• Nenhum resultado encontrado

A decisão judicial como ato argumentativo

2. A SEMÂNTICA DA DECISÃO JUDICIAL: DISCRICIONARIEDADE E

3.1. Decisão Judicial e Argumentação

3.1.3. A decisão judicial como ato argumentativo

A decisão judicial é geralmente definida como a aplicação de uma norma a um caso jurídico concreto. A norma resumir-se-ia à seguinte estrutura lógica: dado o fato F, deve ser a prestação P; dada a não-prestação NP, deve ser a sanção S:

Dado F, deve ser P Dado ñP, deve ser S224

Desde meados do séculos XX, a Teoria do Direito discute também a sanção premial. A ordem jurídica não teria por função apenas a proteção de bens e repressão das condutas, mediante o uso de coerção, por meio da sanção. Frequentemente o Direito também se utiliza de mecanismos que estimulem condutas por meio de prêmios, como o desconto no pagamento antecipado de tributos, a acumulação de pontos pelo comprador pela emissão de notas fiscais etc.. Trata-se da chamada sanção premial, que alteraria ou alargaria a estrutura lógica da norma, podendo ser assim notada:

Dado F, deve ser P Dado P+, deve ser S+ Dado ñP, deve ser S

224

Segundo Arnaldo Vasconcelos, “Ao passo que a norma moral se expressa através de um juízo hipotético simples – ‘A’ deve ser ‘B’ –, a norma jurídica o faz mediante um juízo hipotético disjuntivo, que é composto ou complexo: ‘Dado H, deve ser P, ou dano ñP, deve ser S’. Em termos concretos: dada a situação de alguém (H), obrigado diante de um pretensor, na qualidade de devedor, deve ser a prestação (P), isto é, o pagamento; ou dada a não-prestação (ñP), deve ser a sanção, a saber, a atuação do poder institucionalizado com a função de realizar administrativa ou judicialmente o Direito violado”. VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria da norma jurídica. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 23. Esta fórmula geral ajuda-nos a entender a função da norma jurídica, ainda que possa variar em alguns aspectos de teoria para teoria. Kelsen, por exemplo, dá primazia ao segundo termo do juízo disjuntivo porque, segundo ele, a norma primária é aquela que estabelece a sanção para o caso de descumprimento do que foi estatuído pela norma secundária. Para uma análise alentada de algumas das principais teorias da norma jurídica cf. VASCONCELOS. Op. Cit., p. 47 e ss.

Onde P+ é a prestação prevista na norma que tem por consequência a sanção premial, como o pagamento antecipado de tributos ou a acumulação de pontos pela emissão de notas fiscais, por exemplo; e S+ a sanção premial, a consequência positiva que estimula o agente a um dado comportamento (pagamento antecipado do tributo ou exigência de nota fiscal).

Normalmente se diz que o problema da interpretação ou aplicação da Lei resume- se à subsunção dos fatos às normas. A norma ou hipótese de incidência descreveria a situação fática a partir de um ponto de vista abstrato, isto é descreveria um predicado P ou muitos predicados: P1, P2, P3, ..., Pn. O que a norma estabelece é que, sempre que um determinado

sujeito X cumprir todos os predicados previstos na norma N, deve ser uma consequência O, que indica uma modalidade deôntica, como obrigatório, permitido ou proibido. Em notação lógica teríamos:

Ax <–>P1x ^ P2x ^ P3x ^ ... ^ Pnx –> ORx

P1a ^ P2a ^ P3a ^ ... ^ Pax____

ORa

Ou seja, para todo x (Ax), onde x representa uma variável universal, se e somente se (<–>), x cumprir os predicados P1, P2, P3, ..., e Pn, que são as hipóteses de incidência

descritas na norma, decorre (–>) que a modalidade deôntica OR deve se seguir. A segunda linha descreve a ocorrência dos predicados normativos, sendo assim, a modalidade deôntica, representada pela consequência OR, aplica-se ao sujeito específico (a)225. Veja-se que, aqui, o raciocínio jurídico está descrito de modo muito generalizado e asséptico, na forma de um silogismo jurídico, que pretende emular um raciocínio puramente dedutivo. No mundo da vida, a argumentação jurídica não acontece assim, embora, como já dito, possa se esconder por detrás desta fórmula. Para sairmos na notação formal e ilustrar o ponto que vimos de defender, vejamos o seguinte exemplo de Alexy:

(1) O soldado deve dizer a verdade em questões de serviço (§ 13, ap. 1, da Lei do Soldado)

(2) O senhor M é um soldado

(3) O senhor M deve dizer a verdade em questões de serviço.226

225ATIENZA, Manuel. Op. Cit., p. 43.

226

ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como Teoria da Justificação Jurídica. [tradução: Zilda Hutchinson Silva]. 2 ed. São Paulo: Landy, 2005. p. 219.

Segundo Alexy, esta é forma mais simples de um argumento jurídico. Embora possamos dizer que o argumento jurídico pode ser reduzido a essa forma, devemos também admitir que esta fórmula é por demais simplista, pois deixa à sombra pelo menos dois aspectos de fundamental importância. Em primeiro lugar, muitas vezes, disputa-se qual lei deve ser aplicada ao caso concreto. Em segundo lugar, na maioria das vezes disputa-se a interpretação de um ou mais aspectos da Lei. Mesmo em um exemplo simples como o de que se cuida, restrito ao primeiro disjuntor normativo: dado o fato (2), deve ser a prestação (3), pode-se facilmente verificar que uma extensa argumentação jurídica poderia ser desenvolvida acerca da interpretação do conceito indeterminado “questões de serviço”.

Estabelecer o que sejam “questões de serviço” estaria no âmbito das questões a serem solucionadas em um discurso argumentativo. Imagine-se, por exemplo, que o caso concreto envolva o disparo acidental de uma arma da corporação em um bar, nas imediações do quartel, onde serve o soldado M. O fato “disparo acidental de uma arma da corporação fora do contexto militar” é uma questão de serviço? Muitos argumentos podem ser produzidos a favor ou contra uma resposta positiva a essa questão, tais como:

(1) O uso de uma arma da corporação deve ser rigidamente controlado em todos os contextos

(2) Para que seja rigidamente controlado, o uso de uma arma da corporação deve ser tratado como uma questão de serviço independente do contexto em que se dê .: (3) O uso de uma arma da corporação é uma questão de serviço

Ou

(1’) O uso de uma arma da corporação deve ser controlado apenas quando for intencional

(2’) Para que seja suficientemente controlado, o uso de uma arma da corporação deve ser tratado como uma questão de serviço apenas quando for intencional .:(3’) O uso não intencional de uma arma da corporação não se trata de questão de serviço

Esses são argumentos indutivos porque, ainda que se considerem verdadeiras as premissas (1), (2), (1’) e (2’), delas não decorrem necessariamente as conclusões (3) e (3’). Além disso, não faz sentido avaliar esses argumentos em termos de validade, mas sim em

termos de força. A rigor, não se pode dizer que tais premissas sejam verdadeiras, já que as próprias premissas são disputadas. O que podemos assegurar é que elas fornecem razões, mais fortes ou mais fracas, para as conclusões (3) e (3’).

Simplificamos o exemplo apenas para fins de ilustração. É claro que outras premissas ou razões poderiam ser utilizadas para fundamentar (1) e (1’). Poder-se-ia justificar (1) com o argumento de que o Estado tem o dever de proteger o cidadão e zelar pela imagem das forças armadas. De igual modo, poder-se-ia justificar (1’), com o argumento de que o controle do uso das armas da corporação em todos os casos importaria altos custos. Nesse caso teríamos, como é comum na argumentação jurídica, argumentos estruturados em diferentes níveis227.

Como se vê, a argumentação jurídica não se dá pela simples subsunção de fatos a normas. O silogismo jurídico pode ser melhor compreendido como o resultado de um discurso do que como uma maneira de argumentar juridicamente. A argumentação jurídica ocorre para se estabelecerem a premissa maior, a premissa menor e todos as eventuais questões controvertidas que estejam envolvidas na enunciação de tais premissas, como, no exemplo citado, a densificação do conceito jurídico indeterminado “questões de serviço”.

Um caso prático que tem sido decidido pelos tribunais brasileiros ajudará a ilustrar o ponto sob outros ângulos. O autor A propõe uma ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em que pleiteia a concessão de benefício previdenciário de pensão por morte instituído pelo segurado do regime geral da previdência social – RGPS, ao qual chamaremos segurado S. A alega que é menor e vivia sob a guarda de S. Invoca o art. 33, § 3.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei 8.069, de 1990228 e o art. 227, da Constituição da República229.O INSS, em contestação, argumenta que a pensão por porte

227“A expressão ‘estrutura do argumento’ se refere às relações lógicas entre vários argumentos de um

determinado falante. Existem dois tipos de conexão. Um deles consiste em que a proposição que se fundamenta em um argumento é uma proposição usada para a fundamentação de outro argumento. Neste caso, pode-se falar de argumentos de níveis diferentes. No outro tipo, argumentos diferentes servem da mesma forma ou de forma diferente para justificar a mesma proposição. Aqui se trata de argumentos do mesmo nível”. ALEXY, Robert. Op. Cit., p. 110.

228 Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente,

conferindo a seu detentor o Direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. [...]

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de Direito, inclusive previdenciários.

229Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com

absoluta prioridade, o Direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

pretendida não pode ser concedida a A em virtude da alteração havida no art. 16, § 2.º, da Lei 8.213/91, pela Lei 9.528/97230.

A Lei 9.528 é posterior ao ECA, mas este é especial em relação àquela quanto ao aspecto pessoal (trata da criança e do adolescente). Enquanto aquela é especial em relação a este no aspecto material (trata especificamente do Direito previdenciário). Qual norma deve ser aplicada? De regra, nos debates em curso nos processos judiciais vemos dois tipos de argumento. Os argumentos contrários ao pedido de A têm mais ou menos a seguinte forma:

(1) A Lei 8.213 é posterior e especial quanto à matéria (2) Há precedente do STJ contrários ao pedido de A (3) A aplicação do ECA favorece fraudes

(4) A aplicação do ECA aumenta o déficit previdenciário .: (5) Deve ser aplicada a Lei 8.213

Os argumentos favoráveis ao pedido de A têm mais ou menos a seguinte forma:

(1’) O ECA é especial quanto à matéria

(2’) A Constituição manda proteger a criança e o adolescente (art. 227) (3’) Há precedente do STJ em favor do pedido de A

(4’) O Juiz não deve se valer de argumentos meramente consequencialistas .: (5’) Deve ser aplicada o ECA

A tarefa da argumentação jurídica consiste em (a) estabelecer procedimentos e regras para o uso correto desses argumentos; (b) estabelecer critérios para a avaliação crítica desses argumentos de modo a possibilitar o aprofundamento do debate em torno das questões

230

Em sua redação originária o dispositivo assim dispunha:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

[...]

§ 2º Equiparam-se a filho, nas condições do inciso I, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação.

A Lei 9.528, de 1997, deu a seguinte redação ao dispositivo, retirando o menor sob guarda do rol das pessoas equiparáveis a filhos para fins de dependência previdenciária:

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

jurídicas, da interpretação das lei, da aplicação do Direito e também acerca dos procedimentos adotados para se alcançar esses fins. Em uma primeira análise, é impossível afirmar qual das linhas argumentativas é a melhor ou qual delas conduz à melhor interpretação, à interpretação correta ou à interpretação mais adequada. Ainda assim, por meio da teoria da argumentação jurídica é possível verificar os argumentos inválidos, as falhas no encadeamento das premissas, bem como estabelecer a força relativa dos argumentos. A comunidade jurídica e a sociedade como um todo pode, com grandes ganhos, a partir de uma análise argumentativa convencer-se deste ou daquele argumento, criticar os argumentos utilizados, propor novas interpretações e, com isso, em um processo coletivo, colaborar para a pacificação da interpretação do Direito de acordo com estes ou com aqueles argumentos ou, ainda, de acordo com outros argumentos que venham a surgir ou a se evidenciar.

Atienza destaca que a argumentação jurídica guarda estreita relação com o que se chama metodologia jurídica na Alemanha, por autores como Larenz, Canaris, Engisch, Esser e Kriele231, mas estabelece uma diferença: o objeto da argumentação jurídica é o discurso justificativo dos juízes, enquanto a metodologia jurídica teria um objeto mais amplo, fazendo referência também a uma série de operações levadas a cabo por juristas profissionais e que não têm estritamente ou tão-somente o caráter argumentativo232.

Segundo Atienza, o que se pode chamar de “teoria estandart da argumentação jurídica” parte de uma distinção muito clara entre a decisão judicial e os discursos relacionados ou conectados a ela, de um lado; e, de outro lado, entre o caráter justificativo (o contexto da justificação) e o caráter explicativo e descritivo da decisão (o contexto da decisão). Diz ainda que, em nossos dias, a teoria da argumentação jurídica ocupa-se quase exclusivamente do discurso judicial no contexto da justificação233. Atienza propõe-se a relativizar essas diferenças e adotar uma concepção mais ampliada de argumentação jurídica, que procura conectar a atividade argumentativa com os processos de tomada de decisão, objeto do que ele chama de teoria standard da argumentação jurídica, e com os processos de resolução dos problemas jurídicos, objeto da metodologia jurídica, para considerar os problemas da metodologia a partir de sua vertente argumentativa234.

231 Cf. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do Direito [Tradução José Lamego]. 3 ed. Lisboa: Fundação

Calouste Gulbenkian, 1997. CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito. [Tradução: A. Menezes Cordeiro]. 3 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 7 ed. [tradução: J. Batista Machado]. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996.

232ATIENZA, Manuel; FERRAJOLI, Luigi. Jurisdicción y argumentación en el Estado Constitucional de

Derecho. México, D.F.: Universidad Nacional Autónoma de Méxco, 2005. p. 5.

233

Idem. Ibidem. p. 5.

Um dos objetivos secundários do presente trabalho é entender como se dá a argumentação jurídica que resulta na decisão judicial. A descrição deste modus argumentativo é condição para uma teoria da decisão jurídica, seja de uma perspectiva meramente descritiva, seja de uma perspectiva normativa. A teoria da decisão judicial que apresentamos pode contribuir para o aperfeiçoamento das decisões judiciais a partir dos parâmetros que serão traçados, de modo que se possa garantir seu maior controle em uma perspectiva democrática. Sendo assim, estaremos sempre mais próximo ao que Atienza chama de teoria standard da argumentação jurídica. Acrescento que não se pode entender a argumentação jurídica que se desenvolve na decisão judicial, sem compreender o diálogo que existe entre o juiz, o autor e o réu, no processo judicial, o que chamaremos aqui de diálogo ou discurso interno; e o diálogo que se estabelece entre o juiz de um determinado processo e todos os demais juízes e tribunais que decidem questões semelhantes, o que chamaremos de diálogo ou discurso externo. Sem dúvida alguma, o diálogo interno sujeita-se a regras mais limitadoras. Mas é inegável a influência do diálogo externo sobre o resultado da argumentação, sobretudo na quadra atual, quando nos aproximamos cada vez mais do sistema de precedentes do Direito anglo-saxão.

Como vimos, entender a decisão judicial como mera subsunção dos fatos a uma norma é, no mínimo, uma simplificação que não guarda relação com o que ocorre no mundo real. Por outro lado, entendê-la como ato argumentativo que é desenvolvido isoladamente pelo juiz, encobre outros aspectos igualmente importantes. A decisão judicial é tomada a partir de um diálogo entre as partes da relação processual e o juiz. O juiz jamais aplica a lei sozinho, pelo menos não nos sistemas jurídicos onde vige o princípio da inércia, o princípio dispositivo e o princípio da imparcialidade235. A aplicação da lei está condicionada a um pedido de uma das partes e à análise dos argumentos e provas apresentadas. O pronunciamento sobre os argumentos e sobre a prova dos fatos dá-se em um contexto argumentativo.

A decisão judicial não se resume à aplicação do Direito ao caso concreto, mas é fundamentalmente um ato argumentativo, no sentido de que não há decisão judicial se não são apresentadas razões para a decisão. Na argumentação jurídica, os participantes do diálogo argumentativo buscam justificar suas pretensões que são de pelo menos quatro tipos e relacionam-se ao seguinte: (a) quais normas devem ser aplicadas ao caso concreto e (b) qual interpretação deve ser dada às normas que se pretende aplicar ao caso concreto; e (c) quais

235

Sobre esses princípios cf. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

fatos são relevantes para a aplicação das normas pretendidas; e (d) se esses fatos devem ser tidos como provados.

A escolha pela aplicação dessa ou daquela norma algumas vezes soluciona-se pela aplicação das chamadas “regras de interpretação”, “métodos interpretativos” ou “cânones hermenêuticos”. Na verdade, a aplicação de uma dessas regras, métodos ou cânones também se submete a uma disputa argumentativa e normalmente deve-se oferecer razões para aplicação de uma dessas regras, métodos ou cânones.

A justificação acerca de quais fatos devem ser considerados verdadeiros normalmente leva em conta normas jurídicas referentes ao ônus argumentativo e, algumas vezes, a aplicação dessas próprias normas [ônus argumentativos] é submetida a uma disputa argumentativa. No presente trabalho estaremos sempre mais interessados na argumentação jurídica que se faz para a aplicação das normas e não na argumentação para a descoberta dos fatos. É claro que os dois tipos de argumentação acontecem conjuntamente e, muitas vezes, para a descoberta dos fatos é preciso interpretar normas como as que tratam do ônus da prova, das provas necessárias, das provas possíveis e do seu meio de produção. Todavia, uma parte importante da descoberta dos fatos se faz a partir de argumentos puramente empíricos e não propriamente jurídicos236.