• Nenhum resultado encontrado

MEDCEL CARDIOLOGIA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "MEDCEL CARDIOLOGIA"

Copied!
158
0
0

Texto

(1)

CAPÍTULO

1

1

Anatomia cardíaca básica

José Paulo Ladeira / Victor Ales Rodrigues

1. Introdução

Para iniciar o livro de Cardiologia, é importante relem-brar alguns pontos básicos da anatomia cardíaca. A maioria dos assuntos abordados neste capítulo provavelmente já faz parte do conhecimento do aluno, porém alguns tópicos serão destacados.

2. Coração

A - Visão geral

O coração é uma bomba dupla, de sucção e pressão, au-toajustável, cujas porções trabalham conjuntamente para impulsionar o sangue para todos os órgãos e tecidos. O lado direito do coração recebe o sangue venoso através da veia cava superior e veia cava inferior, bombeando-o, pos-teriormente, através do tronco pulmonar, fazendo-o ser oxi-genado nos pulmões. O lado esquerdo do coração recebe sangue arterial dos pulmões através das veias pulmonares, bombeando-o, posteriormente, para a aorta, de onde será distribuído a todo o corpo.

São 4 as câmaras do coração: Átrio Direito (AD), Átrio Es-querdo (AE), Ventrículo Direito (VD) e Ventrículo EsEs-querdo (VE). Os átrios recebem e bombeiam o sangue ao ventrícu-lo. O sincronismo de bombeamento das 2 bombas atrioven-triculares cardíacas (câmaras direita e esquerda) consti tui o chamado ciclo cardíaco. Tal ciclo inicia-se com a diástole, que é o período em que há o relaxamento e enchimento ventricular, terminando com a sístole, que é o período de contração muscular e esvaziamento dos ventrículos.

Os 2 sons fi siologicamente auscultados no coração são produzidos pelo estalido de fechamento das válvulas que normalmente impedem o refl uxo de sangue durante as

con-trações cardíacas. O 1º som dá-se com o fechamento das válvulas atrioventriculares (mitral e tricúspide), gerando um som grave, denominado de 1ª bulha cardíaca (B1). O 2º som é gerado com o fechamento das válvulas semilunares (pul-monar e aórti ca), denominado de 2ª bulha cardíaca (B2).

B - Localização anatômica

O coração está localizado no mediasti no, que é a cavi-dade central do tórax. Estende-se de forma oblíqua da 2ª costela até o 5º espaço intercostal. Situa-se acima do dia-fragma, anterior a coluna e posterior ao esterno. Está ro-deado parcialmente pelos pulmões. Dois terços do coração estão à esquerda do eixo mediano e o outro terço à direita. O vérti ce cardíaco encontra-se entre a 5ª e a 6ª costela, lo-cal onde se pode fazer a palpação do “choque da ponta” ou

ictus cordis.

C - Morfologia

O coração pode ser descrito como tendo uma base, ápi-ce, 4 faces e ainda 4 margens:

a) Ápice do coração

Situa-se no 5º espaço intercostal esquerdo, a aproxi-madamente 9cm do plano mediano; imóvel durante o ciclo cardíaco e o local de máximo som de fechamento da valva mitral.

b) Base do coração

Voltada posteriormente em direção aos corpos das vér-tebras T6-T9, separada delas pelo pericárdio, seio pericár-dico oblíquo e pela aorta; recebe as veias pulmonares nos lados direito e esquerdo de sua porção atrial esquerda e as Veias Cavas Superior (VCS) e Inferior (VCI) nas extremidades superior e inferior de sua porção atrial direita.

(2)

c) Faces do coração Tabela 1 - Quatro faces do coração

Face esternocostal

(anterior) Formada principalmente pelo VD. Face diafragmáti ca

(inferior) Formada principalmente pelo VE e parte do VD. Face pulmonar

direita Formada principalmente pelo AD. Face pulmonar

esquerda

Formada principalmente pelo VE; forma a impressão cardíaca do pulmão esquerdo.

d) Margens do coração Tabela 2 - Quatro margens do coração

Margem

direita Ligeiramente convexa e formada pelo AD, esten-dendo-se entre VCS e a VCI. Margem

inferior Oblíqua, quase verti cal, formada principalmente pelo ventrículo esquerdo. Margem

esquerda

Quase horizontal e formada principalmente pelo VE e por pequena parte da aurícula esquerda.

Margem superior

Formada pelos átrios e aurículas direitos e es-querdos em vista anterior; a aorta ascendente e o tronco pulmonar emergem dessa margem e a VCS entra no seu lado direito. Posterior à aorta e ao tronco pulmonar e anterior à veia cava supe-rior, essa margem forma o limite inferior ao seio transverso do pericárdio.

3. Revesti mento e parede cardíaca

Há uma membrana fi brosserosa que envolve todo o co-ração e o início de seus grandes vasos chamada pericárdio (Figura 1). Esta tem a característi ca de ser semelhante a um saco fechado contendo o coração. É formado por 2 cama-das: a externa, chamada pericárdio fi broso, mais resisten-te, consti tuída por tecido conjunti vo denso e que tem por função fi xar o coração ao diafragma e grandes vasos; e uma camada interna, chamada pericárdio seroso, mais delicada e que, por sua vez, possui 2 lâminas – lâmina parietal, que reveste internamente o pericárdio fi broso, e a lâmina vis-ceral, que recobre o coração e os grandes vasos. Entre as 2 lâminas, existe a cavidade pericárdica, que contém certa quanti dade de líquido e que permite a movimentação do coração dentro do tórax.

Já a parede do coração é formada por 3 camadas (Fi-gura 2):

Tabela 3 - Formação da parede cardíaca

Endocárdio Camada interna, fi na espessura (endotélio e tecido conjunti vo subendotelial), atuando como revesti -mento ínti mo do coração, inclusive de suas valvas. Miocárdio Camada intermediária, helicoidal e espessa, forma-da por músculo cardíaco. Epicárdio Camada externa, fi na espessura (mesotélio) e for-mada pela lâmina visceral do pericárdio seroso.

Figura 1 - Pericárdio

Figura 2 - Pericárdio e parede cardíaca

A - Câmaras cardíacas

São 4 as câmaras cardíacas (Figura 3), sendo 2 átrios e 2 ventrículos, separados por um septo e por 2 valvas atrio-ventriculares. De forma geral o sangue chega ao coração nos átrios (do pulmão através do AE e do corpo através do átrio direito) e é ejetado do coração pelos ventrículos (para o pulmão pelo VD e para o restante do corpo pelo ventrícu-lo esquerdo).

a) Átrio direito

Recebe o sangue venoso da VCS, da VCI e do seio co-ronário. A aurícula direita é uma bolsa muscular cônica que se projeta como uma câmara adicional, aumentando a capacidade do átrio, enquanto se superpõe à aorta as-cendente. No AD há ainda 2 estruturas muito importantes que serão tratadas mais a frente, são elas o nó sinusal e o nodo atrioventricular (AV). Seu interior é formado por uma parede posterior lisa e fi na e uma parede anterior muscular rugosa, formada pelos músculos pectí neos, que auxiliam na contração atrial.

(3)

A N AT O M I A C A R D Í AC A B Á S I C A

CARDIOL

OGIA

b) Ventrículo direito

É responsável pelo bombeamento do sangue na circu-lação pulmonar. Ele recebe o sangue venoso do AD, que repassa ao ventrículo através da valva tricúspide. Deságua no tronco da artéria pulmonar através da valva pulmonar. Possui em seu interior elevações musculares chamadas tra-béculas cárneas. Os chamados músculos papilares come-çam a contrair antes da contração ventricular, tensionando estruturas chamadas cordas tendíneas. Esse mecanismo é o responsável pela abertura e fechamento das válvulas.

c) Átrio esquerdo

Recebe o sangue arterial, proveniente das veias pulmona-res direitas e esquerdas. Deságua no VE, separado pela valva

mitral. Seu interior possui uma parte maior com paredes lisas e uma aurícula muscular menor, contendo músculos pectí neos. Sua parede é também um pouco mais espessa que a do AD.

d) Ventrículo esquerdo

É responsável pelo bombeamento do sangue ao corpo. Recebe o sangue arterial do AE, que passa ao VE através da valva mitral. Deságua na aorta através da valva aórti ca. O VE forma o ápice do coração, suas paredes são até 3 vezes mais espessas que a do VD, as trabéculas cárneas são mais fi nas e numerosas e os músculos papilares são maiores que do VD. Vale lembrar que a pressão arterial é muito maior na circulação sistêmica do que na circulação pulmonar, por isso o VE trabalha mais do que o VD.

Figura 3 - Estruturas cardíacas

B - Valvas cardíacas

As valvas são formadas basicamente de tecido conjun-ti vo e têm a função de garanconjun-ti r o senconjun-ti do unidirecional do sangue, ou seja, elas impedem o refl uxo sanguíneo nas 4 cavidades cardíacas. As valvas são formadas por válvulas, espécie de folhetos das valvas, que variam de acordo com a localização (Figuras 4, 5 e 6).

a) Valva mitral

Possui 2 válvulas e permite o fl uxo sanguíneo entre o AE e o VE.

b) Valva tricúspide

Possui 3 válvulas e permite o fl uxo sanguíneo entre o AD e o VD. Essas 2 valvas (mitral e tricúspide) são fi xadas

a cordas tendíneas proveniente de músculos papilares. Es-sas estruturas promovem sustentação, permiti ndo que as válvulas resistam a maiores pressões, também impedindo o prolapso.

c) Valva aórti ca

Possui 3 válvulas e permite o fl uxo sanguíneo de saída do VE em direção à aorta.

d) Valva pulmonar

Possui 3 válvulas e permite o fluxo sanguíneo de saída do VD em direção à artéria pulmonar. Ao contrário das outras 2, as valvas aórtica e pulmonar não possuem cor-das tendíneas para sustentá-las. São menores e a pres-são sobre elas é menor que a metade da exercida nas valvas AVs.

(4)

Figura 5 - Focos de ausculta cardíaca Figura 4 - Valvas cardíacas

Tabela 4 - As valvas cardíacas e o exame clínico

Focos de ausculta Valva cardíaca Localização Observações Foco mitral Valva mitral

5º espaço intercostal esquerdo, na linha hemiclavivular, correspondendo ao

ictus cordis ou ponta do coração.

Área em que são melhor percebidos os fenô-menos estetoacústi cos como bulhas, estalidos e sopros relacionados a valva mitral estenóti ca ou insufi ciente.

Foco tricúspide Valva tricúspide Base do apêndice xifoide, ligeiramente à esquerda.

Algumas vezes os acometi mentos da Valva Tricúspide são melhor ouvidos no foco mitral, porém a inspiração profunda intensifi ca o sopro se ele for de origem tricúspide.

Foco aórti co Valva aórti ca 2º espaço intercostal direito, junto ao esterno.

Local de maior intensidade de ausculta de B2, juntamente com o foco pulmonar.

Foco pulmonar Valva pulmonar 2º espaço intercostal esquerdo, junto ao esterno.

Foco onde se têm condições ideais para análise de desdobramentos, patológico ou fi siológico, da 2ª bulha pulmonar.

Foco aórti co acessório Valva aórti ca Entre o 3º e o 4º espaço intercostal esquerdo, próximo ao esterno.

Melhor local para perceber fenômenos acústi -cos de origem aórti ca.

(5)

A N AT O M I A C A R D Í AC A B Á S I C A

CARDIOL

OGIA

C - Coronárias

As artérias coronárias são os primeiros ramos da aor-ta. Elas suprem o miocárdio e o epicárdio. As artérias co-ronárias direita e esquerda originam-se dos seios da aorta correspondentes na região proximal da parte ascendente da aorta e seguem por lados opostos do tronco pulmonar (Figura 7).

a) Artéria Coronária Direita (ACD)

Origina-se do seio direito da aorta, seguindo no sulco coronário. Próximo de sua origem, emite o ramo do nó si-noatrial (supre o nó SA), e depois emite o ramo do nó atrio-ventricular (supre o nó AV). Passando para parte posterior, dá origem ao grande ramo interventricular posterior, que, por sua vez, envia os chamados ramos interventriculares septais.

b) Artéria Coronária Esquerda (ACE)

Origina-se do seio esquerdo da aorta, seguindo no sulco coronário. Na extremidade superior do sulco IV anterior, a ACE divide-se em 2 ramos, o ramo anterior e o ramo cir-cunfl exo. O ramo IV anterior segue até o ápice do coração. Em muitas pessoas o ramo IV anterior dá origem ao ramo diagonal. A artéria circunfl exa origina a artéria marginal es-querda.

Figura 7 - Artérias coronárias

4. Sistema elétrico

O sistema de condução do coração é consti tuído basi-camente de fi bras musculares especializadas para a trans-missão de impulsos elétricos. É representado pelo nó sino-atrial, feixes de condução sino-atrial, nó atrioventricular, feixe atrioventricular com seus ramos e fi bras de Purkinje (Figura 8). Os estí mulos são gerados ritmicamente, resultando na contração coordenada dos átrios e ventrículos.

O nó sinoatrial localiza-se na parte superior do AD, no contorno anterolateral de junção da VCS. Os estí mulos

ge-rados por ele se propagam pelos feixes de condução atrial (anterior, médio e posterior) até o nó atrioventricular, que os retransmitem. O nó AV está situado abaixo do endo-cárdio atrial direito, na parte do septo interatrial imedia-tamente acima do ósti o do seio coronário. O feixe atrio-ventricular dirige-se para a parte membranácea do septo interventricular e em seguida se divide em ramos direito e esquerdo, propagando-se até as paredes dos respecti vos ventrículos.

A frequência de geração e a velocidade de condução são aumentadas pelo sistema simpáti co e inibidas pelo sistema parassimpáti co. Isso acontece para atender as demandas ou conservar energia.

Os nós SA e AV são supridos pelos ramos nodais da ACD, o que justi fi ca a maior incidência de bloqueios da condução AV nas síndromes coronarianas agudas de CD; já os feixes são supridos pelos ramos septais da ACE, o que justi fi ca a presença frequente de bloqueios de ramos agu-dos nas síndromes coronarianas agudas desta artéria. A oclusão de qualquer artéria, com consequente infarto do tecido nodal, pode exigir a inserção de um marca-passo cardíaco arti fi cial.

Figura 8 - Sistema elétrico do coração

5. Grandes vasos

Como grandes vasos, apresentados na Figura 9, pode-mos citar:

-

Aorta;

-

Tronco braquiocefálico;

-

Artéria caróti da comum esquerda;

-

Artéria subclávia esquerda;

-

Porção distal do tronco pulmonar;

-

Veias braquiocefálica direita;

-

Veias braquiocefálica esquerda;

-

Parte da VCS.

(6)
(7)

CAPÍTULO

2

2

Dislipidemia e fatores de risco

para doença cardiovascular

José Paulo Ladeira / Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Nogueira Furtado

1. Introdução

A doença cardiovascular (DCV) é a principal causa de morte entre adultos homens e mulheres, com mais de 250.000 óbitos no Brasil em 2002. Aproximadamente, 50% dos homens e 64% das mulheres não apresentavam sinto-mas prévios de doença até o aparecimento de evento car-diovascular. Por isso, prevenção e tratamento dos fatores predisponentes da doença ateroscleróti ca são de grande importância. Entre os fatores predisponentes, as alterações lipídicas representam um dos mais importantes para o de-senvolvimento e progressão da doença ateroscleróti ca nas sociedades industrializadas, e o seu tratamento objeti va a diminuição do risco cardiovascular.

2. Lípides e lipoproteínas

A arteriosclerose pode ser defi nida como uma afecção de artérias de grande e médio calibre, caracterizada pela presença de lesões com aspectos de placas (ateromas). Ar-teriosclerose é essa afecção nas arteríolas, sendo a lesão tí pica da hipertensão arterial. Uma das primeiras lesões associadas à dislipidemia é a placa gordurosa, formação plana e amarelada na parede dos vasos, sem repercussão clínica. As placas podem evoluir para a formação das placas fi brolipídicas, que são formações elevadas na superfí cie da camada ínti ma da artéria, estáveis ou instáveis. Podem ser associadas a complicações como fi ssuras, calcifi cação, ne-crose, trombose e rotura.

Os principais lípides de importância clínica são Ácidos Graxos (AG), triglicérides (TG), fosfolípides (FL) e Colesterol (C). Merecem destaque os TG, que têm o papel fi siológi-co de reserva de energia, e o C, que é um siológi-componente da

membrana celular e parti cipa da síntese de ácidos biliares e de hormônios esteroides.

As lipoproteínas transportam os lípides do local de sín-tese ao local de uti lização, apresentando as seguintes fun-ções:

-

Formação de membranas celulares;

-

Síntese de ácidos biliares;

-

Substrato para esteroidogênese;

-

Precursor da formação de vitamina D;

-

Produção e armazenamento de energia.

Como os lípides são moléculas hidrofóbicas, para se-rem transportados no plasma, associam-se a determinadas proteínas (apoproteínas), formando complexos lipídicos solúveis. Esses complexos são divididos de acordo com sua densidade, característi ca conferida pela proporção entre quanti dade de apoproteínas e de TG, em:

-

Quilomícrons (Qm);

-

VLDL (Very Low Density Lipoprotein);

-

IDL (Intermediate Density Lipoprotein);

-

LDL (Low Density Lipoprotein);

-

HDL (High Density Lipoprotein).

A dosagem de cada um destes componentes é possível para uti lização clínica, mas é frequente a substi tuição des-tas dosagens pelo cálculo indireto de alguns de seus com-ponentes, conforme a fórmula de Friedwald a seguir:

Para valores de TG menores que 400mg/dL LDL-c = CT - HDL-c - TG/5

Em pacientes com hipertrigliceridemia (TG >400mg/ dL), hepatopati a colestáti ca crônica, diabetes mellitus ou

(8)

síndrome nefróti ca, a equação é imprecisa. Nestes casos, o valor do LDL-C pode ser obti do por dosagem direta.

Devido ao diabetes mellitus e à síndrome metabólica, doenças muito frequentes na população e que causam dislipidemia secundária, os ti pos mais comuns de dislipi-demias são:

-

Hipercolesterolemia isolada ou em associação a hiper-trigliceridemia;

-

Hipertrigliceridemia com HDL baixo.

A classifi cação de Fredrickson, apesar de ser menos uti -lizada atualmente, é importante para entender os padrões das dislipidemias familiares (Tabela 1). Também é importan-te saber que a avaliação semiológica pode sugerir o diag-nósti co em algumas dislipidemias em que é característi ca a aparência do plasma.

Tabela 1 - Dislipidemias familiares: classifi cação de Fredrickson, Lees e Lewis

Tipo Lipoproteínas plasmáti cas pre-dominantemente elevadas

Lipídio plasmáti co predomi-nantemente elevado

Aparência do plasma

após refrigeração Exemplo

I Qm TG Sobrenadante cremoso Defi ciência de LPL

IIa LDL C Claro Hiperlipidemia familiar

IIb LDL e VLDL C e TG Geralmente claro Hiperlipidemia familiar combi-nada

III Remanescentes C e TG Turvo Disbetalipoproteinemia

IV VLDL TG Turvo Hipertrigliceridemia familiar

V Qm e VLDL C e TG Sobrenadante cremoso

e resto turvo Defi ciência de apo-CII

Uma discussão mais aprofundada das característi cas das diferentes síndromes monogênicas que causam dislipidemia não é o objeti vo deste capítulo, mas a Tabela 2 apresenta as principais causas genéti cas dessa alteração.

Tabela 2 - Principais causas genéti cas de dislipidemia

Doença Gene mutante Herança Frequência esti mada na população Padrão de lipoproteínas Defi ciência familiar

de LPL LPL Autossômica recessiva 1/106 I, V

Defi ciência familiar de

apo-CII Apo-CII Autossômica recessiva 1/106 I, V

Hipercolesterolemia familiar Receptor de LDL Autossômica dominante 1/500 (heterozigoto) 1/106 (homozigoto) IIa Defeito familiar de Apo

B-100 Apo-B

Autossômica

dominante 1/1.000 IIa

Hiperlipoproteinemia

familiar ti po III Apo-E Autossômica recessiva 1/10.000 III Hiperlipidemia familiar combinada Desconhecida Autossômica dominante 1/100 IIa, IIb, IV (raramente V) Hipertrigliceridemia familiar Desconhecida Autossômica

dominante Incerta IV (raramente V)

Manifestações tí picas

Xantomas Pancreati tes Doença vascular prematura

Erupti vos +

-Erupti vos (raro) +

-Tendinosos - +

Xantelasma - +

Arco córneo lipídico - +

Palmar - +

(9)

D I S L I P I D E M I A E FAT O R E S D E R I S C O P A RA D O E N Ç A C A R D I OV A S C U L A R

CARDIOL

OGIA

3. Metabolismo de lipoproteínas e colesterol

O metabolismo das lipoproteínas pode ser dividido em 2 vias: exógena e endógena. A via exógena se inicia com a absorção intesti nal dos AG e do C da dieta. Dentro das células intesti nais, os AG são combinados com o glicerol, formando os TG, e o C é esterifi cado pela aceti lcoenzima A. No intracelular, os TG e o C são agregados, formando os quilomícrons. Ao saírem das células intesti nais, estes adquirem apoliproteínas (componentes proteicos dos qui-lomícrons que funcionam como cofatores para enzimas e ligandinas para receptores) como a B-48, CII e E. A apo B-48 permite a ligação entre os lípides e os quilomícrons, mas não se liga ao receptor LDL, prevenindo o clearance precoce de quilomícrons da circulação (Figura 1).

A apo-CII é um cofator para liproteínas que geram quilo-mícrons progressivamente menores por hidrolisar o núcleo de TG liberando os AG. Quando liberados, os 3 AG são uti -lizados como fonte de energia, converti dos novamente em TG ou estocados no tecido adiposo. O produto fi nal dos

qui-lomícrons é chamado de quilomícron remanescente, que é reti rado da circulação por receptores hepáti cos. Os quilomí-crons remanescentes contêm uma pequena quanti dade de lípides que são envelopados pelos componentes restantes de superfí cie. Esses consti tuintes de superfí cie são transferidos dos quilomícrons remanescentes para a formação do HDL.

A via endógena se inicia com a síntese hepáti ca de VLDL, formados por 60% de TG e 20% de ésteres de C. A transfe-rência proteica microssomal de TG é essencial para o trans-porte do conjunto de TG para o retí culo endoplasmáti co, onde ocorrerão a montagem do VLDL e a secreção de apo B-100 no fí gado. O núcleo de TG do VLDL é hidrolisado pela lípase lipoproteica. Durante a lipólise, o núcleo do VLDL é reduzido, gerando o VLDL remanescente. Os componentes de superfí cie do VLDL remanescente como FL, C não esteri-fi cado e apoproteínas são transferidos para o HDL. Os VLDL remanescentes podem ser eliminados da circulação ou re-modelados para formar as partí culas de LDL.

Figura 1 - Metabolismo de lipoproteínas e colesterol

4. Característi cas e causas das dislipidemias

Algumas característi cas dependem do ti po de dislipi-demia que o paciente apresenta. Pacientes com aumen-to de LDL-colesterol podem apresentar xantelasma e

xantomas tendinosos; já os xantomas erupti vos são mais comuns nas grandes hipertrigliceridemias, enquanto a li-pemia reti niana é mais frequente em pacientes com hiper-quilomicronemia. A Tabela 3 sumariza as principais causas de dislipidemia.

(10)

Tabela 3 - Principais causas de dislipidemia

Alteração Dislipidemias primárias Dislipidemias secundárias

Elevação de C

- Hipercolesterolemia fami-liar;

- Defeito familiar apo-B100; - Hipercolesterolemia poli-gênica. - Hipoti reoidismo; - Síndrome nefró-ti ca. Elevação de C e TG - Hiperlipidemia familiar com binada; - Disbetalipoproteinemia. - Hipoti reoidismo; - Síndrome nefró-ti ca; - Diabetes mellitus. Elevação de TG - Hipertrigliceridemia fami-liar; - Defi ciência de LPL; - Defi ciência de Apo-CII; - Hipertrigliceridemia

espo-rádica.

- Diabetes mellitus; - Hiperlipidemia

al-coólica.

As causas de dislipidemia secundária são frequente-mente encontradas na população e podem ser divididas em endócrinas e não endócrinas.

A - Endócrinas

-

Diabetes mellitus: hipertrigliceridemia ou

hiperlipide-mia mista. Há aumento da produção de VLDL e redu-ção do catabolismo de VLDL;

-

Hipoti reoidismo: hipercolesterolemia. Há diminuição

da depuração do LDL. As anormalidades no C costu-mam reverter após a correção do hipoti reoidismo;

-

Terapia com estrogênio: hipertrigliceridemia. Há

au-mento da produção de VLDL; as mulheres pós-meno-pausa podem reduzir o LDL em 20 a 25%. No entanto, não devem ser uti lizados exclusivamente com essa indicação devido ao discreto aumento do risco cardio-vascular com o uso prolongado;

-

Terapia com glicocorti coide: hipercolesterolemia e/

ou hipertrigliceridemia. Há aumento da produção de VLDL e conversão a LDL;

-

Hipopituitarismo: hipercolesterolemia e

hipertriglice-ridemia. Há aumento da produção de VLDL e conver-são a LDL;

-

Acromegalia: hipertrigliceridemia. Há aumento da

produção de VLDL;

-

Anorexia nervosa: hipercolesterolemia. Há diminuição

da excreção biliar de C e ácidos biliares;

-

Lipodistrofi a: hipertrigliceridemia. Há aumento da

produção de VLDL.

B - Não endócrinas

-

Álcool: hipertrigliceridemia. Há aumento da produção

de VLDL;

-

Uremia: hipertrigliceridemia. Há diminuição da

depu-ração de VLDL;

-

Obstrução biliar ou colestase: elevação de

lipoprote-ína X. Extravasamento do C biliar e FL na circulação;

-

Hepati te: hipertrigliceridemia. Há diminuição da LCAT

(Lecithin-Cholesterol-Acyl-Transferase);

-

Lúpus eritematoso sistêmico: hipertrigliceridemia.

An-ti corpos diminuem a aAn-ti vidade da lipase lipoproteica;

-

Gamopati a monoclonal: hipercolesterolemia ou

hi-pertrigliceridemia. Anti corpos ligam lipoproteínas e interferem no catabolismo;

-

Outras causas secundárias: incluem porfi ria, hepati te

e diversos medicamentos (diuréti cos, beta-bloqueado-res, corti costeroides, ciclosporina, entre outros).

5. Rastreamento para dislipidemia

Não há evidências diretas demonstrando que a dosa-gem roti neira de lípides consiga diminuir eventos cardiovas-culares, mas evidências indiretas sugerem que esses even-tos podem diminuir com rastreamento em homens a parti r dos 35 anos e mulheres a parti r dos 45 anos.

O objeti vo primário no manejo dos pacientes com dislipi-demia é o controle do LDL-colesterol. Após ati ngi-lo, a meta é, idealmente, um HDL-colesterol maior que 40mg/dL para os homens e 50mg/dL para as mulheres e para pacientes dia-béti cos. Os TG são o 3º objeti vo, porém, em pacientes com valores de TG acima de 500mg/dL, torna-se prioritário o seu controle pelo risco de pancreati te secundária à hipertrigli-ceridemia. Não é possível calcular os níveis de partí culas de C com a fórmula de Friedewald quando os níveis de TG são maiores que 400mg/dL. Nesses pacientes, pode-se uti lizar o C não HDL como indicador e meta terapêuti ca.

A hepatopati a colestáti ca crônica, o diabetes e a síndro-me nefróti ca também podem tornar a fórmula imprecisa. A IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemia publicada em 2007 recomenda a dosagem direta de LDL-C nesta população.

O NCEP (Nati onal Cholesterol Educati on Program) re-comenda a dosagem de C, HDL, LDL e TG a pacientes com menos de 20 anos, repeti ndo dosagem a cada 5 anos, em caso de presença de valores normais. Tal recomendação se justi fi ca para o rastreamento das causas monogênicas de dislipidemia, que podem causar eventos adversos em pa-cientes com menos de 20 anos. O ACP (American College

of Physicians) considera raridade esses casos, com conduta

mais conservadora, e recomenda o rastreamento a parti r de 35 anos.

6. Risco cardiovascular e alvos do

trata-mento

Para determinar os níveis lipídicos desejados, devem-se seguir estes passos:

(11)

D I S L I P I D E M I A E FAT O R E S D E R I S C O P A RA D O E N Ç A C A R D I OV A S C U L A R

CARDIOL

OGIA

-

1º passo:

Avaliar presença de doença ateroscleróti ca signifi cati va ou seus equivalentes:

• Doença arterial coronariana conhecida manifesta; • Doença arterial cerebrovascular;

• Doença aneurismáti ca ou estenóti ca da aorta abdo-minal ou de seus ramos;

• Doença arterial periférica; • Doença arterial carotí dea; • Diabetes mellitus ti po 1 ou 2.

Pacientes com uma das característi cas anteriores já de-vem ser classifi cados como de alto risco para apresentar novo evento cardiovascular em 10 anos. Se o paciente se enquadra nesse perfi l, deve-se ir direto ao 4º passo.

-

2º passo:

Avaliar o risco cardiovascular. Entre os indivíduos não classifi cados como de alto risco no passo nº 1, devese esti -mar o risco cardiovascular individual por meio dos fatores de risco para doença cardiovascular. Assim, são considerados:

• Tabagismo;

• HAS;

• Baixo HDL-c (<40);

• História familiar de DCV em homem <55 anos ou em mulher <65 anos;

• Idade (homem ≥45 anos, mulher ≥55 anos).

Deve-se acrescentar, também, que quando o HDL-c é maior que 60mg/dL, recomenda-se reti rar um dos fatores de risco. Dessa forma, o risco individual de eventos cardio-vasculares em 10 anos pode ser dividido em:

-

Baixo risco (<10%): no máximo, 1 fator de risco;

-

Risco moderado (de 10 a 20%): 2 ou mais fatores de

risco;

-

Alto risco (>20%): diabetes mellitus, DCV prévia ou

equivalente de risco cardiovascular.

Equivalentes de risco cardiovascular incluem manifesta-ções de formas não coronarianas de doença ateroscleróti ca (doença arterial periférica, aneurisma de aorta abdominal e doença arterial carotí dea).

A IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemia recomenda o uso do escore de Framingham para esta estrati fi cação (Ta-bela 4).

Tabela 4 - Adaptada da IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemia

Homens Mulheres

Idade Pontos Idade Pontos

20 a 34 -9 20 a 34 -7 35 a 39 -4 35 a 39 -3 40 a 44 0 40 a 44 0 45 a 49 3 45 a 49 3 50 a 54 6 50 a 54 6 55 a 59 8 55 a 59 8 60 a 64 10 60 a 64 10 65 a 69 11 65 a 69 12 70 a 74 12 70 a 74 14 75 a 79 13 75 a 79 16

Colesterol Idade Colesterol Idade

Total, mg/dL 20 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 70 a 79 mg/dLTotal, 20 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 70 a 79 <160 0 0 0 0 0 <160 0 0 0 0 0 160 a 199 4 3 2 1 0 160 a 199 4 3 2 1 1 200 a 239 7 5 3 1 0 200 a 239 0 6 4 2 1 240 a 279 9 6 4 2 1 240 a 279 11 8 5 3 2 ≥280 11 8 5 3 1 ≥280 13 10 7 4 2

Fumo Idade Fumo Idade

20 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 70 a 79 20 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 70 a 79

Não 0 0 0 0 0 Não 0 0 0 0 0

(12)

HDL-colesterol (mg/dL) Pontos HDL-colesterol (mg/dL) Pontos

≥60 -1 ≥60 -1

50 a 59 0 50 a 59 0

40 a 49 1 40 a 49 1

<40 2 <40 2

PA (sistólica, mmHg) Não tratada Tratada PA (sistólica, mmHg) Não tratada Tratada

<120 0 0 <120 0 0

120 a 129 0 1 120 a 129 1 3

130 a 139 1 2 130 a 139 2 4

140 a 159 1 2 140 a 159 3 5

≥160 2 3 ≥160 4 6

Escores de Risco de Framingham (ERF) para cálculo do risco absoluto de infarto e morte em 10 anos para homens e mulheres (fase 2) – conti nuação Total de pontos Risco absoluto em 10 anos (%) Total de pontos Risco absoluto em 10 anos (%)

<0 <1 <9 <1 0 1 9 1 1 1 10 1 2 1 11 1 3 1 12 1 4 1 13 2 5 2 14 2 6 2 15 3 7 3 16 4 8 4 17 5 9 5 18 6 10 6 19 8 11 8 20 11 12 10 21 14 13 12 22 17 14 16 23 22 15 20 24 27 16 25 ≥25 ≥30 ≥17 ≥30 -

-

3º passo: fatores agravantes:

A presença de fatores agravantes entre os pacientes classifi cados pelo escore de Framingham como baixo ou médio risco levam o indivíduo à categoria de risco imedia-tamente superior. Os fatores agravantes são:

•História familiar de doença cardiovascular prematura; • Síndrome metabólica;

• Micro ou macroalbuminúria; • Hipertrofi a ventricular esquerda;

• Insufi ciência renal crônica;

• PCR de alta sensibilidade maior que 3mg/L.

-

Exame complementar com evidência de doença

ate-roscleróti ca subclínica: • Escore de cálcio >100; • Espessamento da caróti da; • Índice tornozelo-braquial <0,9.

-

4º passo: metas terapêuti cas e reavaliação do risco:

Tabela 5 - Adaptada da IV Diretriz Brasileira sobre Dislipidemia

Risco em 10 anos pelo escore de Framingham

Meta terapêuti ca Medida

terapêuti ca inicial Reavaliação de metas LDL-c Não HDL-c

Baixo <10 % <160 <190 MEV 6 meses

Intermediário 10 a 20% <130 <160 MEV 3 meses

Alto ou diabéti cos >20% <100 (opcional <70) <130 (opcional <100) MEV + terapia farmacológica 3 meses Aterosclerose signifi cati va >20 <70 <100 MEV + terapia farmacológica Individualizada

HDL-C TG

Homens ≥40 <150

Mulheres ≥50 <150

Diabéti cos ≥50 <150

(13)

D I S L I P I D E M I A E FAT O R E S D E R I S C O P A RA D O E N Ç A C A R D I OV A S C U L A R

CARDIOL

OGIA

Os TG são considerados fatores de risco independentes para doença coronariana, e a classifi cação quanto a seus ní-veis é apresentada na Tabela 6.

Tabela 6 - Classifi cação dos níveis de triglicérides

Classifi cação Nível

Normal <150mg/dL

Limítrofe 150 a 199mg/dL

Alto 200 a 499mg/dL

Muito alto >500mg/dL

Outros fatores de risco menores e que não são usados para tomada de decisão são:

-

Obesidade;

-

Sedentarismo;

-

Dieta aterogênica;

-

Lipoproteína A;

-

Homocisteína;

-

Fatores pró-infl amatórios e pró-trombóti cos;

-

Glicemia de jejum alterada;

-

Evidência de doença ateroscleróti ca subclínica.

7. Tratamento não medicamentoso =

mu-dança no esti lo de vida

A - Dieta

Um dos principais elementos das modifi cações no es-ti lo de vida é a dieta, que deve ser recomendada a todos os pacientes com alteração dos níveis de lípides. Somente com a dieta, 60% dos pacientes têm 1,8% de diminuição do peso corpóreo, e de 5 a 7% de queda dos níveis de LDL. Além disso, a dieta pode ajudar a modifi car outros fatores envolvidos no desenvolvimento de DCV, como hipertensão, diabetes e obesidade. A recomendação sugerida pelo NCEP está na Tabela 7.

Tabela 7 - Dieta recomendada pelo NCEP

Nutriente Recomendação

Gordura saturada <7% total calorias Gordura poli-insaturada Até 10% total calorias Gordura monoinsaturada Até 20% total calorias Gordura total 25 a 35% total calorias Carboidrato 50 a 60% total calorias

Fibra 20 a 30g/dia

Proteína 15% total calorias

Colesterol <200mg/dia

O total de calorias deve proporcionar equilíbrio entre ingestão e gasto de energia, a fi m de manter o peso deseja-do ou prevenir ganho de peso. Entretanto, deve-se salientar que atualmente é considerada mais importante a qualida-de do alimento ingerido do que proporções fi xas qualida-de cada alimento. Uma dieta pode apresentar concentrações mais altas de gorduras, desde que na forma de gorduras

vege-tais, como óleo de oliva ou canola. Dentre os carboidratos, deve-se preferir pelos alimentos integrais e pelas formas com menor índice glicêmico.

B - Álcool

Ingestão de álcool e mortalidade por DCV estão relacio-nadas, e o consumo excessivo determina aumento do risco de DCV, enquanto o consumo moderado (1 dose/dia para mulheres e 2 para homens) está associado a redução do risco cardiovascular. Consumos maiores aumentam o risco, principalmente, de acidente vascular cerebral.

C - Perda de peso

Além de melhorar o perfil lipídico, a perda de peso tem grande influência nos demais fatores de risco car-diovascular envolvidos com o excesso de peso, como HAS e DM. Uma redução no peso de 5 a 10% reduz o C total em até 18%, TG em até 44%, LDL-C em até 22%, e au-menta os níveis de HDL-C em até 27%. Hoje, é uma das mais importantes medidas preventivas quanto ao risco cardiovascular.

D - Ati vidade fí sica

A inati vidade fí sica contribui, substancialmente, com os fatores de risco cardiovasculares lipídicos e não lipí-dicos. Os níveis de HDL-C aumentam proporcionalmente com o nível de gasto energéti co. Os níveis de TG também sofrem uma diminuição importante, especialmente nos pacientes com altos níveis iniciais. A recomendação é que os exercícios sejam realizados de 3 a 6 vezes por semana, em sessões de duração de 30 a 60 minutos.

8. Tratamento medicamentoso

A - Estati na (inibidor da HMG-CoA redutase)

A estati na deve ser considerada medicação de 1ª esco-lha para níveis altos de LDL-C, sejam primários ou secun-dários. Apresenta também o efeito cardioprotetor devido a propriedades pleiotrópicas, envolvendo a biologia da ate-rosclerose (modulando imunorregulação, infl amação, coa-gulação e resposta vasomotora).

Essa medicação inibe de maneira competi ti va a enzima HMG-CoA redutase (Figura 2), que é o passo limitante na síntese de C, levando à queda transitória dos níveis intra-celulares, aumentando a síntese dos receptores celulares de LDL, acelerando a remoção de LDL-c e TG. A medicação aumenta de 5 a 10% os níveis de HDL-c e diminui em 20 a 60% os níveis de LDL-c e 10 a 33% os níveis de TG.

(14)

Figura 2 - Síntese de colesterol

Não só para o tratamento da hipercolesterolemia e da hiperlipidemia mista, o uso da estati na também tem sido recentemente estudado na osteoporose e na insufi ciência coronariana aguda, em que é notado o efeito potencializa-dor na estabilização da placa, principalmente pela atorvas-tati na. A posologia desse grupo medicamentoso é descrita na Tabela 8.

Tabela 8 - Posologia sugerida das estati nas

Dose Melhor administrar

Alteração no LDL-C Atorvastati na 80mg/dia10 a À noite Redução de 37 a 55% Sinvastati na 80mg/dia20 a À noite Redução de 27 a 42% Lovastati na 80mg/dia10 a Após refeição noturna Redução de 21 a 41% Pravastati na 20 a

40mg/dia Ao deitar

Redução de 20 a 33% Fluvastati na 80mg/dia20 a Ao deitar Redução de 15 a 37%

Rosuvasta-ti na 40mg/dia10 a Qualquer ho-rário Redução de 43 a 55%

Há uma relação de equivalência terapêutica entre as estatinas: 10mg de atorvastatina = 20mg de sinvastati-na = 40mg de lovastatisinvastati-na/pravastatisinvastati-na = 80mg de flu-vastatina.

O efeito é observado, em média, de 3 a 4 semanas após o início do uso, podendo-se aumentar a dose após esse in-tervalo, caso não seja ati ngido o efeito desejado. Após uma redução inicial de 30 a 35% do LDL-c, cada vez que se dobra a dose, obtém-se uma redução adicional de 6%.

Algumas apresentações estão citadas na Tabela 9.

Tabela 9 - Apresentação comercial das principais estati nas

Estati na Apresentação comercial Atorvastati na - Lipitor – comprimido, 10 e 20mg; - Citalor – comprimido, 10 e 20mg. Sinvastati na

- Zocor – comprimido, 5, 10, 20 e 40mg; - Mivalen – comprimido, 5 e 10mg; - Vaslip – comprimido, 5 e 10mg. Lovastati na - Mevacor – comprimido, 10 e 20mg;

- Reducol – comprimido, 20mg. Pravastati na - Pravacol – comprimido, 10 e 20mg;

- Mevaloti n – comprimido, 10 e 20mg. Fluvastati na - Lescol – cápsula, 20 e 40mg;

- Lescol XL – cápsula, 80mg.

São medicações consideradas bem toleradas, sendo in-comuns efeitos adversos signifi cati vos. Os principais são ce-faleia, náuseas, alteração de sono, aumento de enzimas he-páti cas e de fosfatase alcalina, miosite e rabdomiólise (prin-cipalmente, na presença de insufi ciência renal, quando as-sociadas a genfi brozila e ciclosporina). São contraindicadas na gestação, na amamentação, em doença hepáti ca aguda e em aumento persistente inexplicável de transaminases.

Recomendam-se obter os níveis basais de CK total e transaminases antes do início da terapia com estati nas. De-vem-se repeti r essas dosagens na 1ª reavaliação ou a cada aumento de dose.

Devem ser suspensas nos seguintes casos:

-

Aumento progressivo de CK;

-

Aumento superior a 10 vezes o limite superior do mé-todo ou manutenção de mialgia;

-

Sinais de hepatotoxicidade: icterícia, hepatomegalia, au-mento de bilirrubina direta e do tempo de protrombina;

-

Elevação de transaminases acima de 3 vezes o limite

superior do método. Se assintomáti ca, avaliar a redu-ção da dose ou suspensão da droga a critério clínico.

B - Resinas sequestradoras de ácidos biliares

São medicações que se ligam aos ácidos biliares no intes-ti no, diminuindo sua absorção no íleo terminal, reduzindo, assim, o pool hepáti co de ácidos biliares. Isso leva ao au-mento da conversão de C em ácidos biliares nos hepatócitos. Dessa forma, ocorrem aumento da síntese e expressão dos receptores de LDL-c, determinando uma queda dos níveis de c. As resinas diminuem de 15 a 30% os níveis de LDL--c e podem levar a um pequeno aumento do HDLLDL--c. Devem ser evitadas entre pacientes com hipertrigliceridemia, pois se observam, eventualmente, aumentos nos níveis de TG.

Por serem medicações sem efeitos sistêmicos, são a úni-ca classe de droga aprovada para o tratamento de hiper-colesterolemia na infância. São, também, consideradas a opção de escolha para mulheres em idade férti l e uti lizadas da seguinte forma:

-

Colesti ramina: de 4 a 24g/dia, 30 minutos antes das

(15)

D I S L I P I D E M I A E FAT O R E S D E R I S C O P A RA D O E N Ç A C A R D I OV A S C U L A R

CARDIOL

OGIA

-

Colesti pol: de 5 a 30g/dia, 30 minutos antes das

re-feições;

-

Colesevelam: 3,75g/dia, às refeições.

A Tabela 10 sumariza as apresentações comerciais des-sas medicações.

Tabela 10 - Apresentação comercial das resinas

Resina Apresentação comercial Colesti ramina Questran pó – misturar com água.

Colesti pol Colestid – tablete de 1g, pacote com grânulos de 5g. Colesevelam Welchol – tablete de 625mg.

O efeito adverso mais comum é a alteração da função intesti nal (plenitude abdominal, fl atulência e consti pação), que ocorre em 30% dos casos, sendo contraindicadas a pacientes com obstrução biliar completa e obstrução intesti -nal. Tais medicações podem levar ao aumento de enzimas hepáti cas e de fosfatase alcalina, de forma que se devem monitorizar esses indivíduos.

C - Inibidores da absorção de colesterol (ezeti miba)

O ezeti miba interfere na absorção intesti nal do C, dimi-nuindo o seu aporte ao fí gado e levando a uma diminuição do depósito hepáti co de C. Ocorre aumento do clearance sérico de C por aumento do seu catabolismo endógeno. Quando usa-do como monoterapia, reduz os níveis de LDL-c em 15 a 20%. Pode ser usado em associação a estati nas, levando a um acrés-cimo de diminuição de LDL-c de até 14%. Tal associação tam-bém mostrou um decréscimo dos níveis de proteína C reati va. A grande indicação são casos em que os níveis de redu-ção do LDL-c estão subóti mos, principalmente quando se desejam evitar doses altas de estati nas, ou quando a dose máxima já foi ati ngida, sem que os níveis de LDL-c estejam sati sfatórios. A dose uti lizada é de 10mg, e deve ser tomada 1 vez ao dia, com ou sem a refeição.

Apesar de ser um coadjuvante importante para ati ngir as metas propostas, ainda não existem estudos clínicos con-sistentes que demonstrem a redução de eventos cardiovas-culares com o seu uso.

Efeitos adversos clinicamente signifi cati vos são inco-muns, ocorrendo entre 1 e 10%. Pode haver diarreia, dor abdominal, artralgia, lombalgia, fadiga, tosse e sinusite. O uso em associação a estati nas pode levar a um aumento das transaminases um pouco maior que o uso isolado de estati nas. No 1º caso, devem-se realizar provas de função hepáti ca antes e depois da introdução da droga.

D - Fibratos

Os fi bratos são as drogas de maior efi cácia a pacientes com hipertrigliceridemia e baixos níveis de HDL-c. A efi cácia da sua ação está relacionada com a magnitude dos níveis de TG. No entanto, quanto maior o nível, menor a probabilidade de nor-malização com o tratamento por fi bratos. São associados à

re-dução dos níveis de triglicerídeos em 35 a 50% e podem elevar os níveis de HDL-c em 15 a 25%. Agem por meio da ati vação do fator de transcrição nuclear PPAR-alfa, levando a:

-

Diminuição da síntese da apo-CIII;

-

Aumento da ati vidade da lipase lipoproteica;

-

Aumento da transcrição da apo-AI (e consequente-mente aumento do HDL-c) e da apo-AII;

-

Aumento da remoção hepáti ca de LDL.

Como via fi nal dessas alterações, ocorrem aumento do HDL-c e diminuição da trigliceridemia, do LDL-C e da coles-terolemia.

As principais indicações para a terapia com fi bratos são níveis de TG acima de 500mg/dL associados a medidas não farmacológicas (recomendação classe I, nível de evidência A), disbetalipoproteinemia familiar e pacientes com baixos níveis de HDL-c. Dentre as medicações disponíveis, citam-se genfi brozila, bezafi brato, fenofi brato, etofi brato, ciprofi bra-to e clofi brabra-to. Este últi mo foi proscribra-to devido à associação encontrada com colangiocarcinoma e outros cânceres gas-trintesti nais.

O genfibrozila tem efeito modesto em diminuir LDL-c em pacientes com hipercolesterolemia e pequeno efeito no LDL-c dos pacientes com hiperlipidemia mista. Além disso, determina aumento do LDL-c em pacientes com hipertrigliceridemia pura. Sua principal característica é a capacidade em aumentar HDL-c em pacientes com altos níveis de TG, porém com pequenos aumentos em pacientes com níveis normais de TG e baixos de HDL-c. O fenofibrato apresenta efeito um pouco melhor na re-dução de LDL-c em relação ao genfibrozila. A posologia e as apresentações dessas medicações estão descritas nas Tabelas 11 e 12.

Recomenda-se evitar a associação do genfi brozila a es-tati nas pelo aumento do risco de rabdomiólise.

Tabela 11 - Posologia dos fi bratos

Fibrato Dose Melhor momento de administração Genfi brozila - 600mg, (2 vezes ao dia)*. - 30 minutos antes das refeições. Bezafi brato - 200mg, (3 vezes ao dia)**;

- 400mg.

- Durante ou após as refeições;

- À noite. Fenofi brato - 250mg, dose única. - À noite. Fenofi brato

mi-cronizado - 200mg, dose única. - À noite.

Ciprofi brato - 100mg, dose única. - À noite; - Longe da refeição. Etofi brato - 500mg, dose única. - À noite, ao jantar. * A dose pode ser diminuída para 900mg antes do jantar, caso os

níveis de TG desejados sejam ati ngidos.

** Em caso de sensibilidade gástrica, iniciar com um comprimido

e aumentar, gradati vamente, para 3. Caso os níveis ideais de TG sejam ati ngidos, pode-se diminuir para 2 vezes ao dia.

(16)

Tabela 12 - Apresentações comerciais dos fi bratos

Fibrato Apresentação

Genfi brozila - Lopid – comprimido, 600 e 900mg. Bezafi brato - Cedur – comprimido, 200mg;

- Cedur Retard – comprimido, 400mg. Fenofi brato - Lipanon Retard – comprimido, 250mg;

- Lipidil – cápsula, 200mg. Ciprofi brato - Lipless – comprimido, 100mg;- Oroxadin – comprimido, 100mg. Etofi brato - Tricerol – comprimido.

Os fi bratos são medicações geralmente bem toleradas. Os efeitos adversos mais relatados são distúrbios gastrin-testi nais. Dor, fraqueza muscular, diminuição da libido, erupção cutânea e distúrbios do sono são outros efeitos re-latados. Além desses, os fi bratos parecem estar envolvidos no aumento de cálculos biliares.

E - Ácido nicotí nico

O ácido nicotí nico age por meio da inibição hepáti ca da produção de VLDL, levando à diminuição do LDL-c. Diminui a transformação de HDL-c em VLDL, aumentando, assim, os níveis de HDL. Também está associado à diminuição dos ní-veis séricos de plasminogênio. A medicação obtém diminui-ção de 5 a 25% nos níveis de LDL-c, de 20 a 50% nos níveis de TG e aumento de 15 a 35% nos níveis de HDL-c.

Deve ser iniciado com 100mg, 2 vezes ao dia, aumentan-do-se gradualmente até a dose-alvo tolerada (dose máxima de 1,5 a 2g, divididos em 3 vezes ao dia). É administrado durante a refeição, para diminuir os efeitos colaterais de

fl ushing (rubor e prurido cutâneo) e náuseas. A

administra-ção prévia de aspirina também diminui a ocorrência de tais efeitos. As apresentações comerciais incluem:

-

Olbetam: cápsula – 250mg;

-

Niaspan: cápsula – 500mg, 750mg, 1000mg;

-

Slo-Niacin: cápsula – 250mg, 500mg, 750mg;

-

Ácido nicotí nico: comprimido – 50mg, 100mg, 250mg,

500mg.

Os efeitos adversos são frequentes, e a droga não é tolerada em até 10% dos pacientes. Os mais comuns são relacionados à mediação por prostaglandinas, como rash cutâneo, desconforto gastrintesti nal e mialgia. Pode levar à piora do controle glicêmico, bem como ao aumento de homocisteína e de ácido úrico. É contraindicado na presen-ça de doenpresen-ça hepáti ca, úlcera pépti ca ati va, hipotensão se-vera e hemorragia arterial. E deve ser evitado em eti listas, pacientes com insufi ciência coronariana, DM, doença renal, gota e história pregressa de doença hepáti ca.

F - Outras drogas

a) Neomicina

Na dose de 2g/dia, a neomicina reduz os níveis de LDL--c e de Lp(a) em cerca de 25%. Age através da formação de

um complexo insolúvel com os ácidos biliares (mecanismo de ação semelhante aos sequestradores de ácidos biliares).

b) Probucol

Esta droga diminui a síntese hepáti ca e a secreção de VLDL, além de diminuir a captação de LDL por via inde-pendente do receptor. Esti mula a ati vidade da proteína de transferência do C (CETP), o que leva à redução do HDL. In

vitro, demonstra grande capacidade em aumentar a

resis-tência do LDL à oxidação, diminuindo a sua modifi cação em formas mais aterogênicas. A administração é via oral, e a eliminação é biliar. A dose diária é de 1g, dividida no almoço e no jantar. Deposita-se no tecido adiposo, sendo sua libe-ração muito lenta. Atualmente, é pouco usada como mono-terapia, mais uti lizada como anti oxidante.

c) Ácidos graxos ômega-3 (óleos de peixe)

Agem pela inibição da síntese de VLDL e de apolipopro-teína B, podendo reduzir os níveis de TG em até 50% e ele-var discretamente os níveis HDL-c. São indicados aos casos de hipertrigliceridemia refratária e encontrados em cápsu-las de 500 e 1.000mg, com teor de ômega-3 de 30 a 50%.

d) Terapia de reposição hormonal (estrogênica) A Terapia de Reposição Hormonal (TRH) em mulheres pós-menopausadas proporciona efeito benéfi co no perfi l lipídico, com redução de 15% no LDL-C, 20% na Lp(a), 24% nos TG e aumento de 10 a 15% no HDL-C. Apesar do te-órico benefí cio cardiovascular, isso não foi confi rmado no estudo Women’s Health Initi ati ve, nem no estudo HERS. A TRH pode até ser prejudicial, não sendo recomendada para prevenção primária ou secundária.

e) Aspirina

O estudo HOT sugeriu que há benefí cio potencial com o uso de aspirina para prevenir eventos cardiovasculares. Seu uso é recomendado pela US Task Force quando o risco de evento cardiovascular é maior que 6% em 10 anos. Já a AHA (American Heart Associati on) recomenda o uso se o risco de evento cardiovascular é maior que 10%. Apesar disso, apenas 14% das pessoas com 1 ou mais fatores de risco car-diovasculares estão em uso de AAS.

f) Anti oxidantes

Não há evidências de que suplementos de vitaminas anti oxidantes (vitamina E, C ou beta-caroteno) previnam manifestações clínicas da aterosclerose, portanto não são recomendados.

9. Situações especiais

A - Pacientes com HDL baixo

O HDL-c baixo está associado a doença ateroscleróti ca. O estudo VA-HIT demonstrou benefí cio com uso de fi brato para aumentar o HDL-c em pacientes com LDL-c não au-mentado. Nesses casos, o uso dos fi bratos é considerado de

(17)

D I S L I P I D E M I A E FAT O R E S D E R I S C O P A RA D O E N Ç A C A R D I OV A S C U L A R

CARDIOL

OGIA

escolha, e a niacina é 2ª opção naqueles sem diabetes ou intolerância à glicose.

B - Pacientes com hipertrigliceridemia

Recomenda-se tratar a hipertrigliceridemia quando em níveis acima de 150mg/dL, procurando enfati zar as medi-das gerais de dieta e ati vidade fí sica quando os níveis estão entre 150 e 199mg/dL. Quando ultrapassam 200mg/dL, o tratamento da hipertrigliceridemia passa a ser objeti vo se-cundário no tratamento, enfati zando a importância de tratar, primariamente, o LDL-c elevado e, posteriormente, o HDL-c baixo. Contudo, nesses pacientes, considera-se introduzir in-tervenção medicamentosa adjuvante às medidas gerais.

Quando os níveis ultrapassam 500mg/dL, os TG passam a ser objeti vo primordial do tratamento, com combinação de terapia medicamentosa (ácido nicotí nico ou fi bratos) com medidas gerais.

Níveis de TG acima de 1.000mg/dL podem causar pan-creati te aguda, e a hipertrigliceridemia é responsável por cerca de 1,3 a 3,8% desses casos. A maioria de tais pacien-tes tem TG em níveis superiores a 4.000mg/dL. Os indivíduos com hipertrigliceridemia importante e sintomas sugesti -vos de pancreati te devem permanecer em repouso até que os níveis de TG fi quem abaixo de 1.000mg/dL.

C - Pacientes HIV positi vo

A dislipidemia relacionada à infecção pelo HIV apresen-ta característi ca alapresen-tamente aterogênica apresenapresen-tando HDL baixo, LDL e TG altos.

Um recente estudo demonstrou a presença de hiperco-lesterolemia em 27% dos indivíduos em terapia anti rretroviral com IP, em 23% dos pacientes que recebiam somente inibi-dores da transcriptase reversa não análogos de nucleosídeos (NNRTI) e 10% no grupo tratado apenas com NRTI, quando comparado com 8% nos indivíduos sem terapia anti rretroviral. A correspondência desses dados para hipertrigliceridemia foi de 40, 32 e 23%, respecti vamente, quando em comparação com os 15% dos indivíduos que não recebiam tratamento.

As estati nas como a sinvastati na, lovastati na e atorvasta-ti na são metabolizadas pelo citocromo P-450 isoforma 3A4, o qual é inibido pelos IPs, entretanto a pravastati na e o ezeti mi-ba podem ser boas alternati vas pelo metabolismo alternati vo. Nos casos de associação entre drogas anti rretrovirais e anti li-pemiantes (fi bratos e/ou estati nas), é fundamental uma rigo-rosa monitorização da função renal, das enzimas hepáti cas e da creati nofosfoquinase (CPK) pela potencialização dos efeitos nefrotóxicos, hepatotóxicos e miotóxicos dessas medicações.

10. Outros fatores de risco para

ateroscle-rose e DCV

A - Lipoproteína A

Trata-se da forma específi ca de LDL-c formado no extra-celular, com interferência no processo de fi brinólise devido

a competi ção com o plasminogênio pelos receptores espe-cífi cos, com diminuição da ati vação e geração do plasmino-gênio na superfí cie do trombo. Além disso, tal lipoproteína se liga aos macrófagos através de receptores de alta afi nida-de, facilitando o depósito de C nas placas ateroscleróti cas.

B - Doença renal crônica

É recomendado na literatura que a doença renal crôni-ca seja considerada equivalente de risco coronariano, pois uma análise mostrou chance de eventos próxima a 20% em 2,8 anos.

C - Microalbuminúria

Vários estudos demonstraram aumento de risco car-diovascular nos pacientes com microalbuminúria positi va. Acredita-se que isso refl ita dano vascular, sendo marcador precoce de lesão endotelial.

D - Hiper-homocisteinemia

É associada a aumento de risco cardiovascular tanto em estudos de caso-controle quanto em estudos prospecti vos. Contudo, pacientes que receberam terapia dirigida com áci-do fólico e vitaminas B6 e B12 não apresentaram benefí cio.

E - Terapia anti oxidante

Sabe-se que o LDL oxidado está associado a aumento do risco de desenvolver aterosclerose. Apesar dos benefí cios teóricos da terapia anti oxidante, vários estudos realizados com uso de vitamina E, vitamina C ou beta-caroteno não demonstraram benefí cio com a intervenção.

F - Fatores de coagulação

Níveis de fi brinogênio são importantes preditores do ris-co cardiovascular, mas ainda não foi determinado se esse é um fator independente de risco cardiovascular. Dados pre-liminares, como D-dímero, parecem também ser associa-dos a aumento de eventos, assim como fator de von Wille-brand, aumento da trombomodulina e diminuição do fator ati vador do plasminogênio.

G - Proteína C reati va

A PCR e outros marcadores infl amatórios associam-se a aumento de risco de doença cardiovascular. Um estudo publicado na Circulati on em 2001 demonstrou que as es-tati nas diminuem em 20% os níveis de PCR. Um 2º estudo, publicado no New England Journal Of Medicine, demons-trou que as estati nas reduzem a mortalidade no subgrupo de pacientes com PCR elevado e LDL normal.

H - Síndrome metabólica

O estudo WOSCOPS encontrou risco 1,7 vez maior de evento cardiovascular no grupo com síndrome metabólica e

(18)

3,5 vezes mais chance de DM. Outros estudos demonstraram associação semelhante. O diagnósti co de síndrome metabóli-ca é feito tendo a obesidade abdominal como critério obriga-tório, somado a pelo menos mais 2 critérios entre os expos-tos a seguir: hipertrigliceridemia, HDL-c baixo, hipertensão arterial e glicemia de jejum alterada ou tratamento para DM.

I - Hiperuricemia

Está associada a aumento de risco cardiovascular, mas não se sabe se tem relação causal com aterosclerose ou se é apenas um marcador de ati vidade do processo.

J - LDL pequenas e densas

A presença de partí culas pequenas e densas de LDL pode estar relacionada a aspectos da síndrome metabólica, e alguns estudos mostraram melhora angiográfi ca da coronariopati a após melhora do seu tamanho. No entanto, conti nua incerto se a mudança no tamanho das partí culas de LDL, além da re-dução no seu número absoluto, traz benefí cios clínicos.

K - Outros fatores

Vários outros fatores se associam a aumento de risco cardiovascular, como:

-

Hipertrofi a de ventrículo esquerdo;

-

Taquicardia ao repouso;

-

Espessamento de artérias e relação ínti ma/média;

-

Doenças do colágeno;

-

Alterações reti nianas;

-

Peptí dio natriuréti co cerebral;

-

Acúmulo de ferro.

11. Resumo

Quadro-resumo

- Dislipidemia é importante fator de risco para doença cardiovas-cular;

- Em pacientes com dislipidemia, deve-se avaliar a possibilidade de dislipidemia secundária;

- A decisão de iniciar estati nas depende da esti mati va de risco de cada paciente e dos fatores de risco que esse paciente apresenta; - O HDL-c aumentado implica diminuição do risco de eventos

car-diovasculares;

- O LDL-c é o principal alvo no tratamento da dislipidemia; - Em pacientes com níveis de TG maiores que 500mg/dL, essa

pas-sa a ser a prioridade do tratamento;

- Pacientes com hipertrigliceridemia podem benefi ciar-se do uso de fi bratos;

- Aspirina está indicada a pacientes com risco aumentado de even-tos cardiovasculares;

- O tratamento medicamentoso depende do perfi l da dislipidemia; - Há outros fatores de risco cardiovascular, como microalbuminú-ria, PCR e hiper-homocisteinemia, contudo ainda restam dúvidas se a intervenção modifi ca o risco.

(19)

CAPÍTULO

3

3

Hipertensão arterial sistêmica

José Paulo Ladeira / Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Nogueira Furtado

1. Introdução

A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) é uma doença que representa um dos maiores problemas em saúde pú-blica no Brasil e no mundo, gerando elevado custo médico--social, principalmente por sua parti cipação em complica-ções como na doença cerebrovascular, na Doença Arterial Coronariana (DAC), na Insufi ciência Cardíaca (IC), na insu-fi ciência renal crônica, na reti nopati a hipertensiva e na in-sufi ciência vascular periférica. É uma condição clínica mul-ti fatorial caracterizada por níveis elevados e sustentados da Pressão Arterial (PA). Tem alta prevalência e baixas taxas de controle, sendo importante problema de saúde pública.

No Brasil, desde a década de 1960, as doenças cardio-vasculares têm superado as doenças infectocontagiosas como a principal causa de morte, com certa parti cipação da HAS nesse fato.

A HAS é um dos fatores mais relevantes para o desen-volvimento de doenças cardiovasculares. Alguns autores consideram que 40% das mortes por AVC e 25% das mortes por DAC são decorrentes de HAS.

No país, em 2003, 27,4% dos óbitos foram decorrentes de doenças cardiovasculares, ati ngindo 37% quando exclu-ídos os óbitos por causas mal defi nidas e violência. A prin-cipal causa de morte de origem cardiovascular em todas as regiões é o AVC, acometendo as mulheres em maior pro-porção. Um dos principais desafi os no tratamento da hiper-tensão é a realização do diagnósti co precoce devido à ine-xistência de sintomas precoces específi cos. Dos pacientes com diagnósti co de hipertensão, ati ngir o alvo terapêuti co é

muitas vezes difí cil e necessita do uso combinado de várias drogas, o que tem impacto na redução da adesão ao trata-mento medicatrata-mentoso.

2. Fisiopatologia

Apesar de não estarem muito bem estabelecidos todos os mecanismos associados à HAS, existem 2 teorias que ex-plicam a maioria dos casos: a neurogênica e a do desbalan-ço na absorção de sódio e água.

A teoria neurogênica sustenta a ideia de que o sistema nervoso autônomo teria o seu set point pressórico alterado para um patamar mais elevado, determinando elevação da PA. A teoria do desbalanço do controle da absorção de só-dio sustenta a ideia de que ocorre perda da capacidade de excreção adequada de sódio frente à quanti dade de sódio ingerido, determinando retenção de sódio e de água.

O sistema renina-angiotensina-aldosterona é o prin-cipal mecanismo de regulação da pressão arterial. Em si-tuações de hipoperfusão renal, (1) ocorre a liberação da renina, uma enzima renal. Por sua vez, a renina (2) ati va a angiotensina (3), um hormônio que provoca contração das paredes musculares das pequenas artérias (arterío-las), aumentando a PA. A angiotensina também desenca-deia a liberação do hormônio aldosterona pelas glândulas suprarrenais (4), provocando a retenção de sódio e a ex-creção de potássio. O sódio promove a retenção de água e, dessa forma, provoca a expansão do volume sanguíneo e o aumento da pressão arterial. Esse é o principal sistema de modulação da PA.

(20)

Figura 1 - Regulação da pressão arterial: sistema renina-angioten-sina-aldosterona

3. Fatores de risco

Existem vários fatores de risco para desenvolvimento da HAS e a maioria pode ser eliminada apenas com hábitos saudáveis e cuidados com a saúde.

-

Idade: existe relação direta entre idade e

desenvolvi-mento de HAS; acima de 65 anos, a prevalência é de 60%;

-

Gênero e etnia: até os 50 anos, a prevalência é maior

em homens, invertendo-se esta tendência após esta idade. Também é mais prevalente nas raças não bran-cas. No Brasil, mulheres negras têm o dobro da inci-dência de HAS do que mulheres brancas;

-

Sobrepeso e obesidade: mesmo em jovens, a

obesi-dade aumenta o risco de HAS; o aumento de 2,4kg/m2 acima do IMC adequado já eleva o risco de HAS;

-

Ingesta de sal: a ingesta excessiva de sal está

associa-da a HAS; já foram identi fi caassocia-das populações indígenas onde o sal não faz parte da dieta e não foram encon-trados casos de HAS;

-

Álcool: o consumo excessivo de álcool determina

ele-vação da PA e aumento da mortalidade cardiovascular em geral;

-

Sedentarismo: a ati vidade fí sica protege o indivíduo

de desenvolver HAS, mesmo em pré-hipertensos;

-

Fatores socioeconômicos: no Brasil, a HAS é mais

pre-valente em pessoas com baixa escolaridade;

-

História familiar: a contribuição de fatores genéti cos

no desenvolvimento da HAS é bem estabelecida, mas

não há como uti lizar o fator genéti co para predizer o risco de desenvolvimento da HAS.

4. Diagnósti co

A medida da PA deve ser feita em toda consulta médi-ca, porém isso nem sempre é feito corretamente. Deve ser aferida com manguito apropriado para a circunferência do braço (o cuff insufl ável deve recobrir, pelo menos, 80% da circunferência do braço), com repouso de, no mínimo, 5 a 10 minutos e absti nência de nicoti na, álcool e cafeína de ao menos 30 minutos. Devem ser realizadas medidas nos 2 braços, considerando a medida de maior valor para re-ferência e certi fi cando-se de que o indivíduo não está de bexiga cheia, pernas cruzadas e nem prati cou exercícios nos últi mos 90 minutos. Todos esses fatores podem infl uenciar a medida da PA.

Para indivíduos com idade superior a 18 anos, o diag-nósti co de HAS é feito sempre que se obtêm 2 ou mais medidas de pressão diastólica, em 2 visitas subsequentes, iguais ou acima de 90mmHg ou pressão sistólica maior ou igual a 140mmHg. Como pode haver grande labilidade da pressão arterial, as medidas devem ser feitas em diferen-tes ocasiões ao longo de semanas ou meses, a menos que ocorram sintomas.

Há situações em que a medida de PA pode estar fal-samente elevada, decorrente de estresse ou outros fato-res, principalmente de aspecto psicológico. Nesses casos, pode-se lançar mão de 2 arti fí cios diagnósti cos: a Medida Residencial da Pressão Arterial (MRPA) ou a Medida Am-bulatorial de Pressão Arterial (MAPA). O objeti vo desses arti fí cios é minimizar ao máximo o estresse da visita ao mé-dico, o desconforto do exame e da medida da PA e permiti r maior número de medidas, oferecendo ideia mais precisa da variação da PA durante o dia. O aumento transitório da PA associado a estresse ou ansiedade não consti tui doença hipertensiva, mas pode indicar propensão para HAS no fu-turo. As principais indicações de MAPA são:

-

Suspeita de hipertensão do consultório ou do avental branco;

-

Suspeita de episódios de hipotensão arterial sintomá-ti ca.

Avaliação da efi cácia da terapêuti ca:

-

Quando a PA casual permanecer elevada, apesar da oti mização do tratamento anti -hipertensivo para diag-nósti co de hipertensão arterial resistente ou efeito do avental branco;

-

Quando a PA casual esti ver controlada e houver in-dícios da persistência ou da progressão de lesão de órgãos-alvo.

A seguir, observe o fl uxograma para diagnósti co de HAS no segmento ambulatorial.

(21)

H I P E RT E N S Ã O A RT E R I A L S I S T Ê M I C A

CARDIOL

OGIA

Figura 2 - Avaliação de normotensos com lesão de órgãos-alvo

A seguir, os procedimentos adequados para a aferição da PA (Tabela 1).

Tabela 1 - Metodologia correta para aferição da PA

Preparo do paciente para medida da pressão arterial 1 - Explicar o procedimento ao paciente.

2 - Oferecer repouso de, pelo menos, 5 minutos em ambiente calmo. 3 - Evitar bexiga cheia.

4 - Não prati car exercícios fí sicos 60 a 90 minutos antes. 5 - Não ingerir bebidas alcoólicas, café ou alimentos e não fumar

30 minutos antes.

6 - Manter pernas descruzadas, pés apoiados no chão e dorso recostado na cadeira e permanecer relaxado.

7 - Remover roupas do braço no qual será colocado o manguito. 8 - Posicionar o braço na altura do coração (nível do ponto médio do esterno ou 4ª espaço intercostal), apoiado, com a palma da mão voltada para cima e o cotovelo ligeiramente fl eti do. 9 - Solicitar para que não fale durante a medida.

Procedimento de medida da pressão arterial 1 - Medir a circunferência do braço do paciente.

2 - Selecionar o manguito de tamanho adequado ao braço. 3 - Colocar o manguito sem deixar folgas, cerca de 2 a 3cm acima

da fossa cubital.

4 - Centralizar o meio da parte compressiva do manguito sobre a artéria braquial.

5 - Esti mar o nível da pressão sistólica (palpar o pulso radial e infl ar o manguito até o seu desaparecimento, desinfl ar rapidamente e aguardar 1 minuto antes da medida).

6 - Palpar a artéria braquial na fossa cubital e colocar a campânula do estetoscópio sem compressão excessiva.

7 - Infl ar rapidamente até ultrapassar de 20 a 30mmHg o nível esti mado da pressão sistólica.

8 - Proceder à defl ação lentamente (velocidade de 2 a 4mmHg/s). 9 - Determinar a pressão sistólica na ausculta do 1º som (fase I de Ko-rotkoff ), que é um som fraco seguido de bati das regulares, e, pos-teriormente, aumentar ligeiramente a velocidade de defl ação.

Referências

Documentos relacionados

5 τῶν δὲ μετὰ χαρᾶς τοῦτον παρασχόντων οὐ γὰρ ᾔδεσαν τοῦ λίθου τὸ ὑπέρτιμον, ἀπῆλθεν εἰς Ἰερουσαλήμ τὸν λίθον ἐπιφερόμενος, 6

Através do experimento in vivo, verificou-se que o pó nebulizado de nanocápsulas (Neb-NC) é efetivo na proteção da mucosa gastrintestinal frente à indometacina, enquanto que os

Quanto à população acometida, apesar da morte súbita ocorrer mais freqüentemente nos chagásicos com arritmia ventricular complexa ou episódios de taquicardia ventricular, ela

Essa tendência, que se inicia nos anos 1940 e se afirma nas décadas seguintes, pode ser atribuída à crescente escolarização feminina que ocorreu a partir das reformas da educação

3 — Rececionada a prova da celebração do contrato do seguro obrigatório, a DGAE disponibiliza ao requerente, no prazo de cinco dias, no «Balcão do empreendedor», o título

5.2 Importante, então, salientar que a Egrégia Comissão Disciplinar, por maioria, considerou pela aplicação de penalidade disciplinar em desfavor do supramencionado Chefe

As variedades linguísticas registradas no Atlas Linguístico da Mesorregião Sudeste de Mato Grosso evidenciam a influência da fala de outras regiões do Brasil, como ficou

No entanto, as perdas ocasionadas na cultura do milho em função da interferência imposta pelas plantas daninhas têm sido descritas como sendo da ordem de 13,1%, sendo que em casos