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2. A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

2.3. O ensino mútuo no Brasil e a formação de professores

Na tentativa de compreensão da historiografia da educação, uma das grandes dificuldades que pode ser encontrada por qualquer pesquisador da mesma são as questões relativas à tentativa de organização de uma cronologia sistematizada, pois os eventos muitas vezes ocorrem de forma simultânea, de óticas bem peculiares ou as fontes de estudo analisadas são de localidades distintas.

Um desses eventos que observamos de forma atemporal e simultânea em vários locais é o método do ensino mútuo. Antes de adentrar propriamente nas discussões do método do ensino mútuo vejamos nas ideias de Castanha (2002, p. 1-2) o que iremos encontrar:

A opção pelo ensino mútuo ou método lancasteriano foi tratada pelos historiadores de forma diferenciada. Autores como Almeida (1989), Chaia (1965) defenderam sua adoção pelas autoridades imperiais. Outros, como Azevedo (1996), Werebe (1985), Xavier, Ribeiro e Noronha (1994), consideram a opção pelo método uma medida simplista, que expressou um completo descaso com a educação do povo.

Nos últimos anos vários historiadores têm desenvolvidos investigações sobre o ensino mútuo de forma mais coesa e com a utilização de farta documentação da época, tais como: Bastos (1999), procurou mostrar as várias fases que marcaram a trajetória do método entre 1808 até 1827. Villela (1999) se ocupou em analisar os motivos que levaram a adoção do método para formar professores na Escola Normal, instituída na Província do Rio de Janeiro em 1835. Faria Filho e Rosa (1999), perseguiram a trajetória do ensino mútuo na Província de Minas Gerais. Por sua vez, Neves (2003), analisou a experiência do método na Província de São Paulo, tendo como foco principal compreender os mecanismos de disciplinarização do povo. Alves (2005) buscou compreender os mecanismos de funcionamento do método e suas contribuições para a configuração do trabalho didático na escola

moderna. Castanha (2007, 2011) estabeleceu relações entre o método Lancaster e o currículo da escola primária e enfatizou as razões históricas para a sua adoção, enquanto política de educação do Estado brasileiro recém independente. (CASTANHA, 2002, p. 1)

Com todo esforço possível esperamos observar as fontes que nos trazem as informações mais fiéis relacionadas mais “especificamente” à educação de jovens e adultos e a formação de professores daquela época. Posterior à criação do regime das aulas régias, ingressamos a um novo período de ensino no Brasil: o método de ensino monitorial ou mútuo.

Com suas origens na Inglaterra, no final do século XVIII, o método monitorial ou mútuo chega ao Brasil oficialmente pelo Decreto das Escolas de Primeiras Letras em 15 de outubro de 1827 (BASTOS, 2011) e teve como primeiro difusor do método, Hipolito José da Costa de Mendonça, que “em 1816 publicou em Londres sete artigos do Jornal Correio Braziliense, do qual era o principal editor, difundindo as vantagens do método para instruir a população” (CASTANHA, 2012, p. 3). Os seus idealizadores na Inglaterra foram o Andrew Bell14 e Joseph Lancaster15.

O método de ensino mútuo ou monitorial tinha como principal proposta à ideia de um ensino regido por um professor com uma disciplina severa que ensina a lição a um grupo de alunos “mais inteligentes”. Estes após terem recebido o ensino do professor, eram divididos em pequenos grupos e ficam encarregados de transmitir aos outros alunos aquilo que o mestre os havia ensinado. Isso garantia um tipo de sistema que bastava um professor para centenas de alunos (ARAÚJO, 2010; CASTANHA, 2012; BASTOS, 1997).

O trabalho de Araujo (2010) traz uma síntese mais clara das características gerais das escolas mútuas devido à subdivisão feita, a saber: o local e as estruturas pedagógicas, mobiliário e material, horários e matérias de ensino, os agentes da educação educativa, os comandos e os estímulos à ação educativa.

Com a criação da Constituição de 1824, outra lei de “garantia” de direitos à educação foi instituída em 182716 que determinava a criação de escolas de primeiras letras em todas as

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Andrew Bell. Bell (1753-1832) era escocês, ministro da Igreja Anglicana e diretor do asilo militar de Egmore, em Madras, na Índia. Antes de sua nomeação ao cargo, o asilo havia sido transformado numa escola para meninos cujos pais haviam sido mortos durante a guerra (ARAÚJO, 2010, p. 88).

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Joseph Lancaster. Lancaster (1778-1838) foi um jovem quaker que abriu uma escola em Londres, sem qualquer financiamento público, em fins do século XVIII. Nessa escola, leciona pelos métodos tradicionais, porém possivelmente pelas suas qualidades docentes e pela pouca oferta de escolas gratuitas, o número de alunos aumenta de dia para dia, tornando o método mútuo um ensino mais fácil (ARAÚJO, 2010, p. 89).

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“O Decreto das Escolas de Primeiras Letras, de 15 de outubro de 1827, primeira lei sobre a Instrução Pública Nacional do Império Brasileiro, propõe a criação de escolas primárias com a adoção do método lancasteriano” (BASTOS, 1997, p.131).

cidades. Os resultados dessa lei fracassaram por vários empecilhos: econômico, técnico e político (ARANHA, 2006; BASTOS, 1997).

O que se vê da Constituição de 1824 não foi contemplado em 1827. A garantia do direito à instrução primária e gratuita não passou de mero discurso formalista, de letra morta. Como não havia exigências de conclusão do ensino primário para ascensão ao curso superior, a elite educava seus filhos em casa, com preceptores.

O que o texto expressa em relação à educação de jovens e adultos pode ser entendido nos estudos de Maria Lúcia de Arruda Aranha que “segundo o relatório de Liberato Barroso, apoiado em dados oficiais, em 1867 apenas 10% da população em idade escolar se matriculara nas escolas primárias” (ARANHA, 2006, p. 223). Com isso, torna a quantidade de adultos sem acesso e desprovidos de determinados amparos educacionais como o amparo do saber e escrever, a continuar no lugar à margem da sociedade.

O Brasil nesse período passava por mudanças políticas e econômicas, como exemplo a Revolução Industrial, houve a necessidade de se ampliar a alfabetização de adultos, e várias propostas surgiram nesse impasse. Uma delas de maior relevância foi o método de ensino mútuo17, onde o professor preparava os melhores alunos para que estes executassem um trabalho de monitoria com um determinado grupo de alunos (ARANHA, 2006, BASTOS, 1997; SAVIANNI, 2005).

Para Tanuri (2000, p. 63), “essa foi realmente a primeira forma de preparação de professores18, forma exclusivamente prática, sem qualquer base teórica, que, aliás, seria retomada pelo estabelecimento de “professores adjuntos”19

.

Uma das justificativas de aplicação do método Lancaster era a falta de recursos para a construção de escolas e financiamentos de recursos para livros e professores (NASCIMENTO

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O método de ensino mútuo foi aplicado pelo anglicano Bell (1753-1832) e pelo quaker Lancaster (1778-1838) em escolas destinadas a crianças pobres. A divisa de Lancaster era: um professor para mil alunos. Anglicanos e quakers, a saber, são ramos da Igreja Protestante na Inglaterra. (ARANHA, 2006).

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A formação dos professores jesuítas vinha de Portugal, e o método lancasteriano (ensino mútuo) foi um método aplicado aos “professores adjuntos” em solo brasileiro, por isso dizer que a primeira formação de professores do Brasil.

19 O "monitorial system" ou "méthode mutuelle", nome adotado na França, baseia-se no ensino dos alunos por

eles mesmos. Todos os alunos da escola, algumas centenas sob a direção de um só mestre, estão reunidos num vasto local que é dominado pela mesa do professor, sob um estrado. Na sala estão enfileiradas as classes, tendo em cada extremidade, o púlpito do monitor e o quadro-negro. Os alunos estão divididos em várias classes, seis em geral, com nível de conhecimento semelhante, ou seja, que não sabem nem mais nem menos que os outros. O aluno é integrado a uma classe depois de averiguado seu conhecimento. A classe tem um ritmo determinado de estudo e um programa a desenvolver de leitura, escrita e aritmética. O professor, antes do início da aula, dá uma explicação especial e indicações particulares. Quando os demais alunos chegam à escola e tomam seus lugares, o monitor de cada classe transmite aos seus colegas os conhecimentos que haviam sido dados pelo professor. O monitor é que tem o controle da classe e que classifica os alunos na classe. Quando um aluno se distingue, quando se mantêm regularmente na cabeça da classe, pode ascender à classe superior, ocupando o último lugar. Se depois de algum tempo não for observado progresso, ele retoma a classe que estava. (BASTOS, 1997, p. 118)

et al., 2012), o que fez com que o método não sobrevivesse por muito tempo, pela falta de qualidade de ensino e a formação de professores para o mesmo.

2.4. A Lei Saraiva: algumas reflexões sobre a precarização do ensino de adultos e a