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2.4 A aprendizagem do consultor no contexto da consultoria organizacional

2.4.1 O processo de aprendizagem de adultos

2.4.1.3 A aprendizagem no contexto social

A aprendizagem sob a perspectiva do aprendizado social dá-se por meio das interações dos indivíduos. Esta perspectiva, para Merriam e Caffarella (1999, p. 259), “combina

elementos tanto da orientação behaviorista como da cognitivista e apresenta uma posição de que as pessoas aprendem observando as outras”. Desse modo, um determinado grupo, formado por pessoas de backgrounds diferenciados, tende a um desenvolvimento de seus conhecimentos, uma vez que uma pessoa irá aprender com outras, através da observação. Esse aprendizado, baseado na observação, é comum entre os artesãos, passando de pai para filho a maneira de construir um determinado objeto, ou em organizações, onde o detentor da

expertise contribui para o aprendizado dos novatos, que o acompanha durante a realização das

atividades.

Nesta perspectiva, podemos considerar que a aprendizagem é situada em um determinado contexto, sofrendo influência do mesmo. Sob esta orientação, Lave e Wenger (1991) ao tentarem esclarecer o conceito de aprendizagem situada reforçam a concepção de que a aprendizagem é inseparável da prática social. Esta abordagem apresenta a idéia de que a prática social vem primeiro e a aprendizagem é uma das suas características. Esta posição contrasta com a abordagem na qual a prática está incluída dentro do processo de aprendizagem, já que sustenta que a aprendizagem é um aspecto integral da prática. Assim, aprendizagem não está meramente situada, mas é uma parte integral e inseparável da prática social.

A teoria da prática social enfatiza a relativa interdependência do indivíduo e mundo, atividade, significado, cognição, aprendizado e conhecimento. Essa visão sustenta que aprendizagem, pensamento e conhecimento são relações entre pessoas em atividade no mundo socio-culturalmente constituído (LAVE; WENGER, 1991).

Seu interesse está em compreender a natureza da atividade da aprendizagem a partir das pessoas envolvidas; procura entender o envolvimento do indivíduo numa perspectiva de que ele participa do mundo e deve ser um agente em atividade no e com o mundo, e não apenas um receptor do conhecimento sobre o mundo (LAVE; WENGER, 1991).

Na aprendizagem situada se destacam dois conceitos principais que são a “participação periférica legítima” e a “comunidades de prática”.

A participação periférica legítima é o processo por meio do qual os aprendizes se tornam membros completos e obtêm legitimação através da participação na prática sócio- cultural da comunidade. Isto é, o principiante busca sua participação de forma legitimada por meio da ajuda de membros mais experientes da comunidade, sendo possível aprender através da observação da prática dos participantes com mais habilidade. No entanto, a participação legítima periférica provê mais do que a “observação”; envolve também a “participação” como uma forma de aprendizado da “cultura da prática” (LAVE; WENGER, 1991).

A participação legítima não é apenas uma condição crucial para a aprendizagem, mas um elemento constitutivo dela, bem como a participação periférica refere-se a estar localizado no mundo social, uma noção complexa que implica em estruturas sociais envolvendo relações de poder (LAVE; WENGER, 1991).

Sendo assim, para Gherardi, Nicolini e Odella (1998) aprender requer o acesso e a oportunidade de fazer parte na prática usual de um grupo, sendo também uma forma de

empowerment. Desse modo, o aprendizado envolve a estrutura social, relações de poder e

legitimação, resultado da participação no ambiente e na prática cultural em que o conhecimento existe.

Para Lave e Wenger (1991) e Gherardi (2001) aprender, pensar e saber são relações entre pessoas em um mundo social e culturalmente estruturado. Assim, para Gherardi, Nicolini e Odella (1998) este aprendizado é obtido através das comunidades de prática. Nestas comunidades, a prática é dependente dos processos sociais através dos quais são sustentados e perpetuados, e aprender ocorre com o acoplamento nessa prática.

A comunidade de prática refere-se a uma prática de trabalho ou social que gera uma comunidade onde o aprendiz adquire e desenvolve conhecimentos e habilidades, sendo desenvolvida em um clico de começo, meio e fim. Entretanto, a comunidade de prática reproduz a si mesma socialmente com ciclos mais longos do que a prática de trabalho em si e pode ser formal ou informal (LAVE; WENGER, 1991).

Os autores destacam que a comunidade de prática não implica necessariamente em um grupo bem definido ou fronteiras da comunidade socialmente visíveis; implica participação em um sistema de atividades no qual os participantes compartilham entendimentos sobre o que estão fazendo e o que isto significa em suas vidas e para suas comunidades (LAVE; WENGER, 1991).

Numa abordagem similar, Gherardi, Nicolini e Odela (1998) apresentam uma visão do caráter social da aprendizagem, defendendo que a aprendizagem no trabalho pode ser entendida como uma atividade tanto cognitiva quanto social. Esta perspectiva é contrastante com a visão dominante na nossa sociedade em que a aprendizagem ainda é vista como um processo de “entrega de conhecimento”, isto é, baseada na noção de aprendizagem como um processo de entrega de informação proveniente de uma fonte de conhecimento (professor ou livro) para um alvo carente desta informação (ECKERT, 1993 apud GHERARDI, NICOLINI; ODELA, 1998).

Nesta última visão, aprendizagem equivale essencialmente à aquisição de um conjunto e dados e fatos, que são acumulados por todas as gerações que nos precederam. Esse

conhecimento é “externo”, e está armazenado em alguma memória (documentos, livros), sendo que o principal esforço do aprendiz é adquiri-lo e armazená-lo na sua própria mente para utilizá-lo quando necessitar.

Embora as autoras (GHERARDI, NICOLINI; ODELA, 1998), considerem que o treinamento e estudo sejam importantes, acreditam que a aprendizagem é profundamente originada nas atividades do dia-a-dia. A maior parte do conhecimento relevante que distingue um especialista de um novato é adquirido no dia-a-dia por ação e reflexão, isto é, pensando sobre o que está fazendo e falando sobre isto com os outros (SCHÖN, 1983). A aprendizagem é vista como muito mais do que uma atividade individual e muito diferente de simplesmente encontrar e adquirir itens do conhecimento organizacional. Tanto na vida cotidiana quanto nas organizações de trabalho pessoas e grupos criam conhecimento negociando o significado de palavras e ações, situações e artefatos materiais (GHERARDI, 2001). Dessa forma, a aprendizagem é sempre uma realização prática, que acontece entre e através de outras pessoas.

Adotar a perspectiva social da aprendizagem significa focar os processos de participação e interação que servem de base ao próprio contexto para a aprendizagem. Nesse novo cenário a linguagem assume importância central e é concebida como a principal forma de ação no mundo social, em vez de ser meramente entendida como um mediador da transmissão de conhecimento, constituindo-se um elemento crucial no processo de aprendizagem. A aprendizagem, dessa maneira, passa a ser concebida como um empreendimento fundamentalmente social, que envolve a comunidade com um todo, ao invés de um fenômeno apenas individual (GHERARDI, NICOLINI; ODELA, 1998).

Em resumo, ao analisarmos todas as visões referentes ao fenômeno da aprendizagem citadas anteriormente, podemos entender que o mundo organizacional é repleto de episódios de aprendizagem resultado da participação cometida de agentes reflexivos detentores de conhecimentos, através da interação e relacionamentos forjados dentro e através dos limites organizacionais convencionais (ARAÚJO, 1998). Esse também parece ser o caso dos aprendizados desenvolvidos pelos consultores organizacionais.