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Ações Afirmativas nas Universidades Públicas Estaduais e a atuação do

No documento Ações afirmativas e o pricípio da igualdade (páginas 141-144)

7 AÇÕES AFIRMATIVAS NO BRASIL

7.8 Ações Afirmativas nas Universidades Públicas Estaduais e a atuação do

As ações afirmativas com objetivo de ingresso das minorias sociais nas universidades públicas tiveram início na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e na Universidade Estadual da Bahia (UNEB) através das leis 3524/2.000 e 3708/.2001 ambas do Estado do Rio de Janeiro.

A Lei 3.524/2.000 do Rio de Janeiro estipulava que 50% das vagas nos cursos da Universidade Estadual daquela Unidade da Federação seria preenchido por alunos oriundos da rede pública de ensino, ou seja, àquele percentual de vagas seria para estudantes que concluíram o ensino fundamental e o ensino médio na rede pública de ensino municipal ou estadual.

Já a Lei 3.708/2.001 do mesmo Estado reservou o percentual de 40% das vagas na Universidade Estadual do Rio de Janeiro e Universidade Norte Fluminense para estudantes negros e pardos. Sendo que nessa cota mínima estabelecida estavam incluídos os negros e pardos beneficiados pela Lei 3.524/1.990.

Essas ações afirmativas como era de se esperar, devido ao longo tempo de discriminação racial em desfavor dos afros descendentes no Brasil, levaram a incidência de várias ações judiciais contestando a sua legalidade.

Entre as ações judiciais propostas, algumas alegavam a inconstitucionalidade das leis acima mencionadas. Entretanto, antes mesmo da questão chegar ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, várias decisões de primeiro grau de jurisdição foram proferidas. Segundo a afirmação de Eder Bonfim Rodrigues, muitas dessas decisões reconheceram a igualdade material e outras negaram essa igualdade preconizada pelas ações afirmativas, fundamentadas “numa igualdade formal, paradígma do Estado Liberal que até hoje exerce forte influência no Judiciário Brasileiro”272.

Como soa óbvio, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, foi o primeiro Tribunal de Justiça do Brasil a enfrentar essa matéria, mesmo porque foi naquele Estado onde se editaram as primeiras normas jurídicas mais densas prevendo ações afirmativas com a finalidade de proporcionar um acesso de grupos

socialmente vulneráveis no ensino público universitário brasileiro; diante de uma realidade assinalada por injustiças sociais contra os negros.

Em um desses julgamentos realizado na décima primeira vara cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro o Desembargador relator do processo, Cláudio de Melo Tavares afirmou em seu voto:

O descumprimento de tal quadro de responsabilidade social de postura afirmativa de caráter nitidamente emergencial, na busca de uma igualdade escolar entre brancos e negros, essas parcelas significativa de elementos abaixo da linha considerada como de pobreza, não permite que se deslumbre qualquer eiva de inconstitucionalidade nas leis 3.524/2.000 e 3.708/2.001273.

Para Eder Bonfim Rodrigues, os julgamentos realizados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro tiveram como fundamento jurídico; o princípio da igualdade como fator de transformação da realidade social dos grupos minoritários ou socialmente mais vulneráveis, estando aí incluídos os negros. De modo que, o Poder Judiciário daquela Unidade da Federação ratificou as ações afirmativas instituídas pelas leis estaduais 3.524/2.000 e 3.708/2.001. Vide essência do acordão prolatado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO DO WRIT. SISTEMA DE COTA MÍNIMA PARA POPULAÇÃO NEGRA E PARDA E PARA ESTUDANTES ORIUNDOS DA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE ENSINO. LEIS ESTADUAIS 3524/00 E 3708/01. EXEGESE DO TEXTO CONSTITUCIONAL. A ação afirmativa é um dos instrumentos possibilitadores da superação do problema do não-cidadão, daquele que não participa política e democraticamente como lhe é na letra da lei fundamental assegurado, porque não se lhe reconhecem os meios efetivos para se igualar com os demais. Cidadania não combina com desigualdades. República não combina com preconceito. Democracia não combina com discriminação. Nesse cenário sócio-político e econômico, não seria verdadeiramente democrática a leitura superficial e preconceituosa da Constituição, nem seria verdadeiramente cidadão o leitor que lhe buscasse a alma, apregoando o discurso fácil dos igualados superiormente em nossa história pelas mãos calejadas dos discriminados. É preciso ter sempre presentes essas palavras. A correção das desigualdades é possível. Por isso façamos o que está ao nosso alcance, o que está previsto na Constituição Federal, porque, na vida, não há espaço para o arrependimento, para a acomodação, para o misoneísmo, que é a aversão, sem se querer perceber a origem, a tudo que é novo. Mas mãos à obra, a partir da confiança na índole dos brasileiros e nas instituições pátrias. O preceito do art. 5o, da CR/88, não difere dos contidos nos incisos I, III e IV,

do art. 206, da mesma Carta. Pensar-se o inverso é prender-se a uma

exegese de igualização dita estática, negativa, na contramão com eficaz dinâmica, apontada pelo Constituinte de 1988, ao traçar os objetivos fundamentais da República brasileira. É bom que se diga que se 45% dos 170 milhões da população brasileira é composta de negros (5% de pretos e 40% de pardos); que se 22 milhões de habitantes do Brasil vivem abaixo da linha apontada como de pobreza e desses 70% são negros, a conclusão que decorre é de que, na realidade, o legislador estadual levou em conta, quando da fixação de cotas, o número de negros e pardos excluídos das universidades e a condição social da parcela da sociedade que vive na pobreza, como posto pela Procuradoria do Estado em sua manifestação. O único modo de deter e começar a reverter o processo crônico de desvantagem dos negros no Brasil é privilegiá-la conscientemente, sobretudo naqueles espaços em que essa ação compensatória tenha maior poder de multiplicação. Eis porque a implementação de um sistema de cotas se torna inevitável. Na medida em que não poderemos reverter inteiramente esta questão em curto prazo, podemos pelo menos dar o primeiro passo, qual seja, incluir negros na reduzida elite pensante do país. O descortinamento de tal quadro de responsabilidade social, de postura afirmativa de caráter nitidamente emergencial, na busca de uma igualdade escolar entre brancos e negros, esses parcela significativa de elementos abaixo da linha considerada como de pobreza, não permite que se vislumbre qualquer eiva de inconstitucionalidade nas leis 3.524/00 e 3708/01, inclusive no campo do princípio da proporcionalidade, já que traduzem tão-somente o cumprimento de objetivos fundamentais da República. Ainda que assim não fosse interpretada a questão exposta nos presentes autos, verifica-se da documentação instrutória do recurso que para o Curso de Letras a Apelada ofereceu 326 vagas, distribuídas entre os dois vestibulares (SADE, para alunos da rede pública, e o Vestibular Estadual 2003, para alunos que estudaram em escolas particulares). A Apelante concorreu a esse último, ou seja, a 163 vagas, optando pelas subopções G1 e G2, havendo para cada uma a oferta de 18 vagas. Ocorre que no cômputo final de pontos veio a alcançar, na sua melhor colocação, na opção G2 a 57a posição, o que deixa evidenciado que mesmo que não

houvesse a reserva de cota para negros e pardos não alcançaria classificação, razão pela qual, nega-se provimento ao recurso, mantendo- se in totum a decisão hostilizada.

Vale lembrar que o Estado do Rio de Janeiro editou em 2.003 a Lei 4.151/2.003, que estabeleceu cota mínima de vagas para ingresso nas Universidades Públicas Estaduais, da seguinte forma: 20% das vagas para estudantes oriundos da rede pública de ensino; 20% para estudantes negros e 5% para estudantes deficientes. Totalizando assim, a reserva de 45% das vagas reservadas para esses grupos socialmente mais vulneráveis.

Observa-se que essa Lei 4.151/2.003, veio aperfeiçoar as leis 3.524/2.000 e 3.708/2.001 que já previam a implementação de ações afirmativas nas universidades públicas do Rio de Janeiro.

Por outro lado, é de se mencionar por oportuno, a participação do Poder Judiciário nesse processo de implementação das ações afirmativas. Primeiro exercendo o papel de guardião do Arcabouço Jurídico e, segundo, tendo a iniciativa quando exerce a função de gestor, da adoção de medidas afirmativas que visam

possibilitar o acesso das minorias no mercado de trabalho. Como ocorre, por exemplo: com Tribunal Superior do Trabalho e o Próprio Supremo Tribunal Federal – STF, que ainda no ano de 2.002 começaram a adotar medidas afirmativas, por meio da instituição de reservas de vagas nos seus contratos de serviços terceirizados.

Esses dois Tribunais Superiores, visando possibilitar a inclusão de negros no mercado de trabalho, passaram a exigir das empresas contratadas a inclusão de negros nos seus quadros de pessoal que prestavam serviços nos referidos Tribunais.

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