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ACADÊMICA Catedrático Onofre de Arruda Penteado Júnior Prof Normalista

Assistente Rafael Grisi Licenciado em Filosofia

Assistente Amélia Domingues de Castro Licenciada em História e Geografia

Auxiliar de ensino Aída Costa Licenciada em Letras

Auxiliar de ensino Berenice Corrêa Gonçalves Licenciada em

Matemática e Física

Auxiliar de ensino Rail Gebara Licenciado em História

Natural Fonte: Anuários da FFCL-USP. São Paulo, 1950.

De acordo com o Anuário da FFCL-USP de 1950, não consta a formação acadêmica do professor Onofre (catedrático de Didática Geral). Quanto aos demais professores (assistentes e auxiliares de ensino), todos possuíam uma formação em nível superior, sendo responsáveis pelas Didáticas Especiais.

A fim de compreendermos a relação estabelecida com as disciplinas pedagógicas, apresentamos, a seguir, o número de alunos licenciados em 1950 pela FFCL-USP, de acordo com o Anuário daquele ano. Os cursos que apresentaram maior número de alunos licenciados em 1950 foram os cursos da área de conhecimentos humanos: Pedagogia (34), Letras Neolatinas (15), Geografia e História (15), Letras Anglo- Germânicas (14), Letras Clássicas (14), Ciências Sociais (12), Filosofia (07) e História Natural (07). Os cursos que tiveram um número menor de alunos licenciados foram os cursos da área de exatas: Química (04), Física (04) e Matemática (03). Vale ressaltar que o pequeno número de alunos da área de exatas matriculados nas disciplinas pedagógicas deve-se também ao número de alunos que conseguia concluir o curso. Daí, um número pequeno de alunos licenciados.

1.5 A Didática Especial da Matemática

A formação de professores de Matemática na antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP é tema central da pesquisa de Silva (2000). De acordo com a autora, todos os professores do primeiro curso de Matemática da FFCL-USP foram professores estrangeiros contratados pelo governo, basicamente professores italianos e franceses, destacando-se, entre eles, Luigi Fantappiè e Giácomo Albanese.

Em alguns depoimentos de ex-alunos do curso de Matemática da FFCL-USP – que selecionamos para nossa pesquisa – identificamos elementos que revelam um forte desprestígio da disciplina Didática Especial da Matemática. O depoimento do professor Benedito Castrucci (1909-1995) ilustra muito bem o desprestígio das disciplinas pedagógicas no âmbito acadêmico.

Formado pela Faculdade de Direito da USP (1935), Benedito Castrucci lecionava várias disciplinas no ensino secundário durante o seu último ano de faculdade como forma de se sustentar financeiramente. Depois de formado, atuou como advogado na Secretaria da Fazenda, mas não se identificou com a profissão. Como já havia lecionado Matemática e gostava dessa área, resolveu prestar vestibular para o curso de Matemática da FFCL-USP.

Ao falar de sua experiência como ex-aluno do curso de Matemática (1937-1939) e assistente do professor Luigi Fantappiè (a partir de 1940), o professor Benedito Castrucci ilustra em seu depoimento uma nítida separação entre os alunos do curso de licenciatura em Matemática (que cursariam as disciplinas pedagógicas) e os futuros docentes universitários (bacharéis em Matemática). No depoimento concedido à Sônia Maria de Freitas (1992), Benedito Castrucci diz:

Eu não fiz aquele curso de Didática. Porque havia um curso de Didática da Matemática, com Didática Específica, Didática Geral, Psicologia, essas coisas todas. E esse curso o Fantappiè nos aconselhou a não fazer: “Estuda Matemática, deixa de lado essas coisas de Didática, porque Didática só tem uma regra boa: saber a matéria. Se você souber a matéria, você é um artista, e se for um mau artista, será a vida toda. Se for um bom artista será um bom professor. O resto põe tudo de lado. Os que fizeram didática na minha turma foram aqueles que já estavam excluídos da carreira de professores na Universidade. Já estavam empurrados para o ensino secundário, foram fazer o curso, era de um ano”. (p. 50)

No depoimento de Castrucci temos o exemplo de um ex-aluno que não fez o curso de Didática. Em seu relato, identificamos um descaso de seu professor em relação às disciplinas pedagógicas, considerando-as como algo menor, dispensável para a vida docente.

Certamente os professores estrangeiros exerceram uma forte influência na formação dos primeiros professores de Matemática formados na USP:

[...] a formação pedagógica do futuro professor de Matemática não era valorizada pelos professores italianos, que até desaconselhavam os estudantes a realizarem um ano de estudos após a conclusão do bacharelado e tornarem-se licenciados em Matemática. [...] O modelo de ensino estava muito mais apoiado no profissional matemático universitário do que no professor do ensino secundário. Por muitos anos, esse foi o referencial que o futuro professor buscou para se espelhar. Assim, o professor ideal passou a ser algum daqueles profissionais com quem ele conviveu, aprendeu e em quem acreditou. (Silva, 2000, p. 13)

Em seguida, temos o depoimento de Júnia Borges Botelho, professora aposentada do IME-USP e ex-aluna do curso de Matemática (1945-1948) da FFCL-USP. Em entrevista concedida para nossa pesquisa, ela nos fala da experiência que teve ao cursar a disciplina Didática da Matemática em 1948 com o professor Rafael Grisi. Segundo ela, fazer o curso de Didática era obrigatório para quem fosse lecionar no ensino secundário:

Era o meio de vida que eu tinha escolhido. Eu não tinha garantias de que seria contratada pela universidade para lecionar – o que dispensaria essa licenciatura. Aliás, quando eu terminei o curso, o professor me disse que gostaria que eu ficasse, mas que a universidade não tinha vagas naquela época. Então, fiz licenciatura porque todos os alunos fizeram. Não foi uma decisão: foi uma necessidade para quem quisesse lecionar no magistério secundário. Se eu não fosse obrigada, provavelmente eu não teria feito o curso. Se eu tivesse a opção de não fazer, eu certamente não teria feito. Mas eu não tinha opção, já que eu precisava lecionar no magistério secundário. Para quem fosse seguir carreira universitária, não havia essa exigência (Botelho, 2006).

Junia Botelho realizou o Curso de Didática de apenas um ano pela obrigação. A necessidade de ter a licenciatura como requisito básico para lecionar no ensino secundário a fez cursar as disciplinas pedagógicas oferecidas pela Seção de Didática. Sobre a metodologia aplicada na disciplina de Didática da Matemática, ela afirma:

Nós não tínhamos aulas de aplicação, aulas que fossem comentadas, depois analisadas. Não houve nada disso. O professor de Didática da Matemática, Rafael Grisi, nos pedia alguns trabalhos. Eu acho que havia um livro de Didática Geral, mas Didática Especial não havia livros. A Didática da Matemática ainda era muito incipiente, muito primária. O curso não deixou marcas. O professor Rafael Grisi fazia umas preleções, não tinha um roteiro, não havia um livro, não existia material escrito. Eu me lembro que havia uma discussão se o ensino da matemática realmente ajudava no aprimoramento do pensamento lógico ou não, isso eu me lembro. Quer dizer, se o aprendizado da matemática tinha influência sobre o aprimoramento do raciocínio ou não. (Botelho, 2006)

De acordo com as memórias da professora Júnia Botelho, a disciplina Didática da Matemática não deixou muitas marcas. Não havia um programa preestabelecido, não havia uma literatura específica para a disciplina. Assim, a concepção de ensino e de

formação de professores assentava-se no bom conhecimento da matéria e em saber ensiná-la:

Na minha época, dominava a ideia de que o essencial era conhecer profundamente a matemática e gostar dela. Uma boa aula derivava normalmente desses dois fatores: conhecer profundamente a matéria e gostar de dar aulas. Principalmente conhecer a matéria. Realmente, quando eu era aluna, não havia valorização nenhuma da Didática da Matemática. Eu até tive um interesse diferenciado da maioria, mas sempre com um certo pé atrás. Porque realmente não se valorizava muito esse estudo sobre ensino de matemática, métodos de matemática... Se considerava que era um terreno muito movediço, sujeito a modismos. E até nos Estados Unidos também havia esse preconceito. Os matemáticos que não conseguiam sucesso na carreira profissional iam fazer Didática da Matemática. Havia certamente essa ideia! Era considerada uma disciplina menor. Não havia ninguém que se entusiasmasse com o curso de Didática. Não era um curso respeitado.

O depoimento de Júnia Botelho vem corroborar o depoimento de Benedito Castrucci: para ensinar matemática não era necessário estudar questões pedagógicas, e sim conhecer muito bem a matéria que iria lecionar. Nesse período, a Didática da Matemática ainda era muito incipiente, e isso fez com que os matemáticos também não a valorizassem. O depoimento da professora apresenta a insegurança que os próprios alunos do curso de licenciatura tinham em relação às disciplinas pedagógicas, uma vez que a própria Júnia Botelho diz ter ficado com um “pé atrás”, manifestando incerteza em relação à área. Vemos que a área pedagógica foi estigmatizada como um “terreno movediço”, em que os conteúdos abordados nas disciplinas pedagógicas estariam sujeitos a “modismos”, sofrendo constantemente alterações e que os alunos eram “contaminados” pelas concepções de seus professores.

Aproveitamos, também, o depoimento do professor Sylvio Andraus, retirado de uma entrevista concedida à Gilda Lúcia Delgado de Souza (1998) para sua pesquisa de mestrado. Na entrevista, o professor Sylvio Andraus também relata sua experiência como ex-aluno do curso de Matemática da FFCL-USP (1950-1953) e afirma que as disciplinas pedagógicas, oferecidas no 4º ano da faculdade (curso de Didática), não eram disciplinas que cativavam os alunos, pois faltava uma prática docente que permitisse aos alunos lecionar com mais segurança.

O professor Sylvio Andraus diz que a formação obtida nas disciplinas “científicas” do curso de Matemática influenciou muito em sua prática pedagógica, enquanto que a disciplina Didática Especial de Matemática não exerceu grande influência, visto que os alunos da licenciatura não desenvolviam aulas práticas, deixando de estabelecer uma relação com a realidade escolar do ensino secundário – nível para o qual lecionariam futuramente:

Então, eu tive a felicidade de ter a nata da USP dando aula para mim! Eu sou produto deles! Então, isso aí foi prejudicial nos meus primeiros anos de magistério porque eu passei para os meus alunos aquela linha de conduta e os meus alunos sofreram comigo. Eu procedia com os meus alunos de forma semelhante à dos meus professores. Errado! Aquilo é para curso superior, não é para curso médio! Nós tivemos uma professora de Didática Especial que ficou naquilo, não dava para usar no colégio! Não dava! Não tínhamos treinamento! Não tínhamos estágio! Isso fez falta para nós! Então, quando passei no concurso e fui dar aulas o que aconteceu foi isso! E aí, eu vim para o Canadá, ainda com aquele perfil e só com o tempo, eu fui diminuindo o nível de cobrança tornando-me mais acessível. Por isso, hoje eu tenho condições, muito melhores, de escrever os livros, do que antigamente! Hoje, eu faria os livros muito mais voltados para o aluno do que para o professor! (Souza, 1998, p. 101-102, grifo nosso)

Quando os professores estrangeiros retornaram aos seus países de origem, após a 2ª Guerra Mundial, houve uma corrida pela efetivação de professores catedráticos, gerando, inclusive, disputa entre profissionais de áreas diferentes. O desprestígio das disciplinas pedagógicas é melhor entendido quando se considera que se tratava de uma disputa de espaço entre profissionais de diferentes áreas. Os professores assistentes – “sucessores naturais” dos professores estrangeiros – tinham que esperar a vez para tornarem-se catedráticos na universidade, enquanto alguns professores do Instituto de Educação assumiram seus postos sem a necessidade de concurso público:

[...] enquanto suas carreiras na universidade dependiam dos humores e favores dos catedráticos, da paciência de esperar o momento de se tornar professor, e do sucesso nas duras provas dos concursos, aquela “gente de fora” vinha assumir automaticamente as cobiçadas posições. (Bontempi Jr., 2007, p. 3)

Por isso, entendemos que o desprestígio das disciplinas pedagógicas, instaurado desde o início, firmou-se na universidade em conseqüência de uma rivalidade proporcionada pela forma de contratação dos profissionais de diferentes áreas:

[...] ainda que resultando na alegação de “inferioridade científica” dos assuntos pedagógicos de que se ocupavam as cadeiras oriundas do IE, a discriminação entre os professores pode ter sido alimentada por um sentimento de angústia dos “filósofos” diante da invasão de espaços e da conspurcação das vias legítimas de ascensão hierárquica pelos “pedagogos”. (Bontempi Jr., 2007, p. 3)

Buscando compreender melhor a disciplina Didática Especial da Matemática no curso de licenciatura em Matemática, analisamos um programa de ensino da disciplina em questão que encontramos nos “Programas aprovados pela Congregação para o ano letivo de 1954” (USP, 1954).

QUADRO 2: