cardeal quinze borlas de cada lado do chapéu eclesiástico79. O mesmo se passou mais tarde com os patriarcas, arcebispos e bispos.

Para os bispos e arcebispos foi atribuída a cor verde, uma inovação da heráldica eclesiástica espanhola levada para o resto da Europa. Em Portugal, os chapéus dos prelados eram no seu interior de negro e forradas a verde80, com as borlas da mesma cor81. Por vezes o esmalte adotado no chapéu heráldico não era equivalente ao originalmente usado pelos prelados, o que não constituía problema visto a armaria não representar literalmente os verdadeiros esmaltes dos objetos das peças heráldicas – embora a heráldica almeje a reprodução fiel do verdadeiro realismo destes objetos82.

A heráldica introduziu elementos simbólicos que distinguem graus na nobreza laica, algo que o clero veio também a adotar. O uso dos chapéus eclesiásticos indicam a distinção de hierarquias na igreja e, embora as cores e o número de borlas usados na heráldica não sejam claramente os corretos devemos admitir que estes nos oferecem os benefícios desejados para a diferenciação das dignidades da igreja.

76 Ibidem, p. 79. 77Ibidem, p. 79. 78 Ibidem, p. 79. 79

HEIM, Bruno Bernard – Cotumes et droit Héraldiques de l’église, p. 80.

80 NORTON, Manuel Artur – A heráldica em Portugal: raízes, simbologia e expressões histórico-culturais,

p. 699.

81

HEIM, Bruno Bernard – Cotumes et droit Héraldiques de l’église, p. 80.

82

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Provenientes de famílias nobres, os prelados mantinham, por vezes, grandes títulos nobiliárquicos, adquiridos por sangue e, ou, obtidos ainda antes de se dedicarem à carreira eclesiástica. Apesar de muitos renunciarem esses títulos, a Igreja não proibia o titular de continuar a usufruir dos emblemas nas suas armas, como ornamentos exteriores. O mesmo se permitia em caso de serem Condes ou Barões83. No entanto, o uso de emblemas como a coroa, que nomeassem a nobreza hereditária não podia ser usado por membros do clero. Contudo, pela sua organização, o clero tem uma hierarquia especial, como já podemos constatar, e os seus próprios símbolos heráldicos – o chapéu eclesiásticos e os cordões com um respetivo número de borlas que, atribui a dignidade ao bispo84.

Uma das coroas mais usadas pelos prelados terá sido sem dúvida a coroa de Conde e de Grandes do Reino – ou seja, os que ocuparam lugares no reino português de maior importância, como governadores do reino. Apresenta-se em forma de diadema

com pedraria, de dezasseis hastes salientes, terminando cada um em uma pérola grossa e todas eguaes85.

Segundo as regras heráldicas, o bispo podia desenhar as suas próprias armas, mediante a sua vontade, podendo misturar elementos relacionados com a sua prática religiosa, de família ou devoção pessoal86. Porém, a forma como as armas eclesiásticas são montadas denunciam erros de regulamentação heráldicos, resultando num agrupamento de elementos esteticamente colocados sem harmonia e de leitura difícil. Em Portugal, conhecem-se poucos casos de escudos elaborados sem recorrer às armas de família, excetuando o caso das ordens eclesiásticas que construíam os escudos com os símbolos referentes à sua ordem religiosa. Contudo, os mesmos não deixam de sofrer alterações consoante a época em que são realizadas.

83

Aquando a ocupação da cadeira prelatícia de Coimbra era atribuído aos prelados o título de Conde de Arganil e de Coja. SILVA, Ana Margarida Dias da; BANDEIRA, Ana Maria; MENDES, Marta Gama - Mitra Episcopal de Coimbra: descrição arquivística e inventário do fundo documental. Coimbra: Boletim do Arquivo da Universidade de Coimbra, Vol. XXIII e XXIV, 2007, p. 115-166.

84

HEIM, Bruno Bernard – Cotumes et droit Héraldiques de l’église, p. 91.

85 RIBEIRO, J. A. Corrêa Leite – Tratado de Armaria. Technica e regras do brasão d’armas. Lisboa:

Empreza da Historia de Portugal, 1907, p. 126.

86

D. Manuel de Noronha, bispo de Lamego, juntou ao seu escudo de família uma estrela, símbolo da sua devoção à Virgem Maria.

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Por outro lado, não podemos deixar de mencionar o bordo do escudo, apesar de ser irrelevante na maior parte das vezes, pela forma simples que apresenta. De acordo com Michel Pastoureau, les armoiries se composent de deux éléments: des figures et del couleurs, que prennent place dans unécu delimite par un pèrimètre dont la forme est indifférente87. Na Idade Média, com o surgimento da heráldica, os bordos do escudo apresentavam-se com uma forma de ponta em ogiva, de cores e metais primários e elementos repetidos como o leão. À medida que avançamos na cronologia o bordo do escudo modifica-se, assim como os suportes onde eram colocados, – igrejas, túmulos, objetos do quotidiano – de acordo com a estética dos movimentos artísticos e dos cenários social, económico ou político.

87“Os armoriais compõem-se em dois elementos: as figuras e as cores, que ocupam um escudo

delimitado por um perímetro cuja forma é indiferente”. PASTOUREAU, Michel – Figures de l’héraldique, p. 44.

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2. A Diocese de Lamego nos séculos XVI a XVII

No presente ponto iremos contextualizar e sistematizar algumas informações, de caráter geral, sobre a diocese no período dos episcopados que nos propusemos estudar, abordando questões como a extensão, população e número de paróquias, distritos eclesiásticos e principais dignidades eclesiásticas.

Apesar de haver números divergentes88 quanto ao movimento demográfico em Lamego na 1ª metade do século XVI sabe-se que esta diocese compreendia um total de 14 vilas, 47 concelhos e 5 honras89.

Lugar da cátedra o termo de Lamego encontrava-se limitado pelo rio Douro e

pelas vilas de Sande, Armamar, S. Martinho de Mouros, Britiande e Maqueija90.No

tocante à cidade em 1527 a população desta concentrava-se no perímetro em torno do castelo (burgo) e no Couto episcopal da da Sé. Assim, à época referida, contavam-se 1411 moradores, estando 58 dentro dos muros do castelo e 105 nos arrabaldes da Sé e, ainda 309 nos bairros da Seara. No mesmo ano, contabilizavam-se 25580 moradores dentro e fora de Lamego, com 2360 nos bairros da do burgo. Como refere Anísio Saraiva, no século

XVI, Lamego revelava ser uma cidade numerosa em termos populacionais, tendo Viseu ou Guarda menor número de fogos e habitantes91 - o que testemunha a importância da cidade em contexto regional e nacional.

Em pleno século XVII, regista-se uma queda demográfica registando-se, na urbe, 800 moradores no ano de 1621 e cerca de 1000 entre os anos de 1625 e 166892.

O número de paróquias da diocese de Lamego foi variando entre os séculos XVI e XVII. Na cidade registam-se, assim, as paróquias da Sé e de Almacave e fora dela, no

88 COSTA, Manuel Gonçalves da – História do bispado e cidade de Lamego. Renascimento.

Lamego:[s.e.], Vol. III, 1982, p. 355.

89

Ibidem, p. 355.

90Ibidem, p. 355. 91

SARAIVA, Anísio Miguel de Sousa (coord.) – Espaço, Poder e Memória: A Catedral de Lamego, sécs. XII a XX. Lisboa: Centro de Estudos de História Religiosa, 2013, p. 107.

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Referências

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