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A ênfase nas curas como caminho de superação do dualismo

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CAPÍTULO III: NO CAMINHO DA SUPERAÇÃO DO DUALISMO CORPO E ALMA

3.2 A ênfase nas curas como caminho de superação do dualismo

Um segundo bloco de questões – que poderia ser uma contribuição para a superação do dualismo – está marcado pela ênfase na cura divina que a Comunidade Cristã Paz e Vida possui. O ser humano tem limitações e fraquezas como tristezas, cansaços e doenças. Assim, é possível afirmar que não é devido à falta de fé que somos afligidos pelas doenças e pesares da vida, mas, é devido as próprias ambiguidades da vida e do corpo. Na visão da Comunidade Cristã Paz e Vida observam-se as manifestações de curas divinas, em que as doenças são reflexos de um mundo “espiritual”. As doenças físicas podem ser curadas por uma ação direta do Espírito ou por uma solução do mundo sobrenatural. Como já referido, há dualismos presentes e, ao mesmo tempo, contradições, em que doenças são manifestações de pecados, como veremos adiante na nossa pesquisa. Como abordado anteriormente, o Novo Testamento mantém sua visão de humano integrado considerando-se que é como um todo vivo. As representações já citadas no segundo capítulo do nosso trabalho – como os termos bíblicos: psyché, pnêuma, sarx, soma e kardia – podem significar tanto um aspecto do ser humano quanto uma visão unitária do ser. De modo geral, nota-se que o Novo Testamento relata um dualismo, mas, este não se refere a pensamentos helênicos e, sim, a uma transformação do ser humano em seu conjunto, em que o velho ser se transforma em uma nova criatura.

Percebe-se que o discurso religioso da Comunidade Cristã Paz e Vida têm influências da filosofia helênica apesar de suas contradições – como as curas divinas e textos escritos por Pagliarin – que mostram uma possível indicação de uma antropologia integrada, tema já trabalhado em nossa pesquisa. No discurso religioso da Comunidade Cristã Paz e Vida encontra-se um dualismo, no qual alma e corpo são meramente separados. No capítulo primeiro deste trabalho aspectos antropológicos da Comunidade Cristã Paz e Vida foram comentados, com referencial nos artigos escritos por Pagliarin, em que ele enfatiza dualismos como o texto já citado A morte do rico e do mendigo, mencionando a parábola do homem rico e Lázaro. Assim, observa-se a presença dessa menção em que alma e corpo devem ser

79 separados; em que os justos guardaram pelo dia do Senhor e os maus serão lançados do hades. O discurso teológico-pastoral atual, considerando as reflexões teológicas mais consistentes, para ser coerente com tais percepções bíblicas, deve superar esse dualismo gnóstico tendo em vista uma antropologia integrada do ser humano. Percebe-se um caminho para esta superação nos discursos religiosos da Comunidade Cristã Paz e Vida por meio das curas divinas, apesar da visão metafísica de Pagliarin a uma valorização da corporeidade em seu discurso.

Segundo Garcia Rubio, o Novo Testamento não deve ser entendido desta maneira, mas, onde: “O espírito humano encontra a complementação de sua espiritualidade justamente em sua união com o corpo” (GARCIA RUBIO, 1989, p. 284). Não havendo partes distintas, porém, uma complementação na qual a unidade não anula a presença das constituições do ser humano, mas a complementam. A Comunidade Cristã Paz e Vida, como uma Igreja de matriz neopentecostal, como qualquer outra igreja pentecostal, não deixa de lado o credo fundamental da fé cristã:

Cremos que Deus já fez toda a sua parte. O Pai, o Filho e o Espírito Santo não obrigam ninguém a abandonar os seus pecados e maus caminhos. O homem continua livre para exercer sua soberana vontade. Contudo, o pecado, a rebelião e a desobediência mantêm o ser humano afastado de Deus. Cremos que não existe pecado que não possa ser perdoado, a não ser aquele que Jesus citou em (Mt 12:31-32), que é a blasfêmia contra o Espírito Santo.Fora disso, qualquer pecado pode ser esquecido por Deus, e a Salvação concedida, desde que haja uma conversão verdadeira.23 Cremos que Jesus ressuscitou em carne e osso

(Lc 24:39), sendo que, apesar disso, seu corpo tem uma nova estrutura molecular que nós não conhecemos, visto que Ele pode entrar em um recinto fechado, diante dos apóstolos, sem que as portas lhe fossem abertas (Jo 20:19,26).As testemunhas que o viram vivo, após a sua morte, puderam comer com Ele (Lc 24:42-43), andar com Ele (Lc 24:15), tocar nas feridas provocadas em suas mãos e pés pelo martírio dos cravos na cruz (Lc 24:39-40; Jo 20:27; I Co 15:4-7). Cremos que o Cristianismo é algo superior a todas as outras religiões do mundo justamente porque nenhuma delas oferece o líder ressuscitado. Todo os grandes homens, profetas e líderes religiosos que morreram, foram e permanecem sepultados. Somente Cristo foi sepultado e revivido (Mt 28; Mc 16; Lc 24; Jo 20-21). Tendo subido aos céus 40 dias depois de ressuscitado (Lc 24:50-51; At 1:9-11) e permanecido até hoje à direita de Deus (Ef 1:19-20). Assim como o ódio e a morte entraram no mundo pela desobediência de Adão, a paz e a vida vieram por Cristo Jesus, nosso Senhor (I Co 15:20- 21).24 Cremos no ensinamento bíblico de que “Há um só Deus” (I Tm 2:5) e que isto se

23 Disponível em: < http://pazevida.org.br/em-que-cremos/18-10-a-salvacao-total-ao-alcance-de-todos.html >. Acesso em: 25 out. 2016.

24 Disponível em: < http://pazevida.org.br/em-que-cremos/16-8-a-ressurreicao-e-ascensao-de-jesus.html >. Acesso em: 25 out. 2016.

80 trata de uma verdade fundamental, tanto no Antigo como no Novo Testamento. Cremos que Deus se revelou à nação de Israel, que o chamava de Javé ou Yavé – (Jhvh ou Yhvh – Êx 3:14-15), tendo a pronúncia correta se perdido devido ao temor que os judeus tinham de desobedecer (Êx 20:7). Cremos, conforme testifica o Antigo Testamento que, Yhvhéé um e que além dele não existe outro Deus, sendo falsos os pretensos deuses dos pagãos (Dt 6:4; Jr 5:7). Esse único Deus, entretanto, já no início do Antigo Testamento se refere a si mesmo no plural (Gn1:26 ; 11:7). O Anjo de Yhvh, que assume forma visível, é mencionado como sendo o próprio YHVH (Gn16:7,13; 18:1-2). Deus também mandou o seu próprio espírito aos profetas (Is 48:16; 63:10), estando o mistério da tri-unidade divina patente a todos os homens, desde o princípio da Bíblia Sagrada. Cremos que, em perfeita consonância com o Antigo, o Novo Testamento confirma a existência de um único Deus, não havendo outro semelhante a Ele. Cremos na revelação Cristã de que Deus é Pai, Filho e Espírito Santo e que os três nomes estão no mesmo plano de poder e glória, perfeitamente harmônicos e interligados (Mt 28:19; II Co 13:13; Ef 2:18; 4:4-6; II Ts 2:13-14; I Pe 1:2) pelos mais estreitos laços de amor e pensamentos, conhecendo cada um a vontade dos outros dois (Jo 5:19-23,26,27,30; 17:21,23) trabalhando todos para a redenção humana. Em alguns casos, têm as mesmas funções: o Pai e o Filho são o Criador (Gn 1:2; Jo 1:1-3) o filho e o espírito são o Consolador (Jo 15:26; Mt 28:20; Jo 16:13-14). Cremos que não há graus de divindade entre os três, porque são uno, apesar das diferentes funções de cada um. O Pai é supremo como a Fonte: dele procede o Filho (I Jo 4:9,14) e o Espírito (Jo 14:16,26) sendo este enviado pelo Filho da parte do Pai (Jo 15:26; I Co 15:24-28).25

Conforme consta, o credo da comunidade Cristã Paz e Vida traz a manifestação da trindade, com as três pessoas juntas, o sacrifício feito por Jesus na cruz, a ressurreição da carne e o perdão dos pecados. Mas o credo da Igreja não faz nenhuma menção a salvação do corpo e, sim, o corpo ressuscitado sendo como uma nova estrutura molecular. É possível então afirmar que a Igreja, em seu discurso, tem o mesmo discurso da filosofia helênica: “que segundo, os seres humanos são centelhas ou gotículas da mesma substância espiritual da qual Deus é feito e foram aprisionados em corpos físicos” (OLSON, 2001, p.36). Assim, entende- se o porquê da estrutura molecular. Roger Olson comenta que para os gnósticos: “Cristo apareceu na pessoa de Jesus, mas que Jesus nunca foi realmente um ser humano físico” (OLSON, 2001, p.37). A teologia neopentecostal não é tarefa fácil de se definir. As novas tendências e igrejas que surgem, se multiplicam e se espalham, torna cada vez mais complexos os temas para novas pesquisas. “Com isso o movimento vai acumulando várias designações: pentecostalismo autônomo, pentecostalismo neoclássico, pós-protestantismo, pós-pentecostalismo” (ROMEIRO, 2013, p. 49). Como já mencionado, os movimentos

25Disponível em: < http://pazevida.org.br/em-que-cremos/12-4-a-unidade-e-tri-unidade-divina.html >. Acesso em: 25 out. 2016.

81 neopentecostais se aproximam das doutrinas pentecostais e, por isso tem, em seus cultos, práticas de exorcismos, e pregam a cura divina como a libertação do corpo enfermo. Essa teologia ganha cada vez espaço nos templos pentecostais e neopentecostais. O nosso estudo fará uma breve descrição dessas doutrinas. O objetivo não é estender muito a temática, visto que já foi abordado sobre a Comunidade Cristã Paz e Vida no primeiro capítulo do nosso trabalho. Para Wanderlei Rosa, as crenças dessa teologia em púlpitos pentecostais são causadas por “doenças é coisa satânica. Quanto mais consagrado, mais saudável será o crente” (ROSA, 2014, p. 138). Em seu artigo, Ricardo Bitun destaca que “na visão da saúde e prosperidade neopentecostal, o fiel deve se apropriar daquilo que Jesus fez por ele na cruz. O texto bíblico do profeta Isaías, capítulo 53, versículos 4-5 verdadeiramente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores.”26 Para a teologia da Comunidade Cristã Paz e Vida, Juanribe comenta:

Quanto às doenças, cremos que elas têm, geralmente, quatros naturezas:

a) FÍSICA: a doença física é causada por germes, micróbios, bactérias, vírus, bacilos e outros microorganismos infecciosos, conhecidos ou não pela ciência. Ex. gripe, tuberculose, pneumonia etc.

b) ESPIRITUAL: a doença espiritual é causada por espíritos de enfermidades que, não conseguindo tomar todo o corpo do ser humano, se alojam em determinada parte do organismo, ocasionando a dor e os sintomas da “doença”. Ao contrário das doenças físicas, as doenças espirituais não podem ser detectadas por exames ou chapas. Ex. o homem que era mudo. Quando Jesus tirou o espírito imundo, o homem falou (Lc 11:14). Idem, mulher que andava encurvada há 18 anos (Lc 13:11,12).

c) PECADO: a doença causada pelo pecado é tão terrível quanto à espiritual, pois também não pode ser detectada por métodos científicos e tão pouco curada por remédios. Ela só pode ser curada quando o homem é perdoado de seus pecados. Ex. o paralítico de Cafarnaum, sobre o qual Jesus disse: “o que é mais fácil? Dizer: Perdoado te são os teus pecados ou dizer: Levanta-te e anda?” (Mt 9:5). E Ele o curou, dizendo: “perdoados te são os teus pecados. Levanta-te, toma a tua cama e vai para tua casa” (Mt 9:6).

d) PROVA DIVINA: esta doença não é causada por nenhuma das três formas, mas é permitida por Deus para provar o homem ou para que o Seu nome seja glorificado. Ex. a doença de Jó e o cego do Novo Testamento, descrito em (Jo 9:2-3).

82 Cremos que é da vontade de Cristo que todos gozemos de boa saúde e que ninguém precise sofrer o flagelo da doença, porque no sacrifício da Cruz do Calvário, Cristo já pagou a conta do médico por nós (Is 53).27

Dessa forma, a corporeidade ganha espaço nos cultos da Comunidade Cristã Paz e Vida.

“A preocupação com o corpo dentro do neopentecostalismo, observa-se também nos cuidados da beleza e a saúde” (KLEIN, 2005, p.161). Observa-se um dualismo presente no discurso religioso da Comunidade Cristã Paz e Vida, mas, também uma valorização em questão ao corpo, como já mencionado no primeiro capítulo da pesquisa. O dualismo presente no discurso da referida Igreja traz quatro naturezas que são causadoras de doenças: a física é causada por fragilidades; as espirituais causadas por espíritos malignos; do pecado, que só pode ser curada pelo perdão dos pecados e, por último, prova divina, uma espécie de mal causador de desgraças e doenças. De acordo com Garcia Rubio: “em conformidade com o esquema neoplatônico, é a alma que faz com que o ser humano seja homem, enquanto que o corpo não passa de instrumento a ser usado por ela” (GARCIA RUBIO, 1989, p. 272). Percebe-se também, em Santo Agostinho, a questão do pecado e do corpo; certamente o corpo como criatura de Deus não é mal. Devido à consequência do pecado, o corpo, com a sua vida programada em discórdia com a alma, tende para o mal, servindo de tentação para esta. Observe que o dualismo platônico presente na Comunidade Cristã Paz e Vida é influenciado por discursos da filosofia helênica. O corpo não pode ser mal já que este é criatura de Deus; nem somos tentados ao mal. Garcia Rubio explica:

Concomitantemente, é afirmado que o corpo não é crido pelo demônio nem é princípio do mal; reafirma-se que o corpo é bom, bem como a realidade da sua ressurreição. Quer dizer, a dualidade alma corpo não deve levar a um dualismo de oposição – exclusão que coloque a alma na esfera do divino e o corpo no mundo do mal e do demoníaco (GARCIA RUBIO, 1989, p. 276).

A comunidade Cristã Paz e Vida, como qualquer outra igreja de matriz pentecostal, enfatiza as suas doutrinas em discursos sobrenaturais, além de transferir os problemas existenciais em castigo ou falta de fé por parte do cristão, ou algo trazido pelos

27 Disponível em: < http://pazevida.org.br/em-que-cremos/27-19-problemas-e-doencas-milagres-e-curas- divinas.html >. Acesso em: 26 out. 2016.

83 espíritos mensageiros do “diabo.” Segundo Ricardo Bitun:

O cristão deve gozar de saúde plena. Para isso basta conhecer os seus direitos como cristãos e declará-los; ou, como eles mesmos preferem dizer, “tomar posse” da cura, ou do desejo que está prestes a acontecer. Quando estes desejos não são alcançados, duas razões se destacam para o insucesso: primeira, a falta de fé; segunda, satanás está impedindo que tal desejo se concretize. Saúde e finanças (prosperidade) devem ser marcas do cristão. Saúde e finanças são seus direitos, pois assim é a vontade de Deus (BITUN, 2009, p. 69).

As curas são por intermédio das pessoas. Basta ter fé que os problemas são resolvidos. Os males são causados pelo mundo das trevas onde os espíritos maus circulam ou porque Deus está provando este crente. Rolim diz que “as doenças são as mais variadas, desde simples nervosismo, dor de cabeça, tonteiras, até as mais graves, físicas e mentais. Os crentes não fazem distinção entre curáveis e não curáveis” (CARTAXO, 1985, p. 211). Desta forma tornam-se ações dos demônios e sobre esta pessoa vai estender os sinais do divino. As manifestações dos movimentos neopentecostais se espalham por todo o mundo com suas crenças e doutrinas, com novas e sofisticadas abordagens, sendo que multidões são influenciadas com suas as manifestações e liturgias.

Na Comunidade Cristã Paz e Vida o corpo é valorizado, mas, parece haver inconscientemente um desprezo gnóstico pelo mesmo, embora já se fale da alma imperecedoura. Exemplos disso são as afirmações de curas divinas, danças dos ritos corporais, manifestações milagrosas e prosperidades como já mencionado neste capítulo e no primeiro. De acordo com Pagliarin, as doenças são reflexo de um mundo “sobrenatural”. As doenças do corpo podem ser curadas por uma ação direta do Espírito. Pagliarin afirma que apenas temos que aceitar Jesus e tomar posse das curas porque Ele, o Deus de todas as coisas, já nos perdoou. Assim, o corpo ganha espaço – e não o desprezo – nos cultos da Comunidade Cristã Paz e Vida. Ao mesmo tempo em que se observa um dualismo presente no discurso religioso, percebe-se também, contraditoriamente, uma valorização do corpo.

3.3 De uma visão sobrenaturalista a uma visão humana responsável

A Comunidade Cristã Paz e Vida utiliza dos meios de comunicação para sua propagação, com os cultos transmitidos pela rádio e outros meios de comunicação, como já citado nessa pesquisa. A visão dos movimentos pentecostais e neopentecostais são dualistas;

84 suas bases doutrinárias estão construídas por uma metodologia da filosofia grega principalmente platônica. A sua identidade são as crenças em poderes sobrenaturais. Bruno da Silveira Albuquerque comenta que “a visão de mundo da vertente pentecostal clássica no Brasil pode ser considerada confirmada e predominantemente dualista? Alguns autores diriam que sim, contudo, outros percebem mais um aspecto de integração do que de dualismo.”28 Para Ildo Bohn, “o enigma da presença do mal na história humana está na origem da experiência com satanás, os demônios e poderes diabólicos, poderes contrários a Deus que é fonte de vida” (BOHN, 2013, p. 7). Estas crenças, muito antigas, são encontradas na Bíblia, porque o próprio Jesus, além de anunciar a boa-nova, também pediu para que seus discípulos fizessem curas e expulsassem demônios (Mc 6.7-13; 16.17; Mt 10.1-7). É possível perceber estas práticas de exorcismos de maneira muito atual nas comunidades neopentecostais. Também as doenças, principalmente ataque epilético, na época de Jesus eram atribuídas a demônios. Outra influência que o povo de Israel teve foi a do gnosticismo. A ideia de Platão (429-347 a.C.) a respeito de demônios mostra como os gregos imaginavam que entre o mundo dos humanos e do Olimpo, o monte das divindades, havia demônios. Acreditava que o mundo estava carregado de demônios e que suas habitações eram o ar. Acreditava-se que a matéria era má e que o corpo era uma espécie de prisão da alma, para esta se libertar. O verdadeiro filósofo desejaria a morte. Essa maneira de pensar influenciaria a concepção judaica mais tarde (BOHN, 2013, p. 29).

Para o Credo da Comunidade Cristã Paz e Vida, as crenças em seres sobrenaturais é muito presente em seu discurso. Juanribe Pagliarin explica:

O nome “satanás” vem do hebraico e significa “adversário”, declarando sua total oposição aos salvos. Tem poder de atuar sobre os incrédulos (Ef 2:2) colocando-os sob controle (I Jo 5:19; Lc 4:6; Jo 12:31; 14:30). Os descrentes estão sujeitos a ele (At 26:18), cegos por ele (II Co 4:4) e enganados por ele (II Co 11:13-14). Ele é mentiroso e homicida por essência (Jo 8:44) e tem poder da morte sobre os seus súditos (Hb 2:14). O salvo é liberto da sua escravidão (Cl 1:13), mas não da sua tentação (At 5:3; I Co 7:5), sendo que o diabo não se furtou de tentar próprio Cristo (Lc 4:1-13). Ataca os crentes com dardos inflamados (Ef 6:16), enreda com estratagemas sutis (I Tm 3:7; II Tm 2:26; Ap 20:3) e desmoraliza com maledicência (I Tm 5:14-15). A palavra “diabo” (grego diabolos) significa “acusador” e a sua intenção é devorar, derrotar e peneirar os discípulos de Cristo (Jó 1:12; I Pe 5:8; Lc 22:31). Satanás e seus anjos caídos sucumbiram diante de Cristo (Lc 10:18; Jo 12:31) e logo esta vitória na Cruz (Cl 2:15) será confirmada no esmagamento de satanás (Rm 16:20),

28ALBUQUERQUE, Bruno da Silveira. O pentecostalismo Integrado: A Contribuição de Alfonso Garcia Rubio para a Superação do Dualismo Antropológico, p.79.

85 sendo primeiramente lançado no abismo (Ap 20:2-3) e depois no lago de fogo (Ap 20:11; Mt 25:41).29

Na Comunidade Cristã Paz e vida observa-se – especialmente nas expressões aqui destacadas – que as situações existenciais da vida como pobreza, doenças e males são causadas por seres sobrenaturais. Os vícios, o fracasso e as doenças são frutos do poder do maligno “diabo” e “causados diretamente por demônios que estão a serviço dele. Esses demônios têm que ser exorcizados. Segundo essa tese, se os males têm sua origem nos poderes mágicos dos demônios as pessoas deixam de serem responsáveis por seus atos e atribuem as culpas a seres e entidades sobrenaturais” (BOHN, 2013, p. 14).

De acordo com o teólogo Garcia Rubio, a superação do dualismo não implica sobre a criação e graça, entre natural e sobrenatural, nem, contudo, na negação da distinção entre essas dimensões do amor de Deus. Deus criou o ser humano cheio de desejo. Nesse caso desejo não absoluto, mas, condicionado que conduz para a graça. O ser humano, destinado a viver a vida divina, encontra-se sobre “existencial sobrenatural” que nesta maneira se faz receber a autorrevelação de Deus. A graça afeta a globalidade do ser humano em todas as suas dimensões. Sua estrutura fundamental, precisamente na sua abertura ao transcendente, encontra na vida da graça a inserção interna no mais íntimo da criatura espiritual-corpórea que é o ser humano. A salvação/libertação do pecado e participação na vida divina diz respeito apenas que a criação não comporta o conceito de salvação. Para Garcia Rubio “a distinção entre os conceitos de natural e sobrenatural (criação e salvação) deve ser cuidadosamente mantida, para ressaltar a gratuidade especial da autocomunicação da vida trinitária à criatura humana” (GARCIARUBIO, 1989, p. 241). Alfonso Garcia Rubio destaca:

A superação real do dualismo evidentemente, não da dualidade, só é possível a partir da experiência unitária básica do ser humano como pessoa. A partir deste dado, certamente pré-filosófico, deve ser desenvolvida uma articulação ou relação de integração-inclusão entre os aspectos ou dimensões do humano respeitando, contudo, as diferenças existentes entre eles (GARCIA RUBIO, 1989, p. 284).

O discurso antropológico sobre a imortalidade da “alma” e o dualismo corpo e “alma”, de forma alguma surgiu das comunidades cristã do primeiro século, mas, houve uma tentativa de superação desse pensamento dicotômico do ser humano, que veio a influenciar

29Disponível em: < http://pazevida.org.br/em-que-cremos/13-5-outros-seres-espirituais-poderosos.html >. Acesso em: 27 out. 2016.

86 toda a história da Igreja. Como já mencionado neste trabalho, o dualismo presente no discurso religioso da Comunidade Cristã Paz e Vida, de certa maneira, foi influenciado por essas tendências gnósticas como ocorreu em toda a história da Igreja, não apenas em movimentos

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