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A Didática da Matemática: além do panorama paulista

DIDÁTICA ESPECIAL DA MATEMÁTICA – (USP – 1954): Professora responsável: Berenice Gonçalves Reginato

1.6 A Didática da Matemática: além do panorama paulista

Buscando ir além do panorama paulista, o trabalho de Dias (2002) retrata, em poucas linhas, a disciplina Didática da Matemática ministrada na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Bahia nos anos 1940. Ao abordar a questão do gênero no magistério baiano, Dias (2002) menciona um pouco sobre a vida de Martha Dantas, professora aposentada de Didática Especial da Matemática (1952-1977) da FFCL-BA. Natural de Salvador (BA), Marta Dantas licenciou-se em Matemática pela FFCL-BA (1945-1948). Recém-graduada, foi convidada pelo professor Isaías Alves (diretor da FFCL-BA) para dirigir o Colégio de Aplicação da universidade, fundado em 1949. Em 1952, foi convidada a lecionar Didática Especial da Matemática na FFCL-BA, em

substituição ao professor Aristides da Silva Gomes. A professora Martha Dantas sentia- se incapacitada para assumir tal disciplina, conforme seu depoimento. Em relação ao professor Aristides da Silva Gomes – que havia sido seu professor de Didática da Matemática na graduação – Martha Dantas afirmou:

[...] apesar de tê-lo tido como professor da referida disciplina e de ser o mesmo um didata por excelência – para o ensino em nível superior – inquietava-me a falta de troca de experiência e de literatura para o ensino de Didática Especial da Matemática. [...] Não me sentindo em condições de assumir o cargo com a competência e segurança desejáveis, solicitei e consegui permissão para me afastar do país e observar o ensino da Matemática em países da Europa, pioneiros na renovação do mesmo quanto aos conteúdos programáticos e processos de ensino. (Dantas, 1993, p. 13)

Ao se tornar responsável pela disciplina Didática da Matemática no curso de licenciatura em Matemática da FFCL-BA nos anos 1950, Martha Dantas preocupou-se com a problemática do ensino de Matemática: os programas de Matemática eram impostos pelo Ministério da Educação, sem consulta aos professores; os livros didáticos eram elaborados apenas para atender aos programas; o autoritarismo, o ensino tradicional, a apresentação da matéria e sua avaliação. Martha Dantas sabia que era preciso mudar, mas não sabia por onde começar. Por isso, decidiu se ausentar do país em 1953 e conhecer novas realidades educacionais em países como a Bélgica, a França e a Inglaterra.

Segundo Martha Dantas, a disciplina Didática Especial de Matemática assumia um lugar marginal no meio acadêmico, uma vez que “os cursos de Metodologia da Matemática eram, por vezes, até ridicularizados e, talvez por isso, não contávamos com literatura apropriada para os mesmos” (Dantas, 2002, p. 05).

Ao saber da existência de um curso de Didática Especial de Matemática na Bélgica, optou por conhecer, inicialmente, esse país. O interesse em conhecer um país que não fosse latino também a fez optar pela Inglaterra. E o entusiasmo pelas publicações francesas e pelo Centro Internacional de Estudos Pedagógicos de Sèvres a fez optar pela França.

Na Bélgica, em contato com Sterkens, Martha Dantas descobriu que a Metodologia do Ensino da Matemática tinha começado a preocupar os professores a partir do século XIX, especificamente no ano de 1865, quando foi publicado, na França, o livro Des méthodes dans lês sciences de raisonnement, de Duhamel. O primeiro curso de Metodologia da Matemática – Cours de Méthodologie Mathématique à l’École Normal de Sciences – foi criado por Félix Dange na Bélgica, na Universidade de Gand, entre 1870 e 1880. Martha Dantas ficou admirada ao saber que, na Bélgica, exigia-se

dos alunos uma tese como requisito para a obtenção do grau de licenciado, fato inexistente até então no Brasil.

Na Inglaterra, em contato com Mr. Rollett, Martha Dantas interessou-se pelos problemas educacionais. A Inglaterra estava perdendo seus melhores professores em função dos baixos salários, justificando o predomínio de mulheres no magistério das escolas secundárias.

Na França, o trabalho desenvolvido pelo Centro Internacional de Estudos Pedagógicos de Sèvres foi o que realmente despertou o interesse de Martha Dantas, uma vez que lá estava sendo desenvolvido todo um trabalho de reforma do ensino de Matemática, fundamentado nos conhecimentos das áreas de Psicologia e Pedagogia. Em Sèvres, a professora teve contato com o “trabalho dirigido”. Por meio de Mlle Dionot e Mme Hatinguais, teve a oportunidade de visitar dois Liceus de Paris: La Fontaine e Camille Sée.

Após o contato com essas três diferentes realidades, a professora Martha Dantas voltou para o Brasil e começou a pensar na situação em que se encontrava o ensino de Matemática no país:

Era preciso fazer cessar o isolamento no qual viviam, no Brasil, um país de dimensões continentais, os que ensinavam Matemática naquela época. Era preciso coordenar esforços para analisar a situação existente e encontrar novos rumos para a educação matemática. Pensei num encontro, um grande encontro que pudesse reunir professores de Matemática do curso secundário de todo nosso país e jurei realizá-lo. (Dantas, 1993, p. 21)

A partir dessas experiências, nasceu o 1º Congresso Nacional de Ensino de Matemática, realizado na cidade de Salvador (BA) em 1955, reunindo professores de diversos estados brasileiros. O congresso abordou algumas temáticas, tais como: a análise crítica dos programas vigentes; os métodos gerais de ensino; as tendências modernas do ensino de matemática; o livro de classe; os meios de preparar e interessar o professor para o interior do país; o aperfeiçoamento contínuo do professor, construindo, a partir dessas temáticas, uma nova área de pesquisa e conhecimento: a Educação Matemática.

Com vista nas reflexões levantadas, vimos o quanto à Didática Especial teve suas origens relacionadas à Escola Normal. Tal filiação implicou em certas características da nascente disciplina, como seu caráter pedagógico amplo, pouco específico em relação à matemática, e o desprestigio de uma disciplina com conteúdos e docentes oriundos do ensino secundário, sem formação específica.

No capítulo seguinte, veremos como essa mesma disciplina muda de nome, apresentando também uma nova configuração e uma nova concepção de formação de professores: a Prática de Ensino.

CAPÍTULO 2:

A PRÁTICA DE ENSINO DE MATEMÁTICA: