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“SELEÇÃO DE PROBLEMAS” – CURSO DE

Fonte: ASCIP

O caderno apresenta uma lista com 115 diferentes exercícios e volta-se à prática da resolução de problemas. Esse material, não publicado, era disponibilizado aos alunos e se assemelha a um projeto de livro didático de matemática, contendo mais exercícios que propriamente atividades propostas para uma disciplina de formação de professores. Essa característica parece espelhar a concepção do curso do professor Scipione, conforme o programa referido, de que a formação do professor devia passar por um contato intenso com conteúdos específicos de matemática básica, levantados em forma de problemas semelhantes ao que seria abordado nos cursos de 1º e 2º graus (atual ensinos fundamental e médio).

Enquanto a FFCL-USP manteve o Colégio de Aplicação em funcionamento de 1959 a 1968, na cidade de Rio Claro, também foi criado um Colégio de Aplicação para prática pedagógica dos licenciandos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro. Criado em fevereiro de 1969 (Decreto Estadual nº51.408/69), o Colégio de Aplicação passou a funcionar em maio do mesmo ano, com a instalação da 1ª série do ciclo colegial. O objetivo do colégio seria “promover investigações quanto a currículos, sistemas de organização e métodos didáticos no campo da educação de nível médio”, além de “funcionar como centro de experimentação e demonstração da FACULDADE” (Plano de Organização Administrativa e

Pedagógica do Colégio de Aplicação apud Mauro, 1999, p. 80). A partir de 1972, o Colégio de Aplicação da FFCL-Rio Claro perdeu seu caráter experimental e passou a funcionar como unidade subordinada à rede estadual de ensino.

Entendemos que as Escolas de Aplicação surgiram com o objetivo de fornecer uma formação prática aos licenciandos. Além disso, elas tiveram um caráter renovador, buscando trazer para a sala de aula novas teorias pedagógicas. A experiência dos Colégios de Aplicação materializa uma concepção de ensino-aprendizagem e também uma concepção de formação de professores: a escola como “laboratório” e espaço de exercício de prática e de aplicação de conhecimentos.

2.3 Os programas de Prática de Ensino de Matemática

A professora Anna Maria Pessoa de Carvalho (1992), docente do Departamento de Metodologia de Ensino da Faculdade de Educação da USP desde 1965, assim expressa a passagem da Didática Especial para a Prática de Ensino:

No princípio era a Didática Especial. Uma Didática Especial muito mais sedimentada nos conhecimentos empíricos e pessoais do professor que a ministrava do que baseada em um corpo de conhecimentos sobre o ensino do conteúdo específico. (p. 247)

Se durante o trabalho com a Didática Especial bastavam apenas os conhecimentos empíricos, na Prática de Ensino, o professor necessitaria de um corpo de conhecimentos muito maior a fim de trabalhar os conteúdos em sua didática específica. A disciplina sairia, então, de um campo teórico, buscando uma prática e trazendo mais realismo às atividades docentes.

Em artigo no qual relata as memórias sobre o ensino de Didática e Prática de Ensino, a professora Amélia Domingues de Castro vem corroborar a ideia de Carvalho (1992). Em seu artigo, Castro (1992) afirma que a Didática Especial foi substituída pela Prática de Ensino:

Passo a uma observação que julgo importante. O Conselho Federal de Educação, em 1962, suprimiu a anterior Didática Especial, substituída pela decisão ambígua referente à obrigatoriedade, sob a forma de Estágio Supervisionado, da “Prática de Ensino das matérias que sejam objeto de habilitação profissional”. Seria apenas estágio? Seriam suprimidas as aulas onde as atividades práticas eram orientadas e discutidas? Nas quais eram propostos os problemas envolvidos no trânsito de uma ciência pesquisada e aprendida, para uma ciência a ser ensinada para ser conquistada pelas novas gerações? Na USP, felizmente, houve apenas a troca de denominação da disciplina. (p. 238)

Em depoimento à nossa pesquisa, a professora Amélia Domingues de Castro revela como foi difícil trabalhar com os professores das Didáticas Especiais na FFCL- USP quando se implementou a Prática de Ensino:

No interior da Faculdade, o conflito existia... Era um “conflito de limites”: até onde vai a Didática e onde começa a Prática de Ensino? [...] Então você estuda uma teoria da prática? Então você estuda na faculdade? E os professores de Didática Especial, que passaram para as Práticas de Ensino, diziam: “Mas eu preciso ter aulas com esses alunos! Eu não posso soltar essa turma nas escolas! O que eles vão fazer lá se não houver uma organização aqui?” A luta foi para conseguirmos aulas no currículo. E muitos diziam: “O que vocês querem é teoria da prática!” E nós dizíamos: “É isso mesmo! Teoria da prática!” Você não pode ter uma prática que seja por ensaio, erro e acerto. Então nós começávamos a estudar a nossa área. Que tipo de matéria é essa? O que é a Biologia? O que é a Geografia? O que é a Matemática? A gente tinha uma discussão muito grande com os alunos. E aí tinha que haver muito entrosamento entre a parte geral e a parte especial. Se eu trabalhasse com eles as teorias de ensino – Piaget, Skinner, condicionamento – você tinha que ver qual era a decorrência disso na área específica. (Castro, 2007, p. 9, grifo nosso)

Por meio desse depoimento, percebemos a grande preocupação que se estabeleceu entre os docentes dos cursos de formação de professores. Sentindo-se na responsabilidade de formar professores para a escola básica, os docentes das Práticas de Ensino não poderiam simplesmente abandonar as aulas teóricas e levar os licenciandos às escolas sem algum preparo teórico: tornava-se necessário, então, que o professor conciliasse a teoria e a prática. Quando a Prática de Ensino – sob a forma de estágio supervisionado – fora imposta pela legislação, muitos docentes não concordaram que seus alunos (licenciandos) pudessem ir às escolas, para realizar os estágios, sem antes passar pela universidade em busca de uma formação teórica que o habilitasse ao trabalho docente. Assim, a disciplina Prática de Ensino passou a aliar a teoria e a prática, elementos fundamentais para a formação do professor.

Segundo Garcia (1994), a maioria das instituições de ensino superior não aceitou a forma como a Prática de Ensino foi instituída nos cursos de formação de professores. Ao lado dos estágios supervisionados, os professores de Prática de Ensino acabaram adotando programas de ensino que lhes permitissem discutir questões relativas aos conteúdos e métodos de ensino. Desse modo, a instituição dessa nova disciplina caracteriza uma nova ruptura da Didática Geral e da Didática Especial, passando a ser, a partir de então: Didática e Prática de Ensino.

Em depoimento à Garcia (1994), a professora Amélia Domingues de Castro indica uma delimitação das áreas – Didática e Prática de Ensino: “Porque nós nunca nos conformamos que a prática de ensino fosse só prática. Sempre se tinha as aulas na faculdade. Então, nós tínhamos que fazer a composição” (p. 126).

O depoimento da professora Amélia mostra que a Prática de Ensino, além de levar o licenciando à realidade escolar, serviria também para que cada área de conhecimento pudesse desenvolver seus referenciais teóricos a fim de que o estagiário pudesse se apoiar em alguma literatura básica e/ou teoria necessária ao trabalho docente. A partir dessa necessidade, as áreas de conhecimento foram se desenvolvendo no interior das universidades.

Garcia (1994) destaca a relação existente entre a didática e a prática de ensino: “A prática de ensino se constituiu nesses anos como um prolongamento da didática geral, não tendo, portanto, uma autonomia em relação a essa”. (p. 127)

Nesse sentido, consideramos, de acordo com Garcia (1994), que a Prática de Ensino foi, nos tempos pioneiros, um desdobramento da Didática, já que em um período anterior – antes do Parecer 292/92 – prevalecia a disciplina Didática Especial nos currículos dos cursos de formação de professores. Nesse sentido, os professores de Prática de Ensino continuaram com as mesmas práticas: lecionando nas universidades para, depois, levar os alunos aos estágios supervisionados.

Essas ideias podem ser vistas nos programas que encontramos disponíveis para consulta nas instituições pesquisadas. Em relação à Prática de Ensino, encontramos o primeiro programa dessa disciplina na FFCL-USP. O programa que encontramos servia a todas as Práticas de Ensino da Universidade de São Paulo referente ao ano de 1964. No caso da Prática de Ensino de Matemática, o programa era o mesmo e, como docente responsável pela disciplina, temos o nome do professor Scipione Di Pierro Netto. Pelo que consta nos programas consultados, a primeira vez que ele apareceu como docente responsável pela disciplina foi em 1962, quando ainda se denominava Didática Especial da Matemática. Até 1960, a disciplina aparecia sob a responsabilidade de outros professores. Em 1964 – após o Parecer 292/62 – a Prática de Ensino já se apresentava nos currículos para ser ministrada em dois semestres letivos:

QUADRO 5:

PROGRAMA DA DISCIPLINA

PRÁTICA DE ENSINO (GERAL) – USP (1964)