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2. A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

2.5. A Campanha Nacional de Educação de Adultos e a formação de professores

Observamos que a EJA teve várias iniciativas, programas e campanhas que tiveram grandes dificuldades de cumprimento de seus objetivos. Perceptível erro que se repete devido ao descaso que se deu e se dá a modalidade educação de jovens e adultos, pela falta de incentivo e investimentos no decorrer dos anos.

Segundo Pereira (2005, p. 13) “a educação de adultos recebe menos recursos e que falta formação profissional para os indivíduos que trabalham no setor”. Como consequência disso a autora ainda afirma que “os serviços oferecidos são de baixa qualidade, não obtendo os resultados esperados, perpetuando, assim, um círculo vicioso que impede que essa atividade adquira sua devida importância”.

Depois do que observamos com a instituição da Lei Saraiva em 1881 que retirou o direito de voto da parcela de adultos analfabetos, um evento que deve ficar claro como tentativa emergencial de “inclusão” da parcela de adultos fora da escola e sem a instrução

escolhido a dedo. No entanto, faltam sempre informações sobre o ensino das massas, e com muito boa razão, pois esse era que inexistente. Este estudo cobre uma área carente de maiores informações, especialmente tão detalhadas quanto o autor as apresenta. Neste seu livro, o maranhense Antônio Oliveira abre uma janela por meio da qual vislumbra-se o cenário da educação pública brasileira no século XIX. Nele o autor debate uma série de problemas do ensino, faz acusações ao Governo do Império, aos políticos, à Igreja, e propõe soluções para os problemas da educação nacional. Causa espanto quão similares aos de hoje eram os problemas de então. Fica a impressão de ter o Brasil, em muitos aspectos, permanecido quase que estático durante esses últimos 127 anos, e não apenas na área da educação”. (OLIVEIRA, 2003, p. 13)

primária “garantida” na Constituição, é a Campanha Nacional de Educação de Adultos, em 1947, capitaneada por Lourenço Filho. O período que atravessou de 1881 a 1947 é marcado pelas lutas de erradicação do analfabetismo e da extinção do poder da Lei Saraiva.

Em 1915, por exemplo, foi criada a Liga Brasileira contra o Analfabetismo que pretendia lutar contra a ignorância para estabilizar a grandeza das instituições republicanas. Mas diante do descaso com a educação como um todo, o Brasil alcançou a marca de 72% de analfabetismo em 1920 (STRELHOW, 2010).

Outras medidas foram tomadas após esses resultados de 1920. Em 1934, foi criado o Plano Nacional de Educação (PNE) que previa o ensino primário integral obrigatório e gratuito estendido às pessoas adultas. Esse “foi o primeiro plano, na história da educação brasileira, que previa um tratamento específico para a educação de jovens e adultos” (STRELHOW, 2010, p. 52).

Em 1938 foi criado o INEP (Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos) e em 1942 o Fundo Nacional do Ensino Primário com o objetivo de realizar programas que ampliasse e incluísse o Ensino Supletivo para adolescentes e adultos. Em 1945, este fundo foi regulamentado, estabelecendo que 25% dos recursos fossem empregados na educação de adolescentes e adultos.

Segundo Di Pierro (2005, p. 1117), “ao final dos anos 40 do século passado foram implementadas as primeiras políticas públicas nacionais de educação escolar para adultos, que disseminaram pelo território brasileiro campanhas de alfabetização” (grifo nosso).

Assim se preparou o terreno para a Campanha Nacional de Adultos. Das características da Campanha em 1947, era uma campanha que “buscava alfabetizar em três meses, sendo o curso primário organizado em dois períodos de sete meses. Uma outra etapa prevista pretendia trabalhar a capacitação profissional e o desenvolvimento comunitário” (PEREIRA, 2005, p. 13).

Beisiegel (1997) destaca o caráter exemplar da Campanha Nacional de Educação de Adultos e Adolescentes como política governamental que exprimia o entendimento da educação de adultos como peça fundamental na elevação dos níveis educacionais da população em seu conjunto (BEISIEGEL, 1997; DI PIERRO, 2001).

Também não por menos, sua análise se estende ainda mais quando se trata deste período quando afirma que “o envolvimento dos poderes públicos com a educação básica de jovens e adultos apresenta-se bem menor do que já foi no passado, nas décadas de 1940 a 1980” (BEISIEGEL, 1997, p. 27). Tais ideias são bastante evidenciadas na busca de literatura

sobre a EJA que, em sua maioria, remetem ao período compreendido pela década de 30 em diante.

Além do necessário enfrentamento direto do problema do analfabetismo adulto, Lourenço Filho já então destacava os efeitos positivos da educação dos adultos sobre a educação das crianças, ambas componentes indissociáveis de um mesmo projeto de elevação cultural dos cidadãos.

Se um meio adverso lhes impede o desenvolvimento, o meio culturalmente elevado produz um efeito contrário. A criança alfabetizada, em um meio de adultos analfabetos, não logra modificar a situação dos adultos. Mas, o adulto provido de alguma instrução, em meio igualmente rude, pode contribuir para transformá-lo, seja atuando no seio do lar, sobre os filhos, seja nas suas relações mais extensas, sobre toda a comunidade (BEISIEGEL, 1974, p. 87).

Compreendemos tal ideia de Beisiegel (1997), um conceito que Bourdieu23 (1998) chama de capital cultural. Segundo Bourdieu (1998, p.41) “cada família transmite a seus filhos, de forma mais indireta do que direta, certo capital cultural e um sistema de valores implícitos e interiores, que contribuem para definir atitudes diante do capital cultural e à instituição escolar”. Certamente as ideias de Beisiegel (1997) e Bourdieu (1998) caminham juntas.

A Campanha produziu, pela primeira vez, material didático específico para os educandos, embora não fosse ideal. Observemos que

A confiança na capacidade de aprendizagem dos adultos e a difusão de um método de ensino de leitura para adultos conhecido como Laubach24 inspiraram a iniciativa do Ministério da Educação de produzir pela primeira vez, por ocasião da Campanha de 47, material didático específico para o ensino da leitura e da escrita para os adultos. O Primeiro guia de leitura, distribuído pelo ministério em larga escala para as escolas supletivas do país, orientava o ensino pelo método silábico. As lições partiam de palavras-chave selecionadas e organizadas segundo suas características fonéticas (BRASIL, 2001; MELLO, 2010).

Várias escolas supletivas foram criadas em período recorde contando com o apoio de diversos profissionais, além de mão de obra voluntária. Outra contribuição foi a modificação

23 Bourdieu utiliza vários ramos associados a ideia de capital. Entre algumas de suas referências ao termo, temos:

capital humano, capital social, capital cultural, capital simbólico.

24

O Método Laubach de alfabetização de adultos foi criado pelo missionário protestante norte-americano Frank Charles Laubach (1884-1970). Desenvolvido por Laubach nas Filipinas, em 1915, subsequentemente foi utilizado em toda a Ásia e em várias partes da América Latina, durante quase todo o século XX. Na América Latina, o método Laubach foi introduzido no período da 2ª Guerra Mundial, quando o criador da mesma se viu proibido de retornar a Ásia, por causa da guerra do Pacífico. No Brasil, este foi introduzido pelo próprio Laubach, em 1943, a pedido do governo brasileiro. Naquele ano, esse educador veio ao Brasil a fim de explicar sua metodologia, com já fizera em vários outros países latino-americanos.

da práxis dos educadores de adultos que era executada seguindo as mesmas particularidades da educação infantil (LINHARES, 2012).

Mesmo diante de toda relevância da Campanha, escolas específicas e material sendo elaborado para EJA, embora tenha começado a despertar interesse quanto à abordagem pedagógica mais adequada, “não foi desenvolvida sob uma abordagem metodológica específica” (LINHARES, 2012, p. 18). O que nos apresenta novamente ainda, mesmo diante de todo esse avanço significativo, a falta de formação específica para a modalidade. Como era então a formação de professores?

Quanto ao tratamento dado aos processos de leitura e escrita, não se observaram avanços nas indicações metodológicas, pois a concepção de alfabetização continuou a ser inspirada na aquisição de um código alfabético e na sua decodificação. Essa concepção só ganhou novo entendimento, em 1960, com Paulo Freire (LINHARES, 2012, p. 18).