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E SPAÇO PÚBLICO E NQUADRAMENTO

No documento Frentes de água. Ao encontro do rio (páginas 59-62)

O espaço público sempre desempenhou um papel fundamental na história das cidades. Era nas praças públicas que se realizavam julgamentos, punições, comícios e tomadas de decisão, promovendo a interação e socialização entre as pessoas (Magalhães, 2009; Carvalho, 2011) ù Figura 16.

Porém no final do século XVII, essa faceta do espaço público como promotor de momentos de socialização alterou-se, passando estes a acontecer cada vez mais em espaços fechados como cafés ou salões particulares (Carvalho, 2011). A vida pública assumiu uma nova forma que, mais recentemente, se tem vindo a materializar na frequência dos grandes centros comerciais.

No entanto, a necessidade natural do Homem de manter contacto social e vida no exterior, enfatizada pelo período de crise económica que se atravessa, afasta-o dos locais de consumo, pelo que, na atualidade observa-se um regresso aos espaços exteriores públicos e abertos.

O espaço público assume-se como um elemento fundamental da cidade, desempenhando funções importantes que influenciam a vida dos cidadãos, segundo Magalhães, logo a seguir à habitação e ao local de trabalho (Magalhães, 2009). O espaço público é capaz de despoletar sentimentos de bem-estar na população e promover a interação entre as pessoas, sendo um dos palcos mais importantes para a

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ocorrência de vida social (Sieber, 2008). E, por isso, estes ùpedaçosù da cidade assumem uma importância fundamental na vida das pessoas.

Figura 16 ù Exemplos de momentos de sociabilização no espaço público

Sieber (2008) defende os espaços públicos exteriores como essenciais à cultura mediterrânica, considerando que a sua existência nas cidades é quase uma questão de sobrevivência para a relação entre o cidadão e a sua cidade. Os espaços públicos exteriores permitem que as pessoas se movimentem consoante as suas necessidades, se encontrem ou reencontrem ou que, simplesmente, deem um passeio (Sieber, 2008).

Amaral (2005), citando Santos, considera que o espaço, como ponto de partida da interpretação geográfica, deve ser entendido como um ùsistema de objetosù e um ùsistema de açõesù ou como ùhorizontalidadeù e ùverticalidadeù. Ou seja, quando se analisa o espaço deve ter-se em consideração as relações sociais e sua materialização. Citando Santos (1996), Amaral (2005) define que ùo espaço é

formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistema de objetos e sistema de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá [ù ]. Os objetivos não têm realidade filosófica, isto é, não nos permitem o conhecimento, se os vemos separados dos sistemas de ações. Os sistemas de ações também não se dão sem os sistemas de objetos. ù.

Portas (1969) partilha a mesma ideia, defendendo ser errado separar a cidade arquitetural da cidade social, pelo que pensar a cidade deve englobar o conjunto de relações entre as peças que a compõe, ao invés de estudá-las independentemente como se não existissem relações e dependências entre as mesmas. Paralelamente, pensar o espaço público implica refletir sobre o seu aspeto físico tendo em vista o campo social, nomeadamente como as decisões sobre o primeiro, poderão afetar o desenrolar de momentos sociais como um simples encontro entre duas pessoas. Mais do que uma estrutura urbana, a cidade é o reflexo do conjunto de indivíduos que a ùviveù diariamente nas suas rotinas. Importa, por isso, ter consciência das necessidades específicas e diferenciadas que caracterizam esse conjunto, essa cidade. Apenas a reflexão sobre a identidade do local permite concretizar espaços públicos que sejam atrativos ao cidadão, nomeadamente, alcançar o objetivo que está por trás de cada ùcriaçãoù de espaço público, que é torná-los atrativos, seguros e vividos.

(c) Comícios e tomadas de decisão em praça pública.

[Fonte:

http://westerlund10.wikis.birmi ngham.k12.mi.us/mitchells+a

ncient+greece+wiki+terms] (b) Julgamento e punição em

praça pública. [Fonte: http://www.brasiliana.usp.br/b

bd/handle/1918/624520088] (a) Democracia em praça

pública, povo Grego [Fonte:

http://veiasdahistoria.blogspot .pt/]

41 Uma cidade vazia de pessoas, que não é vivida, é apenas um ùesqueletoù destinado ao abandono e à desintegração (Bettencourt, 2010). Evidencia-se, assim, que concretizar um espaço público urbano exige mais do que o desenho urbano adaptado à configuração física do local, é fundamental conhecer, interpretar e questionar a traça da comunidade urbana em questão.

O espaço público não se esgota na sua forma e materialidade, a sua essência está no conjunto do que é o espaço físico e visível, das pessoas que o vivem e usam, bem como do contexto envolvente da cidade onde este se assume. É um espelho da natureza do local e da complexidade do Homem e, como tal, pensar e estudar o espaço público requer a integração de várias disciplinas (Carvalho, 2011). Definir a qualidade de um espaço público exige uma avaliação cuidada centrada no espaço, na cidade e nos seus utilizadores. Vários especialistas se dedicam ao estudo do espaço público enquanto objeto de observação, de análise e, consequentemente, de avaliação, destacando-se, nesse âmbito, várias referências bibliográficas importantes dentro do tema da avaliação do espaço público.

Procurando perceber os distintos conceitos, formas de interpretação, de avaliação e, eventualmente, de quantificação da qualidade de um espaço público em termos mais genéricos, foram analisadas sete obras que apresentam, cada uma delas a visão dos respetivos autores sobre as diferentes formas de interpretar e avaliar o espaço público, sugerindo para tal efeito, dimensões e características consideradas as qualidades necessárias para a concretização de espaços públicos de eleição, nomeadamente para o sucesso dos mesmos dentro da comunidade.

A análise de cada obra, seguido do cruzamento das diferentes propostas, permitirá estabelecer uma lista de premissas sobre a qualidade do espaço público e o que os diversos autores consideram ser um espaço público de qualidade. Do cruzamento da opinião dos diversos autores procurar-se-á encontrar e, considerando a adequação ao tipo de espaço público que se pretende analisar, os indicadores que, à partida, serão os mais relevantes para garantir um espaço público de qualidade em frentes de água. As obras de referência analisadas foram as seguintes:

x Bently, I. et al (1985). Responsive environments : a manual for designers. Oxford: Architectural Press.

x Lynch, K. (1999). A boa forma da cidade. Lisboa: Edições 70.

x Madden, K. (1999) How to turn a place around? A hand book for creating successful

public spaces. New York: Project for public spaces, Inc.

x Brandão, P. (2002). O chão da cidade. Guia da avaliação do design de espaço público. Almada: Centro Português do Design.

x Alves, F. B. (2003). Avaliação da qualidade do espaço público urbano. Proposta

metodológica. Fundação Calouste Gulbenkian. Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

x Burton, E., & Mitchel, L. (2006). Inclusive Urban Design - Streets for Life. Great Britain: Architectural Press.

x Gehl, J. (2010). Cities for people. Washington: Island Press.

No ponto seguinte será apresentada uma análise mais detalhada de cada uma das obras que permita distinguir a interpretação que cada autor atribui à qualidade do espaço público bem como as dimensões e indicadores que considera mais relevantes na sua avaliação.

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3.3 ESPAÇO PÚBLICO.AAVALIAÇÃO

No documento Frentes de água. Ao encontro do rio (páginas 59-62)