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Capitulo 4 – NOVA METODOLOGIA DE PARAMETRIZAÇÃO DAS

4.2. Âmbito da proposta

Entender o contexto e os fundamentos expressos nos capítulos anteriores torna claro e percetível o âmbito desta metodologia. Isto é, perceber porque é que durante quase 40 anos foi possível desenvolver uma política de sobreprodução habitacional. Significa que, durante este período, os municípios não estavam dotados de instrumentos eficazes ou de regulamentação capaz de contrariar a procura de localizações rústicos integrados no perímetro urbano e classificados como urbanizáveis. Isto significa que a intenção de comprar localizações não era sempre com a vontade de urbanizar, mas sim de encontrar localizações baratas para adquirir o direito a urbanizar e de gerar uma mais-valia ao proprietário. Este processo “roleta de casino” permitiu a acumulação de riqueza aos proprietários – que no seu grosso eram entidades que detinham um elevado poder financeiro, como bancos, seguradoras, imobiliárias – conduzindo fundamentalmente à acumulação das mais-valias em detrimento do desenvolvimento sustentável da cidade.

Caso o município pretendesse intervir em nome do interesse público, necessitava de expropriá-las, restituindo o valor da localização, não pelo uso existente antes da aprovação do Plano, mas com as mais-valias que este gerou. Em consequência, o proprietário, sem fazer nada, mais tarde ou mais cedo, podia colher as mais-valias geradas pela Administração. Agravando a situação, o governo aprovou uma quarta alteração ao Código das Expropriações com o Decreto-lei n.º 56/2008,de 4 de Setembro, que assegura que as mais-valias são integralmente capturadas pelos privados.

Por outro lado, um dos catalisadores na criação de mais-valias de uma localização são os investimentos públicos. Grandes investimentos – hospitais, universidades, vias rodoviárias, instalações de eletricidade, gás, água, etc. – permitiam valorizar as áreas envolventes. Se estes investimentos vêm de fundos maioritariamente públicos, e se os

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proprietários das localizações vão usufruir desses investimentos, torna-se necessário contribuir para esse desenvolvimento. Torna-se justo que as mais-valias sejam taxadas consoante uma determinada avaliação que os investimentos públicos geraram naquela área, garantindo uma parametrização geral. Daqui decorre a redução do valor da localização, facilitando aos interessados em adquirir o imóvel uma maior liberdade financeira em investir no mesmo com processos de reabilitação que o valorizem de uma forma real.

Em Portugal, esta questão é completamente omissa no sistema de planeamento urbanístico. A singularidade deste sistema é feita destas omissões e traduz-se na adoção de um modelo perequativo19 em que se assume que as mais-valias são integralmente apropriadas pelos particulares e se opta por tributar as mais-valias urbanísticas em sede de IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas) e de IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares), associando-as a ganhos de capital. Estamos perante uma confusão entre lucros de uma atividade normal de promoção imobiliária e ganhos resultantes exclusivamente de decisões da Administração, a qual é reveladora de que, por via dos Planos Municipais de Ordenamento do Território e de declarações de interesse público, a Administração Pública gera mais-valias simples que o mercado reconhece, mas permite que sejam os privados a capturá-las na sua totalidade, revelando-se incapaz de as recuperar em favor da comunidade (Guinote, 2008).

Na perspetiva de atuar contra a especulação, é preciso definir medidas específicas que garantam que o uso do solo tem uma orientação na defesa de uma cidade sustentável, e que o investimento feito na compra da localização é um passo intermedio no investimento para se conseguir mais-valias no imóvel. Isto inclui a adoção de uma divisão entre o bem económico e o bem natural, por diferenciação da avaliação do imóvel e pela localização. Logo, é preciso um processo iterativo entre uma metodologia de avaliação sustentável e o plano de pormenor, de forma a conseguir uma classificação.

Para isso acontecer, é preciso um algoritmo que classifique as áreas reforçando o plano de pormenor, transformando-o num dinamizador e não num plano de fiscalização. Adotando uma iteração, como por exemplo, o MARUS e o plano de pormenor, é possível

19Decreto-Lei n.º 380/99 de 22 de Setembro, revisto pelo Decreto-Lei n.º 310/203 de 10 de Dezembro; «Princípios da perequação

97 ter uma base de classificação das localizações para poder realizar a retenção das mais- valias, de forma a criar uma relação de uniformização das mais-valias consoante a avaliação.

Este processo não tende a servir de base a uma política tecnocrática, mas exatamente o oposto. O MARUS tem de servir como instrumento de apoio a orientação política, na implementação dos pontos de interesse público e no combate à especulação fundiária. Como se pode ver na Figura 14, o processo tem como objetivo as medidas sustentáveis da cidade com o intuito de valorizarem, de forma classificativa, determinadas áreas. Deste modo, com a avaliação sustentável da localização é possível a criação da parametrização das mais-valias, o que permite, a quem investir no imóvel, ter capital para fazer investimentos significativos no domínio da reabilitação energética ou uma construção de domínio social/ambiental.

Figura 14 – Organigrama do modelo dinâmico para os procedimentos urbanísticos

Pelo que foi referido, propõe-se a revisão do atual modelo de seleção de localizações em Portugal, atribuindo a obrigatoriedade fiscal como fator decisor na escolha da localização

Medidas Sustentáveis

Iteração

Reformulação

Estudo Prévio

MARUS

Plano de

Pormenor

Apoio Técnico

Decisão

Política

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pelos agentes promotores que tenham intenções de realizar operações urbanísticas. No final da obra deve ser entregue um comprovativo com a classificação do nível de sustentabilidade da localização, sob a forma de certificado de sustentabilidade, que poderá servir de base no parâmetro ocupação do solo, no cálculo do IMI20, de acordo com a Figura 15.

Figura 15 – Classificação e retenção das mais-valias consoante o nível de sustentabilidade das localizações

Para o nível A+ é atribuído um valor de retenção total das mais-valias por se tratar de uma localização de interesse local demasiado importante. Com esta retenção permite-se evitar a expropriação e facilitar a aquisição das localizações por parte do poder local. Os restantes valores devem ser atribuídos em intervalos constantes, sem nunca exceder o valor das mais-valias líquidas.

No caso do cálculo do nível de sustentabilidade, existem precedentes a nível nacional que podem servir de base para o que aqui se propõe. Desta forma, e como referido anteriormente, é possível, com trabalhos a nível de sustentabilidade no plano de pormenor e da classificação das localizações a partir do MARUS, efetuar intervalos quantitativos que permitam agravar ou desagravar a retenção das mais-valias, em que os parâmetros de avaliação devem ser elaborados e definidos nacionalmente, não promovendo uma falsa competitividade sustentável, de modo a não criar um caminho de “quem oferece menos condições”.

20Fonte: “Taxas e Procedimentos Sustentáveis em Operações Urbanísticas” de Dinis Leitão (2011), que sugere a alteração do atual

IMI por um IMI sustentável.

Maior retenção

Total

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