• Nenhum resultado encontrado

3.2 Elementos indicativos da modernização no oeste catarinense

3.2.5 A chegada da televisão no meio rural do oeste catarinense

A popularização dos meios de comunicação de massa fez chegar também no meio rural a referenciada televisão, que ganha um status inédito e, sua adesão por parte da população, deixa conseqüências profundas no modo de vida daquela gente. Com ela, a cultura local se sente associada e integrada à cultura nacional e internacional e se começa a consumir uma comunicação de massa. O rádio e a energia elétrica foram seus antecedentes, no entanto, sua chegada no campo revela aspectos da modernização tanto como produto das condições materiais postas para a população daquela época quanto no mesmo movimento passou a ser a principal promotora de mudança nos processos sociais. A partir de dados coletados em conversas informais e em entrevistas realizadas com as pessoas da região rural pesquisada, é possível discorrermos sobre sua experiência contemporânea à chegada da televisão no meio rural.

A instalação de antenas repetidoras de transmissão de canais televisivos na década de 1970 anunciava a chegada de um novo tempo18.

Para Madeira (1986),

Em 1975, a televisão já alcançava 40% da população urbana, cobertura que hoje atinge 75% da mesma população. Nas áreas rurais, em cada vinte domicílios, três possuíam tal equipamento. O avança da indústria eletrônica no Brasil se dá no bojo dos enormes investimentos na área de telecomunicações implantadas pelo governo autoritário de 1964, tendo em vista a integração nacional (MADEIRA, 1986, p. 29).

No oeste catarinense, as antenas repetidoras eram instaladas em núcleos regionalizados de maneira que a transmissão do sinal conseguia abranger sempre uma pequena região. Aos poucos as pessoas foram adquirindo os aparelhos televisivos, no entanto nas comunidades rurais era fato raro uma família possuir uma televisão; quando isso ocorria, era o maior acontecimento da comunidade, e a TV não era apenas para a família, mas para um conjunto de pessoas curiosas, admiradas, encantadas e desconfiadas da novidade que passavam a se reunir na casa do dono do televisor para assistir aos programas. As crianças geralmente se reuniam para os programas infantis e filmes que passavam durante à tarde, e os adultos para assistir telenovelas e jornais. Ocorre, porém, que a transmissão do sinal para o meio rural era muito precária, o que fazia com que as pessoas ficassem sem acesso aos programas durante semanas e até meses. Dessa forma a transmissão não era constante, bastava uma chuva forte, vento, um raio ou qualquer outra intempérie, para interferir na qualidade da transmissão do sinal.

Assistiu-se pela televisão eventos marcantes dos anos de 1970 e 1980. A década de 1970 começava com o lema da ditadura militar “Brasil, ame-o ou deixe-o”; a seleção brasileira de futebol, com o slogan “Pra frente Brasil”, se tornara tricampeã mundial, mostrando que o futebol era uma distração nacional e servia para encobrir toda a situação social e política nacional. A ONU declarou 1975 o ano Internacional da Mulher; no final da década de 1970, programas como “Malu Mulher” e “TV Mulher” disseminavam as conquistas femininas pela televisão. Na década de 1980 se assistiu pela TV notícias sobre a Guerra das Malvinas em 1982; em 1984 se viu o movimento

18

Data de 25 de abril de 1978 o Decreto Lei nº 81.600, que regulamenta serviços de rádio, compreendendo a transmissão de sons (radiodifusão sonora) e a transmissão de sons e imagens (televisão).

A Teologia da Libertação e a formação político-cristã de uma geração de jovens rurais militantes...

pelas “Diretas Já” e logo após, a eleição de Tancredo Neves. A TV também mostrou a imagem de um jovem desarmado e aparentemente sozinho enfrentando a força dos tanques de guerra na Praça da Paz Celestial em Pequim, em 1989 e a queda do muro de Berlim e.

Na década de 1990 a novidade é o fato de que os agricultores, para terem acesso mais facilitado aos programas de televisão, passaram a adquirir antenas parabólicas, de modo que atualmente é raro o estabelecimento rural que não tenha no quintal de sua casa esse tipo de antena. As parabólicas, no entanto, não transmitem os programas e notícias regionais, sua tecnologia transmite somente os programas de rede nacional. Tal situação deixa muita gente frustrada por não conseguir acompanhar o que acontece em sua região, obrigando-os muitas vezes a assistir a notícias do Estado de São Paulo ou do Rio de Janeiro, por exemplo.

De que forma a entrada da televisão no meio rural impulsionou mudanças na vida das pessoas? Ela foi responsável por engendrar mudanças no campo dos valores culturais da população e por influenciar o consumo dos jovens. Miceli (1983) sugere:

Os níveis de consumo da TV brasileira estão intimamente relacionados ao capital escolar dos públicos expostos a esses bens. O fato bruto e brutal do analfabetismo, nas proporções consideráveis em que subsiste na sociedade brasileira constitui a alavanca decisiva da colossal penetração da televisão no país e a coloca como uma espécie de sistema de ensino paralelo e integrador: Apesar da sociedade industrial de consumo estar fortemente concentrada nas regiões sudeste do Brasil, conforme demonstram exaustivamente as evidências disponíveis acerca da distribuição regional da maioria dos bens culturais, e de persistirem as disparidades de renda entre regiões e grupos sociais, a indústria cultural brasileira vem contribuindo decisivamente para o processo de unificação do mercado de bens culturais ao fazer às vezes de um sistema de ensino paralelo e ao expor os setores sociais subalternos a veículos e mensagens em certa medida desagregadores de seu repertório original de linguagem, valores e significações (MICELI, apud MADEIRA, 1986).

Os programas televisivos, filmes e novelas, principalmente, com os quais a população entrou em contato, influenciaram nos hábitos, valores e comportamentos. A juventude desse tempo esteve mais do que qualquer outro grupo social suscetível a absorver as novidades nos modos de vestir e se comportar, constituindo-se no que poderíamos chamar de uma “geração televisiva”. Almejou as roupas da moda lançadas pelas novelas, conquistar o mundo, projetos individuais, estudar, mudanças no namoro e comportamento sexual, demarcando uma ruptura comportamental entre as gerações. A

televisão por meio de suas propagandas e programas difundiu maciçamente os benefícios das máquinas agrícolas e dos produtos químicos ou insumos modernos. “Os meios de comunicação se encarregam de criar símbolos visíveis e claros de identidade jovem, o sistema de consumo torna-os acessíveis seja pela queda de qualidade, seja pelo barateamento do produto, seja pela criação do sistema de crediário” (MADEIRA, 1986, p. 18).

Poderíamos continuar elencando uma série de eventos que serviram neste capítulo para construirmos alguns indicadores de modernização na área rural do oeste de Santa Catarina; no entanto apontamos a Revolução Verde, extensão rural, sistema de integração, os Clubes 4-S e a popularização da televisão para afirmar o forte significado do que foram, sobretudo as décadas de 1970 e 1980, para a população rural e seus impactos principalmente na geração jovem desse período. Esses eventos foram muito marcantes para as pessoas que viveram e sentiram essas décadas representadas como “tempos de esperanças”. O grande pacote da modernização agrícola sempre se apresentou sob a falsa promessa de que seria emancipatório, produzindo melhoramentos e progressos técnico e humano. Muitas de tais promessas não aconteceram e estão longe de acontecer, o que faz da modernização um projeto inacabado. Outras ocorrências foram produzidas como conseqüências desse processo, como o surgimento de uma geração que resistiu a esse projeto, o que ficará mais claro nos capítulos seguintes.

3.3 Breve incursão nos dados demográficos da população jovem -