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Ações administrativas para efetivar a tutela da legalidade urbanística

No documento Direito e Processo Administrativo (páginas 52-55)

O MINISTÉRIO PÚBLICO NA JUSTIÇA ADMINISTRATIVA

4. Ações administrativas para efetivar a tutela da legalidade urbanística

4.1. A intervenção do Ministério Público

É na jurisdição administrativa que correm os meios processuais próprios para sancionamento da ilegalidade e reposição da legalidade urbanística.

Nesta jurisdição o Ministério Público, no exercício da legitimidade que para o efeito lhe é conferida por lei, exerce um papel preponderante na defesa dos valores constitucionais de proteção do ambiente e do urbanismo.

O Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais nos artigos 51.º e 52.º prevê uma acrescida possibilidade de intervenção do Ministério Público, regulando com toda a abertura possível as sua representação junto dessa jurisdição.

Por sua vez, o artigo 9.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e Fiscais, por sua vez, atribui legitimidade ativa ao Ministério Público para que este prossiga o tipo de procedimentos e ações que este entenda adequados do ponto de vista processual à defesa dos valores constitucionais e, designada e expressamente, aos do ambiente e urbanismo.

4.2. Ação administrativa especial

O Ministério Público tem legitimidade processual ativa para propor as ações administrativas especiais (e respetivos processos cautelares) capazes de obstar às ilegalidades ambientais e urbanísticas, em três vertentes fundamentais:

- Impugnação dos atos administrativos; - Condenação à prática de ato devido;

- Impugnação de mornas e declaração de ilegalidade por omissão;

Para qualquer um destes efeitos recorre-se à ação administrativa especial prevista no Título III (artigos 46.º a 96.º) que no seu Capítulo II dedica a Secção I (artigos 50.º a º a 65.º) à impugnação de

atos administrativos, a Secção II (artigos 66.º a 71.º) à condenação à prática de ato devido e a Secção III (artigos 72.º a 77.º) à impugnação de normas e declaração de ilegalidade por omissão. Embora se trate do mesmo meio processual – ação administrativa especial – tem particularidades específicas em qualquer dos casos, designadamente quanto à legitimidade e aos prazos de interposição.

Já a tramitação da ação (marcha do processo) é unitária, para qualquer das três vertentes.

Na ação administrativa especial o Ministério Público tem intervenção principal quando é autor, no uso da legitimidade ativa que lhe é conferida.

Quando não é autor, tem intervenção acessória, sendo-lhe entregue cópia da petição inicial e da contestação e notificada a junção do processo administrativo para efeitos de acompanhamento da ação e emissão de parecer nos termos do artigo 85.º do CPTA.

No caso das ações de impugnação de normas, no que ao Ministério Público respeita, têm particular importância as especificidades constantes das normas dos n.ºs 3, 4 e 5 do artigo 73.º do CPTA, segundo as quais:

− O Ministério Público pode pedir a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, sem necessidade da verificação da recusa de aplicação em três casos concretos a que se refere o n.º 1 do mesmo artigo (n.º 3);

− O Ministério Público tem o dever de pedir a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral quando tenha conhecimento de três decisões de desaplicação de uma norma com fundamento na sua ilegalidade (n.º 4);

− E para isso a secretaria, após o respetivo trânsito em julgado, remete ao Ministério Público junto do tribunal certidão das sentenças que tenham desaplicado, com fundamento em ilegalidade, quaisquer normas emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo (n.º 5).

4.3. A caducidade específica do direito de ação de impugnação dos atos nulos em matéria de urbanismo (artigo 69.º n.º 4 do RJUE)

A propósito de prazos para instauração da ação administrativa especial para impugnação de atos administrativos em matéria de urbanismo, impõe-se que seja feita uma particular referência à disposição do artigo 69.º, n.º 4, do RJUE, a partir da alteração introduzida pela Lei n. 60/2007, de 4 de setembro, segundo a qual caduca no prazo de 10 anos o direito de propor a ação, se os factos que determinaram a nulidade não forem participados ao Ministério Público nesse prazo.

Este prazo deve aplicar-se indistintamente aos atos urbanísticos que nasceram antes ou depois da entrada em vigor da lei nova, pois essa é a única solução consentânea com o disposto no artigo 297.º, n.º 1, do Código Civil: “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do

prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar”.

E neste caso, como a lei antiga não previa qualquer prazo, conta-se sempre, e sem mais, a partir da entrada em vigor da nova lei.

Ou seja, como a Lei n.º 60/2007 entrou em vigor em 3 de março de 2008 – teve uma vacatio legis de 180 dias – só a partir de 3 de março de 2018 é que podem começar a surgir casos de caducidade do direito de ação, por via desse prazo de 10 anos.

Finalmente, da interpretação literal da norma resulta que, uma vez feita a participação dos factos ao Ministério Público nesse prazo de 10 anos, não mais caduca o direito de ação! Não nos parece sustentável, por exemplo, o entendimento de que esse prazo de dez anos seja para o Ministério Público propor a ação. É só para lhe ser feita a participação dos factos!

E além disso, a norma do artigo 69.º, n.º 4, do RJUE parece que só se aplica aos atos previstos no RJUE e não em aos atos previstos em legislação especial.

4.4. A ação especial do artigo 112.º do RJUE

Impõe-se também que seja feita uma referência a um meio processual específico, um processo especial e urgente previsto no artigo 112.º do RJUE.

A legalidade urbanística também deve ser observada no sentido de assegurar a garantia dos particulares relativamente ao exercício do seu direito de construir, que devem ver as suas pretensões, quando legais, apreciadas e decididas nos prazos previstos na lei.

Só que muitas vezes a Administração não o faz, e por isso no artigo 111.º do RJUE estabelecem- se as consequências para o silêncio da Administração perante os requerimentos que lhe são apresentados em matéria de urbanismo, decorridos que sejam os prazos fixados para a prática dos atos requeridos:

a) Tratando-se de ato que devesse ser praticado por qualquer órgão municipal no âmbito do procedimento de licenciamento, o interessado pode recorrer ao processo regulado no artigo 112.º; b) Tratando-se de qualquer outro ato, considera-se tacitamente deferida a pretensão, com as consequências gerais.

Nesse processo regulado no artigo 112.º do RJUE pode o interessado pede ao tribunal administrativo a intimação da autoridade competente para proceder à prática do ato que se mostre devido.

É um processo especial e urgente em que findos os dois articulados admitidos, o requerimento inicial e a resposta apresentada em 14 dias, o processo vai com vista ao Ministério Público, para em dois dias emitir parecer, e seguidamente é concluso ao juiz, para decidir no prazo de cinco dias.

Portanto, é (por enquanto, como se verá mais adiante) um caso de intervenção acessória do Ministério Público.

Em caso de procedência, o juiz estabelece prazo não superior a 30 dias para que a autoridade requerida pratique o ato devido e fixa sanção pecuniária compulsória, nos termos previstos no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

4.5. As alterações mais relevantes na proposta de revisão do CPTA

Como é sabido, está em curso a revisão do CPTA, tendo já sido divulgada a respetiva proposta de lei.

Nessa proposta verifica-se que, para além de outras alterações, designadamente na intervenção do Ministério Público, estão previstas algumas alterações com incidência nesta matéria de urbanismo, às quais se deixa aqui uma breve referência.

Assim, desde logo, relativamente às ações administrativas, está previsto o fim do atual regime dualista (ação administrativa especial e ação administrativa comum), passando a existir apenas uma forma única designada Ação Administrativa. É uma opção que não deixa de ter as suas vantagens, mas também à custa de desvantagens relativamente aos casos em que agora se recorre à ação administrativa especial, que tinha uma tramitação mais simplificada, designadamente com menos articulados.

Na intervenção acessória nos termos do artigo 85.º do CPTA, estabelece-se agora o prazo de 30 dias para a emissão de parecer pelo Ministério Público.

Relativamente ao processo regulado no artigo 112.º do RJUE está prevista uma alteração do artigo 112.º do RJUE (mesmo na versão que ainda não entrou em vigor), que altera a tramitação desta ação, deixando de haver essa específica intervenção do Ministério Público.

E até a nível da representação do Ministério Público nos Tribunais Administrativos (e Fiscais) prevê- se que os quadros passem a ser compostos por Procuradores da República e procuradores adjuntos, quando agora são compostos apenas procuradores da República.

No documento Direito e Processo Administrativo (páginas 52-55)