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CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA

2. A Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989

2.3. Princípios Gerais

2.3.4. Respeito pelas Opiniões da Criança

2.3.4.2. A escola e os direitos de participação

O Comité dos Direitos da Criança reconhece que, para implementar o princípio do respeito das opiniões das crianças, é necessário mudar atitudes e práticas, no seio da família, da escola e da comunidade.

Nesse sentido, o Comité dos Direitos da Criança apontou diversas estratégias para implementar o princípio do respeito dos direitos da criança, incluindo a educação, programas de informação e formação contínua de todas as pessoas que lidam com as crianças (cfr. Hodgkin e Newell, 1998, p. 153).

As escolas devem desenvolver um ambiente democrático, propício ao desenvolvimento nos alunos, das competências necessárias para o exercício do direito de participação. Também para Hammarberg (1977) “ L’école est naturellement un lieu important pour l’éxercice de ce droit” (p. 24).

Para efectivar o direito de participação das crianças, é necessário educá-las nesse sentido, o que envolve o desenvolvimento de competências sociais, comunicacionais e do espírito

crítico, bem como proporcionar oportunidades para que as crianças possam praticar e desenvolver essas competências.

Para este efeito, torna-se necessário que as escolas reconsiderem as suas práticas em relação à participação dos alunos, e que os professores se envolvam na reavaliação do seu papel.

Referindo-se ao papel dos professores, Holden e Clough (2005) salientam que “ There are implications for teachers in terms of the values they hold, the freedom and autonomy they give their pupils, and the choices they make within the curriculum” (p. 16).

Debruçando-se sobre a educação que é proporcionada aos alunos nas escolas, Lansdown (1998) salienta que:

se concebe la educación como un proceso inidireccional. No se abre ningún horizonte a la relación dinâmica entre el enseñante y el alumno. Cuántas son las escuelas en todo el mundo que hacen preguntas a los niños sobre lo que se les enseña, lo que les gustaría de aprender, como habría que enseñar y qué métodos de aprendizage les interesan? Cuántos gobiernos entablan el diálogo com los niños cuando elaboran los programas nacionales de estúdio (1998, p. 61)?

Para aquela autora, as escolas e os governos, ao ignorarem as opiniões dos alunos, estão a violar o direito de participação previsto na Convenção sobre os Direitos da Criança.

Refere ainda a autora que os alunos podem contribuir, com as suas opiniões, a sua experiência e a sua criatividade, para a elaboração dos programas escolares. De facto, os programas escolares, ao serem elaborados pelos governos, não deixam margem para a introdução de novas ideias que os alunos expressam nas aulas, nem para introduzir temas sobre os quais eles gostariam de obter respostas.

Atendendo ao descontentamento e desinteresse pela escola, manifestados pelos alunos em todo o mundo, bem como ao aumento das taxas de abandono escolar, os governos deviam procurar a colaboração dos alunos na elaboração dos programas escolares (cfr. Lansdown, 1998, p. 62).

A mesma autora (1998, p. 62) sublinha que os alunos deviam participar nos debates sobre os efeitos das políticas educativas dos governos e nas estratégias a adoptar para a obtenção

de uma maior eficácia na escolarização. Salienta ainda, a existência, em certos países europeus, de redes regionais de estudantes que têm um papel importante no contributo que dão ao governo, sobre as questões educativas, ao transmitir-lhes o ponto de vista dos alunos sobre diversas questões. Também nas escolas existem estruturas democráticas, onde os alunos podem discutir os seus pontos de vista.

Lansdown (1998, p. 62) realça o exemplo da Áustria, país que tem dado grande importância à contribuição das crianças, criando legislação que atribui aos alunos o direito de participarem activamente no funcionamento das escolas. Os alunos têm direito a participar na organização das aulas, na selecção dos materiais didácticos, na redacção de revistas escolares, nas visitas a instituições públicas e na escolha das personalidades convidadas a efectuarem conferências na escola. Também, criaram a Assembleia de Representantes de Alunos, onde participam os representantes de cada turma, para discutir as diversas questões que são de interesse para os alunos. Também os alunos elegem os membros dos órgãos de gestão das escolas. Estes também intervêm nas reuniões em que se decide a aplicação de sanções disciplinares aos alunos, tais como a expulsão e transferência de escola. No final do ano escolar, os representantes das escolas de cada região elegem uma Representação Provincial de Alunos, para o ano escolar seguinte. Esta organização representa os interesses dos alunos de cada região, perante as autoridades escolares, a inspecção e o parlamento. Dão, assim, um importante contributo, dando pareceres sobre questões importantes em matéria de educação e ensino, formulando recomendações sobre anteprojectos de lei, apresentando pedidos, formulando queixas e contribuindo para a planificação e organização das actividades educativas.

Por outro lado, Lansdown (1998) refere que “ La organización de las escuelas y las estructuras que en ellas se ocupan de tomar decisiones por lo general son jerárquicas, formales y poco democráticas” (p. 62).

Na verdade, constata-se que a forma de organização da maioria das escolas leva, na maioria dos casos, a que os alunos não sejam ouvidos, não se tendo em conta as suas opiniões nas decisões que são tomadas. Ora, a Convenção sobre os Direitos da Criança obriga os governos a adoptarem legislação que preveja a adopção de estruturas

democráticas dentro das escolas, criando oportunidades para que os alunos possam manifestar as suas opiniões e intervenham nas decisões que são tomadas. Para Lansdown (1998) “ es necesario que existan estructuras democráticas tales como hors de debate, consejos escolares y mecanismos de representación en los organismos administrativos, de manera que se asegure la participación activa de los niños” (p. 62).

Realça a autora que, no entanto, deve assegurar-se que essas estruturas, em que os alunos participam, tenham um poder real de intervenção, pois a maior parte das vezes, são inúteis e não têm um poder efectivo, pois não têm qualquer influência nas decisões que são tomadas no seio da escola (cfr. Lansdown, 1998, p. 62).

Por outro lado, os alunos também deviam participar na elaboração das normas de funcionamento e disciplina da escola. Salienta Lansdown (1998) que é necessário estabelecer um ambiente democrático dentro da escola, onde os alunos sintam que se respeita o valor da justiça. Assim, para a autora, as regras devem aplicar-se de igual modo para todos, sejam para adultos ou para as crianças, e os comportamentos que sejam proibidos às crianças não devem ser permitidos aos adultos. Só assim, se pode criar um ambiente democrático dentro da escola. Por seu turno, na aplicação de sanções disciplinares, deve ser dada sempre a possibilidade de o aluno ser ouvido.

No que respeita aos métodos de ensino-aprendizagem utilizados pelos professores, a autora refere que, tradicionalmente, o ensino é um processo unidirecional e não interactivo, constituindo um condicionalismo, pois os alunos são dissuadidos de fazer perguntas e de manifestarem a sua curiosidade.

Nesta perspectiva, a autora propõe o seguinte:

…hace falta que se consulte a los niños, invitándolos a tomar parte en la exploración de métodos didácticos eficaces, sino que además debería hacerse un esfuerzo por crear en la clase una atmósfera en la cual se aliente a los niños a ser curiosos, a discutir, a desafiar, a ser creativos, a buscar y descubrir, a ser escuchados y respetados. (Lansdown, 1998, p. 65)

Torna-se, assim, necessário os governos e os agentes educativos empenharem-se no desenvolvimento de um modelo educativo mais participativo, contribuindo para o

desenvolvimento de escolas mais eficazes, centradas nas crianças, respeitando o espírito da Convenção sobre os Direitos da Criança.

Uma vez analisados os quatro princípios gerais da Convenção, consideramos ser importante fazer um levantamento dos objectivos que a comunidade internacional, nas últimas décadas do Século XX, delineou para a educação, pelo que, de seguida, vamos fazer uma apreciação sobre este tema.