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3 A CONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E AS MULHERES COMO

4.3 A Busca pelas mulheres sujeitos da pesquisa: A Condução Teórico-

Os diversos estudos existentes sobre o fenômeno da violência contra a mulher nos remetem a apreensão dos papéis sociais e a forma autoritária pela qual foram se sedimentando as relações entre homens e mulheres, via pela qual foram sendo administrados os conflitos nas relações sociais.

Nessa perspectiva os estudos e pesquisas sobre gênero na atualidade apontam para a necessidade de se apreender essa categoria enquanto sendo uma relação construída socialmente entre seres opostos, assim, temos Faria & Nobre

acompanhado do laudo pericial, quando necessário, devendo tal termo ser remetido ao Juizado para realização de audiência de conciliação e julgamento (XAVIER, 2007).

(1997), Safiotti (1994, 1997 e 2004), Scott (1999), Osterne (2005), dentre outros autores que discutem tal temática.

A leitura desses autores subsidiou a elucidação do caminho a ser seguido por nós, uma vez que os resultados apontados nessas obras convergem para as nossas reflexões sobre a mulher vítima de violência e sua percepção enquanto sujeito de direitos. Visto que ocorre uma unanimidade na certeza de que existe uma contradição entre o ser masculino e o ser feminino, o que pressupõe em suas identidades características que as definem e as determinam ao longo da história humana.

De fato, os nossos estudos nos trazem a convicção e a constatação de que as marcas de uma cultura patriarcal acompanham homens e mulheres desde as origens do Pensamento Ocidental, cultura esta que desde então vem se incorporando ao longo dos anos no cotidiano das pessoas.

Com base em tais constatações e com vistas a não perder o foco do que nos colocamos a pesquisar, adotamos como requisito indispensável para a nossa amostra o fato de que as mulheres a serem entrevistadas teriam em comum não só o fato de ter se deparado com a violência doméstica, mas também, experienciado a desvinculação de sua família em função de terem sido abrigadas. Fato este que pode ter conferido certa homogeneidade na forma de se perceberem enquanto sujeitos de direitos, o que nos permitirá compreender se de fato houve modificações para a vida das usuárias, advindas do serviço que é disponibilizado pelo CREAS.

Assim, considerando que a nossa perspectiva teórica é a de que o uso intencional da força física ou o abuso de poder quando dirigida à mulher é considerado violência contra a mulher, também conhecida como o fenômeno da violência de gênero (doméstica e familiar), definimos adotar instrumentos de coleta de dados que nos possibilitassem conhecer melhor tal realidade.

Desta feita, o percurso metodológico aqui adotado corresponde a uma pesquisa qualitativa, visto sermos cientes de que esse tipo de pesquisa nasce da percepção da dificuldade nas Ciências Sociais de decompor os fenômenos em variáveis isoladas, quantificá-las e determiná-las, uma vez que se constatou ser inviável a percepção de um fenômeno separado de seus múltiplos determinantes e de toda a sua riqueza, o que nos remete a concepção dialética da história, visto que esta nos permite ainda descobrir o significado das ações e das relações que se ocultam nas estruturas socio-históricas e culturais.

Quando estávamos delimitando a metodologia e ao mesmo tempo o Projeto da Dissertação, o CREAS nos forneceu um total de aproximadamente 1.724 (um mil setecentos e vinte e quatro) 63 mulheres atendidas ao ano, pelos mais diversos serviços prestados por este centro. Esse quantitativo nos deu o norte para definirmos as mulheres que iriam fazer parte da amostra. Idealizamos a realização do referido trabalho em dois momentos principais: No primeiro, o nosso planejamento consistia na aplicação de questionário a um recorte de 16 mulheres que foram abrigadas, no espaço temporal que se delimitou tendo em vista o período que compreende a transformação do CIAM em CREAS em virtude do tempo exíguo.

As aproximações iniciais a partir da pesquisa documental a serem aqui destacados revelam a situação das 16 mulheres que foram abrigadas. Cinco ainda sofrem violência mesmo não tendo voltado a conviver com o agressor, duas voltaram a conviver com o agressor, quatro mulheres foram embora do estado do Rio Grande do Norte para conviver com os familiares, quatro não sabíamos mais notícias e seriam revisitadas por nós a partir desta pesquisa e uma fixou residência na ONG, local em que foi abrigada, por falta de vaga na casa abrigo64.

Acrescentamos que, desse universo de dezesseis mulheres, três não chegaram a ser abrigadas na Casa Abrigo Clara Camarão por falta de vaga, ficando, portanto em outros locais, de conhecimento dos técnicos sociais, por um tempo provisório. Ressalta-se ainda que do universo trabalhado, seis mulheres solicitaram desligamento da referida casa antes que as providências cabíveis ao caso fossem concluídas.

De posse desta realidade, advinda do primeiro momento da pesquisa, idealizamos aplicar entrevistas com as dezesseis mulheres, constando tanto as questões relativas aos dados pessoais, como questões de ordem subjetiva que nos permitiria perceber o grau de envolvimento e compreensão dos sujeitos no que se refere à questão da violência experienciada. As mulheres a serem entrevistadas, foram escolhidas por terem experienciado tanto à violência doméstica, quanto o fato de terem sido abrigadas, fragilizando assim seus vínculos familiares.

A entrevista aqui trabalhada caracterizou-se por ser semiestruturada, tendo em vista a nossa pretensão em oportunizar as entrevistadas a possibilidade

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Dados de maio de 2006.

64 Percebe-se, portanto, que as Casas-Abrigo, apesar de serem uma conquista, ainda não respondem

em desenvolver mais livremente seu pensamento. Elaboramos um roteiro de entrevista com perguntas abertas e fechadas (ver apêndice A), guiadas pela perspectiva de que as perguntas deveriam ser claras para que as respostas obtidas pudessem traduzir ao máximo o pensamento das entrevistadas. Portanto, o objetivo principal da entrevista foi investigar e analisar as modificações e/ou resultados trazidos pelo serviço que é disponibilizado no CREAS, para a vida das usuárias, no que se refere à violência contra a mulher e especialmente para as que foram encaminhadas por este centro à casa abrigo. Objetivávamos também, analisar se o atendimento realizado permitiu que estas se percebessem enquanto sujeitos sociais capazes de controlar suas vidas e interferirem em seus destinos.

No desenrolar das entrevistas, buscamos interferir minimamente na espontaneidade das entrevistadas, tentando sempre deixá-las à vontade e buscando estabelecer um clima de confiança, esclarecendo os objetivos que motivaram a pesquisa bem como a importância da contribuição advinda de cada um dos sujeitos envolvidos nesse processo da busca pelo conhecimento.

Os momentos de aproximação com as entrevistadas foram norteados pela noção de que “pesquisador” e “pesquisado” são sujeitos que compõem um processo de desenvolvimento e interação, visto que para as Ciências Humanas não existe objeto de pesquisa (RICHARDSON, 1999).

Nesse momento também foi feita análise documental de material do CREAS a fim de produzir a caracterização das ações voltadas para o universo pesquisado, como também visando traçar o perfil dessas mulheres que foram atendidas e, especificamente, abrigadas e análise de entrevistas e acompanhamentos já realizados com elas quando foram atendidas no CREAS, bem como leitura e apreciações de pesquisas já realizadas pelo referido centro.

Em um segundo momento, após ter havido a aproximação inicial com o universo feminino, seriam retiradas cinco mulheres para que fosse procedida com elas uma pesquisa qualitativa na tentativa de conhecer com mais profundidade parte do que pensam e como vivem.

Em síntese, inicialmente a pesquisa encontrava-se idealizada da seguinte forma:

QUADRO 3Idealização Metodológica da Pesquisa. N de

pessoas Instrumento Objetivo

1º momento 16 Semiestruturada Entrevista violência e sua percepção sobre a situação Conhecer o perfil das mulheres vítimas de vivenciada.

2º momento 05 Entrevista em grupo Conhecer mais profundamente o grupo a partir das experiências em comum.

Após discorrer sobre o caminho metodológico que planejamos, faz-se necessário descrever que este não foi tão simples de ser percorrido, necessitando de mudanças estratégicas durante a fase da realização das entrevistas, que se iniciou em setembro de 2008 estendendo-se até o mês de fevereiro de 2009.

Inicialmente, como já assinalamos, a referida pesquisa tinha por objetivo aplicar o formulário de entrevista semiestrurada, a um recorte de dezesseis mulheres que foram atendidas pelo CREAS e, posteriormente, abrigadas, num segundo momento, após ter havido aproximação com o universo das mulheres seriam retiradas cinco, para proceder com estas uma maior aproximação através de entrevistas em grupo, desta vez realizada no próprio CREAS, com mais tempo para aplicação e maior interação com o universo trabalhado. Porém, vários foram os fatores que contribuíram para que o segundo momento da pesquisa não acontecesse conforme o planejado. Foram eles:

 A frequente indisponibilidade de um carro do CREAS, para realização das visitas e aplicação das entrevistas, uma vez que quando o carro era disponibilizado para este centro, várias eram as necessidades de visitas demandantes dos outros atendimentos;

 O período do ano- outubro de 2008- ano de eleições municipais, o que mobilizou todo o município, dificultando assim a realização das visitas previstas;

 Os endereços das mulheres a serem entrevistadas, informados a este centro, seja residencial ou comercial, haviam mudado e não conseguimos os novos endereços;

 Os números de telefones informados por parte deste universo ao CREAS, não mais correspondiam ou eram inexistentes;

 O temor de algumas mulheres que, tendo voltado a conviver com o agressor, tinham vergonha e sendo assim, ou davam o endereço errado quando eram contatadas para confirmação deste e marcação da entrevista ou não atendiam

a ligação;

 A nova dinâmica de vida da maioria das mulheres que desenvolvem atividades durante o dia, muitas vezes em outro município, só estando em casa à noite ou nos finais de semana;

 O difícil acesso das residências das mulheres. (bairros longínquos e desconhecidos para a pesquisadora);

 Destaca-se ainda que, no mês de dezembro, a dinâmica de vida das pessoas é mais intensa e sendo assim, poucas entrevistas foram realizadas no referido mês. Nesse sentido, tais dificuldades fizeram com que outras estratégias fossem pensadas e executadas para superar os desafios que se apresentavam. Surgiram, portanto, as seguintes estratégias:

 Utilização do carro da pesquisadora para a realização das visitas e execução das entrevistas (conforme o apêndice A);

 Negociação com a direção do centro para que um técnico administrativo que é residente no próprio município e trabalha no acolhimento à mulher vítima de violência pudesse acompanhar a pesquisadora, para facilitar a identificação dos endereços;

 Estender a pesquisa até o mês de janeiro, para que assim fosse possível entrevistar o universo previsto;

 Utilização de contatos telefônicos (endereços antigos, vizinhos antigos, locais de trabalho, órgãos da prefeitura) para certificação dos endereços fornecidos pelas mulheres, ou ao menos de pistas sobre o destino delas;

 Contato com familiares ou amigos das mulheres a serem entrevistadas para esclarecimento da pesquisa, sensibilização destas e obtenção de informações sobre suas vidas na atualidade, quando estas se recusavam por medo ou vergonha de atender a pesquisadora;

 Marcar entrevistas no final de semana ou à noite, no local mais adequado as entrevistadas, com o objetivo de respeitar a dinâmica de vida delas;

 Substituir algumas mulheres a serem entrevistadas, seguindo o critério definido de que tenham sido atendidas pelo CREAS e abrigadas, caso não fosse possível contar com as inicialmente selecionadas;

 Entrevistar a coordenadora do CREAS, as assistentes sociais e outros técnicos que formam a equipe que atende a mulher vítima de violência, a fim de responder aos questionamentos propostos (conforme apêndice B);

 Reavaliar o livro de registro, as fichas de atendimento, fichas de encaminhamento e carta convite do CREAS (conforme os anexos; A, B e C) com a ajuda dos técnicos administrativos que trabalham no acolhimento a mulher vítima de violência, no intuito de identificar outras mulheres que também foram atendidas no espaço temporal descrito, ainda que não tenham permanecido na casa abrigo o tempo necessário, para que estas pudessem substituir aquelas de endereços não localizados.

Tendo sido as estratégias hora pontuadas combinadas com a Coordenação do CREAS, passaremos agora a explicitar a análise dos dados que foram obtidos com o desenvolvimento da presente pesquisa.