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A ÁGUA , O H OMEM E O SEU HABITAT

No documento Frentes de água. Ao encontro do rio (páginas 33-36)

2.2 F RENTES DE ÁGUA A ORIGEM

2.2.3 A ÁGUA , O H OMEM E O SEU HABITAT

ùÀ partida temos, pois, as cidades de água. Sabemos como a água constitui um dos elementos iniciáticos da formação da maior parte das cidades. Por outro lado, consideramos às vezes a água, como elemento da paisagem, mas temos dificuldade em a ùimaginarù como componente fundamental das cidades!ù (Ferreira V. M., 1997)

A água, como se tem vindo a expor, é um elemento que tem forte influência e importância para o Homem e, como tal, é fácil perceber que este recurso natural teve um poder decisivo na formação e no crescimento das aglomerações mais primitivas, verificando-se que estas se estabeleciam, preferencialmente, junto a corpos de água. Para além da localização, a presença de água foi, ainda, determinante para a definição da forma e do padrão urbano.

Debruçando a atenção sobre estas cidades que se relacionam diretamente com corpos de água, percebe-se como estas se moldam em função do elemento líquido. No caso dos rios, estes tanto cortam a cidade, presenciando-se o crescimento urbano da mesma em ambas as margens do mesmo, como servem de fronteira entre cidades diferentes, resultando na equação de um rio, para duas cidades. Esta particularidade era especialmente evidente nos tempos mais remotos, pois as pessoas não tinham conhecimentos suficientes para alterar a natureza, moldando o seu ambiente consoante o que a natureza dispunha (Butuner, 2006).

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O interesse pela localização próxima de manifestações naturais de água tem motivado opiniões. Butuner (2006) defende que a água era considerada um elemento de defesa, um recurso essencial para a produção agrícola, um local de comércio, um meio de transporte e um ponto fulcral para usos industriais. Teixeira (1998) refere-se aos corpos de água como embriões de nascimento de muitas e importantes cidades, defendendo que estes representavam o ponto de união entre povos e uma fonte de prosperidade económica, mas também o perigo de ataques de bandidos e de países inimigos. Costa (2009) aponta que o desenvolvimento dos centros urbanos nas margens de rios tem uma índole comunicativa, pois sendo a cidade o local de excelência para a realização de trocas comerciais, o rio/mar constituía o meio mais acessível para transporte de mercadorias e ligação com outros povos. A presença da água esteve, assim, na génese de muitas cidades, as populações fixavam-se junto da água criando as primeiras raízes de diversas urbes que evoluíram e se converteram em cidades ou metrópoles com grande importância na atualidade. Segundo Gottman, referido por Teixeira (1998), no grupo das 300 maiores cidades mundiais da atualidade, mais de dois terços encontram-se localizadas na proximidade de água, pelo que facilmente se compreende a influência da mesma.

De acordo com Moughtin (2001), a cidade ao ser estruturada pode incluir quatro tipos de manifestações de água (Figura 7). O primeiro é a fonte, que tem uma conotação mágica associada com as grutas, as nascentes e os poços sem fundo. A descendência urbana das nascentes são as fontes ou bebedouros que se enquadram, geralmente, no centro das atividades e são o ponto-de-encontro da comunidade, localizando-se, principalmente, nas praças de comércio da qual se apresenta como exemplo a fonte da Praça do Geraldo em Évora na Figura 7(a). O segundo tipo são as piscinas ou lagoas, que se traduzem em espaços de reflexão, contemplação e recreio e que ganham valor na paisagem urbana quando aliadas ao verde de árvores, plantas e a jardins, como exemplo sugere-se o lago presente no Jardim de São Lázaro no Porto, cuja Figura 7 (b) ilustra. O terceiro tipo é o curso linear de água que corre através das cidades sob a forma do um rio ou canal. O rio no seu estado selvagem (primitivo) assume uma imagem impressionante e pode ser muito destrutivo. Assim, a convivência do rio com a cidade pressupõe algum domínio por parte do Homem sobre o rio, por exemplo desde implementação de sistemas de regularização de caudais como espelhos de água (os mais simples que podem até conviver com a própria cidade) até grandes barragens, que normalmente se localizam a grandes distâncias das povoações mais próximas. Sendo exemplo deste tipo de manifestação o espelho de água do rio Tua, em Mirandela - figura 7 (c). O quarto e último tipo de presença de água na cidade é a linha de costa, ou seja, é confronto com mar ou do oceano. Representa a orla da cidade, o espaço onde outro mundo começa e que se associa tanto a perigos como a possibilidades. Várias são as cidades de Portugal que partilham os seus limites com a linha de costa, sendo que na figura 7 (d) se apresenta uma delas ù a cidade de Espinho.

A fixação das primeiras aglomerações junto a corpos de água é um facto indiscutível. No entanto, a evolução da civilização e o crescimento demográfico não permitiu que todos os núcleos urbanos se concentrassem junto a corpos de água e como o Homem que não dispensa a presença de água no seu

habitat, desde cedo, foi descortinando métodos artificiais de inserir a água no seu espaço urbano,

complementando e valorizando os espaços da sua vida quotidiana (Patrocínio, 2006).

Numa perspetiva mais próxima da atualidade, Lourenço (2011) refere a água como um elemento indispensável e um elemento ameaçador no espaço público da cidade, encarando este duplo sentido como um desafio que impera regular. Entende que a presença de um corpo de água pode ser vista como ùù uma barreira, um obstáculo, um fim urbano e até como um limite associado à demarcação

da linha entre ela e a cidade, entre o vazio e o cheio.ù. No entanto, refere ser essencial considerar o

seu poder de ligação com a cidade, na medida em que ùù a água pode ser ela própria espaço público

15 Figura 7 ù Tipos de manifestações de água, segundo Moughtin (2001)

Castro (2011) aponta a água como uma mais-valia nas cidades, pela expressão que garante ao espaço e pela possibilidade de se desenvolver, nestas zonas de proximidade à água, espaços de lazer capazes de transmitir sentimentos de serenidade e de repouso que enaltecem a paisagem e oferecem uma dinâmica especial e uma identidade própria à cidade.

É nestas perspetivas que os espaços que fazem fronteira com a água ganham importância como espaços de oportunidade para serem vividos e usados pelas pessoas.

Está-se, assim, perante o conceito de frente de água.

Em tempos, espaços de conquista, de comunicação, de defesa, de sobrevivência, de fronteira e um obstáculo territorial.

Hoje, um desafio para recuperar o simbolismo dos laços patrimoniais entre a cidade e a água, através da melhoria, reestruturação, recuperação e revitalização do existente (parque edificado, espaços públicos, espaços naturais, etc.) procurando criar um ambiente singular e identitário da história da cidade bem como da sua herança cultural (Lourenço, 2011).

(a) Fonte existente na Praça do Geraldo, em Évora. [Fonte: http://paisagensdeportugal- familiapereira.blogspot.pt/2012/06/alent

ejo-evora.html]

(b) Lago existente no Jardim de São Lázaro, no Porto. [Fonte: http://silvatexas.blogspot.pt/2011/03/min

ha-infancia-ou-criancices-de- alguem.html]

(c) Rios: Espelho de água no Rio Tua. [Fonte:

http://trasosmontesnet.blogspot.pt/2012/ 12/a-descoberta-de-mirandela-espelho-

de.html]

(d) Cidade de Espinho limitada a oeste pela linha de costa. [Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthre

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No documento Frentes de água. Ao encontro do rio (páginas 33-36)