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Efeito citotóxico e anti-inflamatório da articaína-2-hidroxipropil-beta-ciclodextrina sobre células escamosas de carcinoma de língua

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE PIRACICABA

JONNY BURGA SÁNCHEZ

EFEITO CITOTÓXICO E ANTI-INFLAMATÓRIO DA

ARTICAÍNA-2-HIDROXIPROPIL-β-CICLODEXTRINA SOBRE CÉLULAS

ESCAMOSAS DE CARCINOMA DE LÍNGUA

Piracicaba

2018

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JONNY BURGA SÁNCHEZ

EFEITO CITOTÓXICO E ANTI-INFLAMATÓRIO DA

ARTICAÍNA-2-HIDROXIPROPIL-β-CICLODEXTRINA SOBRE CÉLULAS

ESCAMOSAS DE CARCINOMA DE LÍNGUA

Tese apresentada à Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Odontologia, na Área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica.

Orientador: Prof. Dr. Francisco Carlos Groppo

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO

JONNY BURGA SÁNCHEZ E ORIENTADA PELO

PROF. DR. FRANCISCO CARLOS GROPPO.

Piracicaba

2018

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DEDICATORIA

Dedicado a todos os homens e mulheres de ciência que acreditam em um mundo melhor.

A minha família, pela motivação e apoio constantes no meu desenvolvimento. A minha esposa e melhor amiga Rosa L. Abuhadba-Moscoso.

Aos meus amigos, novos amigos e professores da FOP/UNICAMP com os quais venho convivendo por quase seis anos e com quem compartilhamos a nossa paixão pela ciência e a odontologia.

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AGRADECIMENTOS

À Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) na pessoa de seu diretor, Prof. Dr. Guilherme Elias Pessanha Henriques, pela grande oportunidade de realizar este trabalho.

À Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP) pelo auxílio financeiro desta pesquisa.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa CAPES-Proex durante esses quatro anos de doutorado.

À Coordenadoria do Pós-graduação, representada pela Profa. Dra. Cinthia Pereira Machado Tabchoury pelas orientações e bons conselhos fornecidos desde o início da pós-graduação.

À Coordenadoria do Programa de Pós-graduação em Odontologia, representada pelo Prof. Dr. Marcelo de Castro Meneghim e à equipe de professores adjuntos por viabilizarem a realização da pós-graduação.

Ao meu orientador Prof. Dr. Francisco Carlos Groppo pela dedicação, paciência, disponibilidade e apoio constante durante a pesquisa.

Aos professores da área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica, Profa. Dra. Maria Cristina Volpato, Prof. Dr. Pedro Rosalen, Prof. Dr. Eduardo Dias de Andrade e ao Prof. Dr. José Ranali pelas orientações e conhecimentos compartilhados.

À Profa. Dra. Ana Lúcia Tasca Góis e a todo o pessoal do CPqBA pela disposição e ensino fornecido nas instalações dos laboratórios do centro.

Ao Prof. Dr. Leonardo Fernandes Fraceto e aos seus alunos de doutorado Jhones e Estefânia pela disposição e ajuda fornecida no laboratório do Instituto de Ciência e Tecnologia de Sorocaba – UNESP.

À Profa. Dra. Eneida de Paula e ao seu aluno de doutorado Mario Braga pela disposição e ajuda fornecida no laboratório do Instituto de Biologia da UNICAMP.

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Ao Prof. Luiz Fernando Cabeça pelas orientações e facilidades na caracterização da molécula no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron em Campinas. Aos amigos e colegas da área de farmacologia: Luiz, Bruno “bigode”, Bruno Nani, Josy, Marcelo, Verônica, Luciano, Bruna, Felipe, Marcos, Irlan, Diego, Fernanda, Rafaela, Karina, Jaiza, Aline, Janaina, Klinger, Sidney e Cleiton por todo o suporte e atenção fornecidos neste tempo para atingir os objetivos do curso.

Aos demais docentes, pessoal técnico do laboratório, a nossa secretaria Maria Eliza dos Santos, aos amigos e colegas de outras áreas pela ajuda em vários momentos desse tempo todo.

À minha esposa Rosa Abuhadba-Moscoso pela compreensão e ajuda constante. A todos meus amigos e familiares pelo ininterrupto apoio tanto nos momentos de alegria quanto nas dificuldades nestes quatro anos de doutorado.

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RESUMO

O carcinoma de células escamosas (CCE), especialmente na língua, é a neoplasia maligna mais comum e letal que acomete a cavidade oral. Alguns anestésicos locais têm sido relacionados com efeitos citotóxicos e anti-inflamatórios sobre diferentes tipos celulares. Além disso, tem sido demonstrado que a complexação de diversos anestésicos locais com ciclodextrinas melhoram as propriedades farmacológicas de dessas moléculas. Desta maneira, o objetivo desse trabalho foi realizar a caracterização físico-química de um novo complexo de inclusão de articaína (ATC) em 2-hidroxipropil-β-ciclodextrina (HPβCD) e avaliar os efeitos citotóxicos e anti-inflamatórios in vitro. O complexo de inclusão ATCHPβCD mostrou uma estequiometria de complexação equimolar estável 1:1 (ATC:HPβCD). Os experimentos de difusão demonstraram uma afinidade forte e estável entre essas moléculas (Ka = 117,8 M-1),

sendo a fração complexada de 41,41%. O complexo de inclusão ATCHPβCD teve um

efeito citotóxico maior comparado com a ATC livre. A ordem do IC50 da ATC foi o

seguinte: HaCaT (1,52 mg/mL ± 0,45), SCC15 (3,64 mg/mL ± 0,73), SCC25 (4,08 mg/mL ± 1,24) e SCC9 (5,80 mg/mL ± 1,98); enquanto a ordem do IC50 do complexo

de inclusão ATCHPβCD foi o seguinte: HaCaT (0,63 mg/mL ± 0,17), SCC15 (1,30 mg/mL

± 0,27), SCC25 (1,72 mg/mL ± 0,80), e SCC9 (2,12 mg/mL ± 0,13). Houve diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) entre o IC50 do controle (HaCaT) e o IC50 das

células SCC, tanto no grupo tratado com ATC quanto no grupo tratado com o complexo ATCHPβCD. A ATC livre não mostrou efeito antiproliferativo, porém o

complexo de inclusão ATCHPβCD reduziu significativamente a proliferação celular em

concentrações > 1 mg/mL. A análise por citometria de fluxo mostrou que a ATC e o complexo ATCHPβCD induziram apoptose e necrose, sendo as mais sensíveis as HaCaT e as SCC25 e as menos sensíveis as SCC9. A ATC e o ATCHPβCD reduziram significativamente a liberação de PGE2 em todas as linhas celulares SCC testadas. A

ATC e o ATCHPβCD reduziram significativamente a liberação de IL-6 e IL-8 nas células

SCC9 e SCC25. Estes resultados são promissores para uma melhor compreensão das propriedades farmacológicas da ATC e do complexo de inclusão ATCHPβCD como

potenciais coadjuvantes tópicos pós-cirúrgicos no tratamento do CCE de língua. Palavras-chave: Carticaína. Hidroxipropil-β-ciclodextrina. Carcinoma de células escamosas. Interleucina-6. Interleucina-8. Prostaglandinas.

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ABSTRACT

Squamous cell carcinoma (SCC), especially in the tongue, is the most common and lethal malignant neoplasm that can affect the oral cavity. Some local anesthetics have been related to cytotoxic and anti-inflammatory effects on different cell types. In addition, it has been shown that complexing of various local anesthetics with cyclodextrins improves the pharmacological properties of these molecules. Thus, the objective of this study was to perform the physicochemical characterization of a new articaine (ATC) inclusion complex in 2-hydroxypropyl-β-cyclodextrin (HPβCD) and to evaluate both the cytotoxic and anti-inflammatory effects in vitro. The physicochemical characterization of the inclusion complex of ATCHPβCD showed a stable complexion

stoichiometry 1:1 (ATC: HPβCD). The diffusion experiments demonstrated a strong and stable affinity between these molecules (Ka = 117.8 M-1), being the complexed

fraction 41.41%. The ATCHPβCD inclusion complex showed a greater cytotoxic effect

compared to free ATC. The IC50 order of ATC was as follows: HaCaT (1.52 mg/mL ±

0.45), SCC15 (3.64 mg/mL ± 0.73), SCC25 (4.08 mg/mL ± 1,24) e SCC9 (5.80 mg/mL ± 1.98); while the order of the IC50 ATCHPβCD inclusion complex was as follows: HaCaT

(0.63 mg/mL ± 0.17), SCC15 (1.30 mg/mL ± 0.27), SCC25 (1.72 mg/mL ± 0.80), and SCC9 (2.12 mg/mL ± 0.13). There were statistically significant differences (p <0.05) between the control IC50 (HaCaT) and the IC50 of the SCC cells, both in the

ATC-treated group and in the ATCHPβCD-treated group. Free ATC showed no antiproliferative

effect, but ATCHPβCD reduced significantly the cell proliferation at concentrations >1

mg/mL. Flow cytometry analysis showed that ATC and ATCHPβCD induced apoptosis

and necrosis, being the most sensitive the HaCaT and SCC25 cells and the least sensitive to, the SCC9. ATC and ATCHPβCD significantly reduced the release of PGE2

in all the SCC cell lines tested. ATC and ATCHPβCD significantly reduced the release of IL-6 and IL-8 in SCC9 and SCC25 cells. These results are promising for a better understanding of the pharmacological properties of ATC and the inclusion complex

ATCHPβCD as potentials alternatives as pos-surgical topical adjuvants in the treatment

of squamous cell carcinoma of the tongue.

Key Words: Carticaine. Hidroxypropyl-β-cydextrine. Squamous carcinoma cells. Interleukin-6. Interleukin-8. Prostaglandins.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Estrutura molecular dos anestésicos locais 32

Figura 2 - Estrutura molecular da articaína 33

Figura 3 - Estrutura molecular da HPβCD 40

Figura 4 - Microfotografias das células HaCaT e SCC 46

Figura 5 - Espectros de emissão de fluorescência do ATCHPβCD 55

Figura 6 - Cinetica de complexação do ATCHPβCD 56

Figura 7 - Estequiometria de complexação do ATCHPβCD 56

Figura 8 - Termogramas da ATC, HPβCD e do ATCHPβCD 57

Figura 9 - Espectro 1RNM da ATC 58

Figura 10 - Espectro 1RNM da HPβCD 58

Figura 11 - Espectro 1RNM do ATCHPβCD 59

Figura 12 - Espectro 2D ROESY do ATCHPβCD 59

Figura 13 - Microscopia eletrônica de varredura do ATCHPβCD 61

Figura 14 - Liberação in vitro da ATC e do ATCHPβCD 62

Figura 15 - Efeito citotóxico da ATC e do ATCHPβCD 64

Figura 16 - Efeito da ATC e do ATCHPβCD sobre a proliferação celular 65

Figura 17 - Efeito da HPβCD e da doxorrubicina sobre a proliferação celular 66

Figura 18 - Apoptose celular por citometria de fluxo 67

Figura 19 - Viabilidade celular por imunofluorescência 69 Figura 20 - Liberação de PGE2, IL-6 e IL-8 das células HaCaT 70

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Figura 22 - Liberação de PGE2, IL-6 e IL-8 das células SCC15 71

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Variação química dos H da ATC no complexo ATCHPβCD 58 Tabela 2 - Coeficientes de difusão (D), constante de associação (Ka)

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 14 2 REVISÃO DA LITERATURA 19 3 PROPOSIÇÃO 41 4 MATERIAL E MÉTODOS 42 5 RESULTADOS 55 6 DISCUSSÃO 73 7 CONCLUSÃO 82 REFERENCIAS 83

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1 INTRODUÇÃO

O carcinoma de células escamosas (CCE) é a doença maligna mais comum da cavidade oral (Rodrigues et al., 2014) e de cabeça e pescoço (Scully & Kirby, 2014). Sua prevalência mundial é variável, sendo a Índia e o Sul e Sudeste da Ásia as regiões com o maior número de casos. A incidência mundial é estimada em 275 mil casos por ano, com cerca de 14000 novos casos e 5000 mortes por causa desta doença no Brasil (Warnakulasuriya, 2010). A ocorrência do CCE na língua é a mais comum e associado com uma alta taxa de morte (Tang et al., 2012), particularmente a parte móvel, onde o tumor tende a mostrar um comportamento mais agressivo associado à alta frequência de metástases em linfonodos regionais (Bello et al., 2010). A presença de metástase linfática é um dos fatores prognósticos mais importantes para pacientes com CCE oral (Yuasa-Nakagawa et al., 2013). Apesar das técnicas cirúrgicas modernas e novas estratégias terapêuticas, especialmente novos quimioterápicos, as taxas de mortalidade para o CCE oral continuam a ser elevadas na maioria dos países, com uma taxa de sobrevida global em cinco anos geralmente menor do 50% (Warnakulasuriya, 2010).

A causa do CCE oral é multifatorial. Nenhum agente ou fator (carcinógeno) etiológico único tem sido claramente definido ou aceito, porém tanto fatores extrínsecos quanto intrínsecos podem estar atuando. É provável que mais do que um único fator seja necessário para produzir tal malignidade (cocarcinogênese). Os fatores extrínsecos incluem agentes externos tais como tabaco com fumaça, álcool, sífilis e luz solar (somente para cânceres do vermelhão do lábio). Os fatores intrínsecos incluem estados sistêmicos ou generalizados, tais como desnutrição geral ou anemia por deficiência de ferro. A hereditariedade parece não desempenhar um papel principal na causalidade do carcinoma oral. Vários carcinomas de células escamosas orais têm sido documentados em associação ou têm sido precedidos por uma lesão pré-cancerosa, especialmente a leucoplasia (Neville et al., 2016).

A carcinogênese oral é um processo multifocal altamente complexo que ocorre quando o epitélio escamoso é afetado por várias mutações genéticas. A sequência de alterações genéticas leva a mudanças histológicas como a hiperqueratose, displasia e carcinoma in situ; as quais representam eventos precoces no desenvolvimento da lesão pelo que são consideradas lesões pré-cancerosas. Posteriormente, a perda da

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E-caderina (polipeptídios de adesão expressos nas células epiteliais) e do colágeno IV (principal componente da membrana basal subepitelial) leva à invasão dessas células escamosas no tecido conjuntivo subjacente se produzindo o carcinoma de células escamosas invasivo (Rivera & Venegas, 2014; Tanaka & Ishigamori, 2011; Warnakulasuriya et al., 2007).

Neste processo, uma das proteínas envolvidas na carcinogênese oral é a p53. Esta proteína representa um dos principais fatores de transcrição que está implicada no controle do ciclo celular, apoptose e preservação da estabilidade genética (Massano et al., 2006). Mutações no gene p53 foram detectadas em mais de 50% dos casos de CCE (van Houten et al., 2002). A ativação do p53 foi relatada em vários processos, como danos ao DNA, hipóxia e ativação de oncogénes. Além disso, o p53 protege contra a formação do tumor evitando o acúmulo de células com dano do DNA, o que subsequentemente induz uma perda de função na maioria das neoplasias malignas (Maddocks & Vousden, 2011). Por tanto, a proteína p53 defeituosa produzida como consequência da mutação do gene p53 perde a sua capacidade de induzir apoptose celular, o que leva a uma multiplicação de células mutantes invadindo órgãos e tecidos adjacentes.

A apoptose é uma via de morte celular induzida por um programa estritamente regulado no qual as células destinadas a morrer ativam enzimas que degradam seu próprio DNA e as proteínas nucleares e citoplasmáticas. Este processo de morte celular acontece quando a célula é privada de fatores de crescimento ou quando o DNA celular ou as proteínas são danificadas sem reparo. A apoptose é caracterizada pela dissolução nuclear sem a perda da integridade da membrana. Enquanto a necrose constitui sempre um processo patológico, a apoptose auxilia muitas funções normais e não está necessariamente associada à lesão celular patológica. Além disso, a apoptose, em certos papeis fisiológicos, não desencadeia uma resposta inflamatória (Kumar et al., 2013). Neste ponto, um dado interessante é que a lidocaína, anestésico local de amplo uso na odontologia, em baixas concentrações reduz a viabilidade celular associada a uma perda do potencial de membrana mitocondrial e ativação da via intrínseca da apoptose celular (Oliveira et al., 2014, Werdehausen et al., 2007).

Nas células geneticamente alteradas em diferentes estágios de transformação, os circuitos celulares intrínsecos que provocam o aumento da proliferação celular e a

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sobrevivência celular também podem provocar a produção e secreção de mediadores inflamatórios (Feller et al., 2013). Esses mediadores biológicos geram um microambiente tumoral inflamatório que aumenta ainda mais a sobrevivência celular e a proliferação das células transformadas, além de promover a angiogênese e a evasão de respostas imunes protetoras (Colotta et al., 2009; Mantovani et al., 2008; Mantovani, 2010). Uma vez que um microambiente inflamatório for estabelecido, as interações recíprocas entre as células tumorais em evolução e suas células do estroma sustentam a proliferação de células cancerígenas e promovem a progressão do tumor (Hanahan et al., 2011; Coussens et al., 2002). Assim, fatores comuns de transcrição que normalmente regulam genes que produzem mediadores inflamatórios e genes que controlam a sobrevivência e proliferação celular são a ligação entre câncer e inflamação (Moore et al., 2010). Desses mediadores inflamatórios, a PGE

a mais frequentemente implicada no processo de carcinogênese oral como consequência de uma sobre expressão da COX-2 (Chang et al., 1999), fato que está associado a um mal prognóstico da lesão (Feller et al., 2013). A inibição seletiva da COX-2 tem sidosugerida como alvo na prevenção ou tratamento do CCE (Lee et al., 2002). De forma interessante, foi relatado que a lidocaína possui um efeito modulador no processo inflamatório diminuindo a liberação de IL-1β e IL-8 (Lahav et al., 2002; Lang et al., 2010) e que a bupivacaína inibe a expressão da COX-2 e a produção de PGE2 em macrófagos estimulados com LPS (Huang et al., 2008).

A prevenção e a detecção precoce do câncer oral continuam a ser os objetivos dos esforços para reduzir o impacto desta doença na população. A modalidade de tratamento primário do câncer oral é geralmente determinada de acordo com o estágio da doença, sendo o tratamento cirúrgico o principal suporte do tratamento particularmente em estágios avançados do câncer. A pesar dos eventos adversos da radioterapia como a mucosite, necrose óssea, dificuldade para engolir, alterações na fala, entre outras; a terapia de radiação de feixe externo e a braquiterapia têm sido utilizadas com sucesso como modalidade primária para o tratamento de pacientes com câncer oral de fase inicial e são o padrão na terapia adjuvante em casos pós-operatórios de pacientes com câncer de boca de estágio avançado (Day et al., 2003). Existe uma tendência emergente para o uso de quimioterapia em combinação com terapia de radiação e cirurgia para pacientes com câncer de cabeça e pescoço avançado, recorrente e metastático, embora a evidência seja limitada em relação ao

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benefício de sobrevivência quando usado para tratar pacientes com carcinoma de cavidade oral (Omura, 2014). A terapia coadjuvante inclui agentes quimioterápicos como cisplatina, carboplatina, 5-fluorouracilo, paclitaxel e docetaxel os quais representam alternativas de tratamento, porém custosas e altamente prejudiciais (Rivera, 2015). Por exemplo, a cisplatina, um dos antineoplásicos utilizados em carcinomas de cabeça e pescoço, causa com frequência neurotoxicidade, náuseas e vômitos pelo que seu uso é dose limitante (Kwok et al., 2011).

Na tentativa de compreender melhor o processo de carcinogênese na língua nos aspectos moleculares e teciduais, os modelos pré-clínicos in vitro são rotineiramente utilizados. Além disso, esta metodologia também é empregada em pesquisas para determinar a citotoxicidade e avaliar a síntese de diferentes biomarcadores, quando as células de carcinoma de língua são expostas a substancias que possam modular o processo de carcinogênese oral (Pavan et al., 2015; de Moura

et al., 2013).

Nesse cenário, nos últimos 30 anos, várias pesquisas têm sido desenvolvidas com o intuito de se estudar os efeitos dos anestésicos locais (AL) em diferentes tipos celulares. Por exemplo, Werdehausen et al., (2012) concluíram que a apoptose, em termos de citotoxicidade, induzida pelos AL sobre células Jurkat é concentração – dependente e independente da ligação éster ou amida da molécula, porém com uma correlação moderada da capacidade lipofílica dos AL.

Por outro lado, a articaína (4-metil-3-[2-(propilamino)-propionamido]-2-tiofeno-carboxílico, cloridrato do éster metílico), difere dos outros anestésicos locais do tipo amida, porque contém um anel de tiofeno. O anel de tiofeno permite uma maior solubilidade lipídica, o que facilita a difusão através da membrana nervosa rica em lipídeos para acessar os receptores alvos (McLure & Rubin, 2005). Além disso, a ATC é um dos AL mais solúveis em lipídeos, além de ser o único AL do tipo amida que contém um grupo éster no anel tiofeno, de modo que a biotransformação por hidrólise ocorre no plasma por colinesterases inespecíficas, formando ácido articaínico (metabolito inativo), o qual é parcialmente metabolizado no rim em ácido articaínico glucuronídeo, e por fim eliminado por esta via (Snoeck, 2012; Mojumdar & Lyubartsev, 2010; Vree & Gielen, 2005; Malamed, 2005).

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Os AL quando administrados em doses terapêuticas adequadas para obter anestesia local, são considerados medicamentos com uma ampla margem de segurança devido a seu efeito anestésico reversível e poucos efeitos adversos associados. No entanto, alguns estudos indicam que determinados anestésicos quando aplicados localmente podem aumentar o risco de parestesia oral (Garisto et

al., 2010) ou provocar contração muscular e rigidez (Sánchez et al., 2010). Estas

observações sugerem um potencial efeito citotóxico de alguns AL, especialmente da articaína (Hillerup et al., 2011a; Hillerup et al., 2011b), apontando a necessidade de se desenvolver novas metodologias para avaliar os possíveis efeitos antineoplásicos desses fármacos.

Além disso, novas formulações anestésicas vêm sendo desenvolvidas utilizando carreadores, tais como lipossomas e ciclodextrinas, com o objetivo de prolongar o efeito dos AL, melhorar a solubilidade e reduzir a sua toxicidade (Prado et

al., 2017; Serpe et al., 2014; Cereda et al., 2012; de Lima 2012; Shipton, 2012; de

Paula et al., 2010; Grant & Bansinath, 2001). As ciclodextrinas são cadeias cíclicas contento um número variado de unidades de glicoses. Estes carreadores são capazes de melhorar algumas propriedades físico-químicas de fármacos (Araújo et al., 2006) tais como a solubilidade aquosa e a farmacocinética (absorção, biodisponibilidade e distribuição pelos tecidos) (Roquette-Pharma, 2009; Loftsson & Duchene, 2007; Dollo

et al., 2000). Assim, novas formas mais compatíveis, menos tóxicas ao ser humano e

com melhores propriedades de carreamento de substâncias, foram desenvolvidas resultando nas formas 2-hidroxipropil-β-ciclodextrina; 2,6-dimetil-β-ciclodextrina e o sulfobutiléter de β-ciclodextrina. Esses derivados hidroxialquilados têm melhores propriedades orgânicas e são poderosos solubilizadores de fármacos, sendo utilizados para complexação de agentes antitumorais (doxorrubicina), antidiabéticos (tolbutamida), anti-inflamatórios (piroxicam) (Araújo et al., 2003), diclofenaco e progesterona (Scavone et al., 2016) e adjuvantes da anestesia local (clonidina) (Braga

et al., 2016).

Em resumo, o potencial citotóxico localizado, além da sua reduzida toxicidade sistêmica, junto a um aumento da solubilidade pela complexação com a HPβCD, faz da ATC uma molécula interessante para a análise do seu potencial como fármaco coadjuvante tópico local na terapia pós-cirúrgica no câncer oral.

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2 REVISÃO DA LITERATURA 2.1 Câncer oral

O câncer oral é uma neoplasia maligna que surge no lábio ou no interior da cavidade oral. É tradicionalmente definido como um carcinoma de células escamosas, porque 90% dos cânceres na cavidade oral são originados histologicamente nas células escamosas (Lingen et al., 2008). Tem diferentes níveis de diferenciação e uma propensão para a metástase ao nível dos linfonodos perto da lesão (Barnes L, 2005). Os locais mais comuns de apresentação do câncer oral são a língua (borda ventral-lateral), assoalho da boca e lábio inferior (Yellowitz et al., 2000; Bagan et al., 2010). Independentemente da acessibilidade da cavidade oral durante o exame clínico, o câncer oral geralmente é diagnosticado em estágios avançados. Os motivos mais comuns para isso são o diagnóstico errado inicial e a ignorância do paciente ou do profissional que trata (Markopoulos, 2012), o que, evidentemente, diminui as chances de sobrevivência, apesar das estratégias terapêuticas (Rivera & Venegas, 2014).

Em relatórios mundiais, os tipos de câncer de todas as regiões da cavidade oral e da faringe são agrupados e coletivamente representam o sexto câncer mais comum do mundo (Warnakulasuriya S, 2009). De acordo com os últimos relatórios da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) para o câncer oral que inclui lábios, língua, gengiva, assoalho da boca, parótida e glândulas salivais, a incidência anual é alta em todo o mundo, sendo mais de 300.000 casos diagnosticados, e a mortalidade anual é de aproximadamente 145.000 (Globocan, 2012).

2.1.1 Fatores de risco

O câncer oral é uma doença evitável, onde o tabagismo (Warnakulasuriya et

al., 2005) e o álcool (Ogden et al., 2005) são considerados fatores de risco principais.

Esses fatores estão presentes em 90% dos casos (Dissanayaka et al., 2012), tendo ambos um efeito sinérgico (Koontongkaew, 2013; Tanaka & Ishigamori, 2011).

Atualmente, existe muita evidência que estabelece que a fumaça de tabaco é cancerígena e causa câncer na cavidade oral e no pâncreas, por exemplo (Rivera, 2015). O risco de desenvolver câncer oral é 3 vezes maior em fumantes em comparação com não fumantes (Gandini et al., 2008). Além disso, o risco de câncer

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oral é 35% menor nas pessoas que deixaram de fumar há quatro anos do que aqueles que continuam fumando e não são mais elevados em pessoas com antecedentes de não fumar durante mais de 20 anos em comparação com pessoas que nunca fumaram (Marron et al., 2010). Um ambiente com fumaça de cigarro também é arriscado; o risco de câncer oral é 87% maior naqueles que nunca fumaram, mas foram expostos a um ambiente com fumaça de cigarro (tabagismo involuntário) em comparação com aqueles que nunca fumaram e não foram expostos (Lee et al., 2009). A fumaça do cigarro enfraquece a imunidade na cavidade oral através da promoção da gengivite, periodontite e câncer oral (Lee et al., 2012). Esta fumaça contém vários elementos que promovem o câncer e, basicamente, podem ser agrupados em três grupos distintos: nitrosaminas, benzopirenos e aminas aromáticas. Esses produtos químicos são chamados de pré-carcinógenos, que devem sofrer alterações coordenadas por enzimas oxidativas, de modo que o produto final se torna pobre em elétrons e em um agente para ser ligado covalentemente ao DNA, gerando em consequência uma mutação. Além da oxidação, o metabolismo enzimático ou não-enzimático também pode produzir carcinógenos, como os radicais livres, que possuem elétrons não emparelhados que os tornam extremamente reativos, sendo capazes de promover mutações por mecanismos complexos (Rivera, 2015). O consumo de tabaco expõe o epitélio oral aos radicais livres de oxigênio e nitrogênio que podem afetar mecanismos de defesa antioxidantes. Níveis elevados destes radicais livres são encontrados em lesões pré-cancerosas e no câncer oral (Choudhari et al., 2014).

A despeito que ainda é motivo de debate, o álcool (etanol) pode atuar como um fator de risco local e sistêmico. O uso contínuo de etanol aumenta a permeabilidade da mucosa oral e dilui os componentes lipídicos do epitélio, causando atrofia epitelial e interferência na síntese e reparo do DNA. Além disso, possui genotoxicidade e efeitos mutagênicos, causando diminuição do fluxo salivar; afeta a capacidade do fígado de eliminar compostos tóxicos ou potencialmente cancerígenos; e seu uso crônico está associado a um comprometimento da imunidade inata e adquirida, resultando em maior susceptibilidade a infecções e neoplasias (Reidy et al., 2011).

Apesar das evidências crescentes ressaltarem os sérios problemas de saúde associados ao tabagismo, mastigação do tabaco e ao abuso de álcool, esses fatores

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de risco ainda são responsáveis por 30-40% de todas as mortes relacionadas ao câncer (Ram et al., 2011).

Entre outros fatores de risco está o papilomavírus humano, principalmente associado ao carcinoma da orofaringe (Dalianis, 2014), e a radiação ultravioleta (UV). O IARC classifica o papilomavírus humano 16 (HPV16) e 18 (HPV18) como possíveis causas de câncer de cavidade oral, principalmente nas tonsilas faríngeas. As áreas mais comuns de carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço relacionadas ao HPV são as amígdalas e a base da língua na orofaringe, com uma taxa de prevalência de 75%. A presença de HPV é um biomarcador prognóstico estabelecido no câncer orofaríngeo localmente avançado (Kang et al., 2015). A evidência mostra que o HPV contribui para a carcinogênese por duas proteínas codificadas pelo vírus: a proteína E6 que promove a degradação do produto do gene supressor de tumor p53; e a proteína E7 que promove a degradação do produto do gene do supressor de tumor pRb (proteína retinoblastoma) (Neville, 2009), causando uma desregulamentação do controle do ciclo celular, o que também leva a uma sobre expressão do inibidor da cinase dependente de ciclina p16Ink4a (Dalianis, 2014).

2.1.2 Fenômenos de adaptação e morte celular

A função normal celular requer de um equilíbrio entre as demandas fisiológicas e as restrições da estrutura celular e da capacidade metabólica; o resultado é um estado de equilíbrio ou homeostase. As células podem alterar seu estado funcional em resposta a um estresse leve para manter o estado de equilíbrio. Um maior estresse fisiológico ou estímulos patológicos adversos (lesão) podem produzir: (a) adaptação, (b) lesão reversível ou (c) lesão irreversível e morte celular (Kumar, 2013).

A adaptação se produz quando os fatores estressantes fisiológicos ou patológicos induzem um novo estado que modifica as células preservando a sua viabilidade se opondo aos estímulos exógenos. Essas mudanças incluem: hiperplasia (aumento do número de células), hipertrofia (aumento da massa celular), atrofia (diminuição da massa celular) e metaplasia (cambio de um tipo de célula madura por outro) (Kumar, 2013).

A lesão reversível produz câmbios celulares patológicos que podem ser restabelecidos à normalidade se o estímulo ou a causa da lesão for leve. A lesão

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irreversível se produz quando os fatores estressantes excedem a capacidade da célula para se adaptar e consequentemente produzem mudanças patológicas permanentes que causam a morte celular. Os dois padrões morfológicos de morte celular são a necrose e a apoptose. Embora a necrose representa sempre um processo patológico, a apoptose pode acontecer em algumas funções normais e não se associa necessariamente com a lesão celular (Kumar, 2013).

A necrose é o tipo de morte celular mais habitual, caracterizado por edema celular, desnaturalização e coagulação de proteínas, destruição de organelas e lise celular. Geralmente resulta afetando um grande número de células do tecido envolvido.

A apoptose ou morte celular programada se produz quando uma célula morre pela ativação de um programa interno estreitamente regulado. A função da apoptose é eliminar de modo seletivo as células não desejadas, com uma alteração mínima das células circundantes e do hóspede. A membrana plasmática celular permanece intacta, porém a sua estrutura alterada, de modo que a célula apoptótica fica como alvo de fagocitose. A célula em apoptose é rapidamente eliminada antes da saída do seu conteúdo, e portanto a morte celular por esta via não desencadeia uma resposta inflamatória no hóspede (Kumar, 2013).

O processo de apoptose é controlado por uma família de proteases de cisteína específicas de aspartato, chamadas de caspases que representam uma classe de aproximadamente 12 proteases diferentes. Elas são sintetizadas como pró-enzimas inativas e iniciam ou executam a apoptose quando ativadas por clivagem em locais específicos (Cohen, 1997; Werdehausen et al., 2007). Existem dois mecanismos bem caracterizados para a ativação da cascata da caspase: a via extrínseca, que é iniciada por receptores de morte na superfície celular; e a via intrínseca, que é caracterizada por mudanças na integridade mitocondrial (Budihardjo et al., 1999).

A via extrínseca é iniciada por ligantes específicos que se unem ao receptor de morte da superfície celular, levando à ativação das caspases. Estes receptores de morte são uma família de proteínas transmembrana que pertencem à superfamília dos receptores da necrose tumoral e fatores de crescimento nervoso (Ashkenazi & Dixit, 1998). Essa via envolve três etapas distintas: trimerização do receptor induzido pelo

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ligante, recrutamento de proteínas intracelulares associadas ao receptor, e ativação de caspases (Budihardjo et al., 1999).

Em geral, os receptores de morte na superfície celular se ligam a moléculas específicas, como TNF e CD95L. Esta ligação forma o complexo de sinalização indutor da morte (DISC), que é composto por um ligante, o receptor, moléculas adaptadoras e o iniciador de caspase, especialmente caspase-8 ou caspase-10 em alguns casos

(Voelkel-Johnson, 2005). No DISC, as caspases são ativadas por dimerização e clivagem autoproteolítica. Isso leva à ativação da caspase-3 e clivagem de outros substratos celulares, que são responsáveis pelas mudanças morfológicas e pela morte celular (Werdehausen et al., 2007).

A apoptose na via intrínseca é ativada em resposta a numerosos estímulos, incluindo danos ao DNA, estresse no retículo endoplasmático, privação de citocinas ou ligação de alta afinidade aos receptores de antígenos. O estímulo induz a permeabilização da membrana externa mitocondrial, resultando na liberação de fatores apoptogênicos do espaço interno da membrana mitocondrial (Strasser, 2005; Tischner et al., 2010). O citocromo c é o principal fator pró-apoptótico (Li et al., 1995) A permeabilização da membrana mitocondrial externa é regulada por uma interação complexa de membros individuais das famílias de células de linfoma B-2 (Bcl-2), que são divididas em dois subgrupos. Os membros da família Bcl-2 anti-apoptóticos incluem Bcl-2, Bcl-xL, Bcl-w, Mcl-1 e Bfl-1/A1. Por outro lado, os membros pro-apoptóticos são subdivididos em proteínas Bax/Bak (Bax, Bak e Bok) e grupos proteicos BH3-only (Tischner et al., 2010).

A indução da apoptose faz com que as proteínas BH3-only ativem as proteínas do tipo Bax e Bak, promovendo a mudança conformacional e a formação de poros na membrana mitocondrial externa, liberando o citocromo c(Antignani & Youle, 2006). O citocromo c liberado irá interagir com Apaf-1, e caspase-9, formando o apoptosoma. Isto será responsável pela clivagem da pro-caspase-3 em caspase-3, iniciando a cascata de caspases e posterior apoptose (Werdehausen et al., 2007; Budihardjo et

al., 1999). A caspase-3 inibe à proteína iK (inibidora de uma DNase no núcleo celular);

degrada a lamínula nuclear (que forma os filamentos internos da membrana nuclear); e degrada a gelsolina (reguladora de filamentos de actina do citoesqueleto). Todos

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esses eventos promovidos pela caspase-3 ativa levam à formação de corpos apoptóticos para a sua posterior fagocitose.

2.1.3 Carcinogênese

O CCE na cavidade oral se desenvolve ao longo de muitos anos e, durante este período, vários sítios neoplásicos se transformam e ocorrem na cavidade oral (Tanaka & Ishigamori, 2011). A carcinogênese oral é um processo multifatorial altamente complexo que ocorre quando as células epiteliais são afetadas por várias alterações genéticas (Neville, 2009). Provavelmente, a carcinogênese oral começa com a transformação de um número limitado de queratinócitos normais. Esta transformação pode ser expressa através de alterações citogenéticas e processos epigenéticos que modificam a progressão do ciclo celular, mecanismos de reparo do DNA, diferenciação celular e apoptose, que podem ser causados por mutação aleatória, por exposição a uma variedade de fatores biológicos, cancerígenos ou erros no processo de reparo do DNA (Feller et al., 2013), resultando em um queratinócito instável em um ambiente pré-cancerígeno e levando a alterações neoplásicas malignas (Feller et al., 2013), que podem doar essas alterações aos seus clones. Posteriormente, as pressões de seleção sobre o microambiente da mucosa oral podem atuar sobre a população clonal heterogênea, permitindo perpetuar essas células com melhores ferramentas e vantagens de adaptabilidade, sobrevivência e proliferação acima de suas células vizinhas normais (Feller et al., 2013; Merlo et al., 2006). A tumorogênese requer múltiplos elementos essenciais: um potencial replicativo ilimitado, autossuficiência em sinais de crescimento, falta de sensibilidade aos sinais anti-crescimento, capacidade de evadir a apoptose, aumento da angiogênese, invasão e metástase (Hanahan & Weinberg, 2000). Evidências recentes sustentam que os sinais biofísicos e bioquímicos do tumor associados à matriz extracelular influenciam as características essenciais do câncer e, portanto, são essenciais para a malignidade (Pickup et al., 2014).

As alterações genéticas nos queratinócitos nas capas epiteliais levam a mudanças histológicas na mucosa oral. Tanaka & Ishigamori, (2011) detalham essas alterações na mucosa em vários estágios: (a) estado normal, (b) hiperplasia papilar, (c) displasia leve, (d) displasia moderada, (e) displasia severa, (f) carcinoma in situ e (g) carcinoma invasivo de células escamosas (bem diferenciado). A partir deste ponto,

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se produz a migração por via sanguínea ou linfática de essas células cancerosas provenientes de uma lesão inicial (metástase). Na displasia celular se apresentam algumas características morfológicas como perda da polaridade nuclear, perda da uniformidade; pleomorfismo considerável e núcleos grandes e hipercromáticos.

2.1.4 Microambiente Tumoral

Por vários anos, o câncer tem sido considerado um processo autônomo celular em que mutações consecutivas nos oncogenes e genes supressores de tumores levam à proliferação infinita de células neoplásicas (Kenny et al., 2007). Assim, as estratégias terapêuticas contra o câncer foram focadas e limitadas em tais mutações dentro das células tumorais (Koontongkaew, 2013). No entanto, evidências crescentes indicam que a gênese e a progressão do tumor são determinadas tanto por células tumorais quanto pelo microambiente tumoral (Zhang & Liu, 2013).

Foi indicado que para o controle eficaz do câncer, a gênese e progressão do tumor não deve apenas ser considerado como um processo celular autônomo, mas predominantemente como uma doença que envolve complexas interações multicelulares heterotípicas dentro do tecido recém-formado e o tecido canceroso original. Além disso, a doença deve ser considerada como uma doença sistêmica de tecido tumoral sólido em vez de uma doença isolada. Portanto, o conceito de microambiente tumoral foi proposto como um aspecto integral e área essencial de tecidos cancerosos (Liotta & Kohn, 2001).

O microambiente tumoral contém numerosos tipos de células, incluindo fibroblastos, fibroblastos associados ao câncer, miofibroblastos, células de músculo liso, células endoteliais e os seus precursores, pericitos, neutrófilos, eosinófilos, basófilos, mastócitos, T e células B, células natural killer e células apresentadoras de antígenos, como macrófagos e células dendríticas (Rivera & Venegas, 2014).

Apesar de um recrutamento marcado de células imunes, os fibroblastos associados ao câncer são as células mais abundantes do microambiente tumoral. Estas células são geralmente identificadas pela expressão de α-actina do músculo liso, que é semelhante à expressão de miofibroblastos que acontece no local de cicatrização de feridas e inflamação crónica, no entanto, está ausente nos fibroblastos normais da pele (Shimoda et al, 2010; Räsänen & Vaheri, 2010).

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Os fibroblastos associados ao câncer podem ser diferenciados localmente dos fibroblastos normais ou das células mãe do estroma circundante que são derivadas das células mesenquimais da medula óssea, que é recrutada pelo tumor (Xouri & Christian, 2010). Certas evidências indicam que esses fibroblastos remodelam mecanicamente a matriz extracelular, através do uso de proteases, para facilitar a invasão de células cancerosas (Koontongkaew, 2013). Estudos anteriores demonstraram a existência de um diálogo molecular entre os fibroblastos associados ao câncer e as células tumorais. Estas últimas segretam IL-1α, que estimula a secreção de uma quimioquina, resultando na progressão do tumor (Jung et al., 2010). A presença aumentada destes fibroblastos no CCE tem sido associada a um padrão de invasão difusa, preparando o meio ambiente para a invasão e metástase (de‑Assis

et al., 2012), com um prognóstico desfavorável (Thode et al., 2011).

2.1.5 Inflamação e Câncer Oral

O processo inflamatório é caracterizado pela ativação e recrutamento de células imunes e inflamatórias para o tecido vascularizado danificado. O processo é complexo e requer de uma cascata de sinalização totalmente orquestrada para estabelecer uma comunicação entre os leucócitos infiltrados, endotélio, epitélio residente, macrófagos e músculo liso através de mediadores químicos o qual gera um conjunto de respostas locais e sistêmicas (Kumar, 2013).

A característica única do processo inflamatório é a reação dos vasos sanguíneos que leva ao acúmulo de líquido e leucócitos nos tecidos extravasculares. A resposta inflamatória está estreitamente interligada com o processo de reparo. A inflamação serve para destruir, diluir ou desligar o agente prejudicial e desencadeia uma série de eventos que tentam curar e reconstituir o tecido danificado. O reparo começa durante as primeiras fases da inflamação, mas atinge a conclusão, geralmente após a neutralização da causa. Durante o reparo, o tecido danificado é substituído por regeneração de células parenquimatosas nativas, preenchendo o defeito com tecido fibroso (cicatrização) ou, mais comumente, por uma combinação destes dois processos (Kumar, 2013).

Dentro dos mediadores químicos do processo inflamatório estão a PGE2 e

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que atuam na ativação celular e se comunicam com muitos tipos de células, sendo importantes mediadores inflamatórios. A ligação dessas proteínas aos receptores transmembrana resulta em mudanças na síntese de ARN e na expressão proteica, afetando a dinâmica da matriz extracelular, aumentando a expressão da fibronectina e a permeabilidade do endotélio à adesão e infiltração de neutrófilos, leucócitos e macrófagos (Kraychete et al., 2006; Choudhary & Ahlawat, 2008).

Durante o processo de carcinogênese, as células mutagênicas são exacerbadas pela inflamação crônica (Goto et al., 2014). O papel primário nessa ligação é desempenhado por citocinas produzidas por células cancerosas, bem como células imunes ativadas (Mantovani et al., 2008). A IL-6, uma citocina pleiotrópica com uma variedade de atividades biológicas, é secretada por diferentes tipos de células, incluindo macrófagos, linfócitos T e B, fibroblastos, células endoteliais, queratinócitos e células cancerígenas (Kishimoto et al., 2005). Após a IL-6 ser sintetizada em uma lesão local no estágio inicial da inflamação, ela se move para o fígado através da corrente sanguínea, seguida da indução rápida de uma extensa gama de proteínas de fase aguda, como a proteína C-reativa (PCR), amiloide sérico A (SAA), fibrinogênio, haptoglobina e α1-anti-quimiotripsina (Heinrich et al., 1990). Por outro lado, a IL-6 reduz a produção de fibronectina, albumina e transferrina (Gillmore et al. 2001). Além de ser uma citocina pró-inflamatória, a IL-6 também regula processos regenerativos, metabólicos e neurais através da via ras/raf/Mitogen-activada quinase (MAPK) (Scheller et al., 2014). Cabe salientar que no processo inflamatório crônico presente no CCE existe uma alta expressão de IL-6 em células tumorais o que foi significativamente associada com um prognóstico desfavorável nos pacientes com esta neoplasia (Chen et al., 2012; Jinno et al., 2015). Além disso, o possível envolvimento da sinalização de IL-6 na resistência à quimioterapia e à radioterapia foi documentado em estudos recentes (Chen et al., 2010; Han et al., 2013; Yan et al., 2014).

A IL-8 é considerada o protótipo da família das quimiocinas. É pró-inflamatória em sua natureza e é liberada pelos neutrófilos e macrófagos em resposta a vários estímulos, incluindo ambiente químico, esteroides, sinais inflamatórios e estresses ambientais. Esses estímulos ativam a via do fator nuclear-kappa-B (NF-kB) e isso, por sua vez, ativa a expressão da produção de IL-8. A IL-8 age através de dois receptores

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estruturalmente semelhantes, mas antigênicamente diferentes, o 1 e o CRCX-2. Estes receptores estão localizados em macrófagos associados a tumores, neutrófilos e células cancerígenas. A presença dos receptores em células cancerígenas sugere fortemente que os níveis de IL-8 representam um aspecto importante para o microambiente das células cancerosas (Waugh & Wilson, 2008). A patogenicidade em células cancerosas é derivada do recrutamento de neutrófilos, potencial angiogênico, proliferação, sobrevivência, migração de células endoteliais vasculares, proteção contra apoptose e, finalmente, metástase (De Larco et al., 2004). O papel desta citocina no câncer também pode ser postulado a partir do fato de que o tratamento de lesões cancerígenas com agentes quimioterápicos como o 5-fluorouracilo, entre outros, reduz a expressão de IL-8 (Collins et al., 2000; De Larco et

al., 2001).

O TNF-α é uma molécula pleiotrópica que desempenha um papel central na inflamação, desenvolvimento do sistema imunológico, apoptose e metabolismo lipídico (Salek-Ardanaki & Croft, 2010; Van Herreweghe et al., 2010; Chen et al., 2009; Hehlgans & Pfeffer, 2005). O TNF-α também está envolvido em várias condições patológicas incluindo a migração e invasão celular no câncer (Wu & Zhou, 2010). O TNF-α é produzido por uma grande variedade de células imunes, epiteliais, endoteliais e tumorais; é montado intracelularmente para formar um homotrímero não covalentemente ligado que é expresso na superfície celular (Tang et al., 1996).

De acordo com uma pesquisa sobre carcinoma de células renais, pequenas doses de TNF-α no microambiente do tumor podem aumentar a proliferação, invasão e metástase de células tumorais, aumentar os glóbulos brancos, formar vasos sanguíneos e induzir à elevação de outras citocinas (por exemplo, fator de angiogênese e metaloproteinases da matriz) e desencadeiar a transição epitelial-mesenquimatosa das células tumorais (Ho et al., 2012). Além disso, um experimento animal demonstrou que ao silenciar o gene TNF-α se inibe a proliferação e migração de células cancerígenas gástricas (Sun et al., 2016). No entanto, como o TNF-α promove invasão e metástase de células tumorais não está claro. Pesquisas extensas sobre a via TNF-α/NFkB/Snail confirmaram que o TNF-α pode regular a expressão do fator de transcrição Snail para induzir a transição epitelial-mesenquimatosa e promover as atividades invasivas e migratórias das células tumorais (Zhu et al., 2015).

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O TNF-α envolve cascatas de caspases, fatores de transcrição, fator nuclear kappa B (NF-kB) e proteína ativadora 1 (AP-1), envolvidos na inflamação, regulação do sinal, crescimento celular e morte (Leong & Karsan, 2000). A sobre expressão de IL-8, IL-6 e TNF-α no CCE e outras lesões neoplásicas orais estaria relacionado com o seu potencial pro-angiogênico e pró-inflamação, pelo que seria de grande valor diagnóstico (Rhodus et al., 2005).

A ciclooxigenase (COX) catalisa a síntese de prostaglandina (PG) a partir do ácido aracidônico. Enquanto a expressão constitutiva da COX-1 é importante para a homeostase, a COX-2 está sobre expressada na inflamação e doenças. O aumento da expressão epitelial de COX-2 e a produção de PGE2 podem promover a

carcinogênese através da ativação cruzada do receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR), e o uso regular de fármacos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) reduz a incidência de carcinoma (Bosetti et al., 2006). Tanto a displasia oral como o CCE expressam níveis aumentados de COX-2 (Chan et al., 1999; Renkonen

et al., 2002; Atula et al., 2006). O estudo realizado por Husvik et al. (2009)

demonstraram que a estimulação do fator de crescimento epidérmico (EGF) induziu a expressão de COX-2 (mas não de COX-1) e o aumento da produção de PGE2, a qual

foi atenuada pela inibição específica de COX-2 (mas não de COX-1) ou pelo bloqueio do gene COX-2 mediado por siRNA.Assim, foi comprovado que a produção de PGE2

em linhas celulares de CCE é COX-2 dependente. Por tanto, o bloqueio seletivo da COX-2 poderia prevenir a carcinogênese oral ou ser utilizado como tratamento adjuvante para o carcinoma oral, já que inibe a PGE2 dependente de COX-2 em

células SCC em proliferação (Minter et al., 2003).

2.1.6 Tratamento do CCE

O prognóstico de pacientes com CCE continua a ser desfavorável, apesar dos avanços terapêuticos nesta e em muitas outras doenças malignas. O diagnóstico e o tratamento precoce continuam a ser a chave para melhorar a sobrevivência dos pacientes (Mehrotra & Gupta, 2011).

Entre as abordagens para o tratamento do CCE estão incluídas a cirurgia, radioterapia (radioterapia externa e/ou braquiterapia) e a terapia coadjuvante (quimioterapia com agentes como cisplatina, carboplatina, 5-fluorouracilo, paclitaxel e

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docetaxel) (Huang & O’Sullivan, 2013). A pesar de serem utilizados de forma rotineira, muitos desses medicamentos possuem um alto custo econômico e representam alternativas altamente tóxicas (Rivera, 2015).

O CCE é normalmente tratado por uma ou uma combinação dessas alternativas. A escolha de uma ou outra depende não apenas da localização, tamanho e estágio do tumor primário; mas também das comorbidades apresentadas pelo paciente, o estado nutricional, a sua capacidade de tolerar o tratamento e ao desejo do paciente de enfrentar a terapia (Huber & Tantiwongkosi, 2014). Em tumores ressecáveis, a cirurgia representa a melhor terapia por ser superior a todas as outras alternativas (Rivera, 2015; Yao et al., 2007). Aproximadamente um terço dos pacientes com CCE são diagnosticados na doença do estágio I/II. A terapia local/regional inclui cirurgia, radioterapia ou uma combinação de ambos. Um bom prognóstico para esses pacientes, com taxas de cura de 80% (estágio I) e 65% (estágio II) é esperado (Guneri & Epstein, 2014). Infelizmente, a maioria dos casos de CCE são diagnosticados em estágios avançados da doença (III ou IV) (Kowalski & Carvalho, 2000), com sobrevida a 5 anos menos de 50% (Viet & Schmidt, 2012) e uma cura de 30% (Yao et al., 2007; Guneri & Epstein, 2014). Os pacientes com doença metastática, que não são tratados, mostram uma sobrevida de cerca de 4 meses (Kowalski & Carvalho, 2000).

O câncer oral causa danos substanciais na função da fala, deglutição e mastigação, onde a dor é o principal sintoma. Entre as causas do início ou exacerbação da dor, existem mediadores no microambiente do tumor, falta de terapia paliativa, inervação trigeminal densa e função oral contínua, dor por tratamento e tolerância aos opióides (Viet & Schmidt, 2012).

2.2 Anestésicos locais

O início da era da anestesia local aconteceu em 1884, quando a cocaína foi utilizada clinicamente com sucesso pelo médico oftalmologista Carl Koller. No entanto, os efeitos tóxicos, a farmacodependência e mortes relacionadas à cocaína levaram a suspender seu uso clínico (Gröger & Schmidt-Wyklicky, 2012).

Em 1905, a anestesia local volta a crescer em popularidade com a introdução da procaína sintetizada por Alfred Einhorn e colaboradores. Infelizmente, o fraco efeito

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anestésico e os altos índices de reações anafiláticas associados aos anestésicos locais do tipo éster limitaram o seu uso (Yagiela et al., 2011).

A anestesia local moderna tem início com a introdução dos anestésicos locais do grupo amida, primeiramente com a lidocaína em 1943 e mais tarde com a bupivacaína (Wiles & Nathason, 2010). Desde esse momento até hoje, os anestésicos locais desse grupo que apresentam uma ampla margem de segurança são os fármacos mais comumente administrados na prática odontológica (Sambrook & Goss, 2011).

2.2.1 Mecanismo de ação

De forma geral, os anestésicos locais atuam na membrana celular impedindo a geração e condução dos impulsos nervosos. Bloqueiam a condução diminuindo ou prevenindo o aumento transitório da permeabilidade de Na+ das membranas

excitáveis (Strichartz & Ritchie, 1987). Essa ação dos anestésicos locais é devido a sua interação direta com os canais de Na+ voltagem-dependentes (Brunton et al.,

2011).

As moléculas dos anestésicos locais em seu estado básico não ionizado entram por difusão ao citoplasma da célula nervosa e, internamente, sofrem um processo de ionização. Deste modo essas moléculas, no estado catiônico, obtêm acesso ao seu sitio de ligação no interior do canal quando o canal de Na+ está no estado aberto e,

porque elas se ligam com maior afinidade estabilizando o estado inativo do canal de Na+ (Butterworth & Strichartz, 1990; Strichartz & Ritchie, 1987; Courtney & Strichartz,

1987).

2.2.2 Estrutura molecular dos anestésicos locais

Na molécula dos anestésicos locais é possível distinguir três frações (Figura 1): Um núcleo aromático que é primariamente responsável pela solubilidade lipídica do fármaco, derivado do ácido benzoico, da anilina ou do tiofeno. Adicionando mais grupos a este nível aumenta a lipofilicidade do composto. A parte hidrófila é um aminoderivado do álcool etílico ou do ácido acético. Determina a solubilidade da molécula e o seu grau de ligação às proteínas do plasma. Assim, todos os anestésicos locais são anfipáticos, ou seja, possuem características lipofílicas e hidrofílicas, em

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geral nas extremidades da molécula. A estrutura do anestésico se completa por uma cadeia de hidrocarboneto intermediaria contendo uma ligação de éster ou de amida, o que determina a sua classificação (Malamed, 2004).

Figura 1. Estrutura molecular dos anestésicos locais de tipo amida. O gráfico representa a estrutura da lidocaína, anestésico local padrão desse grupo. (Adaptado

de Malamed, 2004)

2.2.3 Articaína

No grupo das amidas, a articaína, originalmente sintetizada como carticaína, entrou na prática odontológica em 1973 (Ferger & Marxkors, 1973). Atualmente, a articaína 4% com epinefrina 5 μg/mL é amplamente utilizada na odontologia (Snoeck, 2012). A articaína (4-metil-3-[2-(propilamino)-propionamido]-2-tiofeno-carboxílico, cloridrato do éster metílico), difere dos outros anestésicos locais do tipo amida, porque na sua estrutura molecular contém um anel de tiofeno (Figura 2). O anel de tiofeno permite uma maior solubilidade lipídica, o que facilita a difusão através da membrana nervosa rica em lipídeos (McLure & Rubin, 2005).

Figura 2. Estrutura molecular da articaína. Se destaca em cor verde o anel tiofeno e em vermelho o grupo éster (Fonte: autoria própria)

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A ATC bloqueia a condução nervosa por ligação reversível a subunidade α dos canais de Na+ dependentes de voltagem, semelhante a outros anestésicos locais

(Snoeck, 2012).

Além disso, a ATC contém um grupo éster no anel tiofeno, de modo que a sua biotransformação por hidrólise ocorre no plasma por colinesterases inespecíficas, formando ácido articaínico (metabolito inativo), o qual é parcialmente metabolizado no rim em ácido articaínico glucuronídeo, e por fim eliminado por esta via (Snoeck, 2012; Mojumdar & Lyubartsev, 2010; Vree & Gielen, 2005). A ATC é lipossolúvel, altamente ligada às proteínas plasmáticas (94%), e tem uma constante de dissociação (pKa) de

7,8 (Mather & Tucker, 2009). É um anestésico local de potência intermediária, de curta duração com um rápido início de ação (McLure & Rubin, 2005). Quando administrada com epinefrina 1:100 000 ou 1:200 000 atinge um Tmax = 22 min e um tempo de meia

vida de 44 min, aproximadamente (Hersh et al., 2006).

2.2.4 Mecanismos de toxicidade dos anestésicos locais

No contexto geral, o efeito clínico dos anestésicos locais, assim como alguns efeitos colaterais especialmente no sistema cardiovascular e o sistema nervoso central, é devido à interação com locais específicos nos canais de Na+ voltagem

dependentes (Shipton, 2012; Nau & Wang, 2004).

No entanto, os AL não só bloqueiam canais de Na+, já que também possuem a

capacidade de bloquear canais de Ca2+ e K+ (Wang et al., 2011; Xion & Strichartz,

1998; Guo et al., 1991), receptores de potencial transitório vaniloides tipo 1 (Hirota et

al., 2003), e outros receptores operados por ligando. Os AL podem também

interromper o acoplamento entre algumas proteínas G aos seus receptores associados (Hollman et al., 2005; de Paula & Schreier, 1996). Através desta ação, os anestésicos locais exercem efeitos anti-inflamatórios, em particular sobre reações iniciadoras de neutrófilos (Hollman et al., 2001).

Aparentemente os mecanismos pelos quais essas moléculas exercem efeitos citotóxicos não estão relacionados com o seu papel no bloqueio dos canais de Na+

voltagem dependentes (Grishko et al., 2010; Kamiya et al., 2005). As moléculas dos AL interagem com os fosfolipídios das membranas celulares resultando em uma desregulação da atividade de enzimas como a proteína kinase C, fosfolipase A2 e com

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o metabolismo energético da mitocôndria, além de interferir em outras vias de comunicação celular (Szewczyk & Wojtczak, 2002).

Numerosos estudos foram desenvolvidos com o objetivo de estudar os efeitos celulares dos AL, utilizando distintos tipos de células. Alguns destes estudos demonstraram que os AL são capazes de induzir alterações de conformação do citoesqueleto de fibroblastos (Pierzchalska et al., 1998) e eritrócitos (Nishiguchi et al., 1995); alterações na proliferação de células epiteliais da córnea (Hirata et al., 2004) e fibroblastos de pulmão (Nishina et al., 2002); e alterações na viabilidade celular em condrócitos articulares humanos (Jacobs et al., 2011), células de linfoma (Werdehausen et al., 2007), células de neuroblastoma (Werdehausen et al., 2009), células de Schwann e neurônios (Johnson et al., 2004). Da mesma forma, Grouselle

et al. (1990) mostraram que os AL altamente lipossolúveis podem chegar à

mitocôndria e modificar o potencial de membrana de fibroblastos 3T3, e estudos realizados por Villarruel et al. (2011) demonstraram que a lidocaína é capaz de estimular a apoptose em fibroblastos gengivais humanos. Perez-Castro et al. (2009) demostraram que tanto a lidocaína quanto a bupivacaína induzem a apoptose pela ativação da caspase -3/-7 pelo aumento do tempo de exposição ou do aumento da concentração desses anestésicos locais em células de neuroblastoma.

A neurotoxicidade local produzida pelos AL é um fenômeno conhecido o qual é determinado pela lipofilicidade. No estudo in vitro de Werdehausen et al. (2012) demostraram que a citotoxicidade sob células de linfoma T (Jurkat) produzida por oito diferentes anestésicos locais, dentro deles a articaína, foi concentração-depende. A apoptose foi observada com concentrações baixas dos AL, enquanto a necrose com concentrações maiores. Os valores de LC50, após 24 h de tratamento, dos diferentes

anestésicos locais rendeu a seguinte ordem decrescente de toxicidade: tetracaína, bupivacaína, ropivacaína, prilocaína, lidocaína, articaína e mepivacaína; sugerindo à articaína como um dos anestésicos com menor efeito citotóxico sobre aquela linhagem celular.

Em outro estudo, Oliveira et al. (2014) avaliaram a citotoxicidade precoce e tardia produzida por diferentes concentrações de uma formulação comercial de lidocaína 2% contendo epinefrina 1:100.000 sobre fibroblastos de mucosa oral expostos por 30 min, 1, 6, 12, 24 e 48 h. Avaliaram a função celular ao nível

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mitocondrial e citoplasmática usando como reagentes a calceina/homodimero-1 de Etidio e MTT/WST-1. Os resultados mostraram que concentrações ≥ 5% de lidocaína são capazes de reduzir significativamente a viabilidade celular. Concentrações a partir de 1% alteraram significativamente a fisiologia celular. O estudo de microanálise de raios X electron-probe demostrou que esses efeitos estão associados a apoptose. Os testes de atividade celular MTT e WST-1 tenderam a diminuir em resposta ao aumento crescente dos tempos de incubação para a maioria das concentrações de lidocaína, e para as concentrações crescentes de lidocaína.

2.2.5 Anestésicos locais e a modulação do processo inflamatório

Vários estudos têm relatado os efeitos dos AL sobre a modulação de diversos mediadores do processo inflamatório. A lidocaína mostrou efeitos anti-inflamatórios em cultura de células epiteliais intestinais estimuladas com TNF-α, inibindo a secreção de IL-1β e IL-8, além de aumentar a secreção do receptor antagonista de IL-1 que corresponde a um mediador anti-inflamatório (Lahav et al., 2002). De Klaver et al. (2003) demonstraram a capacidade da lidocaína para reduzir as lesões induzidas por citocinas nas células endoteliais e no músculo liso vascular. Em outro estudo, o tratamento com lidocaína foi capaz de suprimir a liberação de IL-8 e IP-10 após estimulação com TNF-α em cepas de células intestinais de adenocarcinoma T-84 e HT-29 (Lang et al., 2010).

Da mesma forma, a lidocaína (0,05% a 0,5%) e a bupivacaína (0,00125% a 0,125%) reduziram a liberação de IL-1β em leucócitos humanos estimulados durante 24 h com LPS in vitro (Sinclair et al., 1993). A ropivacaína e a lidocaína também conseguiram suprimir a secreção de inflamaçãomediadores como LTB-4 e IL-1 em granulócitos (Martinsson et al., 1997).

De Iuliis et al (2001) demonstraram que a bupivacaína leva a uma redução de IL-1β, IL-6 e TNF-α em macrófagos, enquanto a IL-2 e a IL-4 foram reduzidas em fibroblastos de ratos.A bupivacaína também reduziu significativamente a produção de PGE2 e a expressão de COX-2 após a indução por LPS em macrófagos de ratos

ativados (Huang et al., 2008). A lidocaína e a ropivacaína foram capazes de inibir a ativação induzida por TNF-α de Src ao bloquear a sinalização ao nível do receptor-1 do TNF-α(TNF-R1).A ativação de Src está envolvida com a permeabilidade vascular

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aumentada e adesão de células inflamatórias ao endotélio e em metástases tumorais (Piegeler et al., 2012; Piegeler et al., 2014; Piegeler et al., 2015; Guarino, 2010; Kim

et al., 2009).

Utilizando células BV-2 (microgila murina) tratadas com endotoxina 50 ng/mL, a levobupivacaína (25 e 50 μg/mL) prejudica significativamente a regulação positiva de PGE2, quimiocina MIP-2 e as citocinas TNF-α, IL-1β,e IL-6 induzida por LPS nessa

linhagem celular (Huang et al., 2013).

Os efeitos anti-inflamatórios dos AL ocorrem em um intervalo de concentrações que não afeta a viabilidade celular. Apesar dos avanços, o mecanismo anti-inflamatório desses fármacos não está totalmente elucidado. Os efeitos inibitórios da lidocaína contra várias citocinas e quimiocinas sugerem um efeito sobre uma via celular comum (Henkel et al., 1993; Brown et al., 1995).

2.3 Complexos de inclusão com ciclodextrinas

As ciclodextrinas são oligossacarídeos macrocíclicos unidos por ligações glicosídicas α-1,4 com interesse importante na química supramolecular. Eles têm estrutura anelar e a capacidade de produzir complexos de inclusão, que representam encapsulamentos verdadeiros no nível molecular (Bruschi, 2015).

Os primeiros estudos sobre ciclodextrinas começaram no final do século XIX com as observações do cientista francês Villiers. Ele observou cristais dispersos em álcool deixados após a produção de dextrinas a partir de amido, utilizando uma cultura bacteriana impura (Villiers, 1891). A composição química e algumas propriedades químicas desses cristais foram determinadas e, durante o século XX, várias pesquisas foram realizadas para caracterizar as ciclodextrinas, bem como elucidar seu mecanismo de produção por diferentes microrganismos (Loftsson & Duchêne, 2007).

2.3.1 Classificação

As ciclodextrinas são classificadas de acordo com o número de unidades de glucopiranose que possuem na sua estrutura. Portanto, quando a molécula de ciclodextrina possui seis unidades de glucopiranose, a denominação é α-ciclodextrina. Para sete e oito unidades de glucopiranose, elas são denominadas β-ciclodextrina e γ-ciclodextrina, respectivamente.

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Devido à conformação das unidades de glucopiranose, unidas através de ligações α-1,4-glicosídicas, essas estruturas supramoleculares possuem características atraentes. O espaço interno da molécula de ciclodextrina é hidrofóbico, enquanto o exterior é composto por grupos hidroxilo, apresentando comportamento polar ou hidrofílico. Esta característica permite a formação de complexos de inclusão com moléculas ou grupos das mesmas moléculas que apresentam diferentes polaridades. As ciclodextrinas em forma de cone truncado possuem uma cavidade cônica e afiada de 0,78 nm de profundidade, enquanto que os diâmetros superior e inferior aumentam com o número de unidades de glicose (Bruschi, 2015).

Assim que a estrutura cíclica das moléculas de ciclodextrina foi divulgada, propôs-se que elas pudessem incluir moléculas na cavidade. As moléculas lipofílicas podem caber no anel para formar complexos de inclusão solúveis. Devido à cavidade hidrofóbica, as ciclodextrinas têm capacidade de inclusão com uma variedade de substâncias, desde íons até moléculas pequenas, oligonucleótidos e proteínas. A β-ciclodextrina possui o anel com o tamanho correto para várias moléculas de agentes ativos. Estequiometrias diferentes são possíveis, mas normalmente uma molécula do agente ativo se associa com uma molécula de ciclodextrina para formar complexos reversíveis (Bruschi, 2015).

Suas características estruturais determina a aplicação da ciclodextrina como solubilizante para substâncias químicas pouco solúveis em água e como modificador da administração de fármaco. O miconazol, itraconazol, piroxicam, indometacina, digitoxina, naproxeno, hidrocortisona, diazepam e pilocarpina são exemplos de fármacos que melhoraram a sua biodisponibilidade devido ao aumento da solubilidade (Bruschi, 2015).

Com o objetivo de melhorar as características farmacêuticas das ciclodextrinas nativas (solubilidade, capacidade de inclusão, capacidade controlada de liberação de fármaco e redução da toxicidade), foram obtidos alguns compostos semissintéticos. Para isso, modificações químicas são utilizadas para incorporar grupos metilo, etilo, hidroxietilo, carboximetilo e hidroxipropilo nas estruturas originais, fornecendo derivados com diferentes solubilidades (derivados altamente solúveis, anfifílicos e hidrofóbicos). Hoje em dia, mais de 30 tipos são comercializados como produtos farmacêuticos (Bruschi, 2015).

Referências

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