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A expressão educação não-formal se populariza nos fins da década de 1960. Na obra “A crise mundial da educação”, Coombs (1968) enfatiza a necessidade de desenvolver meios educacio- nais diferentes dos tradicionalmente escolares, propondo três tipos de educação: formal, não-formal e informal. A primeira compreende o sistema educacional institucionalizado; a segunda refere-se a toda atividade organizada, sistemática e educativa realizada fora do marco do sistema oficial, para favorecer deter- minados tipos de aprendizagem; e a terceira corresponde a um processo cuja duração é pela vida inteira, na medida em que as pessoas adquirem e acumulam conhecimentos, atitudes e modos de discernimento por meio das experiências diárias e de sua relação com o meio.

Jaume Trilla (2008), em seu texto “A educação não-formal”, explica os contextos e os fatores que propiciaram este tipo de educação, o qual teve início a partir da segunda metade do século XX. Esse autor ressalta o quanto o discurso pedagógico historica- mente se concentrou na escola, sendo a educação identificada com escolarização. Mas alguns fatos irão relativizar e complementar essa perspectiva tão polarizada em torno da escola. Dentre estes, destacam-se: em primeiro lugar, que o essencial para sociedade é a educação, enquanto a escola é uma instituição histórica; em segundo lugar, que a escola como um lócus da formação implica na coexistência de variados mecanismos educacionais; em terceiro lugar, que o processo educativo global e os seus efeitos nas pessoas não podem ser entendidos independentemente de fatores não escolares; em quarto lugar, que a estrutura da escola impõe limites; e, finalmente, que há necessidade de criar outros

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O desenvolvimento de ações educativas não-formais nas escolas públicas Lucrécio Araújo de Sá Júnior

meios e ambientes educacionais, percebidos sem relação de oposição com a escola.

Assim, a expansão da educação não-formal a partir dos anos 1960-70 acabou por acontecer em decorrência de vários fatores:

1. Aumento da demanda da educação com inclusão de setores sociais socialmente excluídos;

2. Transformações do mundo do trabalho que obrigam a operacionalizar novas formas de capacitação profissional; 3. Ampliação do tempo livre;

4. Mudanças na instituição familiar;

5. Os meios de comunicação de massa na vida social; 6. As novas tecnologias;

7. Implementação de ações em setores da população em conflito.

Nesse contexto, novos espaços se formaram e houve uma mudança no discurso pedagógico a fim de torná-lo capaz de integrar e legitimar tais espaços. Ao explicar as mudanças no contexto teórico da educação não-formal, Trilla (2008) explicita que, na produção do discurso pedagógico, a escola não consegue se estabelecer mais como o epicentro da educação.

Tal autor enumera em quatro rubricas os aspectos mais relevantes desse discurso:

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a) O discurso reformista da crise da educação

As novas propostas despontam nas décadas de 1960 e 1970. De modo geral, tratam da educação no mundo, dentro de uma visão macroscópica e compartilhando uma perspectiva disciplinar eclética. Tais propostas apresentavam coincidências com organismos internacionais e os críticos da época as qualifi- cavam de tecnocrático-reformista. Apresentavam análises amplas sem crítica aos contextos cujo lema era reformar, modernizar e readaptar. Como expoentes destas propostas, podemos citar Coombs (1968) e Edgar Faure (1974).

b) As críticas radicais da educação escolar

Eclode uma literatura de discursos críticos à escola. O para- digma é o da reprodução e tem como expoentes Althusser, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet, Bernstein, Bowles e Gintis, e Apple. Destacam-se também I. Illich, E. Reimer e J. Holt, e P. Goodman, bem como as reflexões de Michel Foucault. Estas críticas cultivam e integram as reflexões sobre a educação não-formal, levando alguns a pensar que a ação educativa seria salva e reabilitada simplesmente afastando-se da instituição escolar.

c) A formulação de novos conceitos

Neste marco, surge a ideia de uma educação como educação permanente, recurso terminológico de linguagem pedagógica. As pessoas poderiam se educar para sempre. A educação permanente denota uma extensão do tempo educacional e ao mesmo tempo exige outros recursos educacionais, configurando sua extensão horizontal ou institucional. Em torno desta ideia, orbitam

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expressões como andragogia, educação de adultos e educação ao longo da vida. Também surgem outros conceitos para dar conta da extensão espacial ou institucional tais como educação aberta, formas não convencionais de educação e educação extraescolar. Os últimos conceitos a surgirem no âmbito dessa perspectiva foram: sociedade educativa de aprendizagem, sociedade da aprendizagem, sistema formativo integrado e cidade educadora.

d) O paradigma do meio educacional

A captação da heterogeneidade e a integração de instâncias formadoras conduziram à necessidade de modificar a ótica da pedagogia. O modelo simplista da relação pessoal e direta entre educador e educando esquece que o meio influencia a relação, ou seja, que o meio educa. O educador, além de se relacionar direta e pessoalmente com o educando, atua na medida da sua capa- cidade e autonomia, contribuindo para a configuração do meio educacional. Tal fato conduz à visão da relação entre micromeios, como a sala de aula, e macromeios, como a cidade ou o país. É uma nova lente que representa o paradigma do meio educacional.

Para Trilla (2008), o conceito de educação não- formal considera a educação como um fenômeno complexo, multiforme, disperso, heterogêneo, permanente e quase onipresente. Os conjuntos de processos educacionais contêm elementos variados que impõem classes de aptidões diferenciadas. Fazendo uso das palavras do autor:

Há educação, é claro, na escola e na família, mas ela também se verifica nas bibliotecas e nos museus, num processo de educação a distância e numa brinquedoteca. Na rua, no cinema, vendo televisão e navegando na internet, nas reuniões, nos

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jogos e brinquedos (mesmo que eles não sejam dos chamados educativos e dialógicos) etc. ocorrem, igualmente, processos de educação. Quem educa, evidentemente, são os pais e os professores, mas as influências formadoras são exercidas por políticos e jornalistas, poetas, músicos, arquitetos e artistas em geral, colegas de trabalho, amigos e vizinhos, e assim por diante. (TRILLA, 2008, p. 29)

Ao tratar da tripartição do universo educacional e da defi- nição de educação não-formal, Trilla (2008) explicita que, apesar das contribuições de Coombs (1968), faz-se necessário algumas observações adicionais. A classificação tripartite tem o propó- sito de exaustividade, ou seja, a soma do educativamente formal, não-formal e informal deveria abranger o universo inteiro da educação. Assim, qualquer processo que se situe no universo educacional deve abranger o universo inteiro da educação. A distinção é um modo de setorizar aquele universo, uma tenta- tiva de traçar fronteiras no seu interior. Desse modo, para Trilla (2008), a educação não-formal e formal deveriam ser sub-classes de um mesmo tipo de educação. A seguir, serão discutidas algumas fronteiras que surgem no âmbito da educação segundo o autor.