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A administração municipal e os embates políticos

3.2. O cotidiano da política local até os anos 1970

3.2.3. A administração municipal e os embates políticos

A administração pública municipal teve início em 1891 quando a nascente república instituiu o poder executivo das municipalidades e lhe atribuiu tarefas. Em 03 de junho de 1891 o intendente Vicente Valentim sanciona o “orçamento da intendência” e o primeiro “código de posturas” do município, aprovados pelo Conselho279. Quanto às obras, Carvalho

(2001, p.387, notas) cita o “Tanque da Missão” (reservatório de água que abasteceu a sede por décadas), o cemitério e fez reforma na Igreja Matriz do município.

Conforme pude apurar na pesquisa, as administrações seguintes não conseguiram grandes feitos, o que em parte se deve à fragilidade financeira das municipalidades no período. Prova disso é o fato do intendente Antônio Olavo (1909-1912) ter construído a sede da intendência (em 1911) com recursos tomados por empréstimo ao Pe. João de Mattos (LIMA, 1983). Todavia, João Carregosa da Trindade (1915-1919) assumiu o município depois que a Bahia tinha voltado suas atenções para ele em virtude das disputas de fronteiras e, portanto, fez um governo de mais realizações, entre as quais se destacam a modernização da iluminação pública280 da vila, a construção de um mercado de carne verde (o “barracão”) e um chafariz público281.

Na terceira administração do Cel. Joaquim de Matos (1922-1924) a construção do “Theatro Ypiranga”, primeira casa de cultura do município, foi o destaque. Seu sucessor, o Coronel Santa Rosa, lutou junto ao governo estadual de Góis Calmon para melhorar as estradas da região visando facilitar o escoamento do algodão e do café produzidos na vila. Beneficiado por um clima de maior tranquilidade no cenário político baiano decorrente do “acordo político de 1927”282, Deocleciano Fraga Dias (1926-1928) fez uma gestão focada no

incentivo à cultura trazendo atrações artísticas para a vila. Jonathas Lima de Menezes (1928-

279 O Conselho era composto de 6 vereadores: Faustino José de Mattos, José Maria Santa Rosa, Faustino Ferreira

Lima, Manoel Evaristo de Carvalho, Joaquim de Mattos Carregosa e José Gonçalves de C. Major. In: “Orçamento da Intendência de Patrocínio do Coité, 1891”.

280 Adquiriu as primeiras lâmpadas a querosene com camisa incandescente em substituição aos antigos lampiões

presos a postes de madeira. Informações prestadas por Marcos Aurélio Carregosa Lima (ver bibliografia).

281 Construído com recursos da União, tinha 120 metros de tubos e obtinha boa vazão de água sendo suficiente

para abastecer a população. (In: “Documentos do Município de Paripiranga, 1931-1934”).

282 Sob o comando do governador Gois Calmon, realizou-se uma Convenção Municipalista entre os dias 14 e 16

de janeiro de 1927 com a participação de representantes de todos os 151 municípios baianos. O resultado do evento foi a fundação do segundo PRB (Partido Republicano da Bahia) que dirigiu o estado de forma monolítica até 1930 (SAMPAIO, 1975, pp.143-159).

1930), por sua vez, “renovou” o sistema de iluminação pública283 e instituiu um o “Código de

Posturas” do município.

A segunda administração de João Carregosa foi marcada pela reorganização municipal, que mudou o nome do município. Na administração de Ismael houve grande dificuldade financeira e a prioridade foi o combate ao cangaço. Com a redemocratização em 1945 houve um fortalecimento das finanças municipais e uma maior atenção do poder central em relação às municipalidades. Com efeito, foi sob ainda sob o domínio oligárquico que se verificaram as primeiras evoluções administrativas em Paripiranga.

Como bem observam Vilaça e Albuquerque (2003), entre os anos 1940 e 1950 os coronéis viram-se obrigados a portarem-se como “veículos da modernização” promovendo transformações estruturais que viriam a acelerar seu ocaso. O coronel Jonathas Lima é exemplo deste paradoxo: logo jovem migrou da atividade agropastoril de seu avô e de seu pai para as atividades industrial e comercial. Como prefeito (1945-1947 e 1948-1950), Jonathas Lima acompanhou a evolução político-administrativa do país e deixou marcas em sua gestão. Segundo um dos entrevistados, que inclusive trabalhava para o prefeito no período, a administração chacoalhou o município inteiro: “Veio um engenheiro da Bahia e marcou o município todo pra fazer obra. Teve o hospital, que virou colégio depois, o mercado e o açude” (Francisco Sabino Soares, 04/11/2012). Outro entrevistado afirma de forma categórica: “Tudo aqui, a maioria das coisas quem construiu foi Jonas” (Valdir da Fraga Dias, 24/11/2012).

Matéria do jornal O Ideal, edição de 2 de maio de 1954, traz um inventário das realizações da gestão de Jonathas Lima. Os destaques são: prédio do “Clube Vitória”, Usina de Geração de Energia Elétrica, açougues da sede, Conceição de Campinas, Lagoa Preta e Adustina, prédios escolares na sede (“Paulo Abreu” e “Cenecista”284) e nos povoados,

melhoramentos na Igreja Matriz, o prédio da agência dos Correios e Telégrafos, da Agência de Estatística, o abrigo “Lauro de Freitas”, jardim público e “obelisco” na Praça da Bandeira e o açude “Cutia”.

O açude foi, sem sombra de dúvidas, a maior realização da gestão tendo em vista sua importância para o município. Tratava-se de uma antiga demanda dos paripiranguenses (como observado no capítulo anterior) e da maior prioridade de prefeito Jonathas Lima, conforme

283 Tratava-se de uma usina pertencente ao próprio intendente e arrendada à intendência. Situada no centro da

cidade e instalada num complexo de casarões imponentes, a usina dividia espaço com uma beneficiadora de algodão que completava a renda do empreendedor Intendente (Valdir da Fraga Dias, 24/11/2012).

284 O prédio onde funcionou o colégio CNEC fora construído para abrigar um hospital, mas o mesmo teria sido

palavras pronunciadas por ele mesmo em discurso285 durante a inauguração da “usina de geração de energia” em 1946. A importância da obra é atestada por mais um trecho da fala de um de nossos entrevistados para o qual: “O açude foi uma obra braba, melhorou a vida do povo, pois antes quando tinha seca tinha que pegar água na barragem do Mercador” (Francisco Sabino Soares, 04/11/2012).

Essas realizações são resultado da nova realidade financeira do município que, a partir de 1946, passou a receber o “fundo de participação”. Doravante, conforme admite a própria reportagem de O Ideal, boa parte destas obras foi realizada com recursos federais e estaduais. Embora não se tenha encontrado informações mais precisas sobre esse ponto, é possível supor que Oliveira Brito, a essa altura já tinha bom transito estadual onde fora Secretário de Segurança Pública do governo Mangabeira, era sua ponte com o governo do estado. No plano federal, segundo um dos entrevistados, Jonathas Lima tinha o apoio do deputado Vieira de Melo286, com quem teria articulado muitos dos investimentos que o município iria receber, segundo o depoimento de Valdir da Fraga Dias (24/11/2012). Ademais, desde quando fora intendente na década de 1920, Jonathas Lima viajou muito pleiteando pessoalmente investimento junto aos governos estadual e federal. Como afirma um funcionário do prefeito no período:

O véio Jonas de presidente a governador ele tava no meio deles, uma festa uma coisa qualquer... a mala dele não desarrumava não. Ele viajava e quando chegava D. Júlia desarrumava, lavava, gomava e botava no mesmo lugar porque quando ele recebia um telegrama era só pegar na alça da mala e sair sem dizer pra onde (José Teles do Nascimento, 19/01/2013)287.

Com efeito, a administração de Jonathas Lima Menezes teve para o município de Paripiranga um significado marcante. Executou um “plano de modernização” baseado num conjunto de obras estruturantes e de embelezamento do núcleo urbano que, no dizer do mesmo entrevistado citado acima, equivalia localmente ao que, anos depois, a gestão de Antonio Carlos Magalhães na prefeitura de Salvador (1967-1970) significaria para a capital

285 Voz de Paripiranga, 11/08/1946.

286 Tarcílio Vieira de Melo, natural de Barreiras, foi deputado federal constituinte em 1945 pelo PSD baiano. Em

1954 elegeu-se novamente deputado federal pelo PSD e ganhou grande visibilidade nacional ao polemizar com o líder da UDN Carlos Lacerda.

287 Além dos investimentos, estas viagens (e outras que fez antes e depois de passar pela prefeitura) teriam

rendido contatos com autoridades nacionais como os presidentes Vargas e Juscelino Kubitschek. Jonathas Lima esteve com Vargas no Rio em 1945 e quando o presidente veio à região para inaugurar uma obra em 1952 (Grande Hotel, Cipó, Bahia) ao avistar Jonathas Lima na multidão convidou-o a subir ao palanque. Com Juscelino a aproximação ainda era maior e quando o presidente lançou a pedra fundamental de Brasília, lá estava Jonathas Lima do seu lado (José Teles de Andrade, 19/01/2013).

baiana. Isto é, foi uma modernização que alterou toda a estrutura da cidade transformando sua planta e preparando-a para as mudanças econômicas e sociais em curso.

A despeito de seus costumes aristocráticos e de seu perfil de homem “fechado288”, o

“coronel” adaptou-se aos novos tempos e introduziu um novo estilo na política local. No discurso já referido, acima o prefeito destaca seu “espírito público”, exalta a população como comunidade de “cidadãos iguais” e aponta o progresso como mote de seu governo:

[...] o que fiz e o que faço à frente do nosso querido Município, nada mais é do que corresponder a eterna confiança dos meus concidadãos. [...] sabe o povo desta terra que não poupo esforço, que não fujo as responsabilidades e que cada vez mais procurarei elevar nossa terra, tornando-a digna de figurar entre as primeiras e tornando-a por isto mesmo conhecida além de nossa simples região.

Agradecendo portanto esta significativa manifestação, que atravessou todos os recônditos mais sensíveis da minha alma, chegando até meu coração, tenho apenas a dizer-vos que esta imerecida homenagem me serve de estimulo para cada vez mais procurar servir a minha terra e corresponder a vossa estima e consideração. (Voz de Paripiranga, 11/08/1946).

Tratava-se da festa de inauguração da usina de geração de energia elétrica, mas o evento foi canalizado para a exaltação da figura do prefeito. Este foi o primeiro grande ato público ocorrido no município desde os anos 1920 e foi ele que deu o tom do que seriam os anos seguintes, principalmente nas eleições. A foto abaixo registra o momento do discurso:

Foto 11 – Cel Jonathas Lima de Menezes, primeiro prefeito eleito depois da redemocratização de 1945. Fonte: Arquivo do Museu Histórico-Político da Câmara de Vereadores de Paripiranga.

288 José Teles de Andrade (19/01/2013), que trabalhou 15 anos com Jonathas Lima, afirma que “o velho era de

lua, um dia tava bom outro dia tava ruim. Quando ele não tava pra conversa era melhor não se aproximar que ele era bruto”. Quanto aos costumes aristocráticos refiro-me à maneira de se vestir, ao zelo pela boa mesa e pela vida boêmia nas capitais que acompanhou o velho coronel até o fim da vida.

As administrações seguintes não foram tão marcantes quanto a de Jonathas Lima que só seria superada pela de Clarival Trindade (1977-1982). Entre 1951 e 1954 governou o município Jerônimo Evangelista de Carvalho da UDN. Jerônimo era considerado um homem de “bom senso” e, na administração, tratou de dar continuidade ao projeto modernizante iniciado por Jonathas Lima (João Santa Rosa de Carvalho, 19/11/2012). A edição de 2 de maio de 1954 do jornal O Ideal traz um balanço das ações de sua gestão e relaciona suas principais realizações: matadouro municipal (sede), mercado público do distrito de Adustina, calçamentos e esgotos na sede. Todavia, a maior realização de sua gestão foi a fundação de um novo distrito nas cercanias de sua fazenda (povoado “Maritá”), que permitiu reunir em um núcleo dezenas de famílias dispersas por um vasto território onde eram presas fáceis de cangaceiros. A iniciativa permitia-lhe ter um reduto eleitoral mais fácil de ser mobilizado em tempos de eleições. Nas palavras de um cabo eleitoral do período pode-se entender a como a política funcionava: “O Maritá era eu que resolvia tudo. O povo brigava e depois tanto o que apanhava como o que batia me procurava. Eu resolvia como achava melhor e os dois saiam satisfeitos” (Joaquim Cruz Siqueira, 01/11/2012).

Nas gestões dos filhos de Ismael (Francisco Trindade, 1955-1956, e Antônio Trindade, 1957-1958), a administração municipal não obteve grandes evoluções. Sem o apoio do governo estadual, Francisco e Antônio veem-se com dificuldades. Na oposição o PSD fazia duras críticas à gestão através do jornal O Ideal. Duas edições de 1957 dão ideia de quão hostil eram as relações situação/oposição no período. Na edição nº 198 de 31 de março (coluna Ecos e Comentários, assinada por “Frank”), o jornal relaciona pontos de suposta negligência da administração em relação à manutenção de equipamentos públicos como praças, estradas e até poços artesianos, e depois conclui com crítica e ironia: “A Prefeitura não publica os balancetes pela imprensa para conhecimento do público, como fazem todos os municípios. Governar assim em regime de ditadura é uma beleza!” A edição seguinte (número 199, de 7 de abril do mesmo ano), na mesma coluna e com a mesma assinatura, continua a crítica:

Dizem [...] que o Prefeito e os poucos amigos que tem, espalham que são peitudos pois têm dito por telegrama muitos desaforos ao governador, afirmando os mesmos que esperam a oportunidade para melhor desforrarem o erro cometido de lhe terem dado os seus votos.

... que o Prefeito trabalha bem em política, pois brigou com o governador, com o ex-Juiz de Direito e com o Delegado Especial, só falta brigar com o pároco da freguesia, assim mesmo...

... que os amigos que o elegeram são desatendidos nas coisas mínimas e têm medo até de pedir alguma coisa, ou reclamarem da administração. Clamam os impostos elevados, queixam-se da falta de atenção, mas tudo isso às

escondidas. O Prefeito não erra porque tem anel no dedo, se quem pode errar é o ignorante...

... que todos os papeis dos seus adversários encaminhados ao Prefeito dormem o sono dos inocentes e quando acordam estão com despachos interessantes, dá gosto se ler. É uma beleza governar como ditador. Onde está a democracia tão alardeada por estes senhores?

O trecho citado na íntegra não deixa dúvida de que um clima de animosidade se estabelecera entre situação e oposição, acirrando a tensão entre as duas facções lideradas pelas oligarquias. Além das supostas falhas na administração e dos descontentamentos dos eleitores, a oposição capitalizava politicamente o desentendimento entre o prefeito e o governador. Com efeito, a crise nas relações entre Prefeitura e Governo Estadual serviu para “lavar a alma” da oposição, que em 1954 amargara Juracy e Balbino apoiando o candidato da UDN no palanque municipal. A briga entre as duas autoridades era o que faltava para a oposição, apoiada por Oliveira Brito, preparar seu retorno ao poder.

A passagem dos Trindade pela prefeitura foi, portanto, traumática. Armada com seu jornal, a oposição cuidou de desgastar a imagem política dos situacionistas, inclusive rotulando-os como “ditadores”, de “arrogantes” ou “truculentos”. Tal “campanha” gerou prejuízo aos Trindade, que até os dias atuais são lembrados mais pelo estilo político do que pelas realizações. Conforme aponta um entrevistado: “Os Trindades eram muito fechados, por isso não foram bons políticos” (Lauro Nascimento, 26/07/2012). Em 1958, os Trindade não apresentaram uma alternativa do seio da família para a disputa da prefeitura e a UDN teve que fazer uma opção “renovadora” (voltariam com toda força na década de 1970 com Clarival Dantas e Trindade, sobrinho de Ismael). O nome foi Pedro Rabelo de Matos, “Pedro Faustino”, que seria prefeito entre 1963-1966. A administração de Pedro Faustino não é considerada uma gestão de grandes inovações, mas foi nela que a energia elétrica da Companhia Hidrelétrica de Paulo Afonso – CHESF foi instalada no município, uma importante conquista, cuja inauguração, em 1965, contou com a presença do governador Lomanto Jr.

Passados os dois mandatos consecutivos da UDN (com Jerônimo Evangelista de Carvalho, Francisco Dias Trindade e Antônio Dias Trindade), Paripiranga teve novamente um período de efervescência político-administrativa com as administrações de João Vitorino de Menezes (1959-1962, 1967-1970 e 1973-1976). Vitorioso em 1958, João Vitorino teve o apoio fundamental de Oliveira Brito que, seja como deputado federal seja como ministro de João Goulart (educação entre 1961 e 1962 e minas e energia entre 1963 e 1964), em sua administração.

Foto 12 – Oliveira Brito (ao centro com as mãos para trás) em visita a Paripiranga em 1960 para entrega de veículo “assistência” ao prefeito João Vitorino (do seu lado direito).

Fonte: Arquivo pessoal de Roberto Santos de Santana.

No entanto, a primeira experiência de João Vitorino à frente prefeitura não foi fácil. Contando apenas com metade dos vereadores, o prefeito teve dificuldades de aprovar projetos. Acompanhando os artigos do jornal O Ideal se tem uma noção dos embates daquele período. Em um artigo (edição de 16 de outubro de 1960) comemora-se o “entendimento” dos vereadores na composição da mesa diretora da Câmara que pôs fim a “meses” de paralisação dos trabalhos. Na sequencia o autor289 afirma estar confiante que a câmara iria desenvolver seus trabalhos com “eficiência”, mas dois meses depois, volta a lamentar a “falta de compromisso” dos vereadores do município de Paripiranga e implora para que:

[...] não se reproduzam os lamentáveis desentendimentos que o povo vem presenciando no Legislativo Municipal em consequência da falta de espírito público de alguns vereadores, que preferem entravar a administração municipal a servir ao povo que os escolheu para representa-lo. (O IDEAL, 04 de dezembro de 1960).

Sua segunda administração foi marcada também por grandes dificuldades. O primeiro problema a enfrentar deveu-se ao fato de não ter obtido a maioria na Câmara que seria presidida no primeiro biênio por Justino José das Virgens, um dos mais experientes políticos locais remanescentes da antiga UDN. A desvantagem no legislativo rendeu-lhe, de fato, grandes dificuldades administrativas. Edição de 4 de janeiro de 1969 do jornal A Semana traz uma nota do prefeito sobre promulgação de Lei Orçamentária para o exercício de 1969,

elaborada contingencialmente, em virtude de boicote dos vereadores ao projeto original encaminhado à Câmara meses antes.

Do mesmo jeito, registros dos anais da Câmara de Vereadores comprovam que este período foi de grandes embates entre situação e oposição. Discursos trocando acusações e protestos eram protagonizados de um lado pelos situacionistas João Pimentel e (seu irmão) Justino das Virgens Pimentel e, de outro lado, pelos oposicionistas Justino José das Virgens e José Ferreira de Matos (filho do ex-prefeito udenista Pedro Faustino). Este último chegou a protocolar requerimento (seção de 29/09/1968), sugerindo a convocação do prefeito para prestar esclarecimentos no plenário da Câmara, mas não conseguiu êxito.

Já os situacionistas protestaram (seção de 18/10/1968) contra denúncias “infundadas” que Justino José das Virgens teria publicado nos jornais de Salvador contra o prefeito, o promotor e o juiz da cidade. Muitas seções extraordinárias foram realizadas, mas o processo legislativo continuou travado, até que um oposicionista “muda de lado”. Antônio Marcionilo, vereador do distrito de Adustina, adere290 ao prefeito votando em projeto do executivo, o que

gerou protesto de José Ferreira de Matos (ata de 27/09/1968). Com maioria constituída, o prefeito ameniza a situação, a partir de 1969, e elege o novo presidente, Benedito Virgens291, para o biênio 1969-1970.

Os três governos de João Vitorino não atingiram o sucesso do de seu antecessor e correligionário Jonathas Lima Menezes, que modernizou a cidade nos anos 1940. Além das dificuldades de aprovar projetos na Câmara, e da perda de apoio no nível estadual e federal, João Vitorino priorizou obras menos marcantes como pavimentação de estradas, construção de redes de saneamento, pavimentação de ruas e construção de escolas na zona rural. Com efeito, do ponto de vista administrativo, João Vitorino figura como um hiato entre Jonathas Lima (anos 1940) e Clarival Trindade (anos 1970 e 1980).

A partir dos anos 1970 os problemas políticos se somaram aos problemas administrativos da segunda gestão e da curta gestão de Raimundo Sales. Como acontece em todas as esferas, ao se manter por longos períodos no governo, as facções tendem a apoderarem-se de cargos públicos para presentear seus seguidores, muitas vezes manipulando

290 De acordo com um vereador situacionista da época, Justino das Virgens Pimentel (22/11/2012), a adesão de

Antônio Marcionilio se deveu à promessa de João Vitorino de que o projeto em questão, que era de aquisição de um veículo para a Prefeitura, iria beneficiá-lo como liderança da distante Adustina.

291 Benedito Demétrio da Fraga Virgens era primo de Justino José das Virgens (ambos netos do líder peba Major

Justino) e elegeu-se vereador em 1966 com 256 votos pela facção liderada por João Vitorino (sublegenda Arena 2). Exerceu seu único mandato eletivo de 1967 a 1970, sendo o presidente da Câmara no segundo biênio do mandato (1969-1970).

concursos292. Contudo, muitas vezes, as escolhas derivadas deste “aparelhamento” produzem divergências e cisões no interior de um agrupamento.

Foi o que aconteceu em Paripiranga em 1971, quando Jonathas Lima, acompanhado por Milton Seixas e Bernardino Barbosa, rompe com João Vitorino, em virtude de divergência na indicação de um cargo na educação293, e encerra a coesão dentro da facção. A rigor, esta coesão nunca existira efetivamente, pois, como vimos na seção anterior, a “passagem do bastão” de Jonathas Lima pra João Vitorino não foi tranquila, mas marcada por disputas internas. As rivalidades entre Jonathas Lima e João Vitorino só foram acalmadas em 1976, quando a composição da chapa da facção contemplava o preferido do “novo líder”