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2. A PROTEÇÃO INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS DOS

2.3 A PROTEÇÃO INTERAMERICANA JURISDICIONAL DOS DIREITOS

2.3.1 A Comissão Interamericana De Direitos Humanos (CIDH)

A CIDH funciona como mecanismo de controle ao cumprimento dos instrumentos interamericanos que versam sobre direitos humanos. É o fato de a Comissão trata do monitoramento de todos os Estados que são partes da OEA e não somente dos que ratificaram a CADH71. Ao receber uma denúncia relativa aos Estados

que não ratificaram dita Convenção, a CIDH observará o que dispõe a DADDH e a Carta da OEA72.

70 Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/Principios%20DDHH%20migrantes%20-

%20ES.pdf. Acesso em 30 de junho de 2020.

71 ESTATUTO DA COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. (Aprovado pela

resolução AG/RES. 447 (IX-O/79) Artigo 1: 1. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão da Organização dos Estados Americanos criado para promover a observância e a defesa dos direitos humanos e para servir como órgão consultivo da Organização nesta matéria. 2. Para os fins deste Estatuto, entende-se por direitos humanos: a. os direitos definidos na Convenção Americana sobre Direitos

Humanos com relação aos Estados Partes da mesma; b. os direitos consagrados na Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, com relação aos demais Estados membros.

72 PEREIRA, Antônio Celso Alves. Apontamentos sobre a Corte Interamericana de Direitos

Humanos. In: GUERRA, Sidney. (Org.) Temas emergentes de direitos humanos. Rio de Janeiro: FDC,

Dita Comissão, além da sua atividade de emissão de declarações, estudos e relatórios, desprovidos de caráter normativo, também recebe denúncias e petições individuais e examina os casos que considere pertinentes73.

Assim, se antes da CADH a CIDH estava adstrita à proteção dos direitos humanos por meio de estudos, relatórios e recomendações emitidas aos Estados, atualmente, após a CADH, dita Comissão tem como competência receber denúncias de violação da CADH ou DADDH, assim como receber e conhecer petições individuais ou estatais74.

Importa dizer que qualquer pessoa, grupos de pessoas ou entidades não governamentais, legalmente reconhecidas em um Estado-parte da CADH, pode apresentar à Comissão petições que contenham queixas ou denúncias de violação, nos termos do artigo 44 da CADH.

Em que pesem suas outras funções, o papel da Comissão apresenta grande relevo e importância neste aspecto, vez que não existe o direito de petição individual junto à Corte IDH, sendo a Comissão intermediária entre as denúncias individuais e a Corte75.

Acerca da tutela aos migrantes, importa mencionar, inicialmente, que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) dispõe de uma relatoria específica, cujo objetivo principal é promover conscientização sobre obrigação dos Estados, monitorar a situação dos direitos humanos dos migrantes, assessorar e fazer recomendações aos Estados, preparar relatórios e estudos e atuar em relação as petições apresentadas perante a CIDH76.

A atualmente denominada Relatoria sobre os Direitos dos Migrantes tem sua origem decorrente da Relatoria de Pessoas Deslocadas Internamente e da Relatoria de

73 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Concretização dos Direitos Humanos dos Migrantes pela

Jurisdição Brasileira. Curitiba: Instituto Memória. Centro de Estudos da Contemporaneidade, 2019. p.

321.

74 GUERRA, Sidney. Direito Internacional dos Direitos Humanos. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.

p. 197.

75 "No plano contencioso, como já dito, a competência da Corte para o julgamento de casos é, por sua

vez, limitada aos Estados-partes da Convenção que reconheçam tal jurisdição expressamente, nos termos do artigo 62 da Convenção. Compartilha-se da visão de Cançado Trindade de que este dispositivo constitui um anacronismo histórico, que deve ser superado, a fim de que se consagre o 'automatismo da jurisdição obrigatória da Corte para todos os Estados-partes da Convenção'.(...) Ainda nas lições de Cançado Trindade: 'Sob as cláusulas da jurisdição obrigatória e do direito de petição individual se ergue todo o mecanismo de salvaguarda internacional do ser humano, razão pela qual me permito designá-las verdadeiras cláusulas pétreas de proteção internacional dos direitos da pessoa humana.'" PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 262.

76 Disponível em: <http://www.oas.org/es/cidh/migrantes/mandato/mandato.asp>. Acesso em 26 de

Trabalhadores Migrantes e Membros de suas Famílias, criada em 1996. Em 2012, a CIDH, a fim de responder à multiplicidade de desafios colocados pela mobilidade humana na região, resolveu então transformar o mandato da Relatoria de Trabalhadores Migrantes e Membros de suas Famílias em Relatoria sobre os Direitos dos Migrantes77.

Eleita para o mandato quadrienal da relatoria, que foi iniciado em janeiro de 2020, a comissária de nacionalidade peruana Julissa Mantilla Falcón é a atual titular desta Relatoria específica.

O trabalho da relatoria se concentra em respeitar e garantir os direitos dos migrantes e de suas famílias, solicitantes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas de tráfico de pessoas, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas vulneráveis no contexto da mobilidade humana78.

Dentre as atividades realizadas pela Relatoria, destaca-se a visita in loco, como as ocorridas em países como México, Guatemala, Costa Rica, Estados Unidos79 e

outros80. Nesta visão, a Relatoria atua diretamente nos casos onde haja possíveis

inobservâncias dos Direitos Humanos dos Migrantes, através de suas atividades.

Em relação à visita in loco ao México, concluiu-se por meio de relatório que restou evidente o incentivo do governo mexicano a programas de apoio as pessoas em situação migratória. Destacou-se, também, que o México estava buscando proteger

77 Ibidem.

78 “Para cumprir seu mandato atual, a Relatoria sobre os Direitos dos Migrantes desempenha as seguintes

funções: Aumentar a conscientização sobre as obrigações dos Estados de respeitar e garantir os direitos humanos dos migrantes e de suas famílias, solicitantes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas de tráfico de pessoas, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas vulneráveis no país. contexto da mobilidade humana; Monitorar a situação dos direitos humanos dos migrantes e suas famílias, requerentes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas de tráfico de seres humanos, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas no contexto da mobilidade humana e tornar visíveis as violações de seus direitos; Assessorar e fazer recomendações de políticas públicas aos Estados membros e órgãos políticos da OEA relacionados à proteção e promoção dos direitos humanos dos migrantes e de suas famílias, requerentes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas tráfico de pessoas, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas vulneráveis no contexto da mobilidade humana, a fim de adotar medidas a seu favor; Preparar relatórios e estudos especializados com recomendações dirigidas aos Estados membros da OEA para a proteção e promoção dos direitos humanos dos migrantes e de suas famílias, requerentes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas de tráfico de seres humanos, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas vulneráveis no contexto da mobilidade humana; Agir prontamente em relação a petições, casos, pedidos de medidas cautelares e elevação de medidas provisórias perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, onde se afirma que os direitos humanos dos migrantes e suas famílias, solicitantes de asilo, refugiados, apátridas, vítimas tráfico, pessoas deslocadas internamente, bem como outros grupos de pessoas no contexto da mobilidade humana, são violados em alguns Estados membros da OEA”. Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/migrantes/mandato/mandato.asp. Acesso em 27 de maio de 2020.

79 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Concretização dos Direitos Humanos dos Migrantes pela

Jurisdição Brasileira. Curitiba: Instituto Memória. Centro de Estudos da Contemporaneidade, 2019. p.

320.

80 Disponível em http://www.cidh.oas.org/Migrantes/migrantes.informes.htm. Acesso em 27 de maio de

adequadamente seus nacionais no exterior, motivo pelo qual finalizou o relatório conclamando que outros Estados reproduzissem o exemplo do mexicano81.

Considerando a visita à Guatemala, a comissão expediu relatório onde, dentre outras conclusões, pôde-se parabenizar o governo deste país pelo programa de repatriação segura e ordenada de migrantes. Contudo, também foram destacadas situações de violações aos direitos humanos dos migrantes, como violação ao devido processo, desproteção a vítimas de tráfico e corrupção de funcionários públicos82.

Já em relação a visita in loco à Costa Rica, um dos pontos positivos destacados através de relatório foi acerca da legislação deste país em proporcionar uma série de serviços e prestações sociais a trabalhadores migrantes e suas famílias. Contudo, também se destacaram situações atentatórias contra direitos humanos dos migrantes como desobediência ao princípio da não devolução, a falta de individualização de procedimentos de deportação83.

Por fim, em razão da visita in loco ao Estados Unidos, a Comissão chamou atenção para o crescente número de detenção de migrantes, quando esta deveria ser uma medida excepcional, as condições da detenção que se assemelham à prisão, violações ao devido processo, bem como inobservância aos direitos das crianças e adolescentes, como no caso da separação dos seus pais, dentre outros84.

Noutra seara, dita Relatoria é responsável pela análise das petições individuais apresentas à CIDH, para sua declaração de admissibilidade ou não, assim como tratar da possibilidade de acordos amigáveis ou encaminhamentos à Corte IDH, desde que guardem relação temática.

A título de exemplo, o primeiro caso relativo à tutela de migrações, admitido pela CIDH sob a relatoria específica, datado de 03 de março de 1998, diz respeito a uma petição apresentada pelo empresário peruano Baruch Ivcher Bronstein85.

81 Disponível em: http://www.cidh.oas.org/Migrantes/3.%20Informe%20Visita%20In%20Loco%20a%20M%C3%A9xico% 20(2002).pdf. Acesso em 27 de maio de 2020. 82 Disponível em: http://www.cidh.oas.org/Migrantes/2.%20Informe%20Visita%20In%20Loco%20a%20Guatemala%20(20 02).pdf. Acesso em 27 de maio de 2020. 83 Disponível em http://www.cidh.oas.org/Migrantes/1.%20Informe%20Visita%20In%20Loco%20a%20Costa%20Rica%2 0(2001-2002).pdf. Acesso em 27 de maio de 2020.

84 Disponível em: http://cidh.org/pdf%20files/InformeSobreMigracionesEnEEUU-Detenciones-y-

DebidoProceso.pdf. Acesso em 27 de maio de 2020.

85 Neste caso, concluiu-se que República do Peru privou arbitrariamente Baruch Ivcher Bronstein de sua

nacionalidade peruana (violando o artigo 20.3 da Convenção), como meio de suprimir a sua liberdade de expressão (consagrada no artigo 13 da Convenção), vulnerando, também, seu direito de propriedade

Em outro exemplo, ao analisar a petição apresentada em favor de Victor

Nicolás Sánchez e outros, onde se denunciava os Estados Unidos (pela realização da Operation Gatekeeper no controle de fronteiras), a CIDH declarou a inadmissibilidade

da petição apresentada. Neste caso, a CIDH considerou que ainda não haviam sido esgotados os recursos judiciais internos, motivo pelo qual declarou a inadmissibilidade da referida petição apresentada86.

Em razão da não submissão de alguns Estados à competência da Corte IDH, a CIDH também pode admitir casos e efetivar conclusões e recomendações acerca da denúncia recebida contra esses Estados.

Exemplo disso, em 2004 a CIDH recebeu petição contra o Canadá acerca de possível violação a direitos relacionados ao refúgio. Neste caso, a Comissão concluiu no mérito que o Canadá violou direitos do solicitante de asilo John Doe, recomendando que o Estado adotasse medidas para correta verificação da situação do solicitante, bem como uma total reparação pelos danos sofridos pelo Sr. Doe e, ainda, a adoção de medidas legislativas para assegurar o devido processo aos solicitantes de asilo87.

No mesmo sentido, em 2002 a CIDH recebeu petição contra os Estados Unidos, por suposta violação dos direitos de Wayne Smith, Hugo Armendariz e outros. Como conclusão de mérito, a CIDH entendeu que Estados Unidos violou direito dos Srs. Smith e Armendariz por não oferecer procedimento de deportação individualizado. Como consequência, recomendou que o Estado permita e custeie o regresso dos prejudicados, reabra os procedimentos migratórios, adequando-os ao devido processo, assim como promovesse adequações legais para assegurar principalmente os direitos previtos nos artigos V, VI, e VII da DADDH88.

Dita Relatoria também elabora relatórios anuais sobre países e relatórios temáticos, posteriormente submetidos à CIDH. Atualmente, encontram-se

(artigo 21 da Convenção), assim como o direito ao devido processo (artigo 8.1 da Convenção) e o direito a um recurso simples e rápido perante um Juiz ou Tribunal competente (artigo 25 da Convenção), em violação da obrigação genérica do Estado peruano de respeitar os direitos e liberdades de todos os indivíduos, dentro da sua jurisdição, conforme artigo 1.1, da Convenção. O caso foi submetido à Corte IDH em 1999. CIDH. RELATÓRIO nº 20/98. CASO 11.762. BARUCH IVCHER BRONSTEIN vs. PERU. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/annualrep/97span/Peru11.762.htm>. Acesso em 26 de março de 2020.

86 CIDH. RELATÓRIO nº 104/05. VICTOR NICOLÁS SÁNCHEZ E OUTROS vs. ESTADOS

UNIDOS. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/annualrep/2005sp/EEUU65.99sp.htm>. Acesso em: 26 de março de 2020.

87 CIDH. Informe de Fondo nº 78/11. Caso 12.586 “John Doe y otros vs. Canadá”, 2011.

88 CIDH. Informe de Fondo nº 81/10. Caso 12.562 “Wayne Smith, Hugo Armendariz, Y otros vs. Estados

disponibilizados cinco relatórios temáticos89, dentre os quais destaca-se o último,

publicado em 2016, intitulado de Derechos humanos de migrantes, refugiados,

apátridas, víctimas de trata de personas y desplazados internos: Normas y estándares del Sistema Interamericano de Derechos Humanos.

Mencionado documento alberga o produto do trabalho da Comissão acerca do fenômeno migratório. Nesta seara, considerando o grande desafio da migração internacional, CIDH concretizou entendimento de que os instrumentos que compõe o SIPDH contemplam todas as pessoas que estão submetidas a autoridade dos Estados parte90.

O relatório aponta o entendimento consolidado da CIDH de que os Estados têm a obrigação de garantir princípios fundamentais dos direitos humanos aos seus nacionais e a todos imigrante que esteja em seu território ou sob sua jurisdição, sem qualquer discriminação por sua estadia regular ou irregular, sua nacionalidade, raça, sexo ou qualquer outra causa.

Neste sentido, a CIDH compreendeu que o direito internacional não pode ter como base somente critérios territoriais e que os direitos humanos são inerentes a toda pessoa humana, independente da sua localização. Assim, cabe ao Estado garantir o livre exercício dos direitos humanos, independentemente de fatores relacionados a nacionalidade ou condição migratória do indivíduo91.

89Mobilidade humana, padrões interamericanos (2016); Direitos humanos dos migrantes e de outras

pessoas no contexto da mobilidade humana no México (2013); Relatório de Imigração dos Estados Unidos: Detenções e devido processo legal (2011); Relatório de Progresso do Escritório do Relator Especial sobre Trabalhadores Migrantes e Membros de suas Famílias (2005); Relatório de andamento sobre a situação dos trabalhadores migrantes e dos membros de suas famílias no Hemisfério (1999). Disponíveis em: <http://www.oas.org/es/cidh/migrantes/informes/tematicos.asp>. Acesso em 26 de março de 2020.

90 COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Derechos humanos de migrantes,

refugiados, apátridas, víctimas de trata de personas y desplazados internos: Normas y estándares del Sistema Interamericano de Derechos Humanos. OEA/Ser.L/V/II.Doc. 46/2015. Disponível em:

<http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/MovilidadHumana.pdf>. Acesso em 26 de mar de 2020. p. 75.

91 [...] es evidente que estas protecciones básicas de los derechos humanos previstas en la Declaración

[mutatis mutandis, en la Convención Americana], como ocurre en general con las protecciones internacionales de los derechos humanos, constituyen obligaciones que los Estados de las Américas […] deben garantizar a todas las personas bajo su autoridad y control y no dependen para su aplicación de factores tales como la ciudadanía, nacionalidad ni ningún otro factor de la persona, incluida su condición de inmigración. Es notable a este respecto que uno de los objetivos em la formulación de la Declaración era garantizar como fundamental la “igual protección de la ley a nacionales y extranjeros por igual respecto de los derechos establecidos en la Declaración”[...] CIDH. Derechos humanos de migrantes,

refugiados, apátridas, víctimas de trata de personas y desplazados internos: Normas y estándares del Sistema Interamericano de Derechos Humanos. OEA/Ser.L/V/II.Doc. 46/15. ISBN 978-0-8270-

6554-3. Washington, 2015. Disponível em:

http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/MovilidadHumana.pdf. Acesso em: 06 de dez de 2019. p. 76- 77.

De outro modo, a CIDH também considera necessário constar que a obrigação de observância aos Direitos Humanos não é restrita ao Estado receptor do imigrante internacional - seja refugiado, asilado ou vítima de tráfico – uma vez que o Estado de origem também devem observar tais direitos básicos, bem como assegurar condições para que seus nacionais não sejam forçados a migrar.

Sem embargo, adotou-se o entendimento de que os Estados têm a obrigação de agir com a devida diligência para proteger os direitos humanos. Por sua vez, esse dever inclui quatro obrigações básicas: prevenção, investigação, sanção e reparação por violações dos direitos humanos92.

Em outro cenário que merece destaque, a CIDH definiu que a aplicação de restrições migratórias subjetivas, baseadas em perfil racial (que envolve questões de raça, cor, etnia, religião e outros), fere o princípio da igualdade, consagrado no artigo 24 da CADH93. Portanto, um Estado deve adotar critério objetivos que justifiquem o

controle migratório, restando vedada a possibilidade de estabelecer critérios outros, incluindo-se a vedação de criar categorias suspeitas de pessoas, sob a justificativa de segurança nacional, por exemplo.

De outro modo, dito relatório aponta o entendimento da CIDH em relação à proibição de escravidão e práticas similares, que é tratada por ela como norma de jus

cogens94. Portanto, entende a CIDH que a proteção contra escravidão é uma obrigação

erga omnes para a qual estão submetidas todos os Estados95.

92 Ibidem. p. 79.

93 Neste sentido: La Comisión ha definido la aplicación de perfiles raciales (racial profiling) como una

acción represora que se adopta por supuestas razones de seguridad o protección pública y que está motivada en estereotipos de raza, color, etnicidad, idioma, descendencia, religión, nacionalidad o lugar de nacimiento, o una combinación de estos factores, y no en sospechas objetivas248. Por lo tanto, la CIDH considera que dicha práctica viola el principio de igualdad ante la ley consagrado en el artículo 24 de la Convención Americana249 En mayor detalle, la Comisión ha sostenido, en los casos Nadege Dorzema y otros250 y Personas Dominicanas y Haitianas Expulsadas251 ambos contra República Dominicana, que: En el contexto de la aplicación de leyes migratorias, el derecho fundamental a la igual protección ante la ley y la no discriminación obligan a los Estados a que sus políticas y prácticas de aplicación de la ley no estén injustificadamente dirigidas a ciertos individuos con base únicamente en sus características étnicas o raciales, tales como el color de la piel, el acento, la etnia, o el área de residencia que se conozca por tener una población étnica particular. CIDH. Derechos humanos de migrantes, refugiados, apátridas, víctimas de trata de personas y desplazados internos: Normas y estándares del Sistema Interamericano de Derechos Humanos... p. 99.

94 MOREIRA, Thiago Oliveira. O DIREITO INTERNACIONAL E AS NORMAS DE JUS

COGENS: UMA QUESTÃO FILOSÓFICA. In.: Revista FIDES, v. 3, n. 1, 2012. p. 38.

95 CIDH. Derechos humanos de migrantes, refugiados, apátridas, víctimas de trata de personas y

desplazados internos: Normas y estándares del Sistema Interamericano de Derechos Humanos.

OEA/Ser.L/V/II.Doc. 46/15. ISBN 978-0-8270-6554-3. Washington, 2015. Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/MovilidadHumana.pdf. Acesso em: 06 de dez de 2019. p. 109.

Neste sentido, quando da emissão do seu relatório sobre Comunidades

Cautivas: Situación del Pueblo Indígena Guaraní y Formas Contemporáneas de Esclavitud en el Chaco de Bolivia, a CIDH expressou que a escravidão, servidão e

trabalho forçado geralmente envolvem violações de outros direitos humanos fundamentais sob o prisma da Convenção Americana e outros instrumentos do sistema universal de direitos humanos, como o direito à liberdade, a não serem submetidas a tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, a liberdade de circulação, acesso à justiça, liberdade de expressão e associação e identidade96.

Também estabelecido em sede do SIPDH, a CIDH entende que todos os procedimentos, sejam judiciais ou administrativos, que possam afetar direitos de uma pessoa devem seguir adequadamente o princípio do devido processo legal, de modo que a pessoa possa efetivamente se defender de qualquer ato estatal.

Assim, a CIDH estabeleceu entendimento de que tais garantias devem ser asseguradas independentemente da situação de regularidade migratória ou não,