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4 TALLER COMO EXPRESSÃO E CONSTRUÇÃO DA

4.2 As experiências talleristas

4.2.3 A Construção Solidária da Paisagem Colombiana

O Taller desenvolvido na Colômbia foi organizado por meio da Facultad de Arquitectura da Universidad La Gran Colombia, situada no centro da grande Bogotá. Esse evento desenvolveu-se em um período denominado intersemestral, tendo a denominação de “Taller Vertical”50

, que em um período de dois meses, contou com convidados professores e estudantes nacionais e internacionais.

A maneira de atuação dos talleres desenvolvidos na Colômbia visa à procura pelo avanço e profundidade de relações com seu entorno imediato. A universidade considera “produção social do habitat”, o que gera inúmeros cenários de reflexão sobre os fenômenos urbanísticos, com a visão de trabalhar conceitos sociais, dinâmicos e integralizadores, com a participação dos diferentes atores (professor, estudante e comunidade), para a compreensão dos processos objetivos e subjetivos, avançando no conhecimento territorial e na sua relação com a comunidade.

Durante o período em que fui convidado a ser professor tallerista, no evento realizado em 2014, pude observar que o processo de participação colombiano parte de alternativas em que o estudante domine e tenha a atitude da aprendizagem no seu relacionamento com a comunidade e que isso o fomente para o desenvolvimento de seu projeto urbano arquitetônico, por meio de características peculiares do local (pesquisa em ação), carregando consigo as tradições e o passado.

Vinasco (2013) exerce sua reflexão acerca do saber em Arquitetura e Urbanismo no contexto colombiano:

Na aula, espaço que tradicionalmente se estabeleciam as relações entre professor e estudante, há servido para perpetuar em nossa sociedade moderna estruturas hierárquicas de domínio do saber que se remontam a origem do mesmo em nossa civilização. Neste sentido, a relação entre saber, sabedoria e aprendizagem tem encontrado como metáfora arquitetônica a relação entre luz e espaço, educar-se é iluminar-se, a ilustração é adquirir um bom lustre, uma luz própria. Como exemplo desta significação, de caráter iconográfico, em nosso continente no tempo escuro colonial que desenvolveram as relações de poder entre dominados e dominantes estabeleceram as bases físicas para o ensino de uma ideologia que seria derrotada pelo caráter luminoso dos espaços modernos, uma arquitetura que abateria sua racionalidade e obscuridade. Para a América, a liberdade, é primeiro, de pensamento, de ensino e de leitura (VINASCO, 2013, p. 1, tradução nossa).

50A verticalização do Taller consiste em estudantes atuando em diferentes níveis, juntamente com os professores, compartilhando e produzindo conhecimento no período de duração do evento.

O Taller realizado na Colômbia buscou a articulação com os processos e as atividades investigativas (ANEXO A) e, assim, buscou fortalecer o caráter conceitual de grupos de investigação da Facultad de Arquitectura, articulando o avanço do conhecimento no território e sua relação com a comunidade e seu entorno. Dessa maneira, o Quadro 17 apresenta propostas de ações articuladas com grupos de investigação em sintonia com a metodologia

tallerista desenvolvida na Colômbia:

Quadro 17 – Propostas de ações conjuntas do Taller com investigações

Alternativa de Articulação Momentos Processos

Fortalecer o caráter contextual dos grupos de investigação para avançar no conhecimento sobre o território e sua relação com a comunidade.

Atuação durante o processo acadêmico no campo metodológico – líderes dos grupos em espaços comunitários para

retroalimentar os grupos de investigação.

- Identificação de necessidades de investigação desde a localidade; - Atuação no processo de fase da investigação;

- Definição de variáveis para estruturar um processo investigativo.

Articulação do

TallerIntersemestral Vertical Internacional com Congressos.

- Definição de linhas estratégicas de trabalho para aproveitamento dos resultados do Taller, orientadas a sua articulação com projetos de graduação;

- Definição de linhas estratégicas de trabalho para aproveitamento dos resultados do Taller, orientadas a sua articulação com congressos. Reflexão sobre o tema da

participação na construção e/ou transformação do habitat e como alternativa nos processos de planejamento e gestão da cidade.

Possibilidade de articulação da temática de participação comunitária para incorporá-la como projeto de investigação. Mostra acadêmica.

Processos metodológicos desde os argumentos teóricos e conceituais em volta do desenho participativo.

Fase de análise do grupo de estudantes e direção da equipe docente para conhecer, dimensionar e contextualizar a área de estudo e para serem capazes de formular hipóteses de desenho.

- Análises com a visão de investigação sobre o processo acadêmico, com o objetivo de construir linhas de interação desde os projetos de coordenação (seminários e grupos);

- Elaboração de uma estrutura para o documento de memórias do Taller.

Fonte: Modelo UGC, 2015, tradução nossa.

Destaca-se a projeção social desenvolvida pelo Taller nas comunidades do entorno da universidade colombiana. A compreensão das problemáticas diagnosticadas nessas periferias

e centros históricos faz-se necessária, objetivando ações que visam à melhoria da vida das pessoas, promovendo cidadania e integração dos agentes urbanos.

O fato de os estudantes de Arquitetura e Urbanismo irem visitar “in loco” a comunidade e terem a oportunidade de dialogar com seus moradores transformou o Taller em uma ferramenta essencial pela busca de melhorias e uma plena participação cidadã no processo instaurado. É preciso, portanto, haver interessados e cooperação das partes para que um todo seja efetivado.

Nessas articulações, apresenta-se o Quadro 18, no qual constam as propostas de ações conjuntas do Taller com projeção social:

Quadro 18 – Propostas de ações conjuntas do Taller com investigações

Alternativa de Articulação Momentos Processos

Estratégias e ações que promovam a interação e a integração da projeção social com o entorno acadêmico.

Trabalho

interinstitucional.

- Identificação de mapa institucional e de atores; - Identificação de canais de comunicação interinstitucional; - Desenvolvimento do diálogo interinstitucional; - Concentração de atores; - Solicitação e gestão de documentos; - Gestão de recursos. Reconhecimento do aporte dos

moradores, como recurso indispensável e suscetível de ser orientado e aproveitado por uma equipe profissional

fundamentalmente com sua participação. - Trabalho de campo / reconhecimento; - Trabalho de campo acadêmico; - Taller de participação comunitária; - Socialização do modelo territorial; - Socialização de projetos arquitetônicos. - Acompanhamento no trabalho de convocatória;

- Diálogo sobre participação da comunidade com líderes

comunitários e atores institucionais; - Monitoramento sobre os cenários de participação comunitária. Gestão pertinente com a entidade

governamental que, para o caso, constitui a prefeitura e líderes dos bairros.

Durante o desenvolvimento do Taller, são previstos observadores para monitorar e avaliar os resultados acadêmicos que se construam como resposta dirigida à comunidade.

- Apoio durante o processo acadêmico.

- Análise com a visão de projeção social sobre o processo acadêmico, com o objetivo de construir linhas de interação desde os projetos da coordenação.

Alianças estratégicas para avançar nos resultados dos processos

acadêmicos. - Trabalho

interinstitucional.

- Gestão de acordos para convênios com a prefeitura local.

Convênios e ações conjuntas entre a prefeitura, a comunidade escolhida e a Facultad de Arquitectura da UGC. Fonte: Modelo UGC, 2015, tradução nossa.

Trazer para o debate a projeção social significa complementar ao desenho participativo uma importância singular, sendo este desenho construído por meio de inúmeros argumentos e visualizado de tal forma que se aplica nos processos de formulação de propostas de desenvolvimento e ordenamento territorial, acarretando um debate amplo e de tomadas de decisões com base no mapeamento das regiões em que o Taller atua (Figura 14).

Figura 14 – Polígono de trabalho do Taller Intersemestral

Fonte: Modelo UGC, 2015.

Conforme o mapeamento estabelecido, a Facultad de Arquitectura da Universidad La Gran Colombia (2014) aponta que as tomadas de estratégias talleristas seguem critérios cognitivos, pelos quais se orientam os processos de informalização, análise e elaboração de diagnósticos (quanti-quali), e que devem ser compreendidas como uma solução dos problemas em seu território, de acordo com o Quadro 19.

Os critérios de estudo e desenvolvimento apresentados no Quadro 19 referem-se à forma de atuação dos talleres desenvolvidos na Colômbia, com o objetivo de fazer com que a produção social do habitat fomente, no âmbito universitário, as reflexões sobre os fenômenos urbanísticos, sobre o local de intervenção e relações com o entorno imediato, integrando professor, estudante e comunidade, para consolidar a compreensão do território e sua relação com a comunidade.

Quadro 19 – Critérios de estudo e desenvolvimento

Espaço público: Busca-se analisar a estrutura do espaço público, compreendida como uma

rede de espaços urbanos conformada por praças, pracinhas, jardins, ciclovias etc. Esse critério permitirá a compreensão das relações de bairro com a localidade mediante o estudo da configuração da rede no território e dos fluxos gerados.

Mobilidade e infraestrutura urbana viária: É compreendida pela rede de infraestrutura

viária conformada por vias principais, secundárias e vias dos bairros, do setor como território e de cruzamentos para conectar pontos a nível local e urbano em relação estreita com a mobilidade.

Rede de equipamentos: (cobertura setorial, saúde, educação, segurança etc.).Compreende

esse critério toda a rede de serviços complementares à habitação na atenção setorial. O estudo desse critério deve desenvolver o marco de dois princípios: (i) a cobertura não somente de setor mas também em relação ao nível local e urbano; (ii) com respeito à situação qualitativa da infraestrutura, existe a solução de problemáticas de ordem social.

Estrutura ambiental: Esse critério atende a compreensão de uma estrutura ambiental do

setor, incluída a esta, o equilíbrio de zonas urbanas com ecossistemas naturais existentes, equilíbrio a permeabilidade do solo e implantação eficiente de infraestrutura no setor.

Usos e consolidação: Grade de consolidação do setor por usos do solo, mediante cruzamento

de informações institucionais e visitações técnicas no território escolhido, observando aspectos como o tempo de desenvolvimento do uso no setor e as transformações e configurações físicas que, por essa via, ter sido gerado.

Volume e perfil urbano: (afetação paisagística). Mediante a observação e a análise de

planimetria estudar-se-á o desenvolvimento do perfil urbano, entendendo, aqui, os aspectos da forma na construção da paisagem urbana, a configuração contínua ou interrupta dos perfis enquanto a suas alturas, particularidades de fachadas e tipologias arquitetônicas. Por outro lado, estão os cheios e os vazios na leitura de análises da morfologia urbana como estratégia para compreender a forma de desenvolvimento predial e a densidade construtiva.

Planificação urbana e ação institucional: Critério mediante o qual se estudam as ações de

planificação, estratégias normativas, projetos e programas nos âmbitos territoriais e sociais.

Territórios (produtos de construções sociais) e memória coletiva: Mediante esse critério,

objetiva-se a identificação de diferentes pontos no território que, mediante a habitação social, são fortalecidos para a construção e geração de relações sociais do bairro na memória coletiva de seus habitantes.

Patrimônio: Entendendo a localização e o contexto do território escolhido para estudos, faz-

se importante a identificação e a análise da situação dos diferentes imóveis afetados do patrimônio e de interesse cultural.

Habitabilidade: Esse critério aborda aspectos importantes ao tema da habitação e aos déficit

qualitativos e quantitativos existentes.

Os critérios de estudo e desenvolvimento apresentados acima referem-se à forma de atuação dos talleres desenvolvidos na Colômbia. Essa forma de organizar objetiva fazer com que a produção social do habitat fomente, no âmbito universitário, as reflexões sobre os fenômenos urbanísticos, repensando o local de intervenção e suas relações com o entorno imediato, integrando professor, estudante e comunidade para consolidar a compreensão do território e sua relação com a comunidade.

Cabe ressaltar que o processo coletivo parte, necessariamente, do entendimento inicial e estado da arte das complexidades locais. O apontamento dessas questões em que o Taller é desenvolvido faz com que se iniciem os primeiros diálogos com os participantes e elaborem- se campos de atuação, para que se almejem possíveis descobertas com base em uma metodologia, a qual deve ser trabalhada com responsabilidade e coerência nas ações.

Durante o Taller, para desenvolvimento das técnicas e metodologias, foram organizadas responsabilidades por meio de funções e recursos humanos, ficando os participantes restritos ao cumprimento do seu papel para o pleno atendimento dos objetivos propostos, em uma hierarquia interna capaz de desenvolver, de maneira ágil, todas as fases de trabalho que as complexidades urbanas de Bogotá exigiam dos participantes (Quadro 20).

Quadro 20 – Atores participantes do modelo tallerista da UGC

Grupo: Composto por até 16 estudantes de diferentes semestres, divididos em dois

subgrupos de oito membros, e divididos em duas seções de trabalho de campo (recorrido e Taller). Dentro do subgrupo do Taller, será designado um moderador, um relator, um observador principal e dois estudantes para a equipe de apoio logístico. Os estudantes restantes atuam como observadores externos do processo.

Moderador: Apoiado pelo professor titular, encarregado de orientar os processos e

técnicas aplicadas, buscando o cumprimento dos prazos estipulados, a abordagem dos critérios estabelecidos e a verificação dos trabalhos por parte dos estudantes do Taller.

Relatores: Estabelecem-se devido à importância para levar nota e memória dos

diferentes aportes que os participantes expõem oralmente durante as técnicas de participação.

Observadores: Encarregados da observação do desenvolvimento do Taller mediante o

registro fotográfico. Ainda, dentro de seu papel de observadores de forma espontânea e em desenvolvimento das técnicas, adiantando diálogos semiestruturados uma vez que identifiquem informantes-chave dentro do grupo de participantes.

Apoio logístico: Encarregado de todo o suporte logístico operativo para o

desenvolvimento do Taller, observando os materiais necessários em cada sessão e apoiando os participantes em sua execução.

Observador externo: Estará observando todo o processo de forma passiva e atenta. Participantes: Assumem os membros da comunidade participante no Taller.

Observa-se, nesse cenário de atores, que se faz necessária uma estrutura organizativa de professores e estudantes de Arquitetura e Urbanismo, com o intuito de estabelecer essas responsabilidades, avaliando, com rigor técnico e acadêmico, as formas com que se viabilizam as soluções para os problemas diagnosticados nos levantamentos urbanos, e de forma que se consolide um espaço educativo capaz de produzir leituras dinâmicas que evidenciem as demandas e possíveis ações que promovam a projeção social.

Martínez e Caicedo (2012) propõem uma reflexão acerca das complexidades do ser humano e da responsabilidade multidimensional com o planeta, e isso numa visão específica, com a realidade colombiana para a construção desse espaço educativo capaz de transformar os paradigmas instaurados. Segundo os mesmos autores, faz-se necessária uma profunda reflexão sobre o entendimento das raízes e da situação histórica de opressão.

Entende-se, nessa reflexão, que o Taller desenvolvido na Colômbia parte, necessariamente, de dimensões sociais, culturais e ambientais, conforme Quadro 21, e que a integração dessas dimensões, durante as reflexões, garante a essa organização (Figura 15) um caráter social e integrador.

Quadro 21 – Dimensões analisadas – Taller Colômbia, 2014

TALLER

(Cenário)

DIMENSÕES ANALISADAS

SOCIAL CULTURAL AMBIENTAL

COLÔMBIA

Processo de inter- relação das comunidades que habitam a zona (sítio) com o meio natural que

coexiste o território. A cultura como elemento que caracteriza um espaço territorial (processo construtivo da cidade). Formulação de alternativas para construção da cidade em uma perspectiva de cidade-região.

Fonte: Elaboração do autor.

Na Figura 15, pode-se perceber, no que se refere à região a ser estudada no Taller, que se destaca a complexidade do polígono de trabalho da proposta, demonstrando a capacidade da metodologia de interferir em áreas de difícil acesso e com um sistema urbano carente de conexões para uma melhora no espaço público e de interação com as pessoas.

Figura 15 – Organização do Taller Colômbia. Integração das dimensões social, cultural e ambiental

Fonte: Autor.

A estrutura e a metodologia apresentadas pelo Taller desenvolvido na Colômbia, em 2014, são elogiáveis. Acredita-se que seu sucesso deve-se ao fato de suas bases estruturantes serem apoiadas na integração de três dimensões: as sociais, as culturais e as ambientais.

No Taller da Colômbia, a dimensão social se caracteriza pelo processo de inter-relação entre as comunidades e o meio natural. A dimensão cultural representa a caracterização do território sempre em interação com as questões ambientais, as quais representam a terceira dimensão estruturante dessa organização.

A Figura 16 mostra algumas áreas estudadas para os estudos talleristas colombianos, representadas em modelos físicos e elaboradas pelos alunos durante as oficinas do Taller.

Figura 16 – Modelos físicos das áreas estudadas no Taller Colômbia, 2014

O Taller da Colômbia foi uma experiência muito importante para o desenvolvimento da minha tese. Foi nele que compreendi a interação entre os valores que envolviam questões sociais, culturais e ambientais. Foi no desenvolver das atividades talleristas colombianas que percebi com maior clareza a importância da intervenção ativa das comunidades nas propostas de desenvolvimento de seus espaços habitados e seu entorno, buscando o melhor para os sujeitos a partir das vozes dos próprios sujeitos.