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3 A CONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E AS MULHERES COMO

3.4 As Mulheres Como Sujeitos de Direitos Humanos

Para chegarmos à constatação das mulheres como sujeitos de direitos37, iniciaremos pela era Moderna, na qual como já assinalamos, a Revolução Francesa constitui-se como referência para o início da luta pelos direitos humanos, sendo ainda palco para o surgimento do primeiro Movimento de Mulheres, tendo em vista que estas, participaram ativamente na luta contra a aristocracia feudal. Ainda assim, a Declaração fruto direto da Revolução Francesa, intitulada de Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), surge referindo-se ao homem como sendo um ser genérico. Tal fato suscitou a resistência de Olympe de Gouges, a primeira mulher que foi capaz de afirmar que a Declaração não atendia às

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Vale ressaltarmos que “direitos das mulheres” é ainda um conceito não concretizado plenamente, embora se reconheça os direitos das mulheres como direitos humanos e que mulheres e meninas tenham direito a uma vida sem violência (CFEMEA, 2008).

necessidades das mulheres, visto assegurar somente os direitos dos homens. De posse de tal entendimento, em 1791, Olympe publica a Declaração de Direitos das Mulheres. Contudo, por ser uma mulher a frente do seu tempo, foi julgada e guilhotinada na França em 179338.

Ressalta-se que a Modernidade traz consigo a característica de ter propiciado tanto a possibilidade do surgimento de movimentos sociais que incitaram o questionamento e o desaparecimento de parte de preconceitos históricos contra as mulheres, quanto à condição para que esta sociedade se estruturasse baseada no pensamento Cristão, estabelecendo, portanto a permanência de inúmeras contradições em sua dinâmica social, cultural e política. Tais contradições alicerçam o que mais tarde caracterizam o “machismo”39.

Mais tarde, em 1865, foi formado o primeiro grupo de mulheres dispostas a lutar pelo direito de voto na cidade de Manchester. Desta feita, foi a partir da Primeira Guerra Mundial que vários pequenos grupos de mulheres passaram a compor o Movimento Feminista40 que se consolidou em nível internacional, na década de 1960, colocando em questão tanto o machismo, quanto a submissão das mulheres imposta pelos homens e defendendo a figura de uma mulher mais ativa e participante (cidadã).

Em nível nacional, na década de 1960, vivenciou-se o processo de modernização conservadora da sociedade, em um sistema de governo autoritário, caracterizado pela repressão militar, violência, perseguições, assassinatos, alto índice de inflação, censura de imprensa, entre outros41.

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Em 1948, transcorridos 50 anos de Declaração Universal dos Direitos do Homem é promulgada pela ONU a Declaração dos Direitos Humanos, numa perspectiva de gênero, o que caracteriza que a luta de Olympe de Gouges e das diversas mulheres ao longo da história humana, não foi em vão.

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O machismo é aqui definido como sendo: “Uma forma de organização social e de exercício de poder e dominação masculina, onde as mulheres existem como sujeitos com alguns direitos e na qual têm espaços de autonomia, mas também vulnerabilidade” (Barbieri, 1993, p.14).

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O movimento feminista pode ser definido como sendo um movimento sócio-político que luta pela defesa e ampliação dos direitos da mulher. Surge como uma ação organizada na Europa Ocidental, precisamente na França, com nítida influência das doutrinas socialistas a partir do século XVIII, entre os marcos da corrida industrial e da Revolução Francesa, por conseguinte, surge na primeira metade do século XIX, na Inglaterra e nos Estados Unidos, com o objetivo principal de conquistar direitos civis, como o voto e o acesso ao ensino superior; muito embora a reivindicação pelo voto feminino já tivesse sido levantada na Revolução de 1789. Mais tarde o movimento feminista ressurge na década de 1960, nos EUA, com reivindicações mais amplas, como o direito à sexualidade e à igualdade com os homens no mercado de trabalho (TOSCANO E GOLDENBERG,1992).

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Afirma-se um poder de Estado que assume tanto funções repressivas no plano social, como modernizadoras no plano administrativo. Tornam-se dominantes dentro do aparelho de Estado, os representantes da aliança entre as forças armadas e a tecnoburocracia (IAMAMOTO E CARVALHO,

Destaca-se, ainda nesse período, a efervescência do movimento de mulheres e feministas, mobilização esta que conseguiu dar visibilidade aos prejuízos pessoal e social que atinge as mulheres vítimas de violência, compondo assim, elementos suficientes para despertar a necessidade de um compromisso efetivo do Estado na implementação de políticas públicas sob a ótica de gênero.

No Brasil, já na década de 1960 os movimentos sociais, caracterizaram- se, de forma geral, como instrumentos alternativos de interferência estatal e construção de ideais democráticos, visto que contraditoriamente esse momento se caracterizava pela forte intervenção do Estado na economia e na vida social, dinamizando, por conseguinte os setores estratégicos necessários para este, como também, investindo em políticas sociais, como forma de garantir a reprodução da força de trabalho e reduzir as inúmeras tensões sociais. No final desse período, eclodiu uma diversidade de movimentos em torno de questões concretas advindas das contradições urbanas.

Após, aproximadamente, 21 (vinte e um) anos, tem-se o final do período ditatorial e o início da história republicana. Porém, a instauração da Nova República não significou uma mudança histórica significativa, uma vez que as mudanças que viriam a se constituir estavam diretamente relacionadas ao contexto mundial envolvido com as transformações no comércio, na produção, nas relações de política externa entre países e do declínio dos países socialistas.

Nesse sentido, situaremos agora o contexto em que se deu essa passagem e inserção da sociedade brasileira na chamada Nova República. Acarretado especificamente pelo financiamento público da economia, expandem-se: a miséria, o desemprego em massa ocasionando um descompasso entre a crescente demanda das necessidades sociais e o crescimento do orçamento público, e ainda a ampliação das tensões sociais; visto o enfrentamento da crise estrutural que se instalara tendo em vista as mudanças ocorridas nas relações entre trabalho e desemprego.

Vale ressaltar que a situação no período do milagre econômico vivenciado no Brasil na década de 1970, não se diferenciou muito do anterior, tendo em vista que a situação de dependência econômica do país em relação às nações economicamente mais desenvolvidas, só aumentava, somando-se a política de

2005, p.362). Todo o aparelho repressor do Estado foi utilizado contra forças contrárias ao regime militar instalado em 1964, especificamente contra os comunistas.

estatização das dívidas das empresas privadas, originando, portanto, o crescimento dos desequilíbrios do setor público e da dívida externa.

No entanto, esse quadro oportunizou para a economia global uma reestruturação das forças produtivas e da reorganização das bases objetivas da produção, em vários ramos, enfatizando aqui os ramos produtivos e tecnológicos; retirando-se assim, muitos dos obstáculos que dificultavam a expansão do capital pelo mundo, inclusive no Brasil.

Esse processo de reordenação do Estado para as necessidades econômicas implicou na supressão do Estado de Bem-estar social – que no Brasil, ainda que não tenhamos desfrutado desse tipo de sociabilidade- significou o declínio das escassas conquistas sociais conseguidas às duras penas e por batalhas que se estenderam por décadas pela classe trabalhadora; visto que o acesso e o controle sobre os recursos do fundo público do Estado, que os trabalhadores obtiveram, foram retiradas pelo desenvolvimento do sistema capitalista.

Nesse período, outro protagonista surge: a partir de meados dos anos 1970, o movimento de mulheres começou a denunciar amplamente a absolvição, pelos tribunais do júri, dos autores de homicídios de mulheres. No início dos anos 1980, surgiram grupos feministas em todo o país, denominados SOS-Mulher, voltados ao atendimento jurídico, social e psicológico de mulheres vítimas de violência. A então forte e bem sucedida politização da temática da violência contra a mulher pelo SOS-Mulher e pelo movimento de mulheres em geral fez com que, em São Paulo, o Conselho Estadual da Condição Feminina, também criada no governo Franco Montoro, em 1983, priorizasse essa temática, entre outras. O Conselho propôs, então, a formulação de políticas públicas que promovessem o atendimento integral às vítimas de violência, abrangendo as áreas de segurança pública e assistência social e psicológica.

Nesse contexto, apesar da ausência de dados estatísticos nacionais, a visibilidade da violência doméstica e sexual contra as mulheres ganhou amplitude pelo crescimento do movimento de mulheres. Esse movimento que ressurge, pontua a questão da violência contra a mulher como uma de suas prioridades, sendo um fator determinante tanto no estímulo à geração de dados estatísticos e estudos qualitativos sobre esse fenômeno a partir de então, quanto na propositura e pressão por políticas públicas.

nacional, interamericano e mundial do movimento feminista. O ano de 1975 foi declarado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o “Ano Internacional da mulher”. Em 1979, a assembleia geral da ONU aprovou a “Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência Contra a Mulher”, ratificada em 150 países definindo a violência baseada em gênero.

Vale salientar que tal convenção delimita ainda mais três formas de abrangência da violência contra a mulher, são elas: aquela que ocorre no âmbito familiar, a que ocorre no âmbito comunitário e a praticada ou permitida pelo Estado, por meio de seus agentes.

Nos anos finais da década de 1970 e ao adentrarmos os anos de 1980, temos no âmbito da sociedade brasileira as lutas pela redemocratização da sociedade, propiciando a união política dos diversos setores sociais favorecendo, também, a reorganização dos movimentos sociais. Nesse contexto, o processo de democratização do Estado brasileiro, a partir dos anos 1980, pôs em questão o papel de modernização da sociedade desempenhado pelo Estado através do seu projeto burguês. No entanto, essa modernização não beneficiou a sociedade civil, que se viu cerceada em seus direitos básicos de cidadania e compelida a um sistema de apartheid42 social. Assim sendo, muitos movimentos passaram a ser considerados não mais como alternativos, mas como expressão organizada das massas, assumindo um caráter institucional, através da organização dos conselhos populares e dos conselhos municipais (da saúde, da criança e do adolescente, da mulher, da habitação, dos transportes, etc.)43.

Nesse sentido a instauração da Nova República, aconteceu, sem, no entanto considerar e incluir como pauta as reivindicações das classes populares, a não ser na medida mínima necessária; se caracterizando como sendo uma “transição de continuidade”, sem, portanto trazer mudanças efetivas para a sociedade brasileira no que se refere à desigualdade, à miséria e a falta de acesso.

42Afirma BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO que, em língua africana Apartheid significa

“separação”. Porém, o Apartheid não pode ser entendido simplesmente como “racismo” ou discriminação racial; constitui um sistema social, econômico e político constitucional baseado em princípios teóricos e numa legislação ad hoc. Politicamente falando e em seu sentido restrito apartheid significa “manutenção da supremacia de uma aristocracia branca, baseada numa rígida hierarquia de castas raciais, para as quais existe uma correlação direta entre a cor da pele e as possibilidades de acesso aos direitos e ao poder social e político” (1995, p.530).

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Os conselhos são mecanismos previstos na Constituição Federal de 1988, que pressupõem em sua formação representação do Estado e da sociedade civil, na busca do aperfeiçoamento do processo da gestão democrática (BIDARRA, 2006, p.44).

Com base nessa contextualização, continuaremos a discussão sobre as mulheres enquanto sujeitos de direitos, nos remetendo a percepção de que esse movimento ocorre paralelamente as mais diversas reivindicações e pressões organizadas pelos trabalhadores na década de 1980, no período de redemocratização no país, que ocasionam mais tarde, a incorporação pela Constituição Federal (CF), de muitas demandas sociais de expansão dos direitos sociais e políticos. Um dos maiores avanços dessa Constituição, em termos de política social, foi à adoção do conceito de Seguridade Social – o termo seguridade social, já era adotado desde 1935 nos Estados Unidos e desde a década de 1940 na Europa Capitalista – que inovou a forma de organizar as iniciativas dos Poderes Públicos e da sociedade englobando em um mesmo sistema o acesso às políticas de saúde, previdência e assistência social (SALVADOR E BOSCHETTI, 2006).

A partir desse avanço democrático e através da participação das mulheres nos partidos políticos e nas campanhas políticas eleitorais, as feministas elaboraram propostas de atuação sobre as questões de gênero que foram incorporadas pelos governos estaduais e federais. Isso desencadeou algumas iniciativas importantes para o status da mulher brasileira, que em conformidade com os estudos de Santos e Macedo (1999), em quase todos os movimentos as lutas passaram a assumir características políticas. Nesse sentido, o movimento feminista buscou maiores espaços de reivindicação, tanto nas lutas trabalhistas, como em outras áreas. Concomitantemente, ocorreu um aumento bastante significativo dos movimentos populares e Organizações Não-Governamentais (ONG’s) no Brasil44.

Convém registrar que as autoridades governamentais foram implementando algumas reivindicações do movimento feminista, dentre essas, as delegacias especializadas para o atendimento da mulher, atingindo todas as grandes e médias cidades das unidades federativas do Estado brasileiro. Surgiram assim, no Estado de São Paulo, novos mecanismos de defesa para as mulheres, tais como: Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), a primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DEAM)45 em 1985 e a proposta de implantação do Programa

44 Estima-se que nessas três décadas de feminismo contemporâneo mais de 1.000 grupos foram

organizados no País, atuando em diferentes setores: em partidos políticos, em estruturas do Estado, os sindicatos, as associações de moradores, as universidades, em grupos autônomos, em instâncias de controle social e em ONGs (RAMOS, 2004, p.8).

45A primeira delegacia especializada de defesa das mulheres no Brasil e no mundo, surgiu no ano de

de Assistência Integral à Saúde da Mulher-PAISM entre outras.

Na comunidade científica, as feministas travaram uma luta significativa para ocupar espaços de “estudos sobre a mulher”, na comunidade acadêmica e fora dela. A criação de núcleos e programas de estudos sobre a mulher e a organização de concursos de dotação de bolsas para pesquisas voltadas a mulher ou a temáticas sobre estas, no contexto social do Brasil foram iniciativas realizadas.

Ainda na década de 1980, muitos grupos feministas novos surgiram, particularmente fora do eixo Rio - São Paulo. Trazendo uma nova característica para o trabalho desenvolvido, uma vez que a sua luta deixa de ser “assunto de mulher” para ser absorvida, através da reflexão, divulgação e formação das lutas das mulheres, pelas várias organizações de classe: sindicatos, associações, partidos políticos e outros, realizando assim a articulação necessária com as mulheres das classes populares.

Em paralelo a esses acontecimentos, verifica-se também no cenário político e social brasileiro, no início da década de 1980, o acirramento da pobreza atrelada às fracassadas tentativas de estabilização econômica, além do baixo investimento na área das políticas sociais. Acrescidos ao problema inflacionário, dão-se também corrupções, escândalos e desvios do dinheiro público, ocasionando o descontentamento geral.

No período de 1981 a 1983, configura-se a dívida tríplice – interna, externa e social. A partir de então, começam as tentativas de mudanças. A sociedade (empresários, classe média e camadas populares) se mobiliza, realizando o maior movimento social de todas as épocas: o movimento das ”Diretas Já”, em 1984, apostando na democracia como um dos instrumentos para uma mudança socioeconômica.

No entanto, as diretas não vieram, pois, não foram aprovadas pelo Congresso, no qual o governo tinha maioria. Apesar dessa derrota para os Movimentos Sociais, Ferreira (1997), em suas reflexões, destaca que foram dados passos significativos rumos à democracia.

Os partidos comunistas foram legalizados, as entidades estudantis e as centrais operárias, tais como: a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Central

como dos protestos do movimento de mulheres contra o descaso com que o Poder Judiciário e os distritos policiais – via de regra, lotados por policiais do sexo masculino – lidava com casos de violência doméstica e sexual, nos quais a vítima era do sexo feminino.

Geral dos Trabalhadores (CGT) foram reconhecidas, e o que é mais importante, o Brasil passou a viver sob uma nova Constituição. Esta foi elaborada democraticamente, através de uma Assembleia Nacional Constituinte, coroando assim, o processo que “sepultou” a ditadura no país.

No que concerne à democracia e particularizando o seu significado para as lutas e conquistas do movimento feminista, este contabiliza os seguintes avanços tanto no que tange a inclusão da temática dos direitos das mulheres quanto no que contempla a equidade das relações de gênero na pauta do Congresso Nacional no período de 1995-1999:

● Regularização da união estável como entidade familiar através da Lei nº 9.287/96;

● Regularização do planejamento familiar através da Lei nº 9.263/96, com a garantia do direito à esterilização voluntária de mulheres e homens, conquistada em agosto de 1997;

● Estabelecimento de quotas mínimas e máximas por sexo para candidaturas nas eleições proporcionais para Vereadores e Deputados Estaduais/Federais, respectivamente, através das Leis 9.100/95 e 9.504/1997;

● Aprovação de Emendas ao Plano Plurianual (1995-1999) e ao Orçamento da União referente à cidadania das mulheres (1997, 1998 e 1999);

● Sessões solenes de comemoração do Dia Internacional da Mulher – 8 de março (1995,1996, 1997, 1998), na capital do país;

● Sessões de Audiência Pública em Comissões Permanentes e Temporárias (1995, 1996, 1997 e 1998), na capital do país;

● Seminários “A Mulher no Mundo do Trabalho” (1996 e 1997), na cidade de São Paulo, promovido pelo Conselho de Direitos da Mulher;

● II Fórum Interprofissional sobre o Atendimento ao Aborto previsto na Lei (1997), ocorrido em São Paulo;

● Fórum Nacional sobre “Os Direitos Humanos das Mulheres e a Violência Intrafamiliar – medidas concretas de prevenção e combate à violência doméstica” (1998), ocorrido em Brasília;

● Criação de Comissão Especial na Câmara dos Deputados federais, destinada ao Estudo das Medidas Legislativas que visem implementar, no Brasil, as decisões da IV Conferência Mundial da Mulher (1997);

sobre o Aborto Previsto em Lei (1997).

Ainda a respeito das lutas e garantias do movimento feminista no Brasil nos anos de 1986 a 1988, os novos grupos feministas e as mulheres de classes populares, marcaram presença importante nos mais variados eventos e atividades relacionadas com a participação da mulher na Constituinte. As mulheres participaram dos “plenários pró-participação popular na Constituinte” e de encontros estaduais e nacionais sobre os direitos da mulher na nova Constituição. Duas iniciativas populares foram apresentadas pelo movimento de mulheres ao Congresso Nacional Constituinte: uma sobre os Direitos da Mulher, em geral, e outra sobre a saúde da mulher.

Diante desse quadro estrutural, a luta pela cidadania46 era mais do que nunca urgente e emergente e colocava para as mulheres o desafio estafante de mais uma nova dupla jornada – atuar na defesa de seus direitos específicos e atuar na defesa do respeito aos direitos individuais e sociais em geral, que seriam inscritos, posteriormente, na Constituição Federal de 1988.

Assim, a partir da Constituição de 1988, assegura-se que o Estado brasileiro traga para si a criação de mecanismos para coibir a violência doméstica. Ainda nesse sentido, caminhou o Programa Nacional dos Direitos Humanos (1996) do Ministério da Justiça, no título Proteção do Direito e Tratamento Igualitário perante à Lei e as Estratégias de Igualdade (1997) do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

Desta feita, a cidadania do ponto de vista formal-legal se complementou em 1988, com o reconhecimento da igualdade entre homens e mulheres nos espaços públicos e privados. Sendo reconhecida legalmente pela Constituição Federal, a visibilidade em relação à violência contra a mulher passa a ser ainda mais influenciada pelas mudanças da conjuntura política na década de 1980 e início da década de 1990, motivando o interesse por parte dos pesquisadores por outros tipos de movimentos sociais e entre eles o das mulheres, visto que este demandava não somente bens e serviços necessários para a sobrevivência cotidiana, mas também, reivindicava direitos sociais modernos, quando requisitava a igualdade nas relações

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Ressalta-se que a cidadania para as mulheres está longe de ser assegurada, pois, o nosso horizonte é o que apregoa a Carta de Viena, número 18: “A plena participação das mulheres em condições de igualdade na vida política, civil, econômica, social e cultural nos níveis nacionais, regionais e internacionais e a erradicação de todas as formas de discriminação sexual”.

de gênero, raça, etnia e sexo.

No entanto, esses avanços contemplados na Constituição de 1988, no Brasil, ocorreram em terreno adverso – o quadro de precarização do emprego, da desregulamentação dos direitos, do recuo do Estado nacional em relação às políticas universalizantes de bem-estar social, da crise representada pela