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A crítica que é possível formular quanto a esta orientação jurisprudencial é a seguinte:

No documento Direito e Processo Administrativo (páginas 36-43)

RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL DE ENTIDADES PÚBLICAS

V. Análise crítica

7. A crítica que é possível formular quanto a esta orientação jurisprudencial é a seguinte:

(a) Em primeiro lugar, é desde logo discutível que a indemnização por inexecução se traduza numa indemnização de natureza objetiva. Do que se trata é de uma indemnização pecuniária sucedânea da reposição natural e que tem como fundamento o facto ilícito resultante da prática do ato pré-contratual ilegal. Quer a reposição natural, quando seja possível a execução do julgado anulatório, quer a indemnização por equivalente, quando se verifique a impossibilidade de execução, asseguram já o ressarcimento dos danos causados pela ilegalidade cometida no âmbito do procedimento. Os danos suscetíveis de serem reparados através de um pedido autónomo de indemnização são apenas os danos colaterais ou residuais que não fiquem cobertos pela execução do julgado anulatório ou pela indemnização substitutiva.

A indemnização por perda de chance destina-se, por isso, a ressarcir, não o dano resultante da perda da posição em que o interessado se encontraria se fosse possível prosseguir o processo executivo, mas a perda da possibilidade de intervir no procedimento, quando dele tenha sido ilegalmente excluído, ou de obter a adjudicação, quando tenha sido ilegalmente preterido, por ser essa a forma de ressarcir o dano resultante da ilegalidade.

18 Num outro caso em que estava em causa um concurso para conceder apoios financeiros à atividade teatral, o tribunal deu relevo à verba disponível, ao número de candidaturas, ao número de programas a apoiar e à duração do apoio (acórdão do STA de 20 de janeiro de 2010, Processo n.º 47578A). Num outro acórdão, o STA revogou a decisão recorrida para a realização de diligências instrutórias para determinar o dano indemnizável, em face da insuficiência dos elementos do processo (acórdão do STA 30 de setembro de 2009, Processo n.º 634/09).

19 Nos acórdãos do STA de 29 de novembro de 2005, Processo n.º 41321A, e TCA Sul de 8 de setembro de 2011, Processo n.º 6762/10, ponderou-se o benefício expectável com base numa certo valor percentual do preço indicado na proposta, mas sem ter em linha de conta, no cômputo da indemnização, o grau de probabilidade de ser atribuída ao requerente a adjudicação.

A natureza e a medida da obrigação não pode ser distinta consoante o interessado opte pela propositura de um processo de execução de sentença anulatória ou uma ação de responsabilidade pré-contratual, quando, como foi dito, esses são dois meios processuais igualmente idóneos para obter uma indemnização pecuniária caso se encontre já executado o contrato.

(b) Em segundo lugar, não há, a nosso ver, suficiente razão para arbitrar uma indemnização com base na equidade quando existam elementos que permitam razoavelmente determinar a probabilidade da adjudicação do contrato e se encontrem comprovados quer o valor da proposta do concorrente excluído ou preterido quer o custo que está implicado na execução do contrato. Existindo esses elementos, caberá ao tribunal – ponderando diversos fatores ou índices, como o número de candidatos, o mérito das propostas, os critérios de adjudicação, o grau de discricionariedade na escolha das propostas e o fundamento que determinou a invalidade da anterior decisão – apontar um determinado grau de probabilidade de o concorrente excluído ou preterido ser adjudicatário e, de seguida, fazer incidir esse grau de probabilidade sobre o lucro expectável (isto é, sobre a diferença entre o valor da proposta do concorrente e os custos associados à execução do contrato).

O julgamento por equidade tem naturalmente aplicação mas apenas quando não seja de todo possível determinar a probabilidade de sucesso no procedimento de concurso, designadamente quando a decisão ilegal que impediu o requerente de participar no procedimento tenha sido prévia à apresentação das propostas, ou quando, por inobservância do procedimento que seria aplicável (por ex., ajuste direto ilegal), os potenciais concorrentes não puderam formular as suas propostas, ou ainda quando o critério de avaliação das propostas não se baseie no preço mais baixo mas no da proposta economicamente mais vantajosa e sejam usados fatores ou subfactores que exijam um juízo da Administração não substituível, ainda que com recurso a prova pericial, pelo tribunal.

(c) Por fim, a indemnização por perda de chance depende não apenas da violação de uma regra da contratação pública, mas também da existência de um nexo de causalidade entre a violação da regra e o dano traduzido na perda de chance, sendo para isso necessário que a regra violada seja suscetível de influenciar de algum modo a possibilidade de ser adjudicatário. O concorrente não tem de demonstrar que, se não fosse a irregularidade, seria adjudicatário, mas que teria uma probabilidade (ou uma maior probabilidade) de o ser. Como se referiu, ainda que se não possa excluir a atribuição de uma indemnização por perda de chance com base em ilegalidades meramente formais cometidas no decurso do procedimento, nalguns casos pode não ser possível estabelecer esta relação de causa efeito entre a ilegalidade e a produção do dano (por ex., o vício de falta fundamentação).

VI.

8. Conclusões:

a) A responsabilidade pré-contratual tanto pode ser efetivada através da convolação em indemnização pecuniária do processo de execução de julgado anulatório, quando se verifique

uma causa legítima de inexecução, como por via de ação de indemnização autónoma, que poderá constituir, em certas circunstâncias, o meio processual mais adequado à tutela dos interesses ofendidos;

b) O dano indemnizável pode corresponder ao interesse contratual negativo (dano da

confiança), ao interesse contratual positivo (dano de incumprimento) ou a uma indemnização

por perda de chance.

c) O interesse contratual positivo apenas pode ser considerado excecionalmente quando a conduta culposa da entidade adjudicante tenha consistido na violação do dever de conclusão do negócio e seja possível demonstrar que, se não fosse a ilegalidade cometida, o concorrente ilegalmente afastado ou ilegalmente preterido seria o adjudicatário;

d) O dano resultante de perda de chance tem aplicação quando não seja possível demonstrar com certeza que o concorrente afastado ou preterido seria o adjudicatário, mas exista um nexo de causalidade entre a violação da regra e o dano traduzido na perda de chance, de modo a poder considerar-se que a regra violada influenciou negativamente a possibilidade de ser adjudicatário.

e) Por fim o dano por interesse contratual negativo pode incluir quer os custos incorridos na elaboração e apresentação da candidatura (dano emergente), quer a perda de oportunidades alternativas (lucro cessante referente a outro contrato), abrangendo situações legalmente tipificadas – como as previstas no artigo 79.º, n.º 4, do CCP – ou outras em que, tendo ocorrido um ato ilícito na tramitação do procedimento, não seja possível demonstrar que esse ilícito influenciou a possibilidade de o concorrente ser adjudicatário;

f) No caso do dano resultante da perda de chance, o cômputo do dano é determinado através do grau de probabilidade de o lesado ser adjudicatário (com base em diversos fatores ou índices que relevam para o resultado do concurso), e o lucro expectável (isto é, a diferença sobre o valor da proposta do concorrente e os custos associados à execução do contrato), e não tem, em regra, de ser formulado com base num juízo de equidade.

Vídeo da apresentação

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No documento Direito e Processo Administrativo (páginas 36-43)