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3 Gestão empresarial e inserção de pessoas com deficiência

3.2 Ações afirmativas no Brasil

Apesar da Lei n° 8.213/91 já existir há 20 anos, o debate sobre políticas de ações afirmativas no Brasil é bastante recente. Se instaura mais precisamente, conforme Oliven (2007), a partir da ―[...] III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, ocorrida em 2001, em Durban, África do Sul, em que o Brasil se posiciona a favor de políticas públicas que venham a favorecer grupos historicamente discriminados.‖ (Idem: 40).

Na verdade, o termo ações afirmativas, de acordo com Glazer (2003), surge nos Estados Unidos a fim de proteger os direitos trabalhistas dos dirigentes e ativistas sindicais. Aparentemente aparece, naquele país, pela primeira vez na Lei Nacional de Relações de Emprego de 1935 e estava ligado à discriminação dos empregadores contra os membros ativos dos sindicatos. No início da década de 1960 o termo passou a ser aplicado na questão da discriminação racial no emprego, antes da aprovação da Lei dos Direitos Civis de 1964, que instituiu a proibição aos atos discriminatórios no emprego, nos serviços do governo, em instalações públicas e em outras áreas dos Estados Unidos. Além de proibir a discriminação, ela concedeu ao presidente americano poderes para implantar medidas contrárias à segregação.

A denominação ―affirmative action‖ com o significado e as características que hoje possui e como uma política oficial de governo, consoante Maclaury (2010), teve início em 1961 quando o Presidente John F. Kennedy dos Estados Unidos, criou o Comitê Presidencial de Igualdade de Oportunidades de Emprego (President‘s Committee on Equal Employment Opportunity – PCEEO) e determinou ações para

que todas as pessoas fossem tratadas de forma igual nos empregos contratados pelo governo federal, sem distinção de raça, cor, sexo, religião, ou nacionalidade.

As ações afirmativas, sob o ponto de vista de Lawrence (2002) e de Willert (2010) foram reafirmadas como políticas por meio da Lei dos Direitos Civis de 1964, que tornou ilegal a discriminação racial e sexual. Em 1965, o presidente Lyndon B. Johnson criou o Conselho Presidencial sobre Igualdade de Oportunidades (President‘s Council on Equal Opportunity) e determinou a exigência que fosse incluída nos contratos com todos os empreiteiros e subempreiteiros do governo, uma cláusula que garantisse a igualdade de oportunidades de emprego para as minorias. No ano de 1967, as mulheres passam a ser incluídas nas ações. Pauley e College (2008) entendem que Johnson teve o mérito de ampliar o sentido do termo ação afirmativa, ao utilizá-lo para redefinir o significado da ideia de igualdade de oportunidades.

Além dos Estados Unidos, explica Mascarenhas (2008), as ações afirmativas se estenderam à Europa, principalmente em razão da imigração diversificada. Para Glazer (2003), com finalidades mais parecidas com as norte-americanas, foram implantadas em outros países de imigração inglesa como, Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Índia e África do Sul. Thomas Junior (2004) coloca que no seu início as ações afirmativas estavam voltadas para superar o passado de discriminação contra os negros, depois foram ampliadas para atenderem às mulheres norte-americanas.

O papel das ações afirmativas foi se direcionando para a proteção aos grupos minoritários passíveis de discriminação que estariam fora das leis gerais, destinadas a tratar todos indistintamente, pois as leis votadas pela maioria poderiam oprimir a minoria, como esclarece Fonseca (2008), ao comentar o Art. 27 – Trabalho e Emprego, da Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Com a mesma percepção, expõe Gomes (2001), ―[...] as ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero ou de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada pelo passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais [...].‖ (Idem: 40). Em vista disso, as ações afirmativas estão baseadas na concepção de que os fenômenos sociais surgem a partir das interações sociais, não se constituindo em fenômenos naturais, o que justificaria a intervenção política na

reversão da situação de desigualdades e discriminações sociais pelas quais passam algumas parcelas da população. (COUTINHO, 2006).

Com relação às pessoas com deficiência, elas possibilitam discriminar positivamente em termos de direito aos bens fundamentais como emprego, trabalho, educação, moradia, saúde, segurança, benefícios sociais etc., oferecidos e garantidos pelo Estado aos seus cidadãos. No Brasil as políticas de ação afirmativa tornaram o emprego uma possibilidade concreta para as pessoas deficientes, a partir da obrigatoriedade imposta às empresas por meio das cotas previstas no Art. 93 da Lei nº 8.213/91. Contudo, pode-se dizer que a inserção das pessoas com deficiência no emprego se amplia com a publicação do Decreto n° 3.298/99, que em seu Art. 36 – §5 instituiu a fiscalização sistemática por parte do Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE) no que diz respeito ao cumprimento das cotas previstas, pelas empresas. Visando penalizar as empresas infratoras, o MTE baixou a Portaria n° 1.199/2003 que aprovou as normas para a imposição da multa administrativa variável, conforme previsão no Art. 133 da Lei n° 8.213/1991.

A legislação federal referente à inserção das pessoas com deficiência ou surdas tenta aliar emprego e acessibilidade em todos os níveis e setores da sociedade, garantindo-lhes certa autonomia. Os dispositivos legais de acessibilidade são complementados pelas Normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que buscam eliminar todas as barreiras sociais que possam impedir a inserção de pessoas com deficiências físicas, sensoriais ou intelectuais. Assim, para MTE (2007): ―O processo de exclusão, historicamente imposto às pessoas com deficiência, deve ser superado por intermédio da implementação de políticas afirmativas e pela conscientização da sociedade acerca das potencialidades desses indivíduos.‖ (Idem: 7).

Esse papel das ações afirmativas em benefício dos grupos discriminados teve seu reconhecimento internacional a partir da Declaração de Madri, publicada em março de 2002, conhecida como ―A não-discriminação e a ação afirmativa resultam em inclusão social.‖ (SASSAKI, 2002).

Em termos internacionais, de mais atual como ação afirmativa, existe a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela Organização das Nações Unidas em 13 de dezembro de 2006, que segundo Fonseca (2008) tem o objetivo de assegurar às pessoas com deficiência, todos os direitos humanos ―[...] que em razão de barreiras físicas e atitudinais, não alcançou

até o presente, direitos mínimos inerentes à liberdade e à dignidade humana.‖ (Idem: 93-94). Em seu artigo 27, alínea ―h‖ ela consagra as ações afirmativas, ao falar dos programas a serem contemplados nas políticas que promovam o emprego das pessoas com deficiência no setor privado.