A formação reticular é uma região de estrutura complexa, que ocupa toda a parte central do tronco encefálico, do bulbo ao mesencéfalo. A formação reti cular é assim chamada por causa da grande quantidade de fibras nervosas, dis postas em forma de rede, ocupando os espaços entre os neurônios dessa região. Aliás, as células nervosas aí encontradas têm características especiais, com uma árvore dendrítica ramificada e axônios que geralmente emitem muitos colaterais, podendo assim atingir alvos localizados em regiões distintas.
A formação reticular não é homogênea, e no seu interior podem ser iden tificados numerosos núcleos com características citoarquitetônicas diferentes e com conexões próprias. Se a considerarmos como um todo, contudo, podemos dizer que a formação reticular tem conexões com todo o resto do SNC.
A formação reticular recebe colaterais de todas as vias sensoriais e seus neurônios repassam essas informações ao tálamo e ao córtex cerebral, o que é importante, pois elas atuam na ativação do córtex e na manutenção do estado de vigília. N a formação reticular, identificam-se áreas implicadas no desencadea mento do sono e suas fases constituintes, como o sono dos movimentos oculares rápidos, ou sono paradoxal. A formação reticular liga-se à medula espinhal, através de tratos retículo-espinhais, e participa do controle da motricidade, sen do importante na manutenção do tônus postural. Influencia ainda os processos sensoriais, podendo, por exemplo, inibir a entrada das informações dolorosas, através de circuitos que promovem uma analgesia central.
Um aspecto notável da formação reticular é que no seu interior encon tram-se grupamentos de neurônios que utilizam as monoaminas (dopamina, noradrenalina e serotonina) como neurotransmissores. Os terminais monoami- nérgicos distribuem-se para múltiplas regiões do SN C e parecem ter uma função moduladora nos locais onde atuam. A serotonina é encontrada em vários núcleos situados na linha mediana, que levam o nome de núcleos da rafe. A noradrena lina é encontrada em vários núcleos, entre os quais se destaca o chamado locuj ceruleiut (região azul), uma região pigmentada que se localiza dorsalmente, na porção mais rostral da ponte. A dopamina é encontrada na área tegmental ven tral, um grupamento neuronal da formação reticular mesencefálica.
CEREBELO
O cerebelo, ou pequeno cérebro, situa-se abaixo da porção posterior do cérebro e em posição dorsal ao tronco encefálico ( F ig u r a 10 ) , ao qual se liga por feixes de fibras nervosas denominados pedúnculos cerebelares. No cerebelo, encontramos um revestimento de substância cinzenta, o córtex cerebelar, e in teriormente um corpo medular formado por fibras nervosas, no qual podem ser vistos grupamentos de neurônios, os núcleos centrais do cerebelo.
Visão m edial do encéfalo, em corte sagital m ediano. (Baseado em H eim er, L, ( 1 9 9 5 ) . The H um an Brain and Spinal Cord, 2®. ed. Springer Verlag, N.Y.)
Fig. 10
O córtex cerebelar tem um número impressionante de neurônios, o que rivaliza com o que é encontrado em todo o resto do SN C. Os circuitos aí pre sentes são complexos e capazes de funcionar rapidamente, de forma a sustentar a função cerebelar que está ligada principalmente ao controle da motricidade corporal. As fibras nervosas aferentes ao cerebelo dirigem-se basicamente ao córtex cerebelar e a informação que aí circula é remetida aos núcleos centrais, de onde saem as fibras eferentes.
O cerebelo interage com os núcleos vestibulares do tronco encefálico, que, por sua vez, recebem os impulsos originados nos receptores vestibulares do ouvido interno. E sses circuitos são importantes na manutenção do equilíbrio corporal. O cerebelo recebe também fibras originadas na medula espinhal, que trazem informações proprioceptivas ou cinestésicas de todo o corpo, que serão usadas para o controle da postura e dos movimentos, através circuitos que o cerebelo mantém com o tronco encefálico e com o córtex cerebral motor.2 O ce rebelo participa do planejamento motor e do controle dos movimentos delicados, executados pelas extremidades dos membros, por meio de circuitos reverberan- tes com o córtex cerebral.
Lesões cerebelares podem comprometer o equilíbrio corporal, provocar alterações no tônus postural ou dar origem a incoordenações motoras, com a presença de tremores, ataxia, dismetria etc.
Atualmente, estão se acumulando evidências de que o cerebelo não esteja envolvido apenas na função motora, mas também no próprio funcionamento cognitivo.
K interessante notar que o cerebelo é um centro motor dos mais importantes do SX G , mas não exerce controle direto sobre os motoneurônios da medula, pois suas ligações são indiretas, por intermédio de regiões motoras do tronco encefálico. O utro aspecto interessante é que o cerebelo, que tem dois hemisférios, interage com a m usculatura ipsilateral, ou seja, cada hemisfério cerebelar controla a m usculatura do mesmo lado do corpo.
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N E U R O P S I O O L O G I A H O J E
H IP OTÁLAM O
O hipotálamo é uma pequena região situada na base do cérebro e que pode ser vista também em cortes sagitais medianos, já que está situado na pare de do 3 ventrículo cerebral ( F ig u r a 10 ) . É uma região complexa, formada por muitos grupamentos neuronais, os núcleos hipotalâmicos, com características citoarquiteturais e conexões específicas.
Pode-se afirmar que a principal função do hipotálamo é a manutenção da homeostase, ou seja, a manutenção do meio interno dentro dos limites compatí veis com as funções vitais.
P ara executar suas funções, o hipotálamo recebe informações sobre as condições dos órgãos internos do corpo, além de outras, geralmente indiretas, referentes ao meio externo. Com base nessas informações, o hipotálamo irá exer cer suas funções, através de conexões com o sistema nervoso visceral periférico (simpático, parassimpático e sistema nervoso entérico), com o sistema límbico e com o sistema endócrino.
O hipotálamo é o principal centro regulador da atividade visceral. Há muito se sabe que estimulações no hipotálamo podem desencadear respostas simpáticas ou parassimpáticas, dependendo da região estimulada. O hipotálamo é também importante no fenômeno das emoções, particularmente nas suas ma nifestações periféricas. É uma região nodal do chamado sistema límbico e tem relações com áreas como o complexo amigdalóide, a região septal e o hipocampo, que são importantes para a regulação emocional (ver o item 9).
Além disso, é no hipotálamo que se dá a interação entre os dois principais sistemas reguladores do organismo, ou seja, entre o sistema nervoso e o sistema endócrino. E m neurônios hipotalâmicos (particularmente aqueles dos núcleos de nominados paraventricular e supra-óptico), ocorre o fenômeno da neurossecreção, pois eles produzem os hormônios oxitocina e vasopressina (hormônio antidiuréti- co), que são liberados em capilares sangüíneos na neurohipófise (também chamada de pituitária posterior). O utros núcleos hipotalâmicos produzem polipeptídeos que são conduzidos à adeno-hipófise por via sangüínea e aí regulam a secreção de cada um dos hormônios desta glândula. Como a adeno-hipófise (pituitária anterior) exerce um papel regulador sobre as demais glândulas endócrinas, resulta que o hipotálamo pode influenciar o funcionamento do sistema endócrino em geral. Con tudo, a secreção dos hormônios de liberação ou inibição pelo hipotálamo é regu lada, por sua vez, pela de retroalimentação, pois o nível sangüíneo dos hormônios produzidos pelas diferentes glândulas influencia o ritmo de sua produção.
No hipotálamo, ocorre a regulação de processos importantes para a sobre vivência, como a manutenção da temperatura corporal, a ingestão de alimentos e a ingestão e eliminação de água pelo organismo. O utro fenômeno importante aí integrado é o dos ritmos biológicos circadianos (cujo ciclo tem cerca de um dia de duração). O núcleo supraquiasmático do hipotálamo é o principal relógio bio-
lógico do organismo e recebe informações diretas vindas da retina, que servem para acoplar os ritmos internos com o ritmo claro/escuro da natureza.
M ais recentemente, têm-se tornado mais conhecidas as relações do sistema imunológico e o sistema nervoso. Sabe-se que substâncias liberadas no primeiro podem atuar no segundo, que, por sua vez, pode ter uma atividade regulatória nas respostas imunológicas. O hipotálamo é um centro importante da interação neuroimunológica.
NÚCLEOS DA B A Ü
Os principais componentes dos núcleos da base3 são o corpo estriado e suas extensões ventrais. O corpo estriado é formado pelos núcleos: caudado, putamen e globo pálido ( F ig u r a 1 1 ) . M ais recentemente, vem sendo considerada uma extensão ventral desses núcleos, representada pelo núcleo acumbente e o pálido ventral.
O corpo estriado recebe conexões de várias áreas do córtex cerebral e, por sua vez (por intermédio do tálamo), envia fibras que retornam, fechando o circuito e dirigindo-se, preferencialmente, às regiões do córtex frontal que têm funções motoras. E ssas vias têm um importante papel no planejamento e no controle da motricidade corporal. Lesões nessas áreas e circuitos provocam o aparecimento de alterações posturais, distúrbios do tônus muscular e movimen tos anormais. Sabe-se que na D oença de Parkinson desaparecem neurônios da substância negra, que utilizam a dopamina como neurotransmissor. A falta dessa substância nos terminais axonais no corpo estriado é responsável pelos sintomas dessa doença.
B A S E S E S T R U T U R A I S D O S I S T E M A N E R V O S O
Fig. 11
Os Núcleos da Base, vistos 'p o r transparência", no interior do en- céfalo. (Reproduzido de Cosenza, R.M. (1 9 9 8 ). Fundam entos de N euroanatom ia, 2" ed. Editora Guanabara Koogan, RJ.)
3 O s núcleos da base (ou gânglios da base) são grupamentos neuronais encontrados na região basal dos hemis férios cerebrais e neles se incluem, tradicionalmente, o corpo estriado e o complexo amigdalóide, ou am ígdala cerebral. E ste último, por ter funções muito diversas, merece sér considerado à parte. Por outro lado, muitos autores incluem ainda entre os núcleos da base o núcleo subtalâmico e a substância negra, estruturas que têm conexões importantes com o corpo estriado, embora se situem em regiões à parte.
N E U R O P S IC O L O G IA H O J E
E xistem evidências de que o corpo estriado não participe apenas do con trole motor, mas possa ter um papel mais amplo no controle do comportamento. Pacientes com a Síndrome de T ourette ou o transtorno obsessivo-compulsivo apresentam alterações no funcionamento do corpo estriado, que podem ser res ponsáveis pelas dificuldades no controle comportamental por eles exibidas.
O núcleo acumbente (ou accumbens) é uma extensão ventral da porção anterior do núcleo caudado, e tem merecido atenção porque recebe uma via dopaminérgica vinda do mesencéfalo (área tegmental ventral), que faz parte de um circuito cuja estimulação causa sensação de euforia e de bem-estar. E sse cir cuito é estimulado pelas drogas que causam dependência, como a cocaína ou a heroína. O núcleo acumbente, juntamente com o chamado pálido ventral, que é uma extensão do globo pálido, participa de um circuito que tem origem no córtex pré-frontal e em regiões límbicas (como o hipocampo e o complexo amigdalóide). E sse circuito tem analogia com o que é observado no corpo estriado, pois re torna, via tálamo, principalmente às regiões pré-frontais. Admite-se que ele seja importante como uma interseção límbico-motora, que regularia comportamentos com forte influência emocional e motivacional.
Ainda na base dos hemisférios cerebrais, abaixo da região onde se encon tra o estriado e o pálido ventrais, observa-se a substância inominada, uma região rica em grupamentos neuronais, entre os quais se encontra o núcleo basal de Meynert. E sse núcleo possui uma ampla projeção para o córtex cerebral, sendo a principal aferência cortical que utiliza a acetilcolina como neurotransmissor. O s neurônios desse núcleo tendem a desaparecer precocemente na D oença de Alzheimer, e a perda da inervação colinérgica do córtex tem sido implicada nos déficits cognitivos encontrados nessa patologia.