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A (necessária) convencionalização da legislação migratória brasileira: uma análise da regulamentação da política migratória à luz do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos

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CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – CCSA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – PPGD

MESTRADO EM DIREITO

TONY ROBSON DA SILVA

A (NECESSÁRIA) CONVENCIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO

MIGRATÓRIA BRASILEIRA: uma análise da regulamentação da

política migratória à luz do Sistema Interamericano de Proteção dos

Direitos Humanos.

NATAL - RN

2020

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TONY ROBSON DA SILVA

A (NECESSÁRIA) CONVENCIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO

MIGRATÓRIA BRASILEIRA: uma análise da regulamentação da

política migratória à luz do Sistema Interamericano de Proteção dos

Direitos Humanos.

Dissertação apresentada à banca examinadora do PPGD/UFRN como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação do Professor Doutor Thiago Oliveira Moreira e coorientação do Professor Doutor José Noronha Rodrigues.

NATAL - RN

2020

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TONY ROBSON DA SILVA

A (NECESSÁRIA) CONVENCIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO

MIGRATÓRIA BRASILEIRA: uma análise da regulamentação da

política migratória à luz do Sistema Interamericano de Proteção dos

Direitos Humanos.

Dissertação apresentada à banca examinadora do PPGD/UFRN como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação do Professor Doutor Thiago Oliveira Moreira e coorientação do Professor Doutor José Noronha Rodrigues.

Aprovado em: 29/07/2020.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Doutor Thiago Oliveira Moreira (orientador) UFRN

Prof. Doutor José Noronha Rodrigues (coorientador) UAC/PT

Prof. Doutor Sidney Cesar Silva Guerra (externo) UFRJ

Prof. Doutor Yara Maria Pereira Gurgel (interno) UFRN

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A minha mãe, Luzinete, base estruturante da minha vida e que me dá força para vencer todos os desafios cotidianos, por toda inspiração para que eu possa me tornar um verdadeiro ser humano;

Ao meu companheiro, Vicente, pelo companheirismo, amor, compreensão e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente a Deus, pela oportunidade que colocou em minha vida e que me fez abrir a mente para o mundo da pesquisa e investigação científica, assim como me deu e me dá forças para continuar na luta diária.

Agradecimentos maiores a minha família, em nome da minha mãe, meu irmão, meu companheiro e do meu pai, que sempre acreditou em mim, mesmo quando nem mesmo eu acreditei.

Também quero registrar, em nome dos Professores Keity Saboya, Yara Gurgel, Marco Bruno Miranda Clementino e Jahyr-Phillipe Bichara, minha gratidão a todos os professores e professoras do PPGD/UFRN.

Ao meu orientador, Professor Thiago Oliveira Moreira, meu agradecimento particular pela disposição em me orientar nessa jornada do Mestrado, bem como pela disponibilidade de contribuir fundamentalmente com a pesquisa ora entregue.

Por fim, mas não menos importante, agradecer ao Professor José Rodrigues Noronha, meu coorientador, por ter aceitado a missão de, junto ao Prof. Thiago, me orientar nessa jornada, mesmo estando fisicamente do outro lado do Atlântico.

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RESUMO

O presente trabalho trata do dever de convencionalização da legislação migratória brasileira, destacando-se as recentes alterações normativas decorrentes da Nova Lei de Migração (Lei 13.445/2017), dos instrumentos infralegais que promovem a sua regulamentação e, ainda, de instrumentos infralegais adotados durante o período de pandemia causada pelo novo coronavírus, que restringem o ingresso de imigrantes no Brasil. Para tanto, utiliza-se o recorte das normas internacionais de âmbito regional, vez que no Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos o Controle de Convencionalidade tem sido utilizado expressamente, mostrando-se essencial o conhecimento das tutelas normativas e jurisdicionais oriundas deste sistema, bem como acerca do exercício do Controle de Convencionalidade. No mesmo sentido, estuda-se a temática migrações incutida na evolução constitucional brasileira, dando ênfase para as normas legais implementadas e sua atual regulamentação infralegal. Indaga-se, portanto, a convencionalidade da regulamentação infralegal da lei de migração à luz dos instrumentos normativos regionais. A hipótese é de que, apesar da Lei de Migração representar uma adequação do ordenamento doméstico à luz das normas interamericanas, o Estado brasileiro tem violado as obrigações assumidas ao editar atos normativos (infralegais) inconvencionais sobre o tema em apreço. Nesta linha, este trabalho tem como objetivo demonstrar o dever de adequação do ordenamento jurídico doméstico frente às normas internacionais, assim como a possível inconvencionalidade de instrumentos infralegais que restringem ou mitigam direitos dos migrantes. A metodologia utilizada envolve pesquisa bibliográfica da doutrina e legislação interamericana e brasileira, pesquisa jurisprudencial nas decisões emanadas da Corte IDH e do judiciário brasileiro, que guardam relação com os direitos das pessoas em situação de migração, adotando-se método dedutivo para aferição acerca da compatibilidade ou não do ordenamento brasileiro. Este exercício demonstra relevante importância, vez que a não adequação do ordenamento jurídico interno (à luz dos compromissos internacionais) pode gerar responsabilização internacional ao Estado. Apura-se, por fim, a inconvencionalidade de diversos dispositivos dos instrumentos infralegais que regulamentam a política migratória no Brasil.

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Palavras Chaves: Convencionalização. Controle de Convencionalidade. Direitos Humanos dos Migrantes. Responsabilização Internacional.

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ABSTRACT

The present work deals with the duty of conventionalization of the Brazilian migratory legislation, standing out as recent normative changes of the New Migration Law (Law 13,445 / 2017), of the infralegal instruments that promote its use and also the infralegal instruments adopted during the period of pandemic caused by the new coronavirus, which restricts the entry of immigrants in Brazil. To do so, use norms from international of regional scope, once of having the Conventionality Control expressly used by Inter-American System for the Protection of Human Rights, showing as essential or the knowledge of the normative norms derived from this system, as well and on the exercise of the Conventionality Control. In the same sense, it is studied the theme of migrations instilled in the Brazilian constitutional evolution, emphasizing the implemented legal norms and their regulamentation infralegal. Therefore, the question is the conventionality of Brazilian legal protection in migratory matters in the light of regional normative instruments. The hypothesis is that, although the Migration Law seems to be an adaptation of domestic law in the light of inter-American norms, the Brazilian State has violated it as a promotion assumed by editing unconventional (infralegal) normative acts on the subject under consideration. In this line, this work has as objective to demonstrate or duty of adequacy of the legal system in face of the international norms, as well as the possible unconventionality of infralegal instruments that restrict or mitigate the rights of migrants. The methodology adopted involves bibliographic research on inter-American and Brazilian law and doctrine, jurisprudential research on decisions emanating from the Inter-American Court and the Brazilian judiciary, which is related to the rights of people in situations of study, adopting the deductive method for measuring relative to privacy. or not to do Brazilian planning. This exercise demonstrates importance, whereas non-suitability of internal legal ordering (in light of international commitments) can generate international responsibility for the State. Finally, notes the unconventionality of several devices of the infralegal instruments that regulate the immigration policy in Brazil.

Keywords: Conventionalization. Conventionality Control. Human Rights of Migrants. International Accountability.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 11

2. A PROTEÇÃO INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS DOS MIGRANTES ... 17

2.1 ASPECTOS GERAIS DO SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS ... 17

2.2 CARTA DA OEA, DADDH, CADH E DEMAIS INSTRUMENTOS NORMATIVOS DO SISTEMA INTERAMERICANO... 27

2.3 A PROTEÇÃO INTERAMERICANA JURISDICIONAL DOS DIREITOS HUMANOS APLICADA A PESSOAS EM SITUAÇÃO MIGRATÓRIA ... 34

2.3.1 A Comissão Interamericana De Direitos Humanos (CIDH) ... 34

2.3.2 A Corte IDH e os Estándares Interamericanos de Proteção dos Direitos Humanos dos Migrantes ... 42

3. A CONVENCIONALIZAÇÃO DO ORDENAMENTO JURÍDICO ESTATAL E O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE ... 74

3.1 A FORÇA NORMATIVA DOS INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS E A OBRIGAÇÃO GERAL DE ADEQUAÇÃO DO ORDENAMENTO JURÍDICO INTERNO ... 76

3.2 A ORIGEM DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE ... 86

3.3 PARÂMETROS GERAIS DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE: CONCEITO, FUNDAMENTO, COMPETÊNCIA E NATUREZA JURÍDICA ... 89

3.4 O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE INTERAMERICANO ... 95

3.4.1 Parâmetros Gerais ... 95

3.4.2 Espécies ... 96

3.5 O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE DOMÉSTICO ... 98

3.5.1 Parâmetros Gerais ... 98

3.5.2 Espécies ... 100

3.5.3 Competência ... 104

3.6 EFEITOS DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE ... 108

4. O BRASIL E A SUA CONTROVERSA POLÍTICA MIGRATÓRIA ... 112 4.1 O CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO E O TEMA DAS MIGRAÇÕES . 116

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4.2. DO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO À NOVA LEI DE MIGRAÇÕES ... 128

5. O DEVER DE CONVENCIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO

MIGRATÓRIA INFRALEGAL BRASILEIRA ... 142 5.1 A REGULAMENTAÇÃO DA POLÍTICA MIGRATÓRIA BRASILEIRA ATRAVÉS DE ATOS NORMATIVOS ... 143 5.2 A REGULAMENTAÇÃO DA POLÍTICA MIGRATÓRIA BRASILEIRA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19 ... 151 5.3 A (IN)CONVENCIONALIDADE DA LEGISLAÇÃO MIGRATÓRIA BRASILEIRA: uma análise de convencionalidade do Decreto 9.199/2017, da Portaria nº 666/2019, da Portaria nº 770/2019 e da Portaria PR nº 340/2020 ... 154 6. CONCLUSÃO ... 164 REFERÊNCIAS ... 170

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CIDH – Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Corte IDH ou Corte Interamericana – Corte Interamericana de Direitos Humanos CIJ - Corte Internacional de Justiça

DADDH – Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos

OEA – Organização dos Estados Americanos ONU – Organização das Nações Unidas

SAPDH - Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos SEPDH - Sistema Europeu de Proteção dos Direitos Humanos () SIPDH – Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos

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1. INTRODUÇÃO

Direitos fundamentais, que são Direitos Humanos positivados no ordenamento jurídico, são direitos historicamente conquistados, cujo objetivo principal, em grosso modo, é assegurar condições de uma vida digna para toda pessoa, independente das suas características pessoais, condição social, nacionalidade, ou alguma outra forma de discriminação.

Ao longo da história da humanidade, tais direitos assumiram faces diferentes, sendo fortalecidos ou limitados na medida em que a sociedade avançava ou retrocedia em sua organização.

Nos últimos anos, os direitos humanos foram reconhecidos através de diversas cartas constitucionais, declarando-os como fundamentais, a exemplo do que foi pregado nas revoluções inglesa (1640-1688), americana (1776) e francesa (1789), que conclamaram pela limitação da intervenção do Estado na vida das pessoas, numa clara ideologia liberal iluminista1.

Neste caminho, os Estados passaram a adotar Constituições que, além de promoverem sua organização estrutural, rezavam as garantias de liberdades individuais dos cidadãos e outros direitos fundamentais que assegurassem a manutenção da dignidade humana.

Contudo, após os nefastos acontecimentos da segunda grande guerra, tendo o Estado como cruel violador dos direitos humanos, a exemplo do que foi o nazismo e as milhões de vidas dizimadas, percebeu-se que o entendimento de que ter os direitos fundamentais pautados na soberania estatal não era suficiente para garantia de sua manutenção.

Como resultado desta compreensão, empenhou-se grande esforço para reconstrução da concepção dos direitos fundamentais – pautados, agora, como referencial ético-moral para orientar a nova ordem internacional contemporânea - em repulsa à formalidade legal que aceitara a destruição em massa de pessoas, em razão do condicionamento da titularidade de tais direitos pregada pelo nazi-facismo2.

1 Cf. GURGEL, Yara Maria Pereira. Direitos Humanos, Princípio da Igualdade e não Discriminação:

sua aplicação às relações de trabalho. (Tese de Doutorado). São Paulo: USP, 2007. P. 46. Disponível

em: https://tede2.pucsp.br/bitstream/handle/7852/1/Yara%20Maria%20Pereira%20Gurgel.pdf. Acesso em 04 de julho de 2020.

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Transmudou-se, assim, a antiga noção de soberania absoluta do Estado, que passou a ser relativizada na medida em que foram “proibidas” intervenções nacionais cujo objetivo seja promover a mitigação de direitos fundamentais, numa clara acepção antropocêntrica de tais direitos.

Sob este prisma, percebe-se, de um lado, o surgimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, assim como o de um Direito Constitucional ocidental contemporâneo, aberto a princípios e valores norteadores de proteção aos direitos fundamentais e limitação do poder estatal.

É através deste reconhecimento que surgem as declarações internacionais de direitos humanos, como a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), bem como a criação da Organização das Nações Unidas, em 1948.

Assim, os direitos humanos passaram a contar com tutela jurídica internacional, organizada de forma global pela ONU, que tratou de uma proteção geral aos indivíduos assegurada pela DUDH, pelo Pacto Internacional sobre Direito Civis e Políticos (PIDCP) e pelo Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC).

Ainda em nível global, existem também diversas tutelas de proteção específicas como o Estatuto dos Refugiados (1951) e seu Protocolo Adicional (1967), a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Apátridas (1954), a Convenção para a Redução dos Casos de Apatridia (1961), a Convenção Internacional para Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (1968), a Convenção sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (1979), a Convenção sobre Direitos da Criança (1989), a Convenção Internacional para Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros de suas Famílias (1990), a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (2002), a Convenção Internacional para a Proteção de todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado (2006), dentre outras.

Neste mesmo movimento, percebendo-se que havia a necessidade de um olhar mais focado nas peculiaridades socioculturais de determinadas regiões, foram criados sistemas regionais de proteção dos direitos humanos, com abrangência continental, como o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos (SPIDH), Sistema

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Europeu de Proteção dos Direitos Humanos (SEPDH) e o Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos (SAPDH).

A partir da produção de tratados, acordos e convenções internacionais, partindo destas organizações, ou tratados que são cotidianamente pactuados entre Estados, vários instrumentos normativos de origem internacional foram incorporados à ordem jurídica dos Estados, cuja força normativa gera efeitos internos.

Ao pactuar determinado acordo internacional, o Estado assume um compromisso de cumpri-lo, sob a égide dos princípios pacta sunt servanda e boa-fé, surgindo o Controle de Convencionalidade como sendo a sindicância de aferição da compatibilidade entre o ordenamento jurídico doméstico e as normas internacionais protetivas de direitos humanos, do qual o Estado é parte.

Dito controle acontece na seara dos Direitos Humanos, a fim de evitar violação do patamar mínimo de proteção à pessoa, fazendo com que os Estados tenham de assegurar uma compatibilidade do seu ordenamento jurídico interno aos princípios, regras e direitos humanos assegurados através dos instrumentos internacionais.

Como não poderia ser diferente, em o Brasil sendo parte de diversos tratados internacionais, tem como dever a efetivação de cada um deles, inclusive no que diz respeito aos direitos humanos dos imigrantes que tem chegado ao seu território. Não menos importante, a própria Constituição Federal de 1988 (art. 5º, § 2º) traz uma importante abertura aos direitos humanos oriundos de instrumentos internacionais.

Neste quadrante, resta claro que ao firmar pactos e instrumentos internacionais, o Estado assume um dever de convencionalização oriundo do dever de cumprimento, ou seja, o Estado deve promover uma adequação da sua legislação interna, para compatibilizá-la aos instrumentos internacionais então pactuados. Este dever de convencionalização acontece tanto para a tutela geral quanto para as tutelas específicas dos direitos humanos.

Diante do dever acima descrito, a presente proposta visa o estudo da convencionalidade da legislação brasileira que promove a regulação migratória no país, com destaque para os instrumentos infralegais que regulamentam a Nova Lei de Migração (Lei 13.445/2017), frente normas interamericanas protetivas de direitos humanos, incluindo o teor dos tratados emanados da OEA, bem como a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).

Tal recorte se faz necessário para análise da possível [in]compatibilidade dos instrumentos de regulação migratória adotados pelo Brasil, frente aos direitos humanos

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que são assegurados as pessoas em mobilidade internacional, no âmbito interamericano, onde se tem exercitado expressamente o Controle de Convencionalidade.

Assim, considerando que a Nova Lei de Migração promoveu a convencionalização do ordenamento jurídico brasileiro, questiona-se se os atos normativos infralegais, que regulamentam a Lei de Migração e veiculam a política migratória brasileira, são convencionais ou não.

Para responder a presente problemática e demonstrar que a regulamentação da legislação migratória brasileira se encontra de acordo (ou não) com as normas interamericanas de direitos humanos, notadamente as que tratam especificamente da questão migratória, será necessário satisfazer certos objetivos, sendo foco principal deste estudo a temática dos Direitos Humanos dos Migrantes.

A proposta principal é demonstrar que, apesar da Lei de Migração representar um largo avanço em matéria de adaptação da legislação migratória brasileira aos compromissos interamericanos em matéria de direitos humanos dos migrantes, o Estado brasileiro tem violado as obrigações assumidas ao editar atos normativos (infralegais) inconvencionais sobre o tema em apreço.

Em resumo, neste trabalho será abordado o estudo acerca da proteção interamericana dos direitos humanos dos migrantes; a convencionalização do ordenamento jurídico estatal; da teoria geral do controle de convencionalidade; da política migratória brasileira e do dever de convencionalização da legislação migratória infralegal brasileira.

Assim, no capítulo inicial do desenvolvimento, que trata sobre a proteção interamericana dos direitos humanos dos migrantes, serão evidenciados os instrumentos normativos que acautelam esta temática, os organismos de controle regional e a jurisprudência regional relacionada a proteção dos migrantes.

No segundo capítulo, que trata sobre a convencionalização do ordenamento jurídico estatal, será abordado o dever de compatibilização do ordenamento jurídico interno com o ordenamento internacional, oriundo de regras da boa-fé e pacta sunt

servanda.

No terceiro capítulo, será estudada a teoria geral do controle de convencionalidade, de modo a esclarecer sobre o conceito, fundamento e obrigatoriedade de tal controle, bem como suas espécies em âmbito regional e interno.

No quarto capítulo, será feito um relato histórico de como o Brasil, conhecido como um país formado por imigrantes, tem tratado a temática migratória através das

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suas Constituições e das mais recentes leis que regem o tema. Aliás, em 2017 o Brasil vivenciou o que se chama de convencionalização tácita da sua legislação migratória, quando revogou o atrasado Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/1980), através da instituição da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017).

No quinto e último capítulo, que tratará do dever de convencionalização da legislação migratória infralegal brasileira, abordar-se-á os atos normativos infralegais que tem promovido a “regulamentação” da política migratória e suas possíveis inadequações legais e convencionais. Ao que se apresenta, a regulamentação da referida Lei de Migração e demais atos infralegais tem seguido caminho oposto à própria lei, o que possivelmente poderá colocar (ou já colocou) o Brasil em uma situação declarada de inconvencionalidade, ou seja, de inobservância dos instrumentos internacionais que tratam do tema.

Assim, considerando o avanço do processo de globalização, o intenso movimento migratório e o crescente aumento dos deslocamentos forçados, este estudo se mostra cada dia mais premente seja pelos diversos fenômenos de migração forçada gerada por desastres naturais, como o caso do Haiti, de deslocamentos gerados por crises humanitárias, como no caso da Venezuela, ou deslocamentos forçados em decorrência de conflitos armados, como no caso da Síria. Principalmente nos dois primeiros casos, o Brasil é território “escolhido” por algumas pessoas deslocadas e por isso deve estar juridicamente preparado para enfrentar adequadamente o tema.

Geralmente, as pessoas em situação migratória, especialmente as que estão em situação de vulnerabilidade, não veem respeitados os seus direitos fundamentais das quais são titulares enquanto sujeitos de direitos humanos. Isso, em uma condição individual de ausência ou diferença de poder a respeito dos nacionais. Essa condição de vulnerabilidade tem uma dimensão ideológica e se apresenta em um contexto histórico que é distinto para cada Estado e é mantida por situações de jure (desigualdades entre nacionais e estrangeiros nas leis) e de fato (desigualdades estruturais). Essa situação conduz ao estabelecimento de diferenças no acesso de uns e outros aos recursos públicos administrados pelo Estado.

Segundo observou também a Assembleia Geral das Nações Unidas3, “entre

outros fatores, o processo de mundialização e liberalização, incluindo a crescente disparidade econômica e social entre muitos países e a marginalização de alguns da

3 Assembleia Geral das Nações Unidas, Resolução A/RES/54/212 sobre “Migração Internacional e

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economia mundial, tem contribuído a criar grandes movimentos de população entre os países e a intensificar o complexo fenômeno da migração internacional”.

Sem embargo, ante a necessidade de aferir se o Brasil tem efetivado a proteção aos migrantes “assegurada” pelos tratados e acordos internacionais, faz-se extremamente necessário o estudo da convencionalidade da legislação brasileira.

Considerando os inúmeros tratados, acordos e convenções internacionais do qual o Brasil é signatário, que tratam dos direitos humanos que devem ser assegurados aos migrantes, o estudo acerca de como se comporta a legislação interna do Estado poderá apontar os acertos ou inconformidades da legislação nacional.

Exemplo disso, como restará evidenciado, o Brasil iniciou um processo de adequação do seu ordenamento ao editar a Lei de Migrações, contudo, a sua regulamentação, como a nefasta Portaria nº 666/2019-MJ, revogada pela Portaria nº 770/2019-MJ - e demais instrumentos normativos posteriores -, expõe que ainda há muito caminho pela frente. Dita portaria, além de criar regulamento ilegal, notadamente tem gerado repercussão nacional e internacional acerca do risco de desrespeito aos direitos humanos.

Considerando também a possibilidade de responsabilização internacional pelo possível descumprimento de norma pactuada além das fronteiras, resta clara a importância deste estudo como forma de apontar as possíveis inconvencionalidades do ordenamento jurídico interno brasileiro.

A metodologia utilizada envolve pesquisa bibliográfica da doutrina e legislação latino-americana, pesquisa jurisprudencial nas decisões emanadas da Corte IDH - que tratem da temática relacionada ao objeto deste escrito, pesquisa da doutrina e legislação brasileira que trate da matéria relacionada aos direitos dos migrantes, adotando-se método dedutivo para aferição acerca da compatibilidade ou não do ordenamento brasileiro.

Por fim, espera-se que o presente estudo possa servir de fonte doutrinária para uma efetiva compreensão acerca da matéria de Controle de Convencionalidade relacionada aos Direitos Humanos dos Migrantes, contribuindo, inclusive, para que o Estado brasileiro promova uma correta adequação normativa e não sofra algum tipo de responsabilização internacional.

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2. A PROTEÇÃO INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS DOS MIGRANTES

Sabendo que existe uma ordem de proteção dos direitos humanos global, criada notadamente a partir da fundação da ONU, mas considerando o recorte regional que será empregado neste trabalho, este tópico cuidará de aprofundar o estudo sobre esta proteção normativa no âmbito interamericano.

2.1 ASPECTOS GERAIS DO SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

Os Estados que fazem parte do continente americano, reunindo-se periodicamente para criação de um sistema compartilhado de normas e instituições, ao participarem da IX Conferência dos Estados Americanos, em Bogotá, no ano de 1948, decidiram fundar a Organização dos Estados Americanos (OEA)4, mais antigo

organismo regional do mundo5.

A própria Carta da Organização dos Estados Americanos já destacou a necessidade de criação de um sistema para assegurar o respeito aos direitos humanos no seu preâmbulo 6, conforme preceitua Sidney Guerra7.

4 Contempla 35 atualmente países, resguardando-se a exclusão de participação do Governo de Cuba,

imposta pela Resolução AG/RES. 2438 (XXXIX-O/09). Disponível em: http://www.oas.org/pt/estados_membros/default.asp. Acesso em 01 de maio de 2020.

5 “Durante a 9ª Conferência Interamericana realizada em Bogotá, entre 30 de março a 2 de maio de 1948,

foram aprovadas a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem. A Carta da OEA proclamou, de modo genérico, o dever de respeito aos direitos humanos por parte de todo Estado-membro da organização. Já a Declaração Americana enumerou quais são os direitos fundamentais que deveriam ser observados e garantidos pelos Estados”. CARVALHO RAMOS, André de. Curso de Direitos Humanos. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 313.

6 CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Preâmbulo. [...] Convencidos de que

a missão histórica da América é oferecer ao Homem uma terra de liberdade e um ambiente favorável ao desenvolvimento de sua personalidade e à realização de suas justas aspirações; Conscientes de que esta missão já inspirou numerosos convênios e acordos cuja virtude essencial se origina do seu desejo de conviver em paz e de promover, mediante sua mútua compreensão e seu respeito pela soberania de cada um, o melhoramento de todos na independência, na igualdade e no direito; Seguros de que a democracia representativa é condição indispensável para a estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região; Certos

de que o verdadeiro sentido da solidariedade americana e da boa vizinhança não pode ser outro senão o de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade individual e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do Homem;

Persuadidos de que o bem-estar de todos eles, assim como sua contribuição ao progresso e à civilização do mundo exigirá, cada vez mais, uma intensa cooperação continental; Resolvidos a perseverar na nobre empresa que a Humanidade confiou às Nações Unidas, cujos princípios e propósitos reafirmam solenemente; Convencidos de que a organização jurídica é uma condição necessária à segurança e à paz, baseadas na ordem moral e na justiça [...].

7 GUERRA, Sidney. Direito Internacional dos Direitos Humanos. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2015. p.

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O Brasil foi um dos signatários da Carta da Organização dos Estados Americanos e em 1952, através do Decreto nº 30.544, de 14 de fevereiro daquele ano, promulgou dito instrumento, incorporando-a ao seu ordenamento jurídico interno.

Importante falar que a Carta da OEA não tratou da criação de um espaço de livre circulação de pessoas ou da criação de uma política migratória comum, até por não dispor de caráter supranacional8.

A Carta da OEA, em verdade, teve como objetivo principal a manutenção da paz e segurança do continente, conforme se denota do seu artigo 2º9, mas também

trouxe em seus princípios enunciados no artigo 3º10, a preocupação quanto à temática

dos direitos humanos11.

Já nos seus artigos 106 e 145, dita Carta tratou de estabelecer marcos gerais de proteção aos direitos humanos, anunciando a criação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, cujo objetivo principal é de promover o respeito e a defesa dos direitos humanos12, assim como estabelecendo a criação de uma Convenção específica

para tratar de direitos humanos13.

8 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Concretização dos Direitos Humanos dos Migrantes pela Jurisdição

Brasileira Curitiba: Instituto Memória. Centro de Estudos da Contemporaneidade, 2019. p. 110.

9 CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Artigo 2º. Para realizar os princípios

em que se baseia e para cumprir com suas obrigações regionais, de acordo com a Carta das Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos estabelece como propósitos essenciais os seguintes: a) Garantir a paz e a segurança continentais; b) Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não-intervenção; c) Prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica das controvérsias que surjam entre seus membros; d) Organizar a ação solidária destes em caso de agressão;

e) Procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos que surgirem entre os Estados membros; f) Promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural; g) Erradicar a pobreza crítica, que constitui um obstáculo ao pleno desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério; e h) Alcançar uma efetiva limitação de armamentos convencionais que permita dedicar a maior soma de recursos ao desenvolvimento econômico-social dos Estados membros.

10 Ibidem. Artigo 3º. Os Estados americanos reafirmam os seguintes princípios: [...] l) Os Estados

americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa humana, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo; [...].

11 “Criada como uma Organização Internacional de caráter regional, seus propósitos e princípios

fundamentais, bem como parte de sua estrutura, deixam bastante claro que uma das suas finalidades é a proteção aos direitos humanos. Para tanto, serve-se da capacidade jurídica internacional para celebrar tratados internacionais com outros sujeitos do Direito Internacional, a fim de alcançar os seus objetivos”. MOREIRA, Thiago Oliveira. Ob. Cit. p. 74.

12 CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Artigo 106. Haverá uma Comissão

Interamericana de Direitos Humanos que terá por principal função promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria.

Uma convenção interamericana sobre direitos humanos estabelecerá a estrutura, a competência e as normas de funcionamento da referida Comissão, bem como as dos outros órgãos encarregados de tal matéria.

13 Para se concluir a CADH, certamente, existiu um exaustivo trabalho preparatório para se chegar à

Convenção. Neste sentido: “Os antecedentes da Convenção Americana remontam à Conferência Interamericana realizada no México em 1945, a qual encarregou à Comissão Jurídica Interamericana de preparar um projeto de declaração. Essa ideia foi retomada na Quinta Reunião de Consulta dos Ministros

(21)

Em outro fator destacável, a Carta da OEA traz uma significativa abertura e dever de observância dos Estados ao Direito Internacional. Em seu artigo 3º, alínea b, menciona que “a ordem internacional é constituída essencialmente pelo respeito à personalidade, soberania e independência dos Estados e pelo cumprimento fiel das obrigações emanadas dos tratados e de outras fontes do direito internacional”, em um claro reconhecimento do dever de cumprimento dos tratados e instrumentos internacionais. No mesmo artigo, alínea c, dita Carta enuncia que “a boa-fé deve reger as relações dos Estados entre si”, notadamente fazendo referência ao princípio da boa-fé que rege as relações internacionais e que será discutido mais adiante.

Pelo que se denota, através da Carta de Bogotá (Carta da OEA) é que foi dado ao ideário pan-americano uma base convencional e institucional, ao tempo em que a Organização dos Estados Americanos foi transformada em organismo da ONU14.

A Carta também fez nascer a Organização dos Estados Americanos (OEA), organismo de cooperação internacional15, do qual fazem parte todos os países

americanos independentes, resguardando-se a exceção aplicada ao Governo de Cuba16.

Dita organização tem como um dos seus objetivos (previsto no Artigo 1º da sua Carta) alcançar nos Estados membros “uma ordem de paz e de justiça” e representa

das Relações Exteriores em Santiago do Chile, em agosto de 1959, na qual se decidiu impulsionar a preparação de uma convenção de direitos humanos. O projeto original de convenção, elaborado pelo Conselho Interamericano de Jurisconsultos, foi submetido ao Conselho da OEA e levado aos Estados e à Comissão Interamericana para receber comentários. Em 1967, a Comissão apresentou um novo projeto de convenção. Para analisar os diferentes projetos, a OEA convocou a Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, que se reuniu em São José da Costa Rica de 7 a 22 de novembro de 1969. Em 21 de novembro de 1969, a Conferência adotou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A entrada em vigor da Convenção em 1978 permitiu o incremento da efetividade da Comissão, estabelecer uma Corte Interamericana de Direitos Humanos e modificar a natureza jurídica dos instrumentos nos que se baseia a estrutura institucional”. Disponível em: https://www.oas.org/pt/cidh/mandato/Basicos/intro.pdf. Acesso em 20 de maio de 2020.

14 HANASHIRO, Olaya Sílvia Machado Portella. O Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos

Humanos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: FUPESP, 2001. p. 29.

15 “A sua própria Carta constitutiva deixa claro sua natureza jurídica: a de uma organização internacional

de caráter regional dentro do sistema das Nações Unidas.” SILVA, Roberto Luiz. A OEA ENQUANTO

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL. In.: OLIVEIRA, Márcio Luís de. (Coord.). O Sistema

Interamericano de proteção dos direitos humanos: interface com o direito constitucional contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 98

16 Em 3 de junho de 2009, os Ministros de Relações Exteriores das Américas adaptaram a Resolução

AG/RES.2438 (XXXIX-O/09), que determina que a Resolução de 1962, a qual excluiu o Governo de Cuba de sua participação no sistema interamericano, cessa seu efeito na Organização dos Estados Americanos (OEA). A resolução de 2009 declara que a participação da República de Cuba na OEA será o resultado de um processo de diálogo iniciado na solicitação do Governo de Cuba, e de acordo com as

práticas, propósitos e princípios da OEA. Disponível em

(22)

grande passo para efetivação de um sistema normativo regional de proteção dos direitos humanos17.

A OEA é a mais antiga organização regional18 e realiza os seus fins por

intermédio dos seguintes órgãos: Assembleia Geral; Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores; Conselhos (Conselho Permanente e Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral); Comissão Jurídica Interamericana; Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Secretaria-Geral; Conferências Especializadas; Organismos Especializados e outras entidades estabelecidas pela Assembleia Geral19.

A OEA também tem sua importância para a proteção dos direitos humanos, uma vez que tem papel de organização para alcançar “uma ordem de paz e de justiça, para promover sua solidariedade, intensificar sua colaboração e defender sua soberania, sua integridade territorial e sua independência”, conforme estipula o Art. 1º da Carta da OEA.

Desde a criação da OEA, os Estados americanos adotaram um conjunto de instrumentos internacionais que se converteram na base normativa de um sistema regional de promoção e proteção dos direitos humanos, ao reconhecerem esses direitos, estabelecerem obrigações para a sua promoção e proteção e criarem órgãos para zelar por sua observância.

Ainda em 1948, também restou aprovada a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH), que pode ser considerada formalmente como o marco inicial do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, como fruto de um intenso processo de integração regional20.

Dita Declaração demonstrou contemporaneidade da América no tratamento dos Direitos Humanos, vez que precedeu a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) da Organização das Nações Unidas (ONU), que foi aprovada somente em dezembro de 1948.

17 Neste sentido, leia-se: “Criada como uma Organização Internacional de caráter regional, seus

propósitos e princípios fundamentais, bem como parte de sua estrutura, deixam bastante claro que uma das suas finalidades é a proteção aos direitos humanos. Para tanto, serve-se da capacidade jurídica internacional para celebrar tratados internacionais com outros sujeitos do Direito Internacional, a fim de alcançar os seus objetivos”. MOREIRA, Thiago Oliveira. A Aplicação dos Tratados Internacionais de

Direitos Humanos pela jurisdição brasileira. Natal: EDUFRN, 2015. p. 74.

18 A OEA é uma organização internacional regional do tipo mencionado no artigo 52 da Carta das Nações

Unidas. Em conformidade com o artigo 53 da sua Carta.

19Disponível em

http://www.oas.org/juridico/portuguese/a_organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_estados_americ.htm. Acesso em 15 de maio de 2020.

20 AGUIAR, Marcus Pinto. Acesso à Justiça nos Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos

(23)

A DADDH não foi considerada como parte da Carta da OEA, o que levou a um entendimento inicial de que ela não produziu obrigações jurídicas contratuais, situando a Declaração na categoria de “declaração de princípios”, que não tem a força coercitiva como os tratados internacionais21.

Contudo, com a evolução do direito interamericano em relação à proteção dos direitos humanos a própria Assembleia Geral da OEA tem reconhecido que a DADDH é uma fonte de obrigações internacionais para os estados parte da Organização22. A Corte

IDH, por exemplo, entende que mesmo a Declaração não sendo um tratado (em termos formais), não carece de efeitos jurídicos que vinculam os Estados membros23.

Destaque-se, pois, o entendimento de que independentemente da posição individual do Estado membro, instrumentos tecnicamente não-mandatórios (resoluções de modalidades distintas) têm igualmente exercido efeitos jurídicos sobre os Estados membros da Organização24.

De outro modo, percebe-se, desde o preâmbulo da DADDH, que tal instrumento buscou promover um verdadeiro equilíbrio na balança ao demonstrar que o homem25 é titular de direitos, mas que também há muitos deveres, principalmente

sociais, a observar26.

21 HANASHIRO, Olaya Sílvia Machado Portella. Op. Cit. p. 30.

22 A resolução 314 (VII-0/77) de 22 de Junho de 1977, encarregou a Comissão Interamericana de preparar

um estudo em que “conste a obrigação de cumprir os compromissos adquiridos no Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem”. Na resolução 371 (VIII-0/78) de 1º de julho de 1978, a Assembleia Geral reafirmou “seu compromisso de promover o cumprimento da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem”. A resolução 370 (VIII-0/78) de 1º de julho de 1978, referiu-se ao "Compromissos internacionais" de respeitar os direitos do homem "reconhecidos pela Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem" por um Estado Membro da Organização.

23 Corte IDH: Interpretação da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem no âmbito do

artigo 64 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Opinião Consultiva OC‐10/89 de 14 de julho de 1989. Série A Nº 10, parágrafos 45‐47.

24 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Reflexões sobre o valor jurídico das Declarações

Universal e Americana de Direitos Humanos de 1948 por ocasião do seu quadragésimo aniversário.

Revista Inf. Legisl. Brasília a. 25 nº 99. Jul/Set de 1988. Disponível em https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/181857/000439747.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em 15 de maio de 2020. p. 13.

25 Em que pese o reconhecimento da DADDH como marco de proteção dos direitos humanos, o uso da

expressão “direitos do homem” contraria o seu princípio de igualdade. Em um contexto marcado pelo machismo, que colocou “a mulher” à margem de tantos direitos essenciais durante anos, para assegurar que nenhuma dúvida existisse acerca da igualdade de gênero, talvez o mais indicado a utilizar seria uma expressão como “direitos humanos” ou “da pessoa humana”, como assim fez a Declaração Universal.

26 DECLARAÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS E DEVERES DO HOMEM. Preâmbulo. Todos os

homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos e, como são dotados pela natureza de razão e consciência, devem proceder fraternalmente uns para com os outros.

O cumprimento do dever de cada um é exigência do direito de todos. Direitos e deveres integram-se correlativamente em toda a atividade social e política do homem. Se os direitos exaltam a liberdade individual, os deveres exprimem a dignidade dessa liberdade.

Os deveres de ordem jurídica dependem da existência anterior de outros de ordem moral, que apoiam os primeiros conceitualmente e os fundamentam. [...]

(24)

Neste sentido, elencou em seu artigo 28 que “os direitos do homem estão limitados pelos direitos do próximo, pela segurança de todos e pelas justas exigências do bem-estar geral e do desenvolvimento democrático”, o que representa seu desejo de imposição de equilíbrio nas relações privadas, por exemplo.

Assim, se na sua primeira parte (arts. 1º ao 28), dita Declaração tratou do rol de Direitos inerentes à pessoa humana27 na sua segunda parte (arts. 29 ao 38), a Declaração

cuidou de elencar deveres inerentes ao homem28.

O Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos (SIPDH), dispõe de diversos instrumentos normativos, órgãos de controle e uma vasta jurisprudência, sendo necessário realizar inicialmente um estudo sobre tais29.

Em sua tutela normativa, o SIPDH conta com importantes instrumentos como a Carta da OEA, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH), de 1948 e a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH)30, de 1969, dentre

outros31.

Em razão do objetivo deste trabalho, serão abordados somente alguns aspectos destes demais instrumentos internacionais que compõem o SIPDH, considerando que possam ter importância a este estudo.

27 Dentre eles, podemos citar: Direito à vida, à liberdade, à segurança e integridade da pessoa; Direito de

igualdade perante a lei; Direito de liberdade religiosa; Direito de liberdade de investigação, opinião, expressão e difusão; Direito à proteção da honra, da reputação pessoal e da vida particular e familiar; Direito à constituição e proteção da família. Direito de residência e trânsito; Direito à educação; Direito ao trabalho e a uma justa retribuição; Direito de reconhecimento da personalidade jurídica e dos direitos civis; Direito de proteção contra prisão arbitrária.

28 Dentre os deveres contidos na DADDH, podemos citar: Deveres perante a sociedade; Deveres para com

os filhos e os pais; Dever do sufrágio; Dever de obediência à Lei; Dever de servir a coletividade e a nação; Deveres de assistência e previdência sociais; Dever de pagar impostos; Dever do trabalho; Dever de se abster de atividades políticas em países estrangeiros.

29 “O sistema de proteção internacional dos direitos humanos no continente americano abarca os

procedimentos contemplados na Carta da Organização dos Estado Americanos, na Declaração Americana dos Direitos do Homem e na Convenção Americana de Direitos Humanos.” GUERRA, Sidney. Direito

Internacional dos Direitos Humanos. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2015. p. 179.

30 “Além da Convenção Americana de Direitos Humanos, o sistema interamericano conta com diversos

instrumentos internacionais que protegem direitos específicos. O mais importante deles é, sem dúvida, o Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos em matéria de Diretos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), adotado em 1988 e ratificado pelo Brasil em 1996”. CARVALHO RAMOS, André de. Curso de Direitos Humanos. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 315.

31 “Quanto aos demais instrumentos internacionais do sistema interamericano de direitos humanos,

cite-se, entre outros, a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir o Crime de Tortura, adotada em 1985 e ratificada pelo Brasil em 1989; o Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos relativo à Abolição da Pena de Morte, adotado em 1990 e ratificado pelo Brasil em 1996; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, adotada em 1994 em Belém do Pará (Brasil) e ratificada pelo Brasil em 1995, e a Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas adotada em 1994 e já ratificada pelo Brasil”. CARVALHO RAMOS, André de. Ob.

(25)

Em que pese sua grande relevância ao estabelecer um rol direitos sociais que devem ser assegurados pelos Estados, destaca-se o Protocolo de San Salvador, que foi aprovado em 1988 pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, para consagrar direitos sociais que anteriormente não haviam recebido destaque pelos outros instrumentos.

Dito Protocolo cuidou de um importante rol de direitos sociais, qual sejam: direito ao trabalho; direito à seguridade social; direito a condições equitativas de trabalho; direito à associação sindical; proteção à família; proteção à criança; proteção ao idoso; proteção à cultura; proteção ao meio ambiente equilibrado e outros32.

No que concerne ao controle e monitoramento e implementação do cumprimento das obrigações previstas nos tratados e demais instrumentos internacionais que cuidam dos Direitos Humanos, o SIPDH conta coma Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e com a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)33.

É possível afirmar que no âmbito americano existem dois sistemas normativos de proteção aos direitos humanos34: o geral, baseado na Carta da OEA e na DADDH e o

sistema que abarca apenas os Estados signatários da Convenção que estão submetidos, além da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) já prevista no geral, a Corte Interamericana de Direitos Humanos35.

A Comissão é um órgão planejado desde a fundação da Organização dos Estados Americanos (OEA), pelo qual não se pode olvidar sua importância, e teve sua criação estabelecida através do artigo 106 da Carta da OEA36.

A CIDH teve sob sua tutela as atribuições que seriam posteriormente cabíveis à Corte IDH, vez que enquanto não estivesse em vigor a Convenção que tratasse da

32 GUERRA, Sidney. Direito Internacional dos Direitos Humanos. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.

p. 194.

33 WERMUTH, Maiquel Angelo Dezordi; GHISLENI, Pâmela Copetti. O sistema interamericano de

direitos humanos e a proteção dos direitos sexuais e reprodutivos. Revista da Faculdade de Direito

UFPR, Curitiba, PR, Brasil, v. 62, n. 2, maio/ago. 2017. ISSN 2236-7284. p. 64. Disponível em: <http://revistas.ufpr.br/direito/article/view/49287>. Acesso em: 11 de maio de 2020. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rfdufpr.v62i2.49287.

34 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Aplicação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos pela

jurisdição brasileira. Natal: EDUFRN, 2015. p. 75.

35 GUERRA, Sidney. Ob. Cit. p. 180.

36 CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. A COMISSÃO

INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Artigo 106: Haverá uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos que terá por principal função promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria.

Uma convenção interamericana sobre direitos humanos estabelecerá a estrutura, a competência e as normas de funcionamento da referida Comissão, bem como as dos outros órgãos encarregados de tal matéria.

(26)

matéria de direitos humanos, prevista no artigo 106, a referida Comissão seria a responsável pelas atribuições àquela previstas37.

A criação da Comissão, oficialmente, ficou a cargo da Resolução VIII, oriunda da V Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores, realizada em Santiago, Chile, em agosto de 1959. Seu estatuto foi aprovado em junho de 1960, em Washington D.C., Estados Unidos, mesmo ano em que suas atividades foram iniciadas.

Sediada em Washington D.C., dita Comissão teve sua composição, estrutura e funcionamento previstos pela Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que tratou da matéria nos artigos 34 ao 40, assim como sua competência e função foram reguladas, através dos artigos 41 ao 47 da mesma Convenção.

A CIDH é composta por sete membros da nacionalidade de qualquer dos Estados-membros da OEA, eleitos pela Assembleia Geral da Organização, e é competente para atuar tanto na proteção relativa à OEA quanto na proteção assegurada pela CADH38. Dita Comissão também pauta sua atuação tendo como base seu estatuto e

regulamento.

A Comissão é um órgão autônomo e figura entre os principais da estrutura da Organização dos Estados Americanos, servindo como órgão supervisor, promocional e consultivo39.

Há de se destacar que a referida Comissão desempenha um relevante papel de acesso ao sistema de proteção dos direitos humanos, vez que serve de ponte de atuação entre o indivíduo, que não tem capacidade processual para acionar diretamente a Corte IDH, e o SIPDH.

A CIDH opera através de mecanismos quase judicial e judicial40. Alguns

doutrinadores comparam esta função da CIDH com o Ministério Público41, pois tem

37 CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. A COMISSÃO

INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Artigo 145: Enquanto não entrar em vigor a convenção interamericana sobre direitos humanos a que se refere o Capítulo XV, a atual Comissão Interamericana de Direitos Humanos velará pela observância de tais direitos.

38 Composta em 26 de maio de 2020 pelos seguintes membros: Joel Hernández García, Antonia Urrejola

Noguera, Margarette May Macaulay, Esmeralda Arosemena de Troitiño, Julissa Mantilla Falcón, Edgar Stuardo Ralón Orellana e pela brasileira Flávia Piovesan, que ocupa a segunda vice presidência da comissão. Atualmente, Flávia Piovesan é a nacional brasileira que integra a CIDH, com mandato de 01/01/2018 a 31/12/2021.

39 PEREIRA, Antônio Celso Alves. Apontamentos sobre a Corte Interamericana de Direitos

Humanos. In: GUERRA, Sidney. (Org.) Temas emergentes de direitos humanos. Rio de Janeiro: FDC,

2006. p. 93.

40 AGUIAR, Marcus Pinto. Acesso à Justiça nos Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos

Humanos. 2ª ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2017. p. 62.

41 “[...]Sua atuação é, portanto, bastante semelhante em alguns aspectos a do Ministério Público

(27)

competência para receber e processar as denúncias que lhes são apresentadas por indivíduos, grupos de pessoas e Estados, além de exercer uma função investigativa e de conciliação. É ainda o intérprete da Convenção Americana de Direitos Humanos e para que sua estrutura seja acionada é necessário o peticionamento escrito referindo-se à suposta violação de algum direito humano que esteja disposto na Convenção, na Declaração Americana ou em outros documentos do Sistema Interamericano42.

Diferentemente da Corte IDH, como se verá oportunamente, não é exigida formação jurídica para os membros da Comissão e o seu mandato é de quatro anos, cabendo uma única reeleição, não sendo permitida a presença de mais de um nacional de mesmo Estado na sua composição.

A Corte IDH é composta por sete juízes43, nacionais dos Estados Membros da

Organização, eleitos a título pessoal dentre os juristas da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos44,

destacando-se aqui a diferença nas qualificações pessoais exigidas dos membros da CIDH.

Os juízes são eleitos em votação secreta e pelo voto da maioria absoluta dos Estados-Partes na Convenção, na Assembleia Geral da Organização. Cada Estado pode propor uma lista de até três candidatos, podendo ser de sua nacionalidade ou nacional de um dos Estados parte da OEA, conforme definido pelo artigo 53 da CADH, isto porque não pode haver mais de um juiz da mesma nacionalidade.

Estes juízes são eleitos para mandato de seis anos, podendo serem reeleitos uma única vez. As eleições para Corte acontecem de forma fracionada, sendo que a cada período de três anos acontecem ditas eleições para eleger três ou quatro juízes, a depender do período.

Em outra característica distinta, a Corte IDH pode contar com juízes ah hoc para tratar de matérias específicas, conforme preceituado pelo artigo 55 da Convenção

fiscalizar o respeito aos direitos humanos no plano regional”. MOREIRA, Thiago Oliveira. Ob. Cit. p. 77.

42 AGUIAR, Marcus Pinto. Ob. Cit. p. 65.

43 Atualmente composta por Humberto Antonio Sierra Porto (Colômbia); Patricio Pazmiño Freire

(Equador); Elizabeth Odio Benito (Costa Rica), atual presidente; Eduardo Vio Grossi (Chile); Eugenio Raúl Zaffaroni (Argentina); Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot (México); Ricardo Pérez Manrique (Uruguai).

(28)

Americana, resguardando-se os requisitos pessoais dos juízes, conforme definido no artigo 5245.

A Corte IDH é sediada em São José, Costa Rica. Dita Corte tem dupla competência: contenciosa e consultiva. Para atuar nos casos litigiosos, é absolutamente necessário que o Estado denunciado tenha aceitado a jurisdição da Corte. Em relação à segunda competência, nos anos iniciais de seu funcionamento, a Corte robusteceu a proteção aos direitos humanos ao emitir várias opiniões consultivas, contribuindo para a interpretação e aplicação das normas previstas na CADH46.

Impende destacar que o Sistema Interamericano47, ao lado dos sistemas

europeu e africano, é um dos três sistemas regionais consolidados no mundo, tendo se consolidado ao longo dos anos, com grande peso para a década de 90, como catalizador da promoção e proteção dos direitos humanos, num cenário em que diversos Estados do continente aceitaram sua jurisdição48, motivo pelo qual seu estudo guarda importante

relevância.

Neste capítulo, serão abordados os instrumentos normativos e jurisprudenciais oriundos do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos, do qual o Brasil é parte.

Para tanto, como recorte, serão utilizados os instrumentos internacionais de âmbito regional, para que se possa realizar uma espécie sindicância de compatibilidade entre a legislação interna brasileira e os instrumentos internacionais regionais.

Assim, para se averiguar a possível [in]compatibilidade do ordenamento jurídico interno face ao ordenamento regional, este capítulo abordará os instrumentos internacionais que serão utilizados como base, diga-se a Carta da OEA, a DADDH, a CADH e outros instrumentos, assim como os posicionamentos e manifestações da Comissão Interamericana e a jurisprudência da Corte Interamericana, que é considerada intérprete natural da CADH, conforme será abordado a seguir.

45 GUERRA, Sidney. Direito Internacional dos Direitos Humanos. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.

p. 201.

46 MOREIRA, Thiago Oliveira. Ob. Cit. p. 78.

47 AGUILAR CAVALLO, Gonzalo. Surgimento de um derecho americano de los derechos humanos

en la America Latina. Revista Mexicana de Derecho ConstitucionalNúm. 24, enero-junio 2011.

Disponível em https://revistas.juridicas.unam.mx/index.php/cuestiones-constitucionales/article/view/5945. Acesso em 11 de maio de 2020.

48 Cf. RAMANZINI, I. G. G. (2017). Mudança Institucional em Regimes de Direitos Humanos: o

Sistema Interamericano e os Estados “em cima do muro”. Carta Internacional, 12(2), 150 - 173.

(29)

2.2 CARTA DA OEA, DADDH, CADH E DEMAIS INSTRUMENTOS NORMATIVOS DO SISTEMA INTERAMERICANO

Considerando o recorte material deste trabalho, qual seja a questão da temática sobre migrações, passa-se ao estudo dos dispositivos de tais instrumentos oriundos do SIPDH, que guardem relação com o tema.

A OEA implementou o sentimento de organização regional tendo como principais características o compromisso com a democracia, a manutenção da paz e da segurança no continente e, ainda, a valorização dos direitos humanos49, o que

certamente guarda importância para as pessoas em situação migratória.

Aliás, o trabalho da OEA também tem ganhado relevo em relação à proteção dos direitos humanos relacionados aos migrantes. Nas palavras de Thiago Oliveira Moreira, a Organização dos Estados Americanos tem uma importante contribuição à seara dos Direitos Humanos dos Migrantes, vez que adotou o entendimento de que a proteção aos Direitos Humanos independente da condição de nacional50, embora a Carta da OEA não

tenha tratado especificamente da temática em apreço.

Um importante instrumento normativo que compõe o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos (SIPDH) é a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.

Especificamente quanto à proteção aos migrantes, a DADDH não dispôs de um rol significativo, contudo, há de se destacar seu artigo 27 ao prever que “toda pessoa tem o direito de procurar e receber asilo em território estrangeiro, em caso de perseguição que não seja motivada por delitos de direito comum, e de acordo com a legislação de cada país e com as convenções internacionais”.

Ao prever que à pessoa vítima de perseguição por motivos escusos à lei (seja de ordem política, religiosa, sexual, dentre outros) é dado o direito de acolhida por outro Estado, de modo que assegure sua proteção e manutenção dos direitos inerentes à sua condição humana, dito dispositivo (art. 27) trata acerca do direito de asilo, mundialmente reconhecido.

Aliás, é importante destacar que o asilo mencionado nessa norma pode ser considerado sinônimo de refúgio. Dita norma, editada anteriormente ao Estatuto dos

49 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Concretização dos Direitos Humanos dos Migrantes pela

Jurisdição Brasileira. Curitiba: Instituto Memória. Centro de Estudos da Contemporaneidade, 2019. p.

110.

(30)

Refugiados (de 1951), representa um nítido reconhecimento da existência de um direito humano a solicitação de refúgio.

Nas palavras de Sidney Guerra, a Declaração Americana buscou elencar um rol de recomendações para os indivíduos, fazendo com que se reconheçam direitos e deveres ao ser humano51. A DADDH, notadamente, representa um marco importante

nesta temática, pois contemplou os Direitos Humanos de forma integral (direitos civis, políticos, sociais, culturais e econômicos)52.

A CADH foi aprovada durante a Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, no ano de 1969, em San José, Costa Rica, motivo pelo qual a CADH também é conhecida como Pacto de San José, entrando em vigor no ano de 197853.

Considerada como sendo o principal instrumento normativo do SIPDH, dita Convenção foi ratificada por 25 dos 35 países que integram a Organização dos Estados Americanos, dentre eles o Brasil54, o que demonstra sua notável abrangência - embora

se saiba que o ideal seria a ratificação pela totalidade dos países americanos.

Diferente dos demais instrumentos até então abordados, a Convenção Americana é um tratado internacional, com características hard law55, ratificado pelo

Brasil, através do Decreto nº 678, de 6 de novembro, no ano de 199256.

Este instrumento pode ser dividido em três partes. Na primeira parte, a Convenção Americana estabelece os deveres dos Estados e os direitos protegidos pelo tratado. Na sua segunda parte, a Convenção Americana estabelece os meios de proteção: a CIDH e a Corte IDH, aos que declara órgãos competentes para “conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados Partes nesta Convenção” (art. 33). Já na terceira e última, trata sobre disposições gerais e transitórias57.

51 GUERRA, Sidney. Ob. Cit. p. 188. 52 Ibidem. p. 190.

53 Nos termos do art. 74.2 da CADH, a sua vigência iniciaria quando onze Estados houvessem realizado o

depósito dos instrumentos de adesão ou ratificação.

54 Disponível em: < https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/d.Convencao_Americana_Ratif..htm>.

Acesso em 24 de março de 2020.

55 No âmbito do Direito Internacional, muito se discute sobre normas hard law e soft law. Este status

normativo hierárquico quer dizer, em uma tradução literal, que a regra é forte ou firme, ou que ela é leve, fraca. Neste sentido, ao utilizar a expressão hard law, está se referindo à instrumentos normativos com força cogente, que vinculam os Estados parte.

56 MOREIRA, Thiago Oliveira. A Aplicação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos pela

jurisdição brasileira. Natal: EDUFRN, 2015. p. 75-76.

57 “A Convenção Americana é composta por 82 artigos, divididos em três partes: Parte I sobre os Deveres

(31)

Como se percebe de seu objetivo, o Pacto de São José reafirmou o propósito de criar no continente americano um ambiente de liberdade e de justiça social, respaldado pelo respeito aos direitos humanos.

Neste sentido, a Convenção Americana reitera enunciado da Declaração Universal no sentido de que o ser humano só é realmente livre se forem criadas as condições que o permitam gozar os seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, bem como reafirma o propósito de consolidação de um continente americano pautado pela liberdade pessoal e justiça social58.

Revelando sua abrangência e importância para proteção dos direitos da pessoa humana, dita Convenção traz um rol de direitos, com vistas a proteger o gozo de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, tendo enfoque principal no exercício e proteção dos direitos civis e políticos (arts. 3º ao 25). Contudo, a Convenção Americana não enuncia de forma específica qualquer direito social, cultural ou econômico; limita-se a determinar aos Estados que alcancem progressivamente, a pela realização deslimita-ses direitos, mediante a adoção de medidas legislativas e outras que se mostrem apropriadas, nos termos do art. 26 da Convenção59.

Assim, somente após o Protocolo Adicional à CADH (Protocolo de São Salvador), no ano de 1988, relativo aos direitos sociais, econômicos e culturais, foi elencada uma série de direitos relativos ao trabalho, seguridade social, proteção à família, proteção à criança, proteção ao idoso, à cultura e ao meio ambiente equilibrado.

Considerando o recorte deste trabalho, especificamente em relação aos direitos dos migrantes, destaca-se o artigo 22, que merece ter seu estudo aprofundado, uma vez que dispõe sobre regras inerentes ao direito de livre circulação e residências de pessoas.

No seu primeiro item, dito artigo faz referência ao que se conhece como direito à livre circulação e residência, que consiste, de modo resumido, no direito que toda pessoa tem de se movimentar de um lugar para outro, no país que vive, e estabelecer sua residência onde queira.

Contudo, como poderá ser visto, embora aparentemente simples, este direito se apresenta de forma bastante complexa por apresentar múltiplos aspectos, como a liberdade de poder sair de qualquer país ou a de que pessoas em situação migratória não “Disposições Gerais e Transitórias””. CARVALHO RAMOS, André de. Curso de Direitos Humanos. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 318.

58 GUERRA, Sidney. Ob. Cit. p. 193.

59 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 14ª ed. São Paulo:

Referências

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